quarta-feira, janeiro 11, 2012

Reposicionamento da aeronave - ROBERTO POMPEU DE TOLEDO


REVISTA VEJA

O reposicionamento da aeronave promete ser o hit deste verão. Bem, em matéria de martírio em aeroportos, como se sabe, há muito mais. Comecemos pelo começo, deixando o reposicionamento da aeronave para o fim. O começo é o desafio de chegar aos aeroportos. Nas cidades do país, com a única exceção de Porto Alegre, não há metrôs ou trens para facilitar a empreitada. A única alternativa são estradas congestionadas, e para enfrentá-las é preciso sair de casa com grande antecedência. Em matéria de congestionamento somos escolados, mas pensa o leitor que já viu tudo? Sempre haverá algum jeito de piorar.

No primeiro dia do ano, quem se dirigia ao aeroporto internacional de São Paulo, em Guarulhos, foi premiado com um bloqueio na Via Dutra provocado por dezenas de ônibus estacionados no acostamento e em uma das pistas. Muita gente largava o carro e tentava chegar a pé ao aeroporto. Alguns conseguiram, outros perderam o voo. Os ônibus ali se encontravam para servir aos fiéis que participavam da inauguração de um megatemplo evangélico. Para quem extrai algum prazer do tumulto, eis uma grande ideia: permitir a construção de um megatemplo, bem na beira da rodovia. Especialmente, como era o caso, se o templo está situado no exato ponto de junção entre a rodovia principal (a Via Dutra) e a secundária que conduz ao aeroporto. As condições são ideais para um afunilamento de níveis recorde.

O megatemplo, de iniciativa do empreendimento comercial-religioso que atende pelo nome avassalador de Igreja Mundial do Poder de Deus, tem capacidade para 150.000 pessoas. Naquele dia, compareceram 450.000, em três turnos. Como não foi previsto estacionamento suficiente para os ônibus, eles se acomodaram em plena pista. Prefeitura de Guarulhos, Polícia Rodoviária, Infraero - ninguém se deu conta de que um templo daquelas proporções, naquele lugar, poderia causar esse tipo de problema. E atenção, passageiros, que o templo veio para ficar. Vai ter mais, no futuro.

Vencida a etapa da chegada ao aeroporto, difícil mesmo sem,megatemplos no caminho, atrasos e cancelamentos de voo podem estar à espreita, nunca se sabe. Ou uma greve. Em qualquer dos casos, reinará a falta absoluta de informação. As companhias aéreas, já há algum tempo, chegaram à conclusão de que a melhor política é esconder a cara. O passageiro, no ambiente desolado de um aeroporto, é por excelência um órfão sem padrinho nem albergue que o acolha. Mas vá lá - digamos que foram vencidos todos os obstáculos, inclusive a angustiosa fila do check-in, e enfim se chegou ao portão de embarque. É aqui que fará sua entrada o "reposicionamento da aeronave".

Ele está um pouco por toda parte, mas se manifesta de forma mais aguda no Aeroporto de Congonhas. Está escrito no papelucho que o embarque será a tal hora, no portão tal. O trouxa do passageiro acredita e, depois de vencer infindos corredores e aglomerações, chega ao portão indicado. Confere na telinha: sim, este é seu voo, este o destino, esta a hora do embarque. Está tudo certo. Hora de relaxar. Abrir o jornal, acionar o laptop. Relaxar? Você acreditou? A alturas tantas, ao lançar um olhar distraído para o portão, percebe, com ligeiro alarme, que seu voo sumiu da telinha. Aí vem o aviso, pelo alto-falante: "Devido ao reposicionamento da aeronave, o embarque do voo tal, com destino tal, se dará pelo portão ... "um outro, diferente do originalmente programado e, quando as invisíveis potestades dos aeroportos capricham, no extremo oposto do setor de embarque. Dobra-se o jornal, guarda-se o laptop e sai-se pelos corredores afora, olho nas indicações, respiração em suspenso. O passageiro já não é apenas um órfão. É um órfão largado ao mar, condenado a equilibrar-se numa jangada para chegar à praia.

Pode ocorrer pior. São muitos os avisos pelo alto-falante, nem todos perfeitamente audíveis. Acresce que o passageiro está relaxado, certo de que a parada foi ganha. Nem se preocupa em consultar a telinha. De repente, olha para os lados e percebe que o ambiente se esvaziou. Onde foi parar o pessoal de meu voo? Sai pelos corredores - não, não há mais ninguém para prestar informação. Segue a esmo, e pode ser que encontre por acaso o novo portão de embarque, pode ser que encontre no meio do caminho alguém que escutou o aviso, pode ser que numa tela encontre a orientação de que necessita, mas pode ser que não. Este não é mais apenas o órfão lançado ao mar. A jangada naufragou, e são escassas as possibilidades de chegar à praia. Perdeu, no jogo (que para alguém deve ser divertido,

