sábado, junho 22, 2013

Estes jovens ventos de mudança - WALCYR CARRASCO

REVISTA ÉPOCA

Será que, um dia, olharei as fotos de hoje e verei manifestantes envolvidos em maracutaias?



Confesso que assisto às manifestações em São Paulo, Rio de Janeiro e no resto do país e penso: houve um tempo em que eu estaria lá também, correndo das bombas de gás e das balas de borracha. Na minha época, ainda adolescente, no final dos anos 1960 e início dos 1970, jogavam a cavalaria em cima de nós, manifestantes. Cheguei a me refugiar dentro de lojas, onde os comerciantes fechavam as portas e ficávamos todos lá: nós, os jovens, clientes, vendedores e proprietários em silêncio solidário, ouvindo os gritos, a pancadaria. Na manifestação depois da morte de Vladimir Herzog, na Praça da Sé, arrisquei perder o emprego para comparecer.

Amigos meus foram presos, outros fugiram ou foram banidos. Um dos meus melhores amigos, Flávio Tavares, jornalista e militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), foi trocado por um embaixador. Havia, sim, um ideal, não muito claro, mas de esquerda. Todos acreditávamos no fim da pobreza, na divisão dos bens, no socialismo. Todos citavam Marx, mas raramente algum lera sua obra máxima, O capital. No máximo, o Manifesto do Partido Comunista. Bem mais novo, eu admirava José Dirceu, seus discursos inflamados. Mais tarde, participei de um grupo de teatro popular que se apresentava na periferia da cidade. Sempre acreditando num mundo mais justo. Não sei se por ingenuidade ou por burrice, acreditava que o futuro seria melhor.

Mais tarde acompanhei, compareci às manifestações pelas Diretas Já. Jamais me arrependerei. Sou profundamente contra qualquer governo totalitário, sempre serei. Meu pote de inocência ganhou rachaduras quando soube, mesmo extraoficialmente, das pequenas e grandes corrupções, dos cabides de emprego nos novos governos.

– Não pode ser! – dizia. – São essas pessoas que lutaram por um Brasil melhor.

Mesmo assim, me apaixonei pelos caras-pintadas. Já me tornara menos ativista, mas torcia por eles. Dizia:

– Há esperança.

Agora, assisto de longe às manifestações. Meu coração bate forte.

– Será? – pergunto.

Não entendo bem quem está do lado de quem. Na minha memória de dinossauro, o PT era a âncora dos ativistas. Agora, as manifestações são contra o PT? E o PSDB, que floresceu no PMDB, partido que, com a sigla MDB, corajosamente se opunha aos direitistas pró-militares da Arena? É esse governo que envia a repressão em São Paulo? Tudo fica confuso na minha cabeça. Mas ainda acredito que, um dia, as coisas darão certo. E me inclino para os manifestantes, simplesmente porque são do contra. Em meio a tantos casos de corrupção, verbas multiplicadas, explosão de cargos, alianças que me chocam, só sei que sou do contra. Gostaria de estar gritando com uma faixa na mão.

Então olho as fotos desses jovens, sinto sua veemência. Não são de esquerda, como na minha época. À sua maneira, querem um mundo melhor. Quem sou eu para criticar atos de vandalismo se, na minha época, a turma do contra assaltava bancos e tentava fazer guerrilha no Araguaia? Só penso: qual o futuro desses jovens? O livro A revolução dos bichos, de George Orwell, é fascinante porque mostra como o poder corrompe os idealistas. Da mesma maneira, uma peça meio esquecida de Jean-Paul Sartre, A engrenagem, fala de um político revolucionário que se transforma num ditador semelhante ao que ele derrubou. Sábia maneira de analisar o poder! Eu me pergunto:

– Qual será o destino desses jovens?

Hoje gritam nas ruas. Mas tantos idealistas não foram envolvidos em casos de corrupção? Ou estão fumando charutos cubanos, tomando conhaque em casas monumentais, construídas com as “comissões” em contratos do governo? Olho a foto de tanta gente e penso:

– Onde foi parar aquele idealista?

De todos, o único que evitou as teias do poder foi Flávio Tavares. Vive em Búzios, aposentado.

E depois, os caras-pintadas? Lindberg Farias é acusado de corrupção. Não sei se é inocente ou culpado, mas a simples acusação me decepciona.

Será que, daqui a alguns anos, olharei as fotos de hoje e descobrirei alguns dos manifestantes transformados em políticos envolvidos em maracutaias? E que não tem mesmo jeito, pois a idade nos torna mais ambiciosos e menos idealistas? Ou será que tudo isso agora simboliza um princípio? Um início. Um sinal de que algo pode mudar e de que, mesmo com erros, excessos, há um futuro com gente disposta a lutar por um mundo melhor?

Desespero de causa - RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA

O passe livre passou a ser o passo livre. A adrenalina tomou conta de jovens em busca de ideais 


Diante de mais de 1 milhão de brasileiros nas ruas contra tudo e todos na quinta-feira, em 120 cidades, o sentimento comum entre estudiosos era a “perplexidade”. Estavam perplexos com o tamanho dos protestos, a temperatura da indignação, a falta de lideranças claras, a nuvem difusa de reivindicações. Minha perplexidade sempre foi outra. Não entendia como ninguém saía às ruas contra a calamidade nos serviços essenciais e no baixíssimo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) brasileiro. Era como se fôssemos impotentes para mudar as prioridades do país – já que, pelo voto, só conseguiríamos mudar o ruim pelo menos pior.

Se o movimento começou com foco em passagens mais baratas – ou gratuitas – de ônibus, terminamos a semana numa catarse anárquica. Manifestantes e policiais perderam o controle. Hoje, se uma causa pudesse unir todos os manifestantes, ela seria: “Hay gobierno? Soy contra”. O passe livre passou a ser o passo livre. A adrenalina tomou conta de jovens que se sentiam à margem do processo histórico e político do país, sem voz, sem ilusões, em busca de ideais. Pouquíssimos conhecem de verdade o que significa a palavra “ditadura”.

O protesto atual é perigoso para a paz social? Sim. Mas era mais previsível que a sucessão de estações do ano. Uma hora o brasileiro cordial estouraria – e seria convocado pelas redes sociais... porque foi assim em todos os países, independentemente das bandeiras. Não é isso que nós, profissionais da imprensa, prevíamos? Há anos temos denunciado escândalos na educação, na saúde, no transporte, na habitação, na infraestrutura, nos Três Poderes. Há anos nos indignamos com os impostos escorchantes, a falta de representatividade dos partidos, a corrupção, a impunidade e o mau uso do dinheiro público. E nos revoltamos com as alianças espúrias que permitem a um odioso Marco Feliciano cuidar de direitos humanos e apoiar a “cura gay”.

É triste e assustador ver a ação de vândalos e arruaceiros que depredam equipamento público, picham, invadem prédios do governo, quebram lojas, saqueiam, incendeiam. É triste e assustador ver a ação de policiais de choque que espirram pimenta numa senhora dentro de uma clínica para ela parar de falar, que jogam bombas em jovens de mãos ao alto voltando para casa pacificamente com a bandeira brasileira, que encurralam manifestantes em lanchonetes e jogam gás dentro, que lançam gás lacrimogêneo dentro de hospitais. Isso é receita de guerra alimentada por ódio. Quando a revolta escapa ao controle, só favorece extremistas.

É inadmissível que protestos pacíficos descambem para a intolerância às diferenças. Mesmo que a maioria dos jovens se diga apartidária, eles não têm o direito de incendiar bandeiras. Nem têm direito de hostilizar jornalistas ou queimar carros de empresas de comunicação. Esse comportamento é fascista.

Faz seis anos que escrevo uma coluna semanal para ÉPOCA. Uso a arma possível: as palavras. Condenei tantas vezes Renan Calheiros e a votação secreta, que o alçou ao lugar de seu padrinho José Sarney, com a bênção de Dilma. Sugeri a criação da Contribuição dos Corruptos Municipais, Estaduais e Federais, a CCMEF. Listei “10 razões para se indignar”, no fim de 2010 e de 2011. Fiz campanha contra o voto compulsório. Perguntei ao leitor “Quando vamos moralizar o Poder?”. Revoltei-me com a informação de que 13 milhões de brasileiros, ou 7% da população, não têm banheiro. Defendi que “precisam sair do escuro as relações entre as autoridades e as empresas de ônibus”. Afirmei que “não há vergonha na cara de um país que mata e despreza seus velhos por negligência” nas filas e corredores de hospitais.

E, depois de escrever tudo isso com liberdade, não posso vestir a camisa da Editora Globo para cobrir os protestos. Corro o risco de ser linchada por um grupo minoritário de jovens ignorantes que confundem tudo, uns desmemoriados que desrespeitam o trabalho de tantos jornalistas investigativos, entre eles Caco Barcellos. Ou, então, corro o risco de levar uma bala de borracha na testa ou no olho, disparada por um policial de choque com sede de sangue.

Posso relevar todos esses atos de estupidez, de lado a lado, sob um único argumento: a verdadeira democracia pressupõe um exercício ativo da população, uma vigilância perene sobre as instituições, uma participação atuante de jovens comprometidos com nossa história. E o Brasil enferrujou em anos de pasmaceira e populismo. Está na hora de aprender não só a cantar o hino, mas a respeitar as cidades. Está na hora de as forças da ordem honrarem sua farda e seu poder. Não ataquem inocentes – os senhores estão sendo filmados.

