FOLHA DE SP - 12/07
Gilberto Kassab arrasta seu PSD para alianças tão díspares que até correligionários como Kátia Abreu lhe cobram coerência
Já se tornou folclórica, mas não por isso menos verdadeira, a frase de Gilberto Kassab para definir o PSD, partido que ele mesmo criou: "Não será de direita, não será de esquerda, nem de centro". Os fatos mostram que ele estava certo.
O enunciado gelatinoso revelou-se capaz de descrever com exatidão um partido que, em São Paulo, quase se aliou ao PT de Fernando Haddad e Luiz Inácio Lula da Silva, mas terminou com o antípoda PSDB de José Serra.
Isso, claro, bem depois de ter ensaiado uma fusão com o PSB de Eduardo Campos. No plano federal, faz a corte a Dilma Rousseff. Para completar a salada partidária, que não é especialidade do kassabismo, em Porto Alegre apoia a candidata do PC do B, Manuela D"Ávila.
Nesse comportamento errante da jovem legenda é possível divisar a expressão das características volúveis inscritas em seu DNA. Dessa perspectiva, esperar do PSD alguma coerência ideológica seria uma atitude impertinente.
Não deveria causar espanto, assim, o apoio de Kassab ao petista Patrus Ananias em Belo Horizonte, ainda que essa união pese contra Márcio Lacerda (PSB), aliado na capital mineira do mesmo PSDB que Kassab esposou em SP.
O pacto em Belo Horizonte, determinado com mão pesada por Kassab, desagradou figuras importantes do PSD, porém. O ex-ministro da Previdência Roberto Brant, segundo-vice-presidente do partido, anunciou sua desfiliação.
A senadora Kátia Abreu, vice-presidente nacional da sigla e presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária, endereçou carta desafiadora a Kassab: "[Houve] um grave e insolente dano ao espírito do nosso partido, nascido sob a inspiração da ruptura com os rótulos ideológicos anacrônicos".
Declarando-se em dissidência crítica e vigilante, Kátia Abreu insinuou ainda que Kassab teria usado sua legenda para prejudicar o senador mineiro Aécio Neves, rival de Serra no PSDB.
É forçoso ressalvar que não há, entre os nomes envolvidos, personagem que possa ser descrito como ingênuo. Candura seria imaginar que alguém ingressou no PSD movido por pendores republicanos.
Reedita-se, em mais esta campanha, a "geleia geral" da política brasileira. Não seria o caso de exigir, por aqui, a nitidez ideológica de partidos europeus ou americanos, mas de cobrar um mínimo de clareza programática.
O racha no PSD, antes um agrupamento de conveniência que um partido, confirma o estado depauperado da política. O exagero de incoerência vitima mesmo os mais hábeis articuladores, fama que até aqui se atribuía a Gilberto Kassab.
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