quarta-feira, novembro 19, 2014

Combate à corrupção não é obra de Dilma - JOSÉ NÊUMANNE

O ESTADO DE S.PAULO - 19/11


Acredite quem quiser: a presidente reeleita, Dilma Rousseff, tentou, na reunião do G-20 na Austrália, da forma canhestra que lhe é habitual, tirar proveito da notícia da prisão de empreiteiros na sétima etapa da Operação Lava Jato. Como se esta fosse uma obra de sua administração, a exemplo do PAC, do Bolsa Família e do Minha Casa, Minha Vida. Em sua peculiar versão sobre os fatos da atualidade, teve o desplante de exaltar como mérito do próprio governo o fato de agora se investigar a corrupção "pela primeira vez na História do Brasil".

Como diria Jack, o Estripador, vamos por partes. Primeiramente, a roubalheira na Petrobrás é, sim, e disso ninguém tem mais como discordar, o maior escândalo de corrupção da História do Estado brasileiro, desde que o português Tomé de Souza desembarcou na Bahia para ser nosso primeiro governador-geral. Nada se lhe compara em grandeza de valores, vileza de ações e resultados funestos para uma empresa criada para tornar concreto o lema da esquerda nos anos 50 do século passado - "o petróleo é nosso". O petróleo, descobriu-se agora, não é nosso, é deles: do PT, dos partidos da base, de desavergonhados funcionários de carreira da petroleira e de doleiros delinquentes.

Ainda não apareceram indícios na investigação de que Dilma e seu antecessor na Presidência, Lula da Silva, tivessem tirado algum proveito financeiro do butim. Mas não há mais dúvidas de que ambos estavam a par de tudo. Sabe-se disso não apenas por ter o doleiro Alberto Youssef, um meliante de terceira categoria do Norte do Paraná, contado em delação premiada a agentes federais e promotores. Há provas documentais e históricas, como acaba de revelar o Estado: em 2009, o Tribunal de Contas da União (TCU), no exercício de sua assessoria ao Legislativo, avisou o Congresso que não permitisse o repasse de R$ 13,1 bilhões à Petrobrás porque seus fiscais haviam auditado irregularidades em obras da estatal. O Congresso proibiu, Lula vetou a decisão e mandou dar dinheiro às obras suspeitas.

Mas o então presidente não se limitou a vetar os dispositivos orçamentários e liberar as verbas glosadas pelo TCU: também abusou da jactância de hábito ao fazer troça da mania que o órgão teria de "querer mandar em tudo". Se José Sérgio Gabrielli, então presidente da maior empresa brasileira e seu homem de confiança, não lhe contou, o TCU, no mínimo, avisou. Não se pode dizer que Gabrielli seja confiável aos olhos de Dilma, mas, além de ter sido ministra das Minas e Energia, ou seja, responsável pela atuação da estatal e presidente de seu Conselho de Administração, ela, como chefe da Casa Civil, não podia desconhecer o alerta do TCU nem o desafio em forma de veto do chefão e padrinho.

É fato que a oposição não se pode jactar de ter sido a responsável pela revelação do escândalo do petrolão nem dos casos que o antecederam: o mensalão e a execução do prefeito de Santo André e então coordenador de programa de governo da campanha de Lula à Presidência em 2002, Celso Daniel. A descoberta de documento de um "empréstimo" de R$ 6 milhões do operador do mensalão, Marcos Valério Fernandes, a um dos protagonistas do escândalo de Santo André, Ronan Maria Pinto, pela Polícia Federal (PF) nos papéis apreendidos em mãos de Meire Poza, contadora de Youssef, desvendou a conexão entre os três casos. Valério disse há dois anos que deu essa quantia ao empresário de ônibus para sustar chantagem dele contra Lula. O papel é uma evidência de que o mensalão não serviu apenas para comprar apoio de pequenos partidos no Congresso ao governo, mas também para afastar suspeitas de envolvimento da cúpula da gestão federal e do PT não na execução de Celso Daniel, mas no acobertamento dos verdadeiros assassinos, protegidos pela versão da polícia paulista, sob égide tucana (sem aval do Ministério Público), de que o crime teria sido ocasional.