BRASIL - POLÍTICA & FUTEBOL





Vai passar - BRASIL 2013


Por Chico Tripa

Vai passar
Nessa avenida um samba popular
Cada roubo da política
Da velha cidade
Essa noite vai
Se protestar
Ao lembrar
Que aqui passaram siglas imorais
Que aqui roubaram sob nossos pés
E que enganaram nossos ancestrais

Num tempo
Página infeliz da nossa História
Mensagem forjada na memória
Das nossas novas gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão distraída
Se viu de novo tão subtraída
Em tenebrosas transações

Seus filhos
Erraram cegos bem antigamente
E se iludiram tão perdidamente
Erguendo as teses sindicais
E um dia de sol
A juventude com energia e gás
Viu a farsante ideologia
Com roubalheira e futebol
O futebol, o futebol
(Vai passar)

Vaia pra ala dos bundões famintos
O bloco dos cuecões retintos
E o Zé Dirceu do Lula-Lá
Meu Deus, vem olhar
Vem ver de perto uma cidade a marchar
A evolução da liberdade
Até a coisa melhorar

Ai, que vida bosta, olerê
Ai, que vida bosta, olará
O estandarte dessa revolta geral
Vai passar.

Boa sorte, Aldo - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 22/06

O ministro Aldo Rebelo diz que não tem qualquer sentido pensar em tirar do Brasil a Copa do Mundo de 2014 por causa das passeatas:
— Quebra-quebra já ocorreu em Londres e Paris. As passeatas têm sido pacíficas. Violência é coisa de uma minoria.
O governo vai, entretanto, reforçar a segurança dos eventos ligados à Copa.
Como dizia Nelson...
Para um amigo que desejou boa sorte ao ministro até o fim da Copa das Confederações, Aldo brincou:
— É como dizia Nelson
Rodrigues: com sorte você atravessa o mundo, sem sorte você não atravessa a rua.

Samba no Maraca
A festa de encerramento da Copa das Confederações dentro do Maracanã, no domingo, dia 30, será em ritmo de samba.
A Grande Rio vai fazer uma apresentação especial. Mestre Ciça já prepara paradinhas e coreografias com a bateria. Os integrantes da escola vão se fantasiar de trabalhadores do Brasil.

O dia de Dilma
Ontem, antes de gravar o seu pronunciamento, Dilma passou o dia em reuniões com boa parte do seu ministério, inclusive alguns recém-chegados ao governo, como o baiano César Borges e o paulista Guilherme Afif.

Na saída, foi comum ouvir relatos que a presidente estava tranquila. Ou, como disse um deles, “quem viveu 1968 não se assusta com 2013”.

A gente não quer só...
A revista inglesa “The Economist” ressalta um aspecto que difere as manifestações ocorridas no Brasil das de outros países.
A juventude que foi para a rua aqui tem emprego.

Dois lados da moeda
O que dá para chorar, dá para rir. A disparada do dólar provoca inflação.

Só que o governo federal hoje tem mais reservas em caixa do que dívidas em dólar.

Logo, quando o dólar dispara, lembra o economista José Roberto Afonso, a dívida pública cai.

Segue...
A estimativa é que o recuo da dívida esteja em torno de 1,5 ponto do PIB só com a desvalorização verificada em maio e parte de junho.

“Ao menos para as contas públicas, o dólar virou uma bênção, por ironia ou por paradoxo”, completa Afonso.

Fruto da internet
O ator Felipe Neto, de 25 anos, vai lançar, em agosto, pela Casa da Palavra, o livro “Não faz sentido por trás da câmera”.
Conta como surgiu a ideia de criar o “Não faz sentido”, um dos canais mais acessados do YouTube com picos de 5 milhões de acessos.

No mais

Calma, gente! Não falta estádio 

O temor de que o Estádio Mané Garrincha se transforme num elefante branco levou o governo do Distrito Federal a convidar o Flamengo a jogar lá dia 6 de julho contra o Coritiba, pela sexta rodada do Campeonato Brasileiro.
Se topar, o clube carioca deve embolsar uns R$ 2 milhões.

Aliás...
Este tipo de alternativa reforça dentro do Flamengo a ideia de não assinar um acordo, de 35 anos de duração, com o consórcio que administra o Maracanã, liderado pela Odebrecht.

O Flamengo acha melhor negociar partida por partida. Depois da Copa, não faltará estádio pelo Brasil afora.

Quem tem, tem medo
As manifestações no Rio levaram o ministro José Antonio Dias Toffoli, do STF, a dar bolo no Instituto Besc.
Ele era esperado para participar, ontem, da Cúpula sobre o Judiciário e os Interesses Vitais da Nação Brasileira, no Centro Cultural da Justiça Federal.

Lá vem a noiva
A 5ª Câmara Cível do Rio condenou a estilista Ana Maria da Silva Amaro a indenizar duas clientes em R$ 19.150.
É que a noiva e a sogra encomendaram seus vestidos com ela, mas os receberam com defeito e somente minutos antes da cerimônia, em outubro de 2008.

Papa no Rio
Rio das Pedras, a favela da Zona Oeste do Rio, vai acolher mais de dois mil fiéis durante a Jornada Mundial da Juventude, mês que vem.

Numa entrevista ao jornal “A Voz de Rio das Pedras”, que circula na comunidade, padre Marcos Vinícius, da igreja local, disse que 510 famílias de lá vão abrir suas casas para os peregrinos.

ASSIM SE PASSARAM CEM ANOS
Hoje se completam exatos cem anos que o primeiro transatlântico atracou no Rio. Em 22 de junho de 1913, a Cidade Maravilhosa recebeu o Astúrias, um navio a vapor do serviço postal britânico que trouxe dezenas de estrangeiros. Foi uma festa. Naquela época era comum que as pessoas visitassem o porto e, coma chegada do Astúrias, alguns até subiram para saborear os pratos de sua cozinha. O Porto do Rio já tinha um novo cais no lugar dos tradicionais trapiches, mas, como mostram as imagens do Arquivo Público do Rio, ainda carecia de estrutura. Cem anos depois... deixa pra lá 

GOSTOSA


A VAGABUNDA ESTÁ PARANOICA


O Mundial corre perigo - TOSTÃO

FOLHA DE SP - 22/06

A emoção da torcida, em Fortaleza, ao cantar o Hino Nacional, incorporada pelos jogadores, foi fundamental nos primeiros 20 minutos alucinantes e de bom futebol da seleção brasileira.


Havia, antes da partida, um grande temor de que as bem-vindas manifestações, fora do estádio e em todo o país, passassem para as arquibancadas, por meio de hostilidade ao time brasileiro. Não foi o que ocorreu. Pelo contrário. Os torcedores separaram a seleção do contexto. Mais que isso, sentiram-se orgulhosos em torcer para o Brasil.

Há também uma contradição em tudo isso, de ter protesto, fora, e festa, dentro do estádio.

Uma das reivindicações das manifestações são os absurdos gastos com os novos estádios, frequentados por torcedores que dizem apoiar os protestos. Não há mais lugar também para as fanfests, nas principais praças das cidades, organizadas pela Fifa e parceiros.

Hoje, é outro dia. Não sei o que vai acontecer, dentro e fora do estádio. Provavelmente, o torcedor da Bahia vai apoiar a seleção, ainda mais se o time jogar bem.

Mas não será surpresa se os protestos chegarem dentro dos estádios. A situação é grave. A Copa do Mundo corre perigo.

Quando não há violência, é emocionante ver as manifestações com pessoas de todas as idades.

Espero que os protestos sirvam também de estímulo para que os indignados com as misérias sociais e com os absurdos gastos da Copa se tornem, cada vez mais, cidadãos conscientes, mesmo quando silenciosos. Isso é muito mais importante que atitudes exibicionistas e marqueteiras, para mostrar que é engajado.

Por ser contra os gastos excessivos e não prioritários do governo e ter total independência em minhas opiniões, recusei o prêmio de R$ 100 mil aos campeões das Copas de 1958, 1962 e 1970.

O Brasil é favorito porque tem jogado bem, atua em casa, o calor ajuda, o time está com mais gana de ser campeão, e a Itália não terá Pirlo e De Rossi, além de ter se arrastado no segundo tempo do jogo com o Japão.

O técnico Prandelli foi muito importante na mudança da maneira de jogar da Itália, agora com um time mais leve, ofensivo e trocando mais passes.

Dentro de campo, os responsáveis por isso são De Rossi (27 anos) e Pirlo (34 anos). O único jovem brilhante é Balotelli (22 anos). Não dá para comparar as ausências de Pirlo e De Rossi com as de Paulinho e, talvez, Oscar. O Brasil piora pouco ou nada.

Falta a Neymar uma atuação espetacular contra uma grande seleção, mesmo bastante desfalcada, como a Itália. Pode ser hoje.

Se não for, será na semifinal, na final, no Barcelona ou na Copa do Mundo. É questão de tempo.


Feliciano! Chegou a tua vez! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 22/06

E o Feliciano! Feliciano chegou a sua vez. É que estamos limpando uma merda por vez!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! O gigante acordou de mau humor. E quebrou tudo! O mingau desandou!

E ontem começou o inverno e pra Dilma, o inferno! Manchetes Bombásticas! "Sensacionalista": "Mendigos apoiam a campanha Vem pra Rua". "Piauí Herald": "Cabral quer passe livre para Paris". "Futirinhas": "Vamos fundar o PA, PARTIDO APARTIDÁRIO!".

E agora nas ruas temos: o policial à paisana e o partido à paisana! E o novo comercial da Caixa: "Gente, o Dudu tá protestando". E a Globo agora tá chamando os vândalos de "manifestantes radicais".

E o Feliciano! Feliciano chegou a sua vez. É que estamos limpando uma merda por vez!

E esse cartaz explica a insanidade do Feliciano: "Feliciano, quem foi o boy que partiu seu coração?". Rarará!

E já tem gay pedindo aposentadoria retroativa. E se um gay se recusar a cura gay, rola internação compulsória? E um amigo meu: "sou gay, tô curado, mas antes posso comer o Vladimir Brichta?". DEVE! Rarará!

E aquele menina com o cartaz: "Feliciano, me dá um atestado que hoje acordei sapata". Rarará!

E como disse aquela biba: "tá bom, eu quero me curar, vou ao médico e ele me receita o quê? Comer duas pererecas por dia?". De 12 em 12 horas! Rarará!

E outro: "meu tio tá gay. Fui visitar no hospital e ele tá melhor: tá pegando nos peitos da enfermeira". E o site Sensacionalista: "Movimento gay pede que Hulk cante o Hino Nacional de costas". Rarará!

