Há algum valor no fato de "apenas" 26% dos brasileiros não enxergarem racismo na frase "negro bom é negro de alma branca". Em 1995, segundo levantamento do Datafolha, 47% não viam nada de mais nesse enunciado. Hoje, "só" 9% continuam a considerar apropriada a afirmação "se Deus fez raças diferentes é para que elas não se misturem". Há 13 anos, o percentual era 23%. Essas medições da utilíssima pesquisa publicada ontem pela Folha indicam ter havido, no mínimo, uma transformação na forma pela qual o preconceito de cor se manifesta no país. Mas nunca é demais notar a distância enorme a nos separar da noção -já sepultada- de que no Brasil vigoraria uma peculiar democracia racial. Como dizia Florestan Fernandes nos anos 60, "o brasileiro não evita, mas tem vergonha de ter preconceito". Em 1995, quando saiu a primeira pesquisa Datafolha sobre preconceito de cor no país, cunhou-se um termo para sintetizar o resultado: racismo cordial. Era uma alusão à definição de Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), em "Raízes do Brasil". Para ele, a cordialidade do brasileiro "pode iludir na aparência -e isso se explica pelo fato de a atitude polida consistir precisamente em uma espécie de mímica deliberada de manifestações". Por fim, "a polidez é, de algum modo, organização de defesa ante a sociedade. Detém-se na parte exterior, epidérmica do indivíduo, podendo mesmo servir, quando necessário, de peça de resistência". De 1995 para cá, o "politicamente correto" inundou a sociedade. Os brasileiros estão alertas. Exceto uma minoria isolada de internet, TV ou rádio, poucos duvidam do racismo embutido nos enunciados do início deste texto. É um avanço. Mas essa atitude pública comportada talvez só mascare o forte racismo presente no país. Ainda que hoje expresso de forma mais cordial. |
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