sexta-feira, fevereiro 03, 2012
É bolha ou melhora? - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 03/02/12
As autoridades da Europa e dos organismos multilaterais falaram muito de crise desde a virada do ano. Ontem, de novo o FMI alertou que a América Latina deve "se preparar para o pior". Mas a Petrobras conseguiu uma captação recorde de US$ 7 bilhões, há empresas se preparando para abrir capital na bolsa e o mês de janeiro foi de disparada de valorização de vários ativos. É bolha ou melhora?
O diretor para Hemisfério Ocidental do FMI, Nicolás Eyzaguirre, disse em seu blog que a economia da América Latina não conseguirá escapar este ano dos efeitos da crise internacional. Mas em janeiro abriu-se uma janela de oportunidade que ainda não se fechou.
O mês de janeiro foi um sonho para os investidores. Juros em queda, aumento da circulação de moeda, apetite por risco novamente em alta. O Ibovespa fechou o mês de janeiro com alta de 11,1%. Em dólares, 19,9% de alta porque o real foi a moeda que mais se valorizou. As commodities metálicas fecharam o mês com alta de 15,4%. A bolsa da Rússia subiu 8%, a de Xangai, 10,6%, e a da Alemanha, 9,5%. O cobre subiu 10%, a prata saltou 19%, o ouro, 11%. Algodão e petróleo se contentaram com 4,2% e 3,8%. Somente em janeiro entraram na bolsa brasileira US$ 7,1 bilhões, a maior enxurrada desde 2009.
Há um pouco de melhora e um pouco de bolha na valorização de vários ativos nas últimas semanas. O Banco Central Europeu conseguiu evitar aquele cenário de fim de mundo quando ofereceu dinheiro barato sem limites para os bancos. Foram 500 bilhões e haverá novo leilão este mês de mais 500 bilhões. Quis evitar um novo Lehman Brothers, mas pode alimentar a formação de bolhas. Confira no gráfico abaixo a expansão monetária do BCE.
A Brasil Travel está se preparando para o primeiro IPO (abertura de capital) de uma empresa brasileira em seis meses. A diretora de relações com empresas e institucionais da BM&F Bovespa, Cristiana Pereira, diz que a janela de oportunidade não é garantia de que o mundo tenha melhorado:
- Não houve melhora significativa na economia mundial. Há realocação de recursos. Fundos de investimento estrangeiros tendo que buscar rentabilidade em um contexto de juros baixos nos seus países. Então eles buscam mercados que tenham algum tipo de crescimento.
O desempenho dos setores prova isso. Os considerados de proteção tiveram baixo desempenho, os de maior risco subiram mais. O setor de telecomunicações fechou com 0,4% de queda, e o de energia elétrica, com magros 2% de alta. Já a construção civil disparou 18%. Subiram também petróleo e gás, 17,8%; e siderurgia e mineração, 14,6%.
Para o analista-chefe da XP Investimentos, Rossano Oltramari, a alta atingiu setores que não estão necessariamente com bom desempenho:
- A construção civil subiu muito em janeiro, apesar da redução na venda de imóveis e o resultado ruim de algumas construtoras. O apetite por risco fez os investidores correrem para mercados que tinham caído mais.
Fábio Silveira, da RC consultores, disse que a ação do BCE foi semelhante à do Fed. Jogou dinheiro no mercado emprestando aos bancos a 1% por três anos. Isso aumentou a quantidade de euros em circulação e os bancos e investidores aplicam parte desses recursos em ações ou commodities.
A euforia tem que ser temperada com a cautela, avisa a consultoria inglesa Capital Economics e dá um exemplo. O cobre subiu 10% mas os índices de produção industrial da Europa e do Japão mostraram queda, o que significa menor consumo do produto.
Paulo Bittencourt, consultor da Apogeo Investimentos, acha também que é preciso não se deixar levar pela euforia porque a economia brasileira teve forte desaceleração no ano passado:
- Foi um bom começo de ano, mas não podemos achar que será assim o ano todo. Dos Brics, o Brasil é o país com maior estabilidade e previsibilidade, mas os dados de atividade decepcionaram. A indústria andou de lado, o comércio começou a dar sinais de perda de fôlego com o maior patamar de endividamento das famílias. Houve aumento de inadimplência em algumas carteiras de crédito, como a de automóveis, por exemplo.
A boa notícia é que o pior foi evitado na Europa, até agora. Mas estamos ainda no terreno da volatilidade em que bolhas se formam com facilidade.
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