O Feliciano quer transformar o Brasil num Irã! Ah, tem outro cartaz: "Feliciano cuidado! O gigante acordou de pau duro". Rarará! É mole? É mole, mas sobe!

A Revolta da Hashtag! E o povo agora tá brigando através de hashtags: #vemprarua x #saidarua. Um amigo brigou com a prima dele por causa de hashtags! "Ah, ela botou o hashtag #saidarua". A Revolta da Hashtag!

E eu: #tôcommedo! E outra coisa: o Brasil não pode virar Tribunal Popular. Como nos regimes fechados! Porque nóis sofre, mas nóis goza!

Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

Preparando os filhos para o futuro - FERNANDO REINACH

O Estado de S.Paulo - 22/06

Pais tentam preparar os filhos para o futuro. Buscamos no presente indícios de como será o futuro, imaginamos como será o ambiente em que nossos filhos viverão, e tentamos prepará-los. A novidade é que os esquilos fazem a mesma coisa.

Os esquilos vermelhos (Tamiasciurus hudsonicus) vivem no norte dos Estados Unidos e no Canadá, onde o inverno é longo e frio. Cada esquilo vive em um território delimitado, onde coleta as sementes de uma espécie de pinheiro (Picea glauca). No centro do território esta o ninho, onde o esquilo estoca as sementes necessárias para sobreviver durante o inverno. Se o esquilo não conseguir estocar alimento suficiente, ele não sobrevive ao inverno.

Um grupo de cientistas vem acompanhando uma comunidade desses esquilos desde 1989. Eles descobriram que a densidade de esquilos na floresta varia muito de ano para ano. O mínimo é de 1 animal em cada 10.000 metros quadrados e o máximo é de 4 animais na mesma área. A densidade de animais em um dado ano é determinada pela quantidade de alimento disponível no ano anterior. Se em um ano existe muito alimento, a densidade de esquilos aumenta no ano seguinte. Ao contrário do que você pode imaginar, esse aumento não é causado por um aumento no número de nascimentos nos anos em que o alimento é abundante. O aumento é devido a uma diminuição no número de esquilos que morrem por falta de alimento no inverno que se segue a um verão abundante. Imagine que o ano um foi de muito alimento, o dois será de alta densidade, mas como será o ano três? Se houver muito alimento, a densidade populacional pode se manter, mas se o alimento for escasso, e os esquilos não conseguirem estocar alimento, grande parte da população morre e a densidade populacional volta a ficar baixa.

Estudando essa constante flutuação da população de esquilos, os cientistas descobriram um fato que chamou a atenção. Sempre que a densidade da população era alta em um dado verão, o peso dos filhotes ao nascer era maior. Acompanhando o peso dos recém-nascidos por muitos desses ciclos eles descobriram que sempre que a densidade dos esquilos era alta, mesmo quando naquele ano havia pouco alimento, e o inverno iria ser de alta mortalidade, os filhotes eram mais pesados. Em outras palavras o peso dos filhotes dependia somente da densidade da população, e não da disponibilidade de alimentos.

Essa descoberta levou os cientistas a investigar a razão do aumento de peso dos filhotes quando a densidade populacional era alta. Eles descobriram, medindo a quantidade de hormônio nas fezes das mães, que a razão pela qual os filhotes eram mais pesados era porque as mães, em locais de alta densidade populacional, produziam mais hormônios. Mas como essas fêmeas sabiam que estavam em uma área de alta densidade populacional?

Foi aí que os cientistas tiveram a grande ideia. Como os esquilos produzem sinais sonoros, uma espécie de grunhido, os cientistas imaginaram que talvez a quantidade de grunhidos ouvidos pelas fêmeas fosse a maneira usada por elas para "saber" que a densidade populacional estava alta. Para testar a hipótese os cientistas gravaram os grunhidos dos esquilos e espalharam alto-falantes em toda a floresta. Em uma parte da floresta os alto-falantes tocaram pios de pássaros durante todo o verão, em outra parte tocaram os grunhidos dos próprios esquilos, simulando a presença de mais esquilos na região. Quando os filhotes dessas duas regiões nasceram foram cuidadosamente pesados. Na área em que a densidade era baixa e a "música" tinha sido o pio de pássaros, o peso dos filhotes foi baixo. Nas áreas em que viviam as fêmeas que ouviram os alto-falantes tocando os grunhidos dos esquilos, o peso dos filhotes era maior. Quando os cientistas mediram os níveis de hormônios nas mães o resultado se repetiu. As mães que ouviram pássaros tinham baixos níveis hormonais, as que ouviram grunhidos de esquilos tinham altos níveis hormonais.

Esse resultado indica que os esquilos "deduzem" que estão em um ambiente de alta densidade populacional pelo aumento do número dos grunhidos que escutam na redondeza. Se a densidade populacional é alta eles produzem mais hormônios e os filhotes nascem mais pesados.

Mas porque produzir filhotes mais pesados? É simples e bem conhecido: filhotes mais pesados têm maior chance de sobreviver em seu primeiro inverno. A desvantagem é que eles vivem menos anos.

A conclusão é de que os esquilos, "sabendo" que a densidade está alta, e que a comida no ano que vem pode ser mais escassa, produzem filhotes mais pesados. Se a densidade é baixa, e as chances de fome no ano seguinte são menores, eles produzem filhotes mais leves, capazes de viver um número maior de anos.

Tal como os seres humanos, as mães esquilo usam informações do presente para prever como será o ambiente em que seus filhotes viverão. E ainda no útero preparam os filhos para uma vida melhor. Os esquilos podem não ler jornal, mas tentam entender o presente, imaginar o futuro, e se preparar para enfrentá-lo.

Imbróglio indígena - CESÁRIO RAMALHO DA SILVA

O ESTADÃO - 22/06


Uma verdadeira indústria de demarcação de terras supostamente indígenas está em curso no Brasil. A cargo da Funai, esse processo espalha insegurança jurídica, ameaçando o Estado de Direito e consequentemente a soberania e o futuro do País.
O complexo quadro vigente é fruto de um imbróglio jurídico criado pelo próprio Estado ao longo dos anos, e tanto o governo atual quanto os produtores proprietários de terras escrituradas, os índios, e a sociedade em geral são vítimas.
Segundo o IBGE, o Brasil tem hoje 14,69% do território com áreas indígenas para aproximadamente 817 mil índios. Os 5,2 milhões de propriedades rurais ocupam 38,8% do País. Segundo a Frente Parlamentar Agropecuária, a Funai pretende criar mais 611 reservas, fazendo a área pertencente aos índios chegar a 25% das terras brasileiras.
É preciso evitar a polarização ideológica e equivocada de que há um conflito entre o agronegócio e os índios. Abordar a questão assim é adotar uma postura leviana e distorcida. Governos passados concederam títulos de terras a não indígenas em áreas hoje reivindicadas como pertencentes aos índios. Estas famílias de não indígenas, detentoras legais das propriedades em que vivem e trabalham há três, quatro gerações, não podem ser penalizadas.
Hoje, uma comunidade depende apenas da declaração de seus integrantes e de um laudo antropológico para ser considerada indígena. No entanto, um processo demarcatório coerente precisa passar por estudos antropológicos sérios, documentados, não enviesados, que contemplem o parecer de outras instituições - não só a Funai.
Retirar não indígenas que têm o título de propriedade de suas áreas expedido pelo Estado de terras supostamente habitadas por índios seria apenas trocar o problema de lugar.
É óbvio que, caso as titularidades não forem comprovadas, a lei - devolvendo áreas aos índios - deve ser cumprida, como apregoa a Constituição. Mas, se existe outro direito preconizado na Carta Magna, ele se refere à legitimidade do Direito de Propriedade.
É necessário também restabelecer a Portaria 303, editada pela AGU, que normatiza o regime jurídico para a demarcação e gestão de reservas indígenas. A norma estende a todos os processos as 19 condicionantes definidas pelo STF no julgamento da demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol. Aguarda-se tão somente a publicação do acórdão - adiada, entre outras coisas, pela demora na nomeação do novo ministro do STF - para que a portaria volte a valer. A portaria trata das salvaguardas institucionais às reservas indígenas e determina que todos os órgãos públicos federais sigam o que o STF decidiu. Mas a autoridade do STF como instância máxima está sendo ignorada por ONGs e movimentos ditos sociais. Esses grupos não agem em favor do direito dos índios, atuam em prol de quem os financia, em muitos casos, entidades estrangeiras. Vivem da perpetuação do problema.
É importante também um debate lúcido no Congresso referente à PEC 215, que propõe passar para o Legislativo o processo de demarcação de reservas indígenas. Soma-se a isso especial atenção para o projeto de lei que trata da exploração de recursos naturais e obras nas reservas.
Para concluir, cito pesquisa da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil, que mostra que os índios estão integrados ao modo de vida urbano. Eletrodomésticos e eletroeletrônicos estão presentes nas aldeias e o principal problema enfrentado pelos índios, segundo eles mesmos, é o acesso à saúde. Cerca de 64% deles recebem o Bolsa Família e 67% gostariam de cursar uma faculdade. O levantamento revela que, para os índios, energia elétrica, água encanada, rede de esgoto e casa de alvenaria são muito importantes.
Qual leitura podemos fazer? Que o índio não quer o isolamento, e sim assumir seu papel como cidadão, com direitos e obrigações. A preservação das tradições indígenas pode perfeitamente caminhar de mãos dadas com ganhos de cidadania.

"TODO MUNDO NA RUA É BOM" - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 22/06

ANA ESTELA HADDAD

A primeira-dama de São Paulo, Ana Estela Haddad, diz que as manifestações pela redução da tarifa do transporte são positivas porque "é a juventude voltando a se mobilizar". E afirma que a prefeitura deve "aperfeiçoar" sua comunicação. A mulher de Fernando Haddad (PT-SP) deu as declarações anteontem, na exposição "Khalil Gibran 130 Anos", no Memorial da América Latina. Ela chegou a cancelar a visita ao local, mas depois mudou de ideia.

