O GLOBO - 20/01/12
Na discussão sobre a possível desaceleração do crescimento chinês, voltou a ser lembrado na mídia que a liderança do Partido Comunista da China estaria convencida de que a expansão da economia não pode cair abaixo de 7% a 8% ao ano. Crescimento mais lento poria em risco a coesão social do país e o regime unipartidário. Guardadas as devidas proporções, pode-se fazer indagação similar sobre o Brasil: a que taxa tem de crescer a economia brasileira? Embora não seja uma pergunta fácil, o governo tem a resposta pronta.
Na entrevista publicada na revista "The New Yorker", em dezembro passado, a presidente Dilma Rousseff explicou que "precisamos manter a economia crescendo, sem inflação, para gerar receita que permita continuar nossa política de distribuição de renda". A equipe da Fazenda tem sido bem mais específica. Está convencida de que o crescimento tem de ser de pelo menos 4,5% ao ano, para que a receita tributária permita ao governo continuar a expandir o dispêndio e levar adiante seus programas, sem deterioração das contas públicas.
É uma visão um tanto peculiar dos limites da desaceleração do crescimento. Na China, menos de 7% deixaria o país à beira da explosão social. No Brasil, menos de 4,5% deixaria o governo impossibilitado de dar continuidade à rápida expansão de gasto público que embasa seu projeto político. Há muitas razões para defender um crescimento econômico de 4,5% ao ano. O que há de peculiar é que, entre todas, a que mais mobiliza o governo seja a folga fiscal propiciada por tal ritmo de expansão do PIB.
É importante ter essa firme convicção do governo em mente, ao analisar suas supostas dúvidas sobre como conduzir a política macroeconômica nos próximos meses. O Planalto assustou-se com a desaceleração da economia. E quer que o crescimento seja retomado tão logo quanto possível. Há boas razões para crer que, em um cenário em que não haja uma deterioração dramática do quadro econômico mundial, a retomada já esteja a caminho, na esteira do afrouxamento monetário observado nos últimos meses. Mas o governo não quer dar tempo ao tempo e deixar que os efeitos da queda da taxa de juros se façam sentir em toda sua extensão. Um aumento do nível de atividade concentrado no segundo semestre lhe parece tardio e insuficiente. Significaria mais um ano de crescimento do PIB a cerca de 3%. E de pouca fartura fiscal para fazer face ao reajuste do salário mínimo e a outros aumentos de dispêndio já encomendados.
Pronto a abandonar seu novo discurso sobre política fiscal, adotado há menos de cinco meses, o Planalto não esconde que gostaria que o estímulo monetário fosse complementado com mais um vigoroso impulso fiscal. O governo anda especialmente preocupado com o investimento público, que caiu no ano passado. Não por contenção de gastos, mas em decorrência do desmantelamento das cadeias de comando que acionavam decisões de investimento em ministérios infestados por esquemas de corrupção.
O Planalto agora tem pressa. Foi-se o primeiro ano do mandato. Há eleições municipais pela frente. A cada dia, as deficiências da infraestrutura parecem mais desgastantes. E os cronogramas da preparação do país para a Copa do Mundo e as Olimpíadas, mais alarmantes. Mas como recuperar o investimento público e assegurar o impulso fiscal capaz de antecipar a retomada, sem que as contas públicas se deteriorem e o combate à inflação seja comprometido?
Não é difícil vislumbrar a "solução". Mais uma vez, o governo parece propenso a apelar para o orçamento paralelo que montou no BNDES, alimentado por transferências diretas do Tesouro, não contabilizadas nas estatísticas de resultado primário e de dívida líquida do setor público. Caso a situação externa se agrave, poderá ser feita nova e vultosa transferência de recursos do Tesouro ao BNDES, com roupagem salvacionista. Mas, mesmo que não se agrave, o governo parece disposto a fazer tal transferência a seco. Dissimulando-a, talvez, com a cortina de fumaça de um programa espalhafatoso - e inócuo - de contingenciamento de gastos.
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