segunda-feira, agosto 27, 2012

Querendo que dê certo - LYA LUFT


REVISTA VEJA


Querer que dê certo, a gente sempre quer: a nova turma na escola, o novo amigo, o vestibular, o primeiro emprego, o casamento, o filho, a decisão inescapável, o necessário e o fútil, a segurança e a aventura. Os planos do novo ano. Os desejos bons e também os menos nobres, de que alguém se ferre, que para ele dê errado – porque não somos santos. A construção da vida, tanta coisa. As pessoas queridas. O livro, o carro, o amor ou até a separação. A sobrevivência depois da morte de alguém especial. Que dê certo também o que nem é pessoal mas a todos atinge: o país, a democracia, a qualidade de vida, a dignidade de todos, a redução da desigualdade, o nível do ensino, da saúde, os cuidados com a seca, com a enchente, com os deslizamentos, com os horrores da saúde pública, com o excesso de faculdades pelo país, a insensatez das cotas que promovem a discriminação e o preconceito, e marcam como incompetentes os que se beneficiam delas. Que às vezes nem têm outro jeito, pois nivelamos por baixo: facilitamos as coisas em lugar de dar aos que precisam melhores condições, condições ótimas: isso seria o sensato. Mas somos insensatos; então, torcemos para que, apesar de tudo, dê certo.

Agora nos oferecem mais planos, projetos, pacotes, para que, finalmente, o país deslanche do seu marasmo, que pacotes anteriores não sacudiram direito. Eu quero muito que deem certo esses novos projetos. Estradas e ferrovias, para começar, pois o nosso transporte é mais um inqualificável fator do nosso inqualificável atraso. Portos e aeroportos. Espero que se incluam também saúde, ensino, segurança, que andamos cada vez mais violentos e todas as notícias negativas, que são muitas, saem mundo afora preparando os espíritos para 2016. Que sejam projetos inteligentes e possíveis; que tenham à frente gente supercompetente, embora competência seja mercadoria rara por aqui. Há gente demais improvisando, viramos o país do improviso, do puxadinho, do jeitinho, do palpite? Os muito competentes podem nem querer certos cargos e encargos. Sobretudo se ligados à política: aí tudo se complica, os jogos de poder, os postos dados por interesse, não pelo preparo e capacidade, tanta trama que nem conhecemos direito, mas de que sabemos o suficiente para ficar de cabelos em pé. Ou melhor é não saber, assim a gente se salvaria? Seja como for, eu, que me afasto da política o mais que posso – para preservar alguma qualidade de vida, de objetividade e de harmonia comigo e com o mundo –, eu, que não pertenço a nenhum partido porque são demasiados e confusos, porque brotam feito cogumelos e são mutantes como camaleões nervosos, eu mesmo assim me interesso extraordinariamente por este país. A ele dei filhos e netos, seres humanos decentes e bons, desses que como tantos outros são o sal da terra e para isso não precisam ter poder nem altos cargos: basta que existam e sejam como são. A este país Brasil dei e darei trabalhos e décadas de vida. Dele muito recebi também, nele quero sempre viver, e morrer. Nele estou por escolha consciente todos os dias de minha vida. Então, quero muito que os novos projetos deem certo, com tudo o que contiverem de bom (o medíocre que neles exista faz parte de sermos humanos).

Resta saber o que é “dar certo”. Um plano com bons projetos é um comecinho. Predominarem boas intenções será dar um pouquinho certo (tudo em diminutivos por enquanto). Ficar em mãos experientes e competentes, sem amadorismo, será dar bastante certo. Passar da utopia para entrar na realidade, com seriedade, seria ou será dar supercerto. Se tudo sair medianinho, já vai ser um avanço. Chegar a termo será quase um milagre: a gente não vê muito disso por aqui. Não acredito cegamente, pelo que temos experimentado de grandes palavras, grandes planos – e grande esquecimento. Mas eu quero, eu torço, eu apoio, eu espero, eu observo... e, quando puder, eu comento. Que eu possa comentar só coisas boas, coisas positivas e concretas, e dizer: “Finalmente está dando certo, viva a gente brasileira”.

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