Que leitura você faz das manifestações?
Tem um lado muito positivo, que é a juventude voltando a se mobilizar, a participar. A gente sai de um momento em que as coisas estavam meio... paradas, nesse sentido da participação social. Todo mundo na rua é bom. Participando, se mobilizando. É um aprendizado também. A comunicação nem sempre flui do jeito que a gente gostaria.

Mas houve algo negativo?
Não tenho certeza se ficou bem compreendido, se ficou bem claro, o desenrolar dos acontecimentos. O prefeito tem tido um movimento desde o início do ano muito firme, independentemente de isso estar pautado, de buscar mecanismos, alternativas de financiamento para manter a tarifa do transporte público a menor possível. Mas também isso faz parte, para a gente aperfeiçoar os nossos mecanismos de comunicação.

Houve algum momento em que você temeu pela sua segurança e a do prefeito?
Não. A gente ficou preocupado com a cidade, de maneira geral. Vimos situação de depredação. A gente não quer ver isso, né? Aí teve uma ação... Enfim... Foi difícil.

O clima já está mais tranquilo?
Acho que sim. Vamos ver hoje [quinta]. Acho que ainda vai ter uma movimentação. Vamos ver como as coisas se desdobram. Acho que ainda não dá para saber. Tem que assentar um pouco a poeira.

Qual foi a última vez que você andou de ônibus ou metrô?
Eu ando muito de metrô. Ando bastante de metrô.

Mesmo sendo primeira-dama?
Olha, este ano eu andei menos vezes. Acho que umas duas ou três vezes. É um pouquinho mais difícil, por uma série de situações que não são nem a vontade da gente. Mas eu gosto muito de andar pela cidade, de andar a pé, de estar no meio das pessoas.


UNIVERSO PARTICULAR

Lula fez análise diferente da formulada pela presidente Dilma Rousseff em relação aos protestos no país. Ela acreditava que, assim que o prefeito Fernando Haddad (PT-SP) anunciasse a redução das tarifas, tudo iria se acalmar. O ex-presidente tinha dúvidas. Mas defendia a medida para "tirar o problema da frente". E entender o que realmente as ruas estavam querendo dizer.

PENSE BEM
As manifestações em SP causaram estresse na Faculdade de Direito da USP. Janaina Paschoal, professora de direito penal, enviou carta aos colegas pedindo "reflexão", já que uma das líderes do movimento estuda lá. "É hora de recuar", diz. "A manutenção dos protestos, com a mesma frequência e natureza, implica cavar uma cova para a democracia". Ela disse querer "crer que uma aluna desta casa (...) não objetive ser lembrada como a jovem que trouxe de volta a ditadura" ao Brasil.

NONSENSE

A resposta veio na forma de uma carta assinada por outros professores. "As instituições democráticas não estão em perigo!", disseram, lembrando que a "sociedade brasileira muito esporadicamente consegue se manifestar". Classificando a manifestação de Janaina Paschoal de "lamentável", eles dizem que "a insinuação" em relação à aluna, "sugerindo que ela poderá ser a responsável pela volta da ditadura, é um completo nonsense".

NA PONTA DO LÁPIS
Imóveis em Miami estão entre 40% e 60% mais baratos que em São Paulo e no Rio, segundo pesquisa de uma imobiliária americana. Enquanto o metro quadrado de um apartamento ou casa custa, em média, R$ 12 mil em Moema (SP) e R$ 20 mil em Ipanema (RJ), na cidade americana o valor fica entre R$ 6.000 e R$ 10 mil.

NA PONTA DO LÁPIS 2
Os dados são da empresa Exit Realty Brickell, que mandou representantes às duas cidades brasileiras para tentar atrair compradores recentemente. Dizem que com R$ 300 mil já dá para adquirir um imóvel lá.

SESSÃO ESTENDIDA
Retrospectiva inédita no Brasil da obra do cineasta Howard Hawks vai ocupar de 2 a 31 de julho o Centro Cultural São Paulo.

A mostra, que foi apresentada em Belo Horizonte, reúne 40 longas do americano, diretor de títulos como "À Beira do Abismo", "Levada da Breca" e "Os Homens Preferem as Loiras".

DANÇA, GATINHO
Jesus Luz, ex-namorado da cantora Madonna, foi convidado para participar do programa "Ballando con le Stelle 2013", espécie de "Dança dos Famosos" do canal italiano RAI, que começa em setembro. O modelo e DJ ainda não aceitou.


MAITÊ A MIL

A atriz Maitê Proença apresentou para convidados a peça "À Beira do Abismo me Cresceram Asas", em que adaptou o texto, atua, ao lado de Clarisse Derzié Luz, e divide a direção com Clarice Niskier. A estilista Fernanda Kujawski, o psicanalista Jorge Forbes, a comissária de bordo Emily Sofia e a designer de joias Francisca Botelho estiveram na plateia do teatro Faap, anteontem.

UNIDOS PELO SOCIAL

O ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer e sua mulher, Mary, organizaram jantar beneficente em prol da Unibes (União Brasileiro-Israelita do Bem-Estar Social), presidida por Célia Kochen Parnes. O empresário Daniel Feffer, do grupo Suzano, e Marina Lafer compareceram ao evento no Instituto Cultural Ema Gordon Klabin, no Jardim Europa.


CURTO-CIRCUITO

O documentário "Jards", de Eryk Rocha, está em exibição gratuita nas salas Itaú de Cinema de SP, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Rio e BH e seguirá assim nos próximos 30 dias.

O artista plástico americano John Ross Palmer pinta mural na rua Luigi Pirandello, no Morumbi, a partir das 10h de hoje.

A galeria Mendes Wood, nos Jardins, abre hoje exposição com obras de Gerard Hemsworth e outra curada por Ricardo Sardenberg.

A festa Playlist terá clima junino hoje, às 21h, no Club A WTC, no Itaim Bibi.

O grupo Os Leleke's se apresenta amanhã na Disco, no Itaim Bibi, a partir das 22h. 18 anos.

Palmeiras e Santos lançam novas lojas oficiais no segundo semestre.


Infelicidade de uns - SONIA RACY

O ESTADÃO - 22/06

A questão é política, mas empresários são pragmáticos. Essa coluna ouviu, ontem, quatro dos grandes, impactados com a força dos protestos e a fraqueza dos governos. "Quem vai querer participar de licitações - como a do metrô paulista, que se a vizinha sem saber se sua tarifa estará garantida?" indagou um deles.


Outro contou ter mandado essa semana, para aplicação no exterior, recursos pessoais registrados. A insegurança só cresce." O terceiro, mais otimista, optou por olhar a metade do copo cheia. "A interlocução estava tão difícil, todo mundo achando que o País está uma maravilha, que certamente as coisas vão melhorar,"

O quarto? "Estou mudo".

...alegria de outro?

Mas tem um empresário satisfeito: o dono da Condor, única empresa no Brasil que fabrica gás pimenta. Seu estoque acabou. Novos pedidos? Só daqui a 30 dias.

Way out

Além dos EUA, a Alemanha também surge como plano B para a Copa de 2014.Segundo apurou a coluna, Joseph Blatter conversado com a federação alemã e executivos de patrocinadoras do Mundial.

Problema? Teria que “desinstalar"’ o aparato publicitário já montado para a competição. Preocupado, Piqué tenta convencer Shakira a voltar para casa. O zagueiro da Espanha teme a onda de manifestações por aqui. A cantora chegou anteontem ao País com o filho do casal, Milan.

Radical

Bruno Barreto tem sugestão algo anárquica para os ativistas: “Calote na Receita, com a população depositando o imposto em juízo até haver transparência nas contas do governo”. Para o cineasta, sem dinheiro, eles vão se mexer

Batalha Naval

A Marinha abriu sindicância para apurar as declarações de integrante da corporação no Facebook. Em um dos posts,Wladimir Fernandes, que se identifica como fuzileiro naval, diz: ""boa sorte policias (sic) do RJ e do SP batam muito nos que se dizem manifestantes, que comecem os jogos”.

À coluna, a corporação ressaltou que “repudia qualquer tipo de incitação à violência”.


E AGORA...

O QUÊ?



Silvio Caccia Bava, sociólogo, diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil e ex-diretor da Associação Nacional de Transportes Públicos, falou à coluna sobre a onda de manifestações no País.

●Por que está tão difícil traçar um perfil desse movimento social? Eu também estou tentando compreender até agora. E não é nada fácil.

Acontece que as manifestações foram agregando pautas. Em um primeiro momento, era o Movimento Passe Livre. Quando a polícia foi extremamente violenta, houve uma sensação de indignação geral. Começam a surgir indícios de que existe um grande desabafo.

●Como assim? É uma espécie de grito da sociedade, rebelada contra as condições de vida nas cidades. Não se trata apenas de transporte, mas, também, de violência, educação, saúde, dívidas a pagar... E uma juventude que não consegue se empregar e não enxerga um futuro.

●O movimento é difuso? Está apontando para uma ideia de luta pelo direito à cidade, de reapropriação do espaço público. E com toda a variedade de grupos: direita, esquerda, radicais. É um momento de radicalização. Agora, nas manifestações, aparecem gritos de "sem violência" se contrapondo aos de "sem burguesia". É muito difuso.

Eu fico preocupado com os desdobramentos, porque isso pode dar em nada.

●E a questão do apartidarismo? Muitos defendem manifestações apartidárias; já outros acham isso antidemocrático.

O movimento não é de esquerda nem de direita. Deveria poder contemplar e aceitar todas as manifestações.

Mas uma parte dos que estão na rua não tem visão de democracia. E não quer se misturar com outra que repudia, não quer ver o movimento ganhar uma coloração partidária. Considero isso natural.