Nestes 13 anos, nos governos Alckmin, Lembo, Serra e Goldman, a oposição não se aproveitou do fato de comandar a polícia estadual paulista para produzir sequer uma investigação decente que convencesse a família de que a morte de Daniel teria sido casual. Como é de conhecimento geral, tucanos e democratas também nada tiveram que ver com a delação do petebista Roberto Jefferson sobre o mensalão, escândalo do qual foi protagonista José Janene, um dos autores intelectuais da roubalheira na Petrobrás, que teria resultado na lavagem de R$ 10 bilhões.

A Operação Lava Jato é um trabalho que a Nação não deve a nenhum "sinal verde" de Dilma ou de Lula nem à denúncia de tucano algum. Mas, sim, às divisões internas da Polícia Federal, ao poder autônomo do Ministério Público Federal, à competência técnica e ao tirocínio corajoso e probo do juiz federal paranaense Sérgio Moro. O sucesso das investigações também se deve à delação premiada, à qual o "Paulinho" de Lula e "Beto" Youssef recorreram para não padecerem o que hoje padece Marcos Valério por ter achado que seus poderosos parceiros não o abandonariam. Não houve ordem "republicana" para investigar, processar e prender todos os culpados, "doa a quem doer". Nem denúncias de uma oposição indolente e nada vigilante.

Dilma também anunciou em Brisbane que a Lava Jato pôs fim à impunidade. Bem, aí depende! A impunidade no Brasil já teve um grande baque com as condenações do mensalão. Graças ao relatório de implacável lógica de Joaquim Barbosa, políticos tiveram a inédita sensação de eleitores serem iguais a eleitos perante a lei. As diferenças na execução penal, contudo, mostram que essa igualdade continua relativa: a banqueira, os advogados e o publicitário continuam na cadeia e os insignes companheiros que tinham mandato ou ministério estão "presos" em casa.

A prisão dos empreiteiros mostra que a delação premiada é mesmo pra valer. Mas os políticos eventualmente delatados ainda continuam soltos.

A marcha da insensatez - ELIO GASPARI

O GLOBO - 19/11


Empreiteiras defendem-se desprezando o 'Efeito Papuda', uma tática vencida, desafiadora e talvez suicida


O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, também conhecido como "Kakay", é uma espécie de Sobral Pinto do andar de cima. "Doutor Sobral" era um homem frugal, sempre vestido de preto, defendendo causas de presos ferrados pelo poder dos governos. O espetaculoso "Kakay" é amigo dos reis e vive na Pasárgada de Brasília. Defendendo empreiteiras apanhadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, disse o seguinte: "Dentro da normalidade, você teria de declarar (as empresas) inidôneas. Se isso acontecer, para o país".

Ele não foi o primeiro a mencionar esse apocalipse, no qual está embutida uma suave ameaça: se a faxina não for contida, o Brasil acaba, pois com essa gente não se deve mexer. O presidente do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, propôs uma "repactuação" dos contratos que essas companhias têm com a Viúva: "Parece que as empresas estão demonstrando boa vontade, todas elas ajudando, estão se dispondo a devolver recursos, portanto há uma boa vontade". Mais: "Poderíamos repactuar, eles perderiam o que está acima do preço. Como consequência, faríamos economia para o erário". O vice-presidente Michel Temer foi na mesma linha, propondo a "repactuação de eventuais exageros". Falta saber o que Nardes entende por "acima do preço" e o que Temer define como "exageros".

Como até hoje nenhuma empreiteira, salvo a Setal, reconheceu ter delinquido, parece até que a delinquência é da Polícia Federal, do Ministério Púbico e do Judiciário. A "repactuação" só pode começar pactuando-se a verdade. Se de fato houve uma "denúncia vazia de um criminoso confesso", como disse Marcelo Odebrecht, referindo-se ao ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, então sua empresa nada tem a ver com a história, merece os devidos pedidos de desculpas e "Paulinho" deve voltar para a carceragem. Se a Camargo Corrêa, a Mendes Júnior e a OAS nunca praticaram atos ilícitos, dá-se o mesmo e nada há a repactuar.

Grandes empresas metidas nas petrorroubalheiras adotaram uma atitude desafiadora, talvez suicida. Tentaram tirar o processo das mãos do juiz Sérgio Moro. Em seguida, fizeram uma discreta oferta de confissão coletiva, rebarbada pelo procurador-geral da República com três palavras: "Cartel da leniência". "Repactuação" pode ser seu novo nome.

