Nefasto efeito dominó
RODOLFO LANDIM
FOLHA DE SP - 28/10/11
Tivemos recentemente mais um capítulo da novela que se transformou no que era para ser somente a discussão do novo marco regulatório do setor de petróleo aplicável a novas áreas do pré-sal e que acabou colocando em um debate sem fim a distribuição das receitas relativas aos tributos arrecadados pela produção de petróleo.
No dia 19 passado, foi aprovado no Senado o projeto de lei nº 448, que, assim como a lei nº 12.351/2010, vetada pelo ex-presidente Lula, propõe, entre outras coisas, nova forma de partilha entre a União, os Estados e os municípios, produtores e não produtores, dos recursos arrecadados a título de royalties e participação especial.
Foram vários meses de negociação, mas que não levaram a nenhum consenso pelo simples fato de que alguns princípios elementares -como o de não impactar a arrecadação atual do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, Estados altamente dependentes dessas receitas para o equilíbrio de suas contas- não terem sido respeitados. Segundo o projeto de lei, as novas regras incidirão não só nos futuros contratos de concessão a serem assinados, mas também nos já em vigor.
Para ter uma ideia do tamanho da pancada no Rio de janeiro, previsões de produção de petróleo apontam para perda de cerca de R$ 50 bilhões nos próximos nove anos -somente em 2012, algo como R$ 1,534 bilhão para o Estado e R$ 1,797 bilhão para os municípios do Rio. Com várias obras de infraestrutura em andamento para a Copa do Mundo e para os Jogos Olímpicos e a Lei de Responsabilidade Fiscal em vigor, caso de fato configurado o cenário de corte, o Rio teria de paralisar seus projetos imediatamente. E aceitar isso calado seria um verdadeiro suicídio político.
Assim, são mais do que compreensíveis as ameaças do Rio e do Espírito Santo -caso o projeto passe pela Câmara e seja sancionado pela presidente Dilma-, de recorrerem ao STF arguindo a inconstitucionalidade da lei. É difícil também imaginar que, caso isso venha a ocorrer, que a relação entre o governo desses dois Estados e o federal não será afetada. Algumas recentes declarações do governador do Rio, Sérgio Cabral, nos levam a crer até em um possível rompimento.
Talvez isso explique, em parte, o silêncio do governo paulista em relação ao tema. É verdade que, por um lado, o Rio possa até ganhar um pouco no curto prazo pelo acréscimo das suas receitas, mas, devido às grandes reservas existentes em áreas do pré-sal confrontantes a São Paulo, outorgadas sob o regime de concessão, a perda a médio e a longo prazos seria muito maior. Mas colocar lenha na fervura, ajudar a desestabilizar a base governista e tentar trazer o governador do Rio, um político habilidoso e muito querido em seu Estado, para alinhar-se novamente ao PSDB, partido pelo qual já foi eleito três vezes deputado estadual, pode também ter tido o seu peso.
A verdade é que a solução não é simples, e o peso do governo federal será decisivo até porque, mesmo deixando as discussões correrem no Congresso sem seu claro posicionamento, vai chegar a hora de sancionar ou de vetar a lei. E aí, seja qual for a decisão tomada, o balanço político dos efeitos da lei recairá em boa parte sobre o Planalto.
Mas, infelizmente, o impacto de tudo isso vai bem mais longe. Um diretor da ANP disse "ser mais sensato" que novos leilões só ocorram após haver acordo ou decisão judicial sobre o assunto, apesar de o texto aprovado pelo Senado não ter alterado a alíquota de 10% dos royalties incidente nos contratos sob regime de concessão que seriam o objeto da 11ª Rodada de Licitações. E o presidente da Câmara já disse que o assunto não será discutido antes do final de novembro.
Consequentemente, teremos o desestímulo das poucas empresas do setor ainda com apetite para investimento no Brasil e que para aqui vieram com promessas e esperanças de terem espaço para exercer suas atividades. Após três anos de espera por leilões e agora com menores perspectivas de novos, poderemos assistir em breve a outras companhias seguindo o rumo de venda de ativos da Devon, da Anadarko e da Shell.
RODOLFO LANDIM, 54, engenheiro-civil e de petróleo, é presidente da YXC Oil & Gas e sócio-diretor da Mare Investimentos. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de exploração e produção e presidente da Petrobras Distribuidora.
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