Passaria a ser um problema se eles não pudessem se expressar. Mas as bandeiras continuam lá

O desmonte da Saúde - MÁRCIA ROSA DE ARAÚJO

O GLOBO - 22/06
Décadas atrás, os hospitais públicos do Rio de Janeiro eram centros de excelência, com equipes completas e experientes, que proporcionavam ótima formação para os residentes. Havia vínculo emocional e comprometimento dos médicos com o hospital, além da possibilidade de uma carreira. Hoje, o que se vê é a desativação de serviços, o fechamento de unidades, a falta de concursos com salários dignos e vínculo precário de trabalho. Isso, obviamente, afeta o interesse das novas gerações de médicos pelo serviço público, já que o atual sistema não permite que o profissional se fixe na rede, tanto na capital quanto no interior.

Uma preocupação do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro relaciona-se à privatização da Saúde: a tendência dos governos de entregar os serviços na mão de Organizações Sociais. Os médicos estão sendo coagidos a aceitar a implantação de empresas como a Ebserh. Recentemente, ganhamos uma ação que proíbe a Prefeitura do Rio de delegar às OSs a gestão das unidades já existentes. Os hospitais municipais Lourenço Jorge, Miguel Couto, Salgado Filho e Souza Aguiar, e dois PAMs da Zona Norte da cidade, por exemplo, não podem ser administrados desta forma.

A contratação de médicos estrangeiros é outra medida imediatista e ineficaz para iludir a população. Afirmo, com base em fundamentos e pesquisas, que não faltam médicos no Brasil. O governo federal implementa uma política desastrosa: para extinguir os estatutários, não faz concursos públicos com salários decentes e carreira para os profissionais se interessarem por exercer a profissão no interior. Como se não bastasse, está decidido a trazer para o país médicos estrangeiros sem a revalidação de diploma. Isso me faz acreditar que o povo brasileiro passará a ser cobaia de profissionais não qualificados. Não se trata de um tabu. É a defesa intransigente da ética e da qualidade de atendimento para pessoas que dependem daquilo que foi uma vitória da Constituição: o SUS.

Outro grupo que se frustra diante do caos instalado na Saúde pública é o de médicos que estão prestes a se aposentar. Sem a chance de passar adiante o legado científico de suas instituições, terminam a carreira acompanhando a rotatividade de temporários que, sem perspectivas, migram de um hospital para o outro, seguindo as tendências do mercado. Este cenário também é resultado da inércia das autoridades e de suas atitudes equivocadas, como a determinação do Ministério da Saúde que suspende a aposentadoria especial. Autoritário, o governo está impedindo os médicos de se aposentarem e obrigando-os, em alguns casos, a retornarem ao trabalho, mais um ato inconstitucional.

O acordo automotivo, de novo - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 22/06


Os gestos de gentileza trocados nos últimos dias pelas presidentes Dilma Rousseff e Cristina Kirchner para tratar do acordo automotivo entre Brasil e Argentina não deixam dúvidas de que os dois governos estão dispostos a manter a vigência desse acordo, cujo item mais importante - o controle do comércio entre os dois países - perderá validade no dia 30 de junho, passando, então, a vigorar o livre comércio. O regime de liberdade comercial, aliás, deveria estar em vigor desde a criação do Mercosul, há 22 anos, mas, por pressão argentina generosamente tolerada pelo governo brasileiro, vem sendo seguidamente adiado.

Não tendo podido tratar diretamente desse assunto na última reunião de trabalho que manteve com sua colega argentina, em 25 de abril, Dilma encarregou o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, de, como seu enviado pessoal, iniciar as negociações com a presidente argentina. Num gesto de deferência, Cristina Kirchner, de sua parte, concordou em reunir-se com Pimentel na residência oficial de Olivos, onde não costuma receber representantes de governos estrangeiros.

São mesuras injustificáveis para renovar um acordo que nunca deveria ter existido. O acerto entre os dois governos para regulamentar o comércio binacional de automóveis e componentes tornou-se mais uma das gazuas comerciais que distorcem e desmoralizam o Mercosul. O Mercosul foi criado em 1991 como uma zona de livre comércio, que implicava o livre fluxo de mercadorias entre os países-membros. Sua prematura transformação em união aduaneira, em 1995, tornou ainda mais injustificável o acordo automotivo. Mas, por pressão dos fabricantes argentinos de veículos, ele vigora desde 2000, com alterações pouco significativas feitas em suas sucessivas renovações, a última das quais é de 2008.

A renovação do acordo automotivo é vital para a indústria argentina. Nos cinco primeiros meses deste ano, ela produziu 331 mil veículos, dos quais 159 mil, ou praticamente a metade, foram vendidos no mercado brasileiro. O Brasil absorve quase 90% dos veículos exportados pela Argentina.

Pode-se dizer que o acordo interessa também aos fabricantes brasileiros, pois, dos 411 mil veículos exportados pelo País em 2012, a Argentina absorveu cerca de 70%. É importante, no entanto, examinar algumas diferenças essenciais entre a estrutura produtiva e a capacidade de exportação para outros mercados do Brasil e da Argentina.

Enquanto, como se viu, o mercado brasileiro absorve praticamente a metade de tudo o que a indústria automobilística argentina consegue produzir, o mercado argentino compra menos de 10% do que se produz no Brasil. Esses números mostram o grau de dependência da Argentina em relação ao Brasil. O fato de o Brasil ser o principal (e quase único) destino dos veículos exportados pela Argentina coloca a indústria do país vizinho diante de dois desafios, como declarou recentemente o presidente da Adefa (o correspondente argentino da Anfavea), Cristiano Ratazzi: renovar o acordo automotivo e conquistar novos mercados.

O segundo exige investimentos em tecnologia e inovação que não vêm ocorrendo. O primeiro, com a generosa concordância do governo brasileiro, poderá ser superado sem grandes sustos.

O acordo automotivo renovado em junho de 2008 tem validade de seis anos. Mas ele estabelece que o comércio de todos os produtos automotivos será livre entre os dois países a partir de 1.º de julho de 2013 - daí a angústia com que os fabricantes e o governo argentino esperam a conclusão dos entendimentos iniciados por Pimentel e que agora prosseguem em nível técnico.

Com a provável renovação desse acordo injustificável numa união aduaneira, o Brasil se aprofundará num atoleiro comercial que o impede de abrir mercados muito mais promissores por meio de acordos bilaterais, que são desprezados pelo governo do PT.

Os sibaritas e as patentes - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 22/06

SÃO PAULO - Cientistas e inventores, a exemplo de qualquer animal, tendem à preguiça, isto é, só gastam energia quando há motivo. Foi com base nessa premissa que os voluptuosos sibaritas desenvolveram, já em 500 a.C., um mecanismo que dava a cozinheiros e descobridores de produtos de luxo o direito de explorar com exclusividade durante um ano os frutos de sua imaginação. Alguns séculos depois, surgiria o moderno sistema de patentes.

Há racionalidade no esquema. Quando concedemos ao inventor o direito de ser o único a ganhar com sua criação por um período limitado de tempo, não só estabelecemos um incentivo à inovação como estimulamos a competição, o que gera mais soluções. A lógica é tão sedutora que, em 1980, a Suprema Corte dos EUA autorizou o patenteamento de um ser vivo criado por biotecnologia e, logo, genes, genomas humanos e não humanos entraram na onda.

Nem todos gostaram, pois a moda trouxe um problema matemático que atende pelo nome de "tragédia dos anticomuns". Trata-se do movimento espelho da mais conhecida "tragédia dos comuns", que é quando vários indivíduos, agindo racionalmente, exaurem recursos comuns limitados, como um pasto ou ponto de pesca, pois nenhum dos coproprietários pode bloquear a ação dos demais. Na "tragédia dos anticomuns", temos o oposto: como vários proprietários podem limitar o acesso ao bem, ele é subutilizado, ainda que isso não interesse a ninguém.

É o que ocorria no campo da biotecnologia nos EUA. Como muita gente tinha algo patenteado, criaram-se feudos sobrepostos. Se um cientista quisesse desenvolver uma droga ligada a um gene "com dono", precisava negociar com o detentor da patente. Como uma pesquisa típica envolve até centenas dessas negociações, muitos preferiam nem tentar.

Fez bem a Suprema Corte dos EUA ao decidir que genes que ocorrem naturalmente não são patenteáveis.


O legado das ruas - ROSISKA DARCY DE OLIVEIRA

O GLOBO - 22/06

Rios de gente invadem as cidades. Transborda o descontentamento. Não foi súbito nem inexplicável. Há muito tempo jovens lotavam as avenidas virtuais por onde passam as redes sociais protestando contra a humilhação a que estávamos submetidos.

Quantos assinaram a Lei da Ficha Limpa, o que de melhor se fez como ação cidadã nesses últimos anos? Aprovada, Renan Calheiros foi eleito pelos seus pares presidente do Congresso. E gargalhou.

Quantos festejamos o resultado do julgamento do mensalão em que o Ministério Público teve um papel fundador? Um obscuro deputado do PT pariu um monstrengo, a PEC 37, tentando paralisar o MP enquanto a execução das sentenças vai sendo posta em risco por chicanas jurídicas que desmoralizam a Justiça.

Quantos pedimos a saída imediata do infelicíssimo Feliciano, cuja incurável doença do ódio quer curar o amor alheio, na contramão da sociedade que avança no sentido das liberdades, propulsada sobretudo pelos jovens que delas não vão abrir mão? Feliciano preside a Comissão de Direitos Humanos, cada vez mais cinicamente agressivo graças à inércia e à cumplicidade de todos os partidos.

Cresceu a percepção de que a Casa em que deveriam se refletir nossos interesses se transformara em um depósito do lixo da corrupção. Somados, somos quantos milhões? Quantos milhões de roubados, de traídos?

O que está acontecendo é novo por sua amplitude e pela rapidez da mobilização. Mas o desgosto e a indignação são antigos. A juventude supostamente apática, desmiolada, desinteressada do país, sem história, está aí, fazendo a sua e a nossa história Se a fagulha foram vinte centavos, convenhamos que menos que isso estava valendo a dignidade da população.