As grandes empreiteiras oscilam entre o silêncio e a negativa da autoria. Deu certo até que surgiu o "Efeito Papuda". Não só José Dirceu, o "capitão do time" de Lula, foi para a penitenciária, como as maiores penas foram para uma banqueira (Kátia Rabelo) e um operador de palácios (Marcos Valério). Ocorrido esse desfecho inédito, seguiu-se a descoberta da conveniência de se colaborar com a Viúva em troca da sua boa vontade. Já há dez doutores debaixo desse guarda-chuva e tudo indica que outros virão. As empreiteiras estão rodando um programa vencido.

Quem olha para o trabalho do juiz Moro e do Ministério Público pode ter um receio. Abrindo demais o leque, ele se arrisca a comprometer a essência da investigação. Como ele tem conseguido preservar sigilos, pode-se ter a esperança de que o principal objetivo da operação é ir de galho em galho, para chegar ao topo da árvore.

De repente - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 19/11


RIO DE JANEIRO - De quinze em quinze anos, o Brasil esquece o que aconteceu nos últimos quinze anos, decretou o jornalista, escritor e pensador --malgré lui-- Ivan Lessa (1935-2012). Dura lex, mas que pode ter um corolário ainda mais cruel: quando uma nova situação se instala, a anterior deve ser contestada, diminuída e, o mais rápido possível, evaporada dos anais. Sobram exemplos entre nós.

A República, por exemplo. Instaurada em 1889, dedicou-se a desmerecer tudo que viera da Monarquia --inclusive o fato de sua pregação demolidora ter sido amplamente garantida pelo mais democrático governante brasileiro, D. Pedro 2º. Bem feito que, em 1930, vitoriosa a Revolução que entronizou Getulio, aquela República belle époque passaria a ser chamada de República Velha e também se tornaria sinônimo de atraso político, corrupção eleitoral e mesmice social.

E não só no terreno político. A Semana de Arte Moderna disseminou o mito de que, com raras exceções, toda a literatura brasileira pré-1922 era desprezível e o Modernismo viera para salvá-la. Idem quanto à bossa nova --alguns de seus adeptos acreditam que tudo que aconteceu na música brasileira até 1958 foi apenas uma preparação para que João Gilberto gravasse "Chega de Saudade". Nada disso é verdade.

Mas é na política que essas lendas mais florescem. Quando o PT chegou ao poder, em 2003, seus líderes apegaram-se ao discurso de que o Brasil começava ali. "Nunca antes na história desse país" etc. Conquistas então recentes, como o Plano Real, o fim da inflação e a estabilização da moeda --mérito de seus adversários--, foram apagadas. O passado não valia nada, não existia.

Agora, de repente, passou a valer. O PT quer dividir com o PSDB os malfeitos da Petrobras. Malfeitos, aliás, que ele, o PT, teve 12 anos para, como diz, "mandar investigar".

Regulação da mídia - SÉRGIO LAZZARINI

O ESTADO DE S.PAULO - 19/11


O tema da regulação da mídia retornou com força. Agenda histórica de partidos de esquerda, a proposta de criação de uma agência reguladora para o setor foi posta de lado por Dilma Rousseff no primeiro mandato. Segundo ela, os "excessos" da imprensa seriam preferíveis "ao silêncio da ditadura". Mas, com a necessidade de contentar suas bases durante o polarizado confronto eleitoral, Dilma se viu obrigada a mudar de ideia. Embora seja refratária a qualquer controle de conteúdo, agora se diz favorável a um marco de regulação econômica contra monopólios e oligopólios.

Em entrevista ao jornal Valor Econômico (7/11), foi perguntada se esse tipo de regulação já não estaria sob a jurisprudência do nosso órgão antitruste, o Cade. Ela respondeu: "O Cade está aí para qualquer setor. Por que o setor de energia, petróleo, transporte tem regulação e a mídia não pode ter?".

Faz muito sentido a pergunta. De fato, marcos regulatórios da mídia existem em vários países desenvolvidos. Mas boas perguntas podem ocultar segundas intenções. A blogosfera governista deixa muito claro que a proposta de regulação tem endereço certo: grandes grupos de jornalismo que, segundo eles, distorcem informações a favor da oposição e das elites. Ainda assim, vamos dar o benefício da dúvida. Poderiam estar o governo e suas bases de fato interessados na criação de um marco de regulação imparcial e eficaz?

