Começou mal a aventura de colunista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mais uma vez ele atribuiu aos outros a responsabilidade pelas falhas de seu governo. E mais uma vez ele atribuiu as mazelas da política de saúde à extinção do imposto do cheque, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Pura cascata. A carga tributária voltou a crescer no ano passado e chegou a 35,8% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo as contas da Receita Federal. Outros emergentes cuidam muito melhor da educação e da saúde com impostos muito menores. Mas isso não é tudo. O governo e seus aliados só não aplicam mais dinheiro nos programas de saúde porque não querem. Recursos não faltam, até porque a administração federal continua incapaz de usar as verbas de investimento previstas no Orçamento-Geral da União.
Se os projetos de outros Ministérios não deslancham, por que não se transfere o dinheiro para o Ministério da Saúde? Neste ano, até 1º de julho, o Tesouro desembolsou apenas R$ 2,49 bilhões para os programas de investimento, 4,93% da verba autorizada para o ano. A maior parte desse dinheiro corresponde a restos a pagar.
Essa incapacidade de investir explica a diferença de ritmo entre os pagamentos efetuados pelos diversos órgãos do governo. O Ministério da Saúde gastou, até 1º de julho, 44,03% da verba prevista para 2009, segundo o site Contas Abertas. O dos Transportes, apenas 14,04%. O de Minas e Energia, 5,87%. O das Cidades, 7%. Trocando em miúdos: gastou menos quem tinha a agenda mais carregada de projetos de investimento. O problema é de incompetência geral do governo, não de falta de dinheiro. A incompetência, nesse caso, é demonstrada também na má distribuição de recursos entre os Ministérios e na fixação inepta de prioridades.
Quando se vai ao detalhe da execução, o resultado é assustador. No programa Luz para Todos, tema de uma campanha oficial de propaganda no rádio e na TV, o governo só gastou neste ano, até o começo de julho, 0,42% da verba prevista. À Segurança da Sanidade na Agropecuária, essencial tanto para o bem-estar da população quanto para as exportações, o Orçamento destina R$ 180 milhões - uma miséria -, mas o dispêndio efetivo só chegou a R$ 14,6 milhões, 8,11% do valor autorizado. Estão previstos R$ 923,4 milhões para Segurança de Voo e Controle do Espaço Aéreo. A despesa ficou, até 1º de julho, em R$ 89,36 milhões, 9,68% do montante programado. E quantos brasileiros sabiam de um programa intitulado Gestão da Transversalidade de Gênero nas Políticas Públicas? Pois existe e já consumiu 8,05% dos R$ 5,96 milhões previstos.
A péssima distribuição de recursos é visível também na dotação dos chamados Poderes da República. Nunca é demais lembrar: embora só haja 81 senadores, o Senado tem um orçamento de R$ 2,7 bilhões, maior que o do município de Campinas (R$ 2,5 bilhões), com mais de 1 milhão de habitantes, um dos maiores e mais desenvolvidos do Brasil. Se o presidente Lula se permite dar conselhos ao presidente do Senado e meter o nariz numa crise do Legislativo, por que não usa essa mesma disposição, mais produtivamente, para discutir o custo absurdo e escandaloso da chamada Câmara Alta?
Se o presidente da República estivesse realmente preocupado com a qualidade do gasto público, não teria comprometido as conta federais com seguidos aumentos de salários para o funcionalismo nem permitiria mais contratações. As despesas com a folha de salários estão entre aquelas com maior crescimento neste ano, enquanto a receita é comprometida pela crise econômica. Apesar disso, o presidente manteve os aumentos programados para entrar em vigor em 1º de julho. Poderia legalmente atrasar a vigência dos novos salários, mas preferiu outro caminho, levando os ministros da Fazenda e do Planejamento a pedir ao Congresso o afrouxamento das normas orçamentárias. Para quê? Para continuar aumentando os gastos de custeio neste ano e no próximo - tempo de eleição. Para investir mais, não precisaria mexer em regras fiscais. Bastaria cobrar mais competência de seus auxiliares.
Se o governo investe pouco, não é por falta de dinheiro, ao contrário da tese sustentada pelo Ipea em sua nova tentativa de justificar o injustificável, a enorme tributação brasileira. Segundo o mesmo instituto, não há excesso de funcionários públicos e sobra espaço para a contratação de mais gente. O governo usará teses desse tipo para justificar a gastança eleitoral. Mais um desperdício: não é preciso tanto esforço para convencer quem acredita em cascata. |
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