Um abismo separa a sociedade brasileira de seus representantes deixando no ar o inadiável repensar do sistema político que perverte a democracia representativa, que já não representa ninguém como dizem, com razão, os cartazes nas ruas. E, ao dizê-lo, longe de atacar a democracia, os manifestantes a estão revitalizando em sua expressão contemporânea. Esse o primeiro legado do movimento.

O escárnio passou da conta. Quanto mais zombavam de nós e frustravam nossas esperanças, mais o protesto virtual ganhava corpo. Veio às ruas, em carne e osso.

A truculência da polícia argumentou com balas de borracha. A violência policial tem como outra face da sua moeda podre o vandalismo, minoritário e boçal. Ambas atentam contra a democracia. A violência da polícia é responsabilidade do Estado. A dos vândalos — eufemismo para perigosos pescadores de águas turvas — é responsabilidade do Estado e do movimento de protesto, a quem cabe isolá-los, condená-los, demarcando-se de quem nada tem a ver com seu espírito amplo e luminoso, que não rima com incendiar uma das joias da arquitetura mundial, o Palácio Itamaraty. Gente encapuzada, bestas-feras que agridem o patrimônio público, deve ser investigada e punida. De onde quer que venha, violência nunca mais há de ser outro legado do movimento.

O movimento que está nas ruas não é pré-político como já foi dito, mas pós-política. É contemporâneo de novas formas de comunicação e ação pública. Habita o mundo complexo da interlocução imediata entre jovens e adultos de uma classe média que vem se expandindo, suficientemente informada para criticar a má qualidade dos serviços públicos, consciente de que a corrupção conta a história desse desastre. Corrupção nunca mais, legado maior da voz das ruas.

Inútil interpretar o movimento com os instrumentos da velha política, esvaziando-o de seu ineditismo. Viciados nos seus próprios métodos, os políticos, Maquiavéis de quinta categoria, perguntam-se a quem aproveita, temendo-se uns aos outros, penetras na festa em que são mal vindos. Incapazes de enxergar fora de seu mundo autista que há vida lá fora, não percebem que essa massa que canta o Hino Nacional, cujo mal-estar atingiu um ponto crítico, não está a serviço de ninguém senão de si mesma, de sua justificada aspiração ao bem viver.

A agenda fala por si: saúde, educação e transporte, serviços essenciais ao bem-estar. Bom governo, transparente, honesto e eficiente. E a liberdade de cada um viver a sua própria vida. Na linha de frente da manifestação de Brasília, um arco-íris desafiava o céu trevoso dos fundamentalistas.

Quanto aos governantes serão doravante julgados pela resposta que forem capazes de dar a esta incontornável agenda da sociedade. Rios de gente invadem as grandes cidades e seus afluentes se multiplicam. Em que mar irão desaguar, impossível saber.

Direitos de uns e dos outros - WALTER CENEVIVA

FOLHA DE SP - 22/06

A individuação das tendências será o passo inicial para dar alguma ordem à paz urbana


O tema essencial do processo jurídico, nestes tumultuados dias, está nas tentativas de individuar as forças coletivas em confronto nas ruas e praças das cidades. Ainda não se chegou a uma solução definitiva. Nem mesmo na identificação segura de todos os blocos ou grupamentos de pessoas e tendências envolvidas saindo às ruas, ao lado dos muitos movidos por simples curiosidade.

O destaque do esforço criador de problemas para certames de futebol é ruidoso, nas não parece muito significativo. Os registros adversos para o Poder Legislativo mereceram maior atenção, sendo apenas um segmento das críticas endereçadas aos políticos.

O mesmo se diga daqueles que chegaram até a violência, a destruição de veículos e mesmo a agressão de supostos inimigos dos políticos ou das tendências desses, defensores da democracia ou não. Neste último caso, tem-se insinuado a desagradável hipótese de segmentos com intenção de levar à restauração dos processos ditatoriais.

A individuação das tendências será o passo inicial para dar alguma ordem à paz urbana, das férias escolares de julho e de dezembro. Um rumo, no caminho ainda sem organização definitiva, está na busca do que significarão, para o futuro político do país, quando a verdadeira face destes supostos lutadores apartidários permitir avaliar suas pretensões.

Em seguida, caberá somar esforços para bem dos fins comuns, determinando o posicionamento dos defensores da democracia.

Alguns parâmetros colhidos no direito poderão ser úteis. Um deles é essencialíssimo: nenhuma dissidência, nenhum interesse de grupo pode estimular a quebra da linha democrática.

O começo da compreensão do problema é lugar comum: "meu direito termina quando começa o direito do outro e vice-versa". Desde logo ficam excluídos os que, sob desculpa de reivindicação justa, descambam para a violência. A liberdade, sob a lei, é faculdade natural e jurídica, embora não seja caso de ver a liberdade apenas como direito. É mais que isso: é garantia, ou privilégio, assegurado a todos, mesmo sem limites definidos em lei. Sua essência está em que seja capaz de assegurar, com clareza, a liberdade de todos.

Os movimentos coletivos tendem a facilitar o abuso. Os que vão à praça pública afirmando seu direito têm de se opor a agressões e a agressores. O infrator dará causa para ser chamado a responder pela ofensa.

Cabe lembrar, ainda, o exemplo concreto das agitadas intervenções públicas em diligências policiais e, portanto, sob o manto do poder público. De um lado, os críticos da situação encontrada; do outro, as autoridades públicas, que não mostraram a antecipação prévia dos limites da contenção dos excessos que seriam de prever nem dos limites da contenção cabível. Deram a impressão de terem sido surpreendidas. Criou-se um confronto desnecessário, com a predominância aparente de interesses políticos em detrimento dos interesses gerais.

O caminho não parece vinculado a questões de direito local ou internacional. Nas maiores cidades, a gestão do transporte público e sua importância para o povo agravou a confusão. A persistência dos eventos de grandes massas não é favorável, o que acrescenta preocupações novas quando se pensa na visita do papa.

Pânico em SP - ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR

FOLHA DE SP - 22/06

Surgidos em uma butique de Londres, punks ainda vivem e vão para confronto até nas ruas do Brasil


King's Road, 430, Londres. Nesse endereço, havia uma butique. E nesse endereço nasceu o punk.

A butique se chamava Sex. Seus donos eram o dândi Malcolm McLaren e a estilista Vivienne Westwood.

A Sex, dizia McLaren, tinha como objetivo "não vender absolutamente nada". Servia como ponto de encontro de desocupados e párias em geral.

Filhinho de papai criado pela avó --senhora judia muito chique, mas impiedosamente ausente--, McLaren (1946-2010) tinha sonhos de grandeza. Fez escola de arte. Suas raízes estavam no surrealismo, nos dadaístas e, principalmente, nos situacionistas de Guy Debord (1931-1994). Via a existência humana como um grande acontecimento radical, uma sucessão de situações extremas, vida e arte indistinguíveis.

No início, eram os Ramones e os New York Dolls. Canções rápidas e cruas, antítese do rock grandioso e autoindulgente que se praticava na época. Os Ramones e os Dolls eram de Nova York, não de Londres. Numa viagem aos EUA, McLaren os viu tocar e enxergou o futuro. Só faltava formatar aquela cena, que não tinha nem nome.

De volta à capital inglesa, McLaren se sentia corroído pelo tédio. Queria passar a Sex para frente, não conseguia. Queria formar uma banda, mas não saía do lugar.

Em uma carta para uma amiga, transcrita no livro "England's Dreaming", do jornalista Jon Savage, contou: "Escrevi letras para duas canções, uma delas chamada Too Fast to Live Too Young to Die'. Imagino um cantor parecido com Hitler, aqueles gestos, aquele formato dos braços, e falando sobre a própria mãe em frases incestuosas".

Em um certo momento, McLaren foi abordado por um dos inúmeros vagabundos que passavam o dia na Sex. Era o delinquente juvenil Steve Jones, autor de pequenos e grandes furtos, muito bom na guitarra.

As memórias obsessivas de McLaren a respeito do novo rock visto em Nova York, mais a ambição de Jones por arrumar um otário que bancasse sua banda: foi essa a fagulha do punk como hoje o conhecemos.

Juntaram-se à dupla o baterista Paul Cook, melhor amigo de Jones, e, no baixo, Glen Matlock (que depois seria substituído por Sid Vicious, um analfabeto musical por quem McLaren era obcecado).

Depois de muito procurarem um vocalista, escolheram outro vadio da trupe frequentadora da Sex, o mais intratável e arrogante de todos: John Lydon, futuro Johnny Rotten.

Por mais que a iniciativa de formar o grupo tenha sido de Steve Jones, os Sex Pistols eram um experimento de McLaren. Vinham da mente de McLaren e sua sócia/parceira Westwood a atitude agressiva, o visual de roupas rasgadas e alfinetes pendurados, as camisetas com mensagens e desenhos ofensivos (inclusive suásticas, pura provocação). A polícia chegou a invadir a Sex para apreender roupas com estampas homoeróticas.

Era 1976. Os Sex Pistols --e a mística deles-- consolidavam, aos empurrões, seu lugar no "zeitgeist".

Corte rápido para São Paulo, junho de 2013.

À beira de rios fétidos, em meio à arquitetura opressiva, militantes de esquerda, playboys de sapatênis, universitários de faculdades boas e ruins, patricinhas deslumbradas, manos casca-grossa, skatistas, tiozinhos descolados, até alguns petistas vacilantes, todo mundo protesta contra não se sabe bem o quê.

E, é claro, eles também estão lá: os punks. Bandeiras anarquistas, coturnos, camisetas dos Ramones e Dead Kennedys, jaquetas do GBH. Nas franjas do tumulto, encarando a polícia, botando para quebrar.

São a ponta final de um fenômeno que começou logo depois do sucesso dos Pistols.

Na Londres da butique Sex, o punk nasceu como experimento estético. Mas, à medida que sua irradiação crescia, o movimento ganhava outros contornos.

No interior da Inglaterra, o punk foi abraçado por trabalhadores de baixa renda, brancos, revoltados contra estrangeiros que podiam tomar seus empregos. Daí foi só um passo para alguns interpretarem literalmente a simbologia original. Derraparam para o nazismo.