Nos últimos anos, o País presenciou uma progressiva concentração setorial em grupos de grande peso. Foi uma política deliberada do governo, desde Lula. Com abundantes recursos do BNDES e outros fundos públicos, foram criados "campeões nacionais" oriundos do entrelaçamento de diversos grupos. Por exemplo, para facilitar a criação da Oi, resultado da sua fusão com a Brasil Telecom, o governo alterou até regras vigentes no setor, definidas pelo Plano de Outorgas, que impedia que um mesmo grupo tivesse concessões em regiões distintas. Como mostrei no livro Capitalismo de Laços, conexões societárias cruzadas proliferaram em múltiplos setores. Um governo que estimulou tanta concentração e cruzamento societário estaria genuinamente preocupado com a defesa da concorrência no setor de mídia?

De forma ainda mais ampla, tivemos claros sinais de que o atual governo não acredita em regulação econômica independente - algo visto como receituário neoliberal. As atuais agências, que já careciam de aprimoramento, foram enfraquecidas e subordinadas às decisões do Executivo. Em 2003, pouco antes da sua posse, Lula se queixou de ser "o último a saber" sobre os reajustes de preços propostos pelas agências. No mesmo ano, Dilma, ministra de Minas e Energia, manifestou desconforto com a divulgação de certas informações pela Agência Nacional de Petróleo. Já como presidente, passou por cima de várias agências para implementar suas políticas de intervenção. No setor elétrico, por exemplo, seguiu com sua ideia de redução forçada de tarifas mesmo havendo opinião contrária de técnicos da Agência Nacional de Energia Elétrica. Um governo que enfraquece agências que já existem irá de fato se comprometer a não intervir em prol da sua própria agenda?

Não é de estranhar, pois, que a nova proposta de regulação da mídia seja vista com muito ceticismo e desconfiança sobre suas reais intenções. Faço, então, uma proposta concreta. Vamos, antes de tudo, reforçar nosso marco regulatório de forma ampla. O governo terá de se comprometer a manter as agências verdadeiramente independentes, sem virar a mesa quando algo for decidido à sua revelia. Terá de acabar com as nomeações políticas e loteamento de cargos, indicando técnicos de grande experiência e reconhecimento no seu setor. As agências terão mandato claro e metas propostas por especialistas, discutidas pela opinião pública e aprovadas pelo Legislativo. No quesito concorrencial, vamos definir com clareza o que compete a cada agência e o que já pode ser feito pelo órgão de defesa da concorrência que já existe, o Cade. Aí, sim, podemos discutir o interesse público de um novo marco de regulação da mídia e até mesmo, se cabível, em outros setores. Que tal?


*Sérgio Lazzarini é autor de 'Capitalismo de Laços e 'Reinventando o capitalismo de Estado'. E-mail: sergiogl1@insper.edu.br

Na trilha do dinheiro - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 19/11

Há pelo menos duas situações nessa Operação Lava-Jato que chamam a atenção do cidadão comum: uma, causando genuíno espanto; a outra, esperança de que o processo venha a ser bem-sucedido ao seu final, seguindo os passos do mensalão, de cujo enredo o petrolão é sequência lógica. Que o diga o juiz Sérgio Moro, que assessorou a ministra Rosa Weber no julgamento do mensalão.

Causa espanto em todas as rodas o volume de dinheiro desviado por esse esquema criminoso instalado dentro da Petrobras. O que definiu o tamanho do escândalo foi a notícia de que o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco concordou em devolver cerca de US$ 100 milhões desviados da companhia.

Ele era o sub de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras preso na Lava-Jato, da Polícia Federal, e fez acordo de delação premiada. Embora tenha seu nome mencionado no relatório do Ministério Público Federal, Barusco não foi preso por ter feito o acordo, e é apontado por vários dirigentes de empresas como o responsável por operacionalizar a propina que era paga ao ex-diretor.

Parte do dinheiro já foi apreendida administrativamente, como US$ 20 milhões em nome de Barusco na Suíça. Se o subordinado tem condições de devolver tanto dinheiro, quanto não terá desviado o chefe, que era o diretor diretamente nomeado pelo PT, indicado pelo ex-ministro José Dirceu no tempo em que era o capitão do time de Lula? Não é à toa, portanto, que Duque é dos poucos presos que não estão dispostos a aderir à delação premiada, pelo menos por enquanto. A prorrogação de sua prisão tem o objetivo de levá-lo a falar.