Onde comprar estantes de livros? - CLÁUDIO DE MOURA CASTRO


REVISTA VEJA


Em 1970, voltando do meu doutoramento, comecei a montar casa no Rio de Janeiro. Logo notei que as lojas não ofereciam estantes de livros. Havia estames de tudo, menos de livros. Diante do orçamento apertado, descobri uma solução. Por serem feitas em série, escadas de subir em postes de luz são muito baratas. Com elas e mais tábuas - para colocar os livros - resolvi o problema. Quando fui morar em Brasília, em 1980, foi a mesma coisa, pois nas lojas só havia estantes profundas, para jarras ou processos administrativos. Para livros, nem pensar. Comprei sólidas tábuas de mogno e fiz minha linda estante. Recentemente, com mudanças de escritório, precisei novamente de estantes. Debalde, peregrinei por Tok & Stok, Ema, Walmart e Leroy Merlin. Eram as mesmas de antes, para bibelôs e jarros. Para livros, ou são horrendas e mal-acabadas (para bibliotecas públicas e feitas de chapa de metal) ou são os precários trilhos verticais, com mãos francesas de encaixe duvidoso. Acabei comprando gôndolas de quitanda, no mesmo gênero, mas um pouquinho mais robustas. Por desfastio, busquei também no site do Magazine Luiza, encontrando centenas de estantes mas nem uma só para livros (a maioria era para TV).

Como os donos dessas empresas não são tontos, é inevitável concluir que, se não oferecem boas estantes, é porque não há compradores. Ou seja, o brasileiro frequentador dessas lojas não possui o volume de livros que provocaria a demanda por elas. Os poucos que precisam de estantes mais avantajadas se entendem com seu marceneiro e pagam as comas, também mais avantajadas. Triste constatação, pois não? E como será no mundo mais rico? Apenas para ter gosto. Digitando a palavra bookcase, aparecem 725 itens. Há um número para cada cor, aparecendo também acessórios e modelos menos apropriados para livros. Por seguro, digamos que•existem mais de 300 modelos de estantes para livros. A comparação é escandalosa.
Falando de estantes de livros, em uma área rural da Islândia, uma casa de camponeses modestíssimos foi transformada em um museu sobre os hábitos e os estilos de vida locais. Mostra a casa como estaria por volta de 1920, austera e espartana, como tudo no país. Chamou atenção a biblioteca do dono. A estante, mais alta do que eu e com um bom metro e meio de largura, estava repleta de livros, com o desgaste que corresponde ao uso frequente. Quem já viu estante de livros nas aristocráticas fazendas brasileiras? Na realidade, os islandeses estão entre os leitores mais furiosos, comprando oito livros por pessoa/ano e os domicílios abrigando uma média de 338 livros. Na Austrália e na Nova Zelândia, acima da metade dos lares tem mais de 100 livros.
Como serão os hábitos de leitura dos brasileiros? Os resultados não são nada lisonjeiros. A média brasileira é de 1,8 livro lido por habitante/ ano. Isso se compara com 2,4 para nossos vizinhos colombianos, cinco para os americanos e sete para os franceses.
Diriam os cínicos, e daí? Um passatempo como outro qualquer. Infelizmente, não é assim. Uma pesquisa em 27 países mostrou que a biblioteca familiar se correlaciona mais com bons resultados na educação do que a própria escolaridade dos pais.
Uma biblioteca de 500 livros se associa a acréscimos de escolaridade que vão de três a sete anos. Segundo os autores, "uma casa onde os livros são valorizados fornece às crianças ferramentas que são diretamente úteis no aprendizado escolar...". E tem mais, leitores mais assíduos visitam mais museus, fotografam mais e, surpresa, praticam mais esportes.
A revista The Economist inventou uma brincadeira que era avaliar o realismo das taxas de câmbio pela diferença de preço dos hambúrgueres no McDonald"s, já que em todos os países ele é o mesmo sanduíche detestável. Surpresa! O "índice do hamburguer" revelou-se uma medida respeitável e tem vida longa. Quem sabe, além do Pisa, não poderíamos passar a medir educação e hábitos de leitura por uma simples pesquisa nos sites das lojas
de móveis? Bastam alguns minutos. Isso é fácil, difícil será mudar essa triste situação.

Abaixo a fumaça - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 11/01/12


A 6ª Turma do TRT do Rio condenou a Souza Cruz a indenizar um ex-funcionário em R$ 2 milhões. Por dez anos, o homem trabalhou como provador. Diz que fumava uns 200 cigarros por dia, quatro vezes por semana.
O juiz convocado Leonardo Dias Borges, relator do acórdão, considerou que o ex-funcionário adoeceu por causa do trabalho.

Acervo de Apolônio
A família de Apolônio de Carvalho (1912-2005) acertou a doação do acervo do líder comunista ao Arquivo Nacional, a exemplo do que já fez a de Luís Carlos Prestes (1898-1990).
A entrega será em fevereiro, quando Apolônio faria 100 anos, pelas mãos de sua viúva, Renée, e de seus filhos, René e Raul.

Segue...
Outra novidade será o lançamento de um livro com depoimentos de Renée, a jovem francesa com quem se casou na França durante a resistência à ocupação nazista, depois de integrar as Brigadas Internacionais na Guerra Civil Espanhola.