De modo geral, o punk transferido ao Terceiro Mundo bebeu mais nessa fonte caipira inglesa do que no experimentalismo londrino. Como regra geral, os punks do hemisfério Sul adotaram uma rigidez quase militar, distante da atitude libertária de McLaren e discípulos.

Mas todas as ramificações do punk mantêm traços comuns, como o inconformismo e a rejeição à política institucional. Há quase 40 anos, um dos pôsteres mais famosos dos Sex Pistols já previa: "Nós somos o futuro. O seu futuro."

Apagão de soluções - CELSO MING

O ESTADÃO - 22/06

A combinação de políticas econômicas experimentalistas do governo Dilma não tem respostas adequadas e firmes para a maioria dos problemas macroeconômicos do País.
O crescimento contínua sendo enfrentado com pacotes destinados predominantemente a puxar pelo consumo, como se viu há dez dias, quando o governo lançou um programa de R$ 18,7 bilhões em recursos públicos para financiamentos com juros subsidiados para a compra de móveis e aparelhos domésticos. Os investimentos seguem lentos demais. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) continua empacado e as concessões para construção e ampliação de portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, exploração de petróleo e energia elétrica, entre outras, esbarram na ineficiência do setor público até mesmo para leiloar concessões e prover licenciamento ambiental. O investimento continua em insatisfatórios 18,4% do PIB, como viu-se na última edição das Contas Nacionais.
Para contra-atacar a inflação espalhada e renitente que ultrapassa o teto da meta de 6,5% em doze meses, o governo aceitou a virada do Banco Central, que desistiu de esperar para ver e voltou a puxar os juros básicos para cima, "até o nível que vier a ser necessário". Mas se recusa a usar a arma mais poderosa e indispensável, que é a política fiscal austera e responsável.
No discurso oficial, a inflação nunca escapou do controle e se deve sempre a choques externos de oferta, nunca a problemas internos. A estratégia do governo é esperar que reflua mais ou menos espontaneamente ou que os preços sejam estancados com conversa.
No relatório sobre as Contas Externas ontem divulgado pelo Banco Central, se viu que, em cinco meses, o rombo nas Contas Correntes (comércio exterior de mercadorias e serviços mais transferências unilaterais), em doze meses, saltou de 2,4% para 3,2% do PIB. Como a ênfase continua sendo a expansão do consumo, como ficou dito, a tendência é de que as importações cresçam mais rapidamente do que as exportações. Mais ainda, a entrada de Investimentos Estrangeiros Diretos não deverá mais cobrir esse rombo, porque os capitais internacionais passarão a tomar o rumo dos Estados Unidos. A remoção do IOF de 6% na entrada de recursos externos destinados às aplicações financeiras e de 1% nas operações com derivativos cambiais não parece suficiente para reverter os fluxos.
O governo também não tem resposta firme para a crescente perda de competitividade da indústria. O programa de desonerações tributárias é caro, segmentado e gerador de distorções. Setores da indústria que não forem os de veículos e de aparelhos domésticos são, na prática, considerados de segunda classe e dificilmente integram as listas dos favorecidos. E a intenção de desvalorizar o real para baratear em dólares as exportações esbarra agora no avanço da inflação.
Também não se vê iniciativa destinada a aumentar o mercado externo para o setor produtivo nacional. O governo segue prestigiando os perfuradíssimos tratados do Mercosul e submeteu-se à retranca comercial da Argentina. Não há negociação de nenhum acordo comercial bilateral com outro bloco de países que pudessem dar alguma preferência ao produto brasileiro.
Enfim, o mix de políticas do governo Dilma não se limitou a desmontar o tripé anteriormente bem-sucedido (responsabilidade fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante). Já não consegue resolver os problemas que aí estão.
Cenário. O dinamismo do mercado de trabalho é uma das apostas do governo para aquecer a economia e um dos trunfos eleitorais para a candidatura à reeleição da presidente Dilma. A pesquisa CNI/Ibope, divulgada esta semana, mostra que mais da metade da população aprova as medidas do governo de combate ao desemprego.
*Meta estourada
O estouro do teto da meta de 6,5% em 12 meses é inevitável neste mês e no próximo. Depois disso, ainda vai-se ver o quanto da alta do dólar será repassado para a inflação. O índice de difusão (que mede quanto a inflação está espalhada), continua alto, em torno dos 62%.

Protesto e economia - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 22/06

Duas questões são inevitáveis para uma coluna de economia num momento conturbado como este de manifestações: o que há de economia na insatisfação coletiva e como os protestos afetam a economia. Primeiro, é preciso explicar o que não é: a disparada do dólar não é efeito direto da situação brasileira. Ocorre no mundo inteiro. Mas sobe mais no Brasil.
O dólar ontem caiu, depois de cinco altas, mas a valorização maior da moeda americana nos últimos dias no Brasil é efeito das incertezas sobre o país, e uma delas é o déficit externo, que chegou a 3,2% do PIB. A eclosão de manifestações é só mais uma razão para o dólar subir, mas não a mais importante. O que há é uma realocação global do capital dos investidores após o pronunciamento do Fed. O presidente do Banco Central americano, Ben Bernanke, fez um pronunciamento otimista sobre a economia americana e isso elevou a aposta no dólar. Ele subiu frente à maioria das moedas do mundo.
Banco Central brasileiro já sabia que aconteceria essa nova postura da política monetária americana. Mas não achava que a desvalorização da moeda brasileira seria tão forte e acreditava que a alta do dólar não afetaria a inflação.
Já está afetando a inflação e criando outras distorções. Empresas que se endividaram recentemente em dólar, e já tinham dívidas altas em moeda estrangeira, estão com um custo financeiro maior, como a Petrobras. Quando o dólar sobe, o custo de importar combustíveis fica mais alto. A desvalorização alimenta a elevação dos preços. E a inflação é uma das causas da insatisfação popular. O movimento é circular.
Há muito de economia no movimento que levou brasileiros às ruas, mas essa não é a única fonte de insatisfação. A inflação tirou renda das famílias, que já está muito comprometida com o pagamento das dívidas; e o país não cresce. A perspectiva é de inflação alta e juros subindo e encarecendo as dívidas. A sensação de ascensão social, que vinha encantando milhões de famílias, encontrou nessa combinação uma barreira.
O efeito das manifestações na economia é
mais lento. Se os protestos continuarem por muito tempo, há um preço econômico: empresas fecham mais cedo e produzem menos nos dias de passeata, como na quinta-feira, entregas atrasam, eventos são cancelados, investimentos começam a ir para a gaveta à espera de mais previsibilidade, capitais procuram portos mais seguros. As empresas detestam ambiente fluido. Mas qualquer um é capaz de separar o que são movimentos eventuais de protesto - mesmo que em alguns casos haja episódios violentos - e o que são países com instabilidade política e sem instituições fortes. Não é o caso do Brasil, que tem instituições democráticas sólidas, a despeito da insatisfação que se tenha com uma ou outra dessas instâncias de poder.
Em resumo: as manifestações não são culpadas pela disparada do dólar ou queda da bolsa. Há outros fatores provocando esses efeitos. Eles podem apenas ficar mais agudos. Também não se pode acusar os movimentos de provocarem danos à economia. Se eles se prolongarem por muito tempo, com o governo se mostrando incapaz de responder aos eventos, investimentos podem ser adiados. Por enquanto, o que há é apenas um acompanhamento da situação.
O problema é que os investidores brasileiros e estrangeiros querem mais austeridade fiscal. Acham que assim o país superará o início da crise de confiança que se formou levando ao viés negativo na classificação de risco. Os manifestantes têm feito reivindicações que, para serem atendidas, exigirão aumentos de gastos. O governo, ao distribuir subsídios indiscriminadamente aos setores empresariais, ficou sem margem de manobra para ampliar os investimentos públicos. 

Dilma no inferno da S&P, das pesquisas e passeatas - ROLF KUNTZ

O ESTADÃO - 22/06

O Brasil de dona Dilma vai mal quando cai o dólar, vai mal também quando sobe. É um país invejável. Em todo o mundo, oscilações das moedas principais podem causar tensão e mexer com as bolsas, mas neste país o desarranjo tem sido maior. Em tempos de valorização, o real dispara. Diante da política frouxa no mundo rico, ninguém falou tanto quanto as autoridades brasileiras em tsunami monetário e em guerra cambial. Se o sinal se inverte, como nos últimos dias, a depreciação do real também é maior, como na quinta-feira. Em nenhum outro mercado o dólar chegou a subir 2,45%. A grandeza é a marca nacional. "Temos muita bala na agulha", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, procurando tranquilizar os brasileiros enquanto crescia a turbulência nos mercados. Até o arsenal de intervenção é superior. Nas armas comuns, a conta é uma bala por agulha.

Quanto ao volume de reservas, US$ 376,11 bilhões no dia 19, o ministro Mantega tinha razão. O governo dispõe de bom volume de moeda estrangeira para combater a variação excessiva do câmbio. Mas nem sempre isso basta. Na quinta-feira, o Banco Central ofereceu cerca de US$ 3 bilhões, com escasso resultado. Numa crise prolongada, as reservas se perdem e sai vitorioso quem joga contra a moeda nacional.

É cedo para saber quando os mercados se acomodarão e onde estará o real nesse momento. De toda forma, o governo daria um passo no rumo certo se reconhecesse o mau estado da economia, a tendência de piora de vários indicadores e a vulnerabilidade do País.

O pessoal da Standard & Poor's explicou direitinho por que impôs um viés negativo à perspectiva econômica do País. Os economistas da Moody's também justificaram tecnicamente a decisão de reavaliar a economia brasileira. Não é preciso, no entanto, ter alguma formação econômica para perceber muita coisa fora dos eixos. O alerta das agências de classificação de risco e a perda de popularidade mostrada nas pesquisas sobre o governo apareceram praticamente ao mesmo tempo. Simples casualidade? É difícil e arriscado sustentar essa hipótese, especialmente quando se consideram as reivindicações apresentadas nas passeatas - muito mais amplas que a mera exigência de redução das tarifas de transporte público.