Já parecem pouco os US$ 23 milhões que o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa prometeu devolver, no primeiro gesto de desapego estimulado pelas regras de delação premiada. Fora o tamanho do dinheiro envolvido nas diversas operações, está chamando a atenção o profissionalismo com que o Ministério Público e a Polícia Federal estão agindo, sob a coordenação do juiz Sérgio Moro, que, como especialista em lavagem de dinheiro, está seguindo normas estritas para identificar o caminho do dinheiro, até chegar aos corruptores e aos corruptos. Está seguindo o conselho que o Deep Throat nunca deu aos repórteres do "Washington Post", mas que ficou célebre: "Follow the money" ("Sigam o dinheiro").

O juiz está tomando também todos os cuidados, desde o primeiro momento, para evitar desvios que possam impugnar as provas do processo, mas tem sido rigoroso no cumprimento da lei. As empreiteiras haviam proposto, na semana da prisão em massa, um acordo conjunto para pagarem uma multa bilionária que zeraria o processo para um recomeço dentro de novas regras.

O acordo não foi aceito, pois ele implicaria a falta de punição dos corruptores. A partir da decisão do juiz, que mandou prender donos e altos executivos das empreiteiras, as empresas estão tentando um acordo de repactuação com a Controladoria Geral da União, o que tem o respaldo do Tribunal de Contas da União (TCU).

A ideia é não paralisar as obras das empreiteiras espalhadas por todo o país. A repactuação implica a redução dos custos superfaturados e a devolução do sobrepreço já pago pela Petrobras, mas não evitará que os executivos implicados sejam incluídos no processo.

Além disso, os promotores encarregados do caso estão deixando para tratar dos políticos envolvidos na corrupção da Petrobras por último, justamente para não criar um ambiente que dificulte as investigações.

Mesmo figuras que não têm mandato, como o expresidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, hoje secretário do governo da Bahia, e João Vaccari Neto, o tesoureiro do PT, ainda não foram incluídos na lista dos que serão arrolados para depoimentos na Polícia Federal. Ambos, e outros ainda, têm laços políticos fortes e poderiam criam embaraços para as investigações.

Não divulgando a lista de políticos e assemelhados envolvidos no esquema de corrupção da Petrobras, o juiz Sérgio Moro ganha também tempo para consolidar na opinião pública a imagem de independência e imparcialidade com que a operação está sendo conduzida, impedindo sua partidarização.

Pelo critério do Torto, temos Papa - ROSÂNGELA BITTAR

VALOR ECONÔMICO - 19/11


A decisão mais concreta a que chegaram os participantes da reunião de cúpula do PT e do governo, na Granja do Torto, 48 horas após o resultado da apuração que deu a reeleição a Dilma Rousseff, foi que a presidente levaria consigo, à reunião do G-20, na Austrália, o novo ministro da Fazenda escolhido para o segundo mandato. A resolução compreendia o anúncio da escolha antes de partir, e a expectativa do ex-presidente Lula, que dividiu o comando do encontro com Dilma, era que a escolha recairia em uma das suas três indicações já conhecidas.

Do ponto de vista do acertado, o ministro da Fazenda é, portanto, Alexandre Tombini, presidente do Banco Central? Foi ele que, num desvio de rota de última hora, mudou a direção de viagem iniciada para ir com Dilma à reunião do G-20. Se atendeu à recomendação de "levar ao G-20" o novo ministro, o processo Tombini não se encaixou nas demais regras do acerto, a de anúncio antecipado ao ex-presidente, nem nas sugestões da lista de Lula: Luiz Trabuco, Henrique Meirelles e Nelson Barbosa. Cumpriu apenas parte do script: o novo viajante participou de tudo, reuniu-se reservadamente com a presidente, foi onipresente no encontro, deixando em segundo plano o ministro Guido Mantega, que viajou também na comitiva mas para se despedir daquele fórum.

O PT desconfia que o ministro seja Tombini só porque ele estava na viagem à Austrália, como haviam acertado na reunião com Dilma, e não porque a presidente tenha informado Lula sobre a escolha. Henrique Meirelles e Nelson Barbosa sofreram uma fritura em fogo alto antes mesmo de a presidente dar uma satisfação ao ex-presidente sobre suas decisões.

