Nossa presidente é de fato desafiadora e ama assumir riscos. Acaba de demonstrar essas qualidades, ou virtudes, no caso das contas de energia elétrica e dos desafios aos seus críticos e "pessimistas", como ela diz. Pois, apesar deles, tudo está dando certo.
Esse temperamento vem de longe. Ninguém entra numa luta armada contra o regime do país onde vive se não tiver espírito desafiador e se teme o risco. Ela ainda teve a influência de bravos gaúchos em sua vivência no Rio Grande do Sul. Gaúchos, em geral, são desafiadores e intimoratos - desde quando ainda não haviam decidido se seriam brasileiros, uruguaios, paraguaios ou argentinos e guerreavam contra todos esses vizinhos. Chegaram a tentar fundar uma República própria. Aceitaram ser parte do Brasil só depois de muito resmungo e graves tiroteios. Apacificação da província parece que só se impôs mesmo depois de Getúlio Vargas ter aportado no Rio de Janeiro.
De qualquer forma, Dilma gosta de fazer apostas. E não teme colocar o País como cacife. A Pe- trobrás está às tontas para saber de onde vai tirar dinheiro para cumprir os objetivos que a presidente quer que a empresa alcance, enquanto engole prejuízos. As empresas de energia elétrica concordaram, sim, em reduzir as contas de luz, mas a operação só foi aceita porque quem paga a conta é o contribuinte: R$ 19 bi- lhõesjáestão à disposição, no Tesouro Nacional, para cobrir o rombo. Como um grande número de brasileiros que pagam contas de luz não paga impostos, nem perceberão a esperteza.
Na verdade, as questões do preço da gasolina e a da diminuição das contas de energia, assim como a da queda forçada dos juros, não têm nada que ver, ou têm muito pouco que ver, com a ques- tão dramaticamente mais importante de dar condições de competitividade à economia brasileira, que está ficando para trás no contexto da economia internacional. E têm tudo que ver com o fato de serem dois passos importantes na caminhada da presidente para a reeleição. O projeto petista de 20 ou 30 anos 110 poder é a vitamina do voluntarismo de Dilma, como foi do seu antecessor.
Já tivemos um presidente voluntarista, embora menos exclusivista e mais democrático do que Lula e Dilma. Juscelino Kubitschek não queria ficar no poder por 20 ou 30 anos, mas queria porque queria que o Brasil caminhasse 50 anos em 5 e queria ficar na história com a construção de Brasília a qualquer preço. Contra muitos conselhos e opiniões da época, embrenhou-se nas duas "missões" e, de fato, conseguiu alguns importantes avanços para o Pais na área industrial e de infraestrutura. Mas nos legou uma tremenda desordem nas contas públicas. Passamos décadas tentando consertar um estrago que acabou nos levando àcrise da dívida externa e a um extenuante processo de montar, de fato, uma contabilidade pública que pudesse ser levada a sério.
Sem falar no processo inflacionário, que só pôde ser domado no final do governo Itamar - para dizer a verdade, quase que por um golpe de sorte política: uma boa idéia de uma brilhante equi- pedeeconomistas pôde ser aproveitada por um ministro da Fazenda que não entendia bulhufas do assunto, mas que, felizmente, acabou eleito presidente da República e deu continuidade à boa idéia. E quejá tinha havido tantas experiências fracassadas para conter a inflação, cujos resultados foram apenas muita turbulência pai a a população e desprestígio para ogoverno, que não custava experimentar a idéia um tanto heterodoxa esquematizada meio sem pretensões pela dupla Pérsio Árida e André Lara Rezende, no famoso projeto "Larida". Deu certo.
São exemplos, e não são únicos, de que às vezes a ousadia dá resultados positivos.
No discurso puramente eleitoral na televisão, com que nossa presidente apresentou a sua ousada decisão de baixar na paulada as contas de luz e desafiou "os que são sempre do contra" e "os pessimistas", além de garantir que não vai haver nenhum racionamento de energia elétrica - outra ousada aposta -, discorreu ainda sobre várias "realizações" do seu governo que ninguém consegue ver onde estão.
Foi um discurso para açular as falanges entusiasmadas do PT e prepará-las para a campanha que já começou.
O racionamento de energia já estaria havendo, se não fosse o "pibinho", ou seja, o baixíssimo crescimento da economia - obra mor dos seus dois anos.
Há mais de dois anos que "os do contra" e "os pessimistas" vêm dizendo que o crescimento da economia não pode depender apenas do aumento do consumo; que faltam investimentos; e que é preciso criar condições para eles, pois a maioria dos investimentos que alimentam o PIB vem da área privada.
Mas os resultados da destruição da política monetária, da queda forçada dos juros, da gestão fa- limentar de empresas estatais, do aumento dos déficits em conta corrente, da elevação da dívida pública e da emissão de títulos públicos para pagar juros públicos levam tempo para aparecer e afligir o público. Até lá, ela pode, sem dúvida, garantir a reeleição.
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