Na quinta-feira, dirigentes do PT conclamaram militantes para entrar nas passeatas com camisas vermelhas e bandeiras do partido. Tentaram e foram rechaçados. Boa parte dos envolvidos nas marchas deve ter votado, no entanto, em Lula, em Dilma e em vários de seus companheiros, incluídos alguns postes. Não está claro se perceberam, mas vários protestos - alguns dos mais notáveis - foram contra iniciativas e políticas federais dos últimos dez anos. Pessoas de espírito mais prosaico já haviam classificado como irresponsabilidade o compromisso de organizar e hospedar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. Já haviam chamado a atenção, há anos, para o atraso das obras, para o aumento dos custos e o risco de bandalheiras, quando fosse preciso compensar o tempo perdido. A organização Contas Abertas, especializada no acompanhamento das finanças públicas, atualizou com frequência os valores comprometidos e as previsões de desembolso. Quem quisesse poderia acompanhar pela internet, sem maior esforço, a formação de mais um imbróglio financeiro e econômico. Novos gastos, alguns muito pesados e de relevância mais que discutível, foram postos no alto da escala de prioridades, tornando mais bagunçada uma gestão pública já muito ruim.

A perda de tempo e boa parte do encarecimento das obras decorreram de um escandaloso desleixo do governo. Nada, ou quase nada, foi feito no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele batalhou com empenho para trazer as competições ao Brasil e foi vitorioso em 2007. A partir daí, parece haver esquecido o assunto. O trabalho duro ficou para o governo seguinte, já herdeiro de uma inflação elevada, de uma economia com baixo padrão de investimentos e de contas externas em situação de risco. Os dados básicos são claros:

1. Nos dois primeiros anos do novo governo o produto interno bruto (PIB) ficou estagnado, com expansão de 2,7%, em 2011, e 0,9%, em 2012. O quadro continua feio em 2013, mas a obrigação de gastar com a Copa e com os Jogos Olímpicos permanece em pé.

2. Enquanto isso, pioram as contas públicas, arrasadas pela gastança, pela multiplicação irresponsável de incentivos fiscais improvisados e também de transferências do Tesouro para os bancos federais. A grande preocupação do governo, nessa área, é inventar meios de continuar fingindo fidelidade à política de metas fiscais. Os truques contábeis empregados até há pouco tempo já foram escrachados.

3. A inflação tem recuado ligeiramente, mas a parcela de itens com elevação de preços ainda supera 60%. A desinflação dos alimentos terminou e os grandes fatores inflacionários, como a gastança federal, permanecem.

4. O Banco Central refez as projeções das contas externas e elevou de US$ 67 bilhões para US$ 75 bilhões o déficit em conta corrente esperado para 2013. As exportações, nesse quadro, serão 2,22% maiores que as do ano passado. As importações aumentarão 7,97% e o superávit comercial diminuirá 63,93%, de US$ 19,41 bilhões para US$ 7 bilhões.

Que fazer? Há uma pauta evidente na área dos investimentos, na tributação (até agora sujeita a remendos mal escolhidos e mal costurados), na educação (com a redefinição urgente de padrões e prioridades) e no campo da tecnologia. Na hora do aperto, no entanto, a presidente corre para ouvir seu padrinho, guru e conselheiro mor da República e da Prefeitura de São Paulo, como se ele fosse inocente da maior parte dos grandes problemas de hoje, incluído o abacaxi multibilionário dos grandes jogos.

Ação direta - PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O GLOBO - 22/06

Estou neste momento no Brasil para o nascimento do meu quarto neto, Luiz Felipe. O garotinho nasce num momento conturbado da vida nacional. Eis que por toda a parte irrompem manifestações iradas. Assisti a tudo, estarrecido, pela televisão.

Todo mundo foi pego de calça curta — políticos e autoridades, sociólogos e politólogos, economistas e jornalistas. Como disse Keynes certa vez, “o esperado nunca acontece; é o inesperado sempre”. Ninguém, que eu saiba, antecipou a escala das manifestações. Apesar da surpresa geral e unânime, não faltam explicações, análises, teorias. Aqui estou neste momento improvisando as minhas.

Na verdade, tenho apenas uma e solitária hipótese: as manifestações de rua no Brasil, a exemplo de episódios similares em outros países nos anos recentes, traduzem um colapso da confiança na democracia. O cidadão comum sente-se cada vez menos representado pelos partidos, pelos políticos e pelos governos. No Brasil, como em outros países, as manifestações não são contra determinadas correntes partidárias ou a favor de outras. Se entendi bem, o brasileiro vai à rua contra “tudo que está aí”.

A desilusão com a democracia representativa é muito disseminada – mesmo em países com larga tradição democrática e instituições supostamente sólidas e experimentadas. Quando a desilusão política se combina com dificuldades econômicas e sociais, explode a insatisfação.

Já cabe perguntar se a palavra democracia não deveria ser sempre aspeada. “Governo do povo, pelo povo e para o povo”, na célebre definição do maior presidente dos Estados Unidos, a “democracia” reduz-se cada vez mais a um conjunto de rituais vazios de conteúdo democrático.

Para que votar? — pergunta o cidadão. E com certa razão. O mercado domesticou a urna. O eleitor vota, o político se elege, mas o Poder Econômico dá as cartas antes, durante e principalmente depois das eleições.

O dinheiro sempre mandou, não há dúvida. Mas, nos tempos recentes, manda como nunca. A turma da bufunfa é a face oculta, ou nem tanto, dos poderes eleitos. Estes fazem, não raro, mera figuração. Nos bastidores, o bufunfeiro exerce sua insidiosa influência.

Uma das razões é o custo gigantesco das campanhas políticas. Sem apoio da bufunfa, nenhum partido, nenhum candidato é competitivo. Em uma palavra: a política foi colonizada pelo dinheiro. E a “democracia” se transfigurou em plutocracia.

Como espantar-se se um número cada vez maior de “eleitores” prefere a ação direta? Para citar Lincoln uma vez mais, “pode-se enganar alguns o tempo todo, todos por algum tempo, mas não se pode enganar a todos o tempo todo”.

Mudanças no mundo do trabalho - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 22/06

É importante reconhecer os benefícios que vieram com a globalização, o livre comércio e a economia de mercado


Estive esta semana em Genebra, onde levei à Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT) alguns temas que considero relevantes para o mundo do trabalho como um todo.

Representei o setor empresarial brasileiro, em especial a agropecuária, e confesso ter me sentido particularmente à vontade naquele encontro em que os aspectos humanos da economia estiveram em primeiro plano.

De forma geral, o empregador brasileiro está bastante consciente das dificuldades que o mundo atravessa. Vivemos num país que ainda precisa avançar na redução dos índices de pobreza. Só recentemente, mais de 20 milhões de brasileiros deixaram essa condição.

Manifestei em meu pronunciamento a certeza de que, quaisquer que venham a ser as mudanças na sociedade e na economia, a OIT não pode renunciar às suas responsabilidades com os que sofrem injustiças, privações e, sobretudo, com a falta de condições decentes de trabalho

Esse posicionamento não se confunde com compaixão. Demanda esforço permanente para compreender as transformações e a verdadeira natureza das crises, e para reconhecer o que está, ou não, dentro dos limites do controle de nossa vontade.

Tanto o ceticismo em relação à nossa capacidade de intervir nos processos econômicos e sociais como o excesso de voluntarismo ou a tentação das utopias nos impedem de construir os avanços que constituem o verdadeiro progresso humano.

Embora uma parte importante do mundo esteja em crise "" e padecendo do mais terrível efeito dela, que é o desemprego-- é impossível não reconhecer que ele está melhorando e se tornando mais justo.

Nos últimos 20 anos, o número de pessoas vivendo em pobreza absoluta foi reduzido à metade. No Brasil, este progresso é visível, transformando a estrutura social e a própria fisionomia das cidades e dos campos.

Neste momento, as economias emergentes e em desenvolvimento já têm uma participação maior na produção mundial do que as economias desenvolvidas.

Importante reconhecer que tudo isto é fruto, primordialmente, do crescimento econômico resultante da globalização, do livre comércio e da economia de mercado.

Esses princípios surgiram e se impuseram nas sociedades dos países ricos e foram suas melhores mercadorias de exportação. Não seria justo nem compreensível que, diante de dificuldades transitórias, estes países patrocinassem a volta aos mercados protegidos e ao Estado onipresente. Tudo o que não lhes serviu em suas marchas para o progresso.

A organização da produção econômica e o mundo do trabalho estão em processo de transformação acelerada. A produção está fragmentada em longas cadeias que cruzam regiões e fronteiras nacionais. As formas tradicionais de relação de trabalho não sobrevivem às novas realidades.

Segundo o sociólogo espanhol Manuel Castells, a produtividade e a competitividade são os processos centrais da economia moderna. A produtividade depende de um processo contínuo de inovação que, no seu curso, desloca o trabalho entre indústrias, setores e regiões. E a competitividade em níveis globais apoia-se na flexibilidade.

Tudo isso conspira contra a estabilidade do trabalho e das vidas humanas. São mudanças que, de um lado, implicam muitos custos sociais, mas de outro criam renda e riqueza, absorvendo novos trabalhadores, antes excluídos.

Neste contexto, proteger os direitos essenciais da pessoa obriga que sejamos inovadores e criativos.

Como bem registrou o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, às vezes, questões de princípio viram pretexto para a intransigência. Padrões de garantia que serviram no passado podem ser disfuncionais na atualidade.

E não podemos perder de vista que as condições sociais e culturais no mundo ainda são muito heterogêneas. Abrir-se para este reconhecimento não é sinal de fraqueza, mas de sabedoria.

Os países emergentes não podem deixar de ser otimistas em relação ao futuro e às transformações presentes. O mundo do trabalho está mudando e o grande desafio é proteger o ser humano em primeiro lugar.