Esse seria o enredo da escolha na perspectiva da reunião do Torto. Pode não ser Tombini o ministro a ser anunciado? Claro que pode. Pode ser Meirelles o ministro ou o presidente do Banco Central? Pode também. Pode ser Trabuco, Barbosa ou um economista renomado na Fazenda, no Planejamento ou em outro local destacado da economia? Claro. Como pode também ser qualquer outro ainda invisível, esse tipo de novelo é do perfil de gestora de Dilma. Ela, inclusive, ao contrário do sinal que deu de ter escolhido Tombini, levando-o ao G-20, pode ter decidido também não levar seu novo ministro à Austrália, como recomendara Lula, e ter dado a Tombini e a Mantega a missão de, em reuniões reservadas e longe do Brasil, fazerem um elenco de nomes e de problemas a serem enfrentados para decidir na sua volta. Também pode, pode, pode. Tudo pode.

O mais provável, entretanto, é que se perceba primeiro o sinal mais óbvio: a reunião do Torto recomendou que levasse oministro novo ao G-20, e ela levou Tombini. Pode ter significar decisão, pode não significar nada.

A presidente prometeu mudar, especialmente na forma de governar, mas não mudou. Até as especulações estão represadas, enquanto o país pega fogo com o mega escândalo da Petrobras e o governo se queda à matroca. É grande a perplexidade e o medo. Sim, o medo, ninguém sabe até onde vai a arrebentação.

Lula, não apenas pelo ministro da Fazenda, mas por tudo, está novamente desacorçoado. Lá se vai apenas um mês da sofrida vitória, para a qual sua contribuição foi decisiva. Assessores de Dilma anunciam que, esta semana, ela volta a reunir-se com ele, mas não há data. Os lulistas mais aguerridos tentam reduzir o estrago no prestígio do ex-presidente, dizendo que ele nem apoia Meirelles, portanto não é tão perdedor, mas não seguram a onda de desânimo.

E se não for mesmo Tombini? Não importa, ela concordou em levar o novo ministro da Fazenda ao G-20, e foi ele quem ela convidou. Afirma-se ao redor de Lula, onde estão os mais comprometidos com o futuro do PT: que a presidente Dilma nomeie quem quiser, desde que seja logo. Que a presidente Dilma faça o que quiser da Petrobras, inclusive deixe lá a presidente Graça Foster, desde que seja logo. É, também, o que recomendam políticos de sua base de apoio, tentando buscar alguma estabilidade para erguer as barricadas de proteção dos efeitos da Operação Lava-Jato.

As definições são urgentes, mas a presidente continua adepta de manobras diversionistas. Foi com sua concordância que oministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, concorreu com o chefe da Casa Civil, em matéria de providência inútil e desproporcional à gravíssima situação da maior estatal do país, ao tentar virar as baterias para dois delegados que atuam nas investigações da Petrobras e que apoiaram o candidato adversário de Dilma no segundo turno pelas redes sociais. O Brasil estaria, na concepção do ministro, vivendo um simples terceiro turno eleitoral, não um terremoto.

Foi também com a ordem presidencial que se detonou a batalha contra a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara. E foi com seu conhecimento, no mínimo, que o governo se moveu para tirar a relatoria das contas de campanha das mãos do ministro Gilmar Mendes. O que pensa das suas próprias guerras, o novo governo e a Petrobras, não se sabe.

A presidente centraliza tudo, e como não tem núcleo estratégico, retaguarda política, equipe atuante, o Brasil parou à espera da sua volta, como havia parado durante a campanha. As fotografias da reunião do Conselho da Petrobras, de autoria de Leo Pinheiro (Valor) e Ricardo Borges (Folha), publicadas ontem, são um choque: as autoridades se apresentam destruídas. Dilma não se abala, nem quanto ao tempo, nem quanto ao ritmo.

O PT e a presidente Dilma estão colocando o Tribunal Superior Eleitoral em situação constrangedora. Se obrigarem o presidente do TSE, o ministro Antonio Dias Toffoli, ex-advogado do PT e do governo, a trocar o relator das contas de campanha da presidente, porque o sorteio caiu em Gilmar Mendes, um dos três últimos ministros não nomeados pelo PT, estará criado o impasse. Qualquer outro que receba agora a missão por concessão do governo ficará sob suspeita. Todo o episódio dá mais uma razão aos que temem o aparelhamento dos tribunais e a satisfação do desejo do governo de controlar os três poderes.

