A euroarmadilha
Paul Krugman
O GLOBO - 01/05/10
Há pouco tempo, os economistas europeus costumavam gozar seus colegas americanos por terem questionado a marcha da Europa rumo à união monetária. “No conjunto”, declarou um deles num artigo publicado em janeiro passado, “o euro se saiu, até agora, bem melhor do que previram os economistas americanos”.
O artigo resumiu as visões “eurocéticas” como tendo sido algo do tipo: “não pode acontecer, não é uma boa ideia, não vai durar”. Bem, o euro aconteceu, mas agora parece ter sido uma má ideia. Quanto à questão se irá durar, isso agora é uma discussão em aberto.
Para compreender a “eurobagunça”, é preciso ver além das manchetes. Neste momento, todos estão concentrando suas atenções na dívida pública, que faz a coisa parecer um problema de governos que não conseguiram controlar seus gastos. Porém, isto é apenas parte da história.
O fato é que há três anos nenhum dos países agora mergulhados em crise ou próximos do abismo pareciam estar vivendo algum problema fiscal.
Inclusive o déficit fiscal da Grécia de 2007 não era, na relação com o PIB, maior do que os déficits dos EUA nos anos 1980. Já a Espanha teve superávits.
E todos os países estavam atraindo grandes fluxos de capital estrangeiro, sobretudo porque os mercados acreditavam que pertencer à zona do euro tornava os títulos de Grécia, Portugal e Espanha um investimento seguro.
Mas aí veio a crise financeira global. Esses fluxos de capital secaram; as receitas caíram e os déficits saltaram. E se pertencer ao clube do euro antes havia encorajado os mercados a apostar nos países hoje em crise sem muito critério, agora isso criou uma armadilha.
Qual é a natureza da armadilha? Nos anos de dinheiro fácil, salários e preços nos países em crise subiram mais rapidamente do que no resto da Europa. Agora que não há dinheiro, essas nações precisam pôr os gastos em ordem.
Mas isso é algo mais difícil de fazer agora do que quando cada nação europeia tinha sua própria moeda. Naquele então, os custos podiam ser corrigidos ajustando a taxa de câmbio — por exemplo, a Grécia poderia cortar seus salários relativamente aos da Alemanha reduzindo o valor do dracma em relação ao marco alemão.
Porém, agora que Grécia e Alemanha repartem a mesma moeda, a única forma de reduzir os custos relativos da Grécia é através de uma combinação de inflação alemã com deflação grega. E como a Alemanha não vai aceitar inflação, tem que ser deflação grega.
O problema é que deflação é sempre e em qualquer lugar um profundo e doloroso processo. Invariavelmente envolve uma queda prolongada com alto desemprego.
E isso também agrava os problemas da dívida, pública e privada, pois se a receita cai, o peso da dívida, não.
Este foi o alerta dos céticos.
Desistir da capacidade de ajustar a taxa de câmbio, disseram eles, atrairia crises. E foi o que ocorreu. E agora? O que acontecerá com o euro? Se antes achava-se impossível que os países se desfizessem do euro, agora a possibilidade existe. E a lição da crise não são os gastos excessivos dos governo, mas o fato de estarem numa camisa de força.
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