A falta que faz a Lei Anticorrupção - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 19/11


Por razões que só a razão explica, o Palácio do Planalto ainda não regulamentou a Lei Anticorrupção, que prevê a responsabilização objetiva de empresas em casos de corrupção.

Caso já estivesse regulamentada, a Lei Anticorrupção, aprovada pelo Congresso logo após as manifestações de junho de 2013, poderia evitar uma discussão que agora se levanta sobre a responsabilidade das empreiteiras nas maracutaias que estão vindo à tona a partir das delações de Paulo Roberto Costa e de Alberto Youssef.

E, com isso, a discussão sobre a responsabilidade das empreiteiras na razzia praticada contra a Petrobrás deixa muito à vontade quem postula que caberá apenas a responsabilização de pessoas físicas. É claro, no entanto, que, existindo a Lei Anticorrupção, essa solução seria um preço muito baixo para empresas que cometeram delitos da gravidade e da extensão denunciadas. É preciso investigar com diligência e prudência, estabelecendo as conexões e as responsabilidades, para que, no momento certo, possa se afirmar quem deve ser punido e quem não deve.

A precipitada atitude de dizer nesse momento que, caso as grandes empreiteiras sejam responsabilizadas e declaradas inidôneas para participar de licitações, ocorrerá uma paralisação generalizada das obras públicas não passa de uma cortina de fumaça, como se tais empresas fossem importantes demais para serem responsabilizadas.

Não cabem raciocínios desse quilate, como se existisse no Brasil imunidade por grandeza ou por importância. Ao contrário, a punição às empresas pode - se for o caso de puni-las - produzir efeitos muito benéficos, como, por exemplo, as empreiteiras redirecionarem a sua atuação para a atividade que lhes correspondia originalmente - tomar empreitadas -, deixando de participar diretamente de concessões de serviços públicos.

Houve um tempo, ainda não tão distante, em que eram os consórcios de empreendedores - e não as empreiteiras - que participavam dessas licitações. Esse retorno à atividade original pode ser benéfico para todos os envolvidos. Muita proximidade com o governo não faz bem a essas empresas nem muito menos aos governos.

No entanto, o governo de Dilma Rousseff ainda não regulamentou a Lei Anticorrupção, omissão essa que acaba dando espaço a especulações com as quais um país sério não precisaria ter de lidar. O decreto presidencial que regulamentaria a lei está sendo prometido desde o início do ano.

Em janeiro, o ministro da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage, afirmou que o decreto estava quase pronto, bastando apenas passar pelo crivo da presidente Dilma. Recentemente, ao ser questionado sobre o atraso de mais de dez meses, Hage alegou que as eleições retardaram a discussão sobre o assunto, mas "tudo indica que sairá muito proximamente o decreto".

Já passa da hora de regulamentar a Lei Anticorrupção. No mês passado, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou um relatório no qual frisava a importância dessa lei para o combate à corrupção, ao mesmo tempo que ressaltava que a falta de regulamentação privava o País de importantes instrumentos de combate à corrupção, como a responsabilização objetiva (não se necessita comprovar dolo ou culpa) das pessoas jurídicas por atos lesivos à administração pública e a possibilidade de acordo de leniência, uma figura equivalente à delação premiada para as empresas. A OCDE dizia que o Brasil havia dado um grande passo com a aprovação da lei pelo Congresso. Era, obviamente, um elogio limitado, pois os efeitos desse passo ainda estavam no ar em razão da falta de regulamentação.

Diante das graves denúncias envolvendo a Petrobrás e grandes empreiteiras, a não regulamentação da Lei Anticorrupção pode sair muito cara à presidente Dilma. As concretas denúncias envolvendo a Petrobrás e grandes empreiteiras podem sugerir aos desavisados que a demora excessiva na regulamentação de uma lei que veio cumprir um desejo explícito da sociedade tem o propósito de não perturbar o sono dos corruptos.


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

Gleisi roga a senadores não ser convocada à CPMI

Ex-ministra da Casa Civil do governo Dilma, Gleisi Hoffmann (PT-PR) tem procurado senadores de vários partidos, inclusive de oposição, para tentar impedir sua convocação na CPMI da Petrobras. O megadoleiro Alberto Youssef disse ter entregue R$ 1 milhão para sua campanha ao Senado, em 2010, e Paulo Roberto Costa, também preso na Operação Lava Jato, disse ter recebido pedido do ministro Paulo Bernardo (Comunicações), marido de Gleisi, para “ajudar na campanha” dela.

Desgaste

Quem viu Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann nos últimos dias afirma que o casal anda bem abatido, após as delações do Petrolão.

Fator decisivo

Desnorteada e dividida, a base aliada não pôde impedir a quebra de sigilo do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, na CPMI da Petrobras.

Chumbo trocado

Após a convocação de Sérgio Machado, indicado por Renan Calheiros à Transpetro, o PMDB deu o troco: votou pela convocação de Vaccari.

Roubômetro

O Petrolão por enquanto só perde para a Copa, no campeonato de superfaturamento de obras: R$ 10 bilhões contra R$ 25,6 bilhões.

‘Homem da mala’ da Friboi foi pupilo de Severino

Apelidado de “Homem da Mala da Friboi” na campanha, após atuar como office-boy do Grupo JBS, Ricardo Saud foi assessor e pupilo de Severino Cavalcanti (PP-PE), que exigiu “diretoria que fura poço” na Petrobras para apoiar o governo Lula. Saud continuou no ramo: dividiu apartamento em Brasília e carregava pasta de Eduardo da Fonte (PP-PE), deputado citado na delação premiada de Paulo Roberto Costa.

Piada ambulante

O “deslumbramento” de Ricardo Saud entrou para o anedotário de Brasília e neutralizou em parte as generosas doações do JBS/Friboi.

Recorde mundial

Após torrar R$ 253 milhões nas eleições, o JBS/Friboi é o recordista mundial em doações – desinteressadas, claro… – para políticos.

À beira de um ataque

Políticos ligados a Lula estão preocupados: a investigação do Petrolão o deixou mais preocupado (e nervoso) que nos tempos de mensalão.

É a democracia, abestados

Dilma cuspiu fogo, reclamando que “ninguém controla” e nem sequer tem acesso a informações da Polícia Federal. Até o ministro da Justiça, chefe da PF, só soube da fase “juízo final” da Lava Jato como qualquer brasileiro: pela imprensa. Que essa turma também adoraria controlar.

Questão de isonomia

Políticos do PMDB reclamam tratamento isonômico: o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, deveria fazer companhia a Fernando Baiano na cadeia. Um e outro eram contato dos partidos na quadrilha do Petrolão.

Rabo preso

A Procuradoria da República no DF intimou o comandante do Exército a explicar por que se recusa a confiscar honrarias militares concedidas a mensaleiros. O general Enzo Peri ainda se esconde de jornalistas, e o Ministério da Defesa informou que “não faz atendimento à imprensa”.

Ganha peso

A oposição está na torcida para que a CPMI da Petrobras nem sequer consiga votar o relatório este ano, o que só aumenta a necessidade de criar uma nova comissão de inquérito na próxima legislatura, em 2015.

Empilhando contratos

Amiga do prefeito de S. Bernardo (SP), Luiz Marinho (PT), a agência de propaganda Sotaque levou licitação de R$ 9 milhões do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC. Agora é favorita na licitação de R$ 6,7 milhões na vizinha São Caetano, do aliado Paulo Pinheiro (PMDB).

Troco petista

Logo após a quebra de sigilo bancário de João Vaccari, petistas escreveram requerimento à mão para incluir na pauta da CPMI a inútil convocação de José Gregori, tesoureiro do PSDB.

Surpresa

Candidato à Presidência da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tem garantido a deputados que não aparecerá entre os envolvidos no Petrolão: “Se eu tivesse o que temer, não estaria na disputa”, afirma.

Decadência

Um boné enviado da Irlanda para um leitor chegou ao Brasil em 72 horas, mas até hoje – 33 dias depois – os Correios não o entregaram no destino. Pior: nem se dão ao trabalho de fixar prazo.

Pensando bem…

…sem furar um único poço, a gangue do escândalo da Petrobras descobriu por que petróleo é chamado de “ouro negro”.