Sagrado e profano
Dom Orani Tempesta vai orar, domingo agora, na... feijoada do Cacique de Ramos. Dará uma benção pelos 51 anos do bloco.
O arcebispo do Rio também foi convidado para comandar a lavagem da Sapucaí, dia 12 de fevereiro, na cerimônia afro de reinauguração. A Rádio Corredor da Missa diz que deve topar.

Parece bizarro. E é
O Crystal Hair, salão de vips, na Barra, no Rio, está aplicando caviar para hidratar os cabelos das madames. Custa R$ 500.

Números enganam
A Zahar venceu a concorrida disputa pelo livro “How not to be wrong”, de Jordan Ellenberg, professor de matemática da Universidade de Wisconsin (EUA).
O livro pretende desmistificar a matemática e a estatística para o público leigo.

Favela tour
Sexta, 30 alunos do MBA da Harvard Business School vão visitar as favelas da Babilônia e do Chapéu Mangueira, no Rio. No grupo, há americano, libanês, francês, suíço, vietnamita etc.
Segunda, o presidente da Câmara dos EUA, John Boehner, foi ao Vidigal. Com as UPPs, virou moda levar gringo às favelas.

Pinto no lixo...
Nos anos 1980, o então governador Brizola levava celebridades, como o chanceler alemão Willy Brandt, ao Cantagalo.
Depois, houve visitas esporádicas de gente como o Papa João Paulo II, ao Vidigal, e Bill Clinton, à Mangueira.

Tim, a turnê
A produção do musical “Tim Maia, vale tudo”, sucesso no Rio, planeja levá-lo a cinco capitais.
Mas, em 2011, só captou pela Lei Rouanet R$ 600 mil de R$ 1,7 milhão necessários. O Ministério da Cultura estendeu o prazo de captação até o fim deste ano.

As colunas de Paes
Dilma, alérgica a certas ditaduras, não permitiu a inclusão do Brasil no roteiro de visitas de Ahmadinejad à América Latina.
Mesmo assim, o iraniano mandou um presente ao Brasil. Mais precisamente ao Rio.

Segue...
Trata-se de uma reprodução das famosas colunas de Persépolis, a antiga capital do Império Persa, palco de grandes momentos da história universal.
Paes vai pôr a reprodução numa pracinha que fica perto da Quinta da Boa Vista.

Retratos da vida
A 8ª Câmara Cível do Rio condenou a Casa de Saúde Saint Roman, em Santa Teresa, a indenizar um paciente em R$ 50 mil.
A vítima estava internada na clínica psiquiátrica quando teria sofrido abuso sexual de um funcionário. Sem provas, o suspeito foi absolvido criminalmente.

Canteiro de obras
O licenciamento de novas construções na cidade do Rio alcançou em 2011 a marca de 5,3 milhões de metros quadrados, recorde desde 1980.
Em 2010, haviam sido 4,9 milhões de metros quadrados.

Acabou em samba
Carlos Lupi, o ex-ministro que disse amar Dilma, é, até agora, o político mais “homenageado” nos sambas de bloco do Rio. Depois do Lima é Tio Meu, agora é o Clube do Samba, do saudoso João Nogueira (1941-2000).
Trecho da letra de “Dilma, eu te amo”: “Dilma, eu te amo/Ai, se eu te pego(...)/Não vou largar meu conforto/Clube do Samba, eu daqui só saio morto.”

MARINA ELALI, a cantora que atuará na minissérie “Brado retumbante”, com estreia marcada para dia 17, na TV Globo, posa na (bela) pele da personagem Fátima, intérprete de um chefe de Estado. A bela vai enfeitiçar o presidente Paulo Ventura (Domingos Montagner)

ANDERSON SILVA, nosso campeão mundial de peso médio do UFC, estará assim na revista “Quem” que chega hoje às bancas. Na entrevista, o fortão conta que prefere não fazer sexo no período de concentração para as lutas, e que todos os seus irmãos são policiais

PONTO FINAL
Quem desfalca a coluna a partir de hoje é Elisiário Souza Lima. O nosso Souza ajudou muito a turma da coluna na pesquisa de texto e, principal-ente, na seleção de fotos dos “clones” ou “gêmeos separados ao nascer”. Que o amigo seja muito feliz em seus novos desafios. Souza é o da esquerda... e também o da direita.

Última centelha - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 11/01/12
Houve quem achasse precipitada a ação da polícia e do governo de São Paulo ao invadir e desbaratar, mesmo temporariamente, a cracolândia. E imprudente, ao espalhar os usuários de crack por áreas da cidade até então a salvo do convívio com aquelas pessoas. Argumentam também que as ações de segurança e saúde pública devem ser feitas em conjunto e não adianta desgraçar ainda mais a vida dos infelizes sem uma alternativa de tratamento.

Todos os argumentos são válidos, inclusive este, mas há fatores a considerar. Enquanto ilhados naquela região de São Paulo, os usuários sentiam-se seguros dentro da sua miséria. Suas únicas relações eram entre si e com quem comerciavam para conseguir dinheiro ou droga. Era uma cadeia produtiva fechada, que poderia durar pelo resto da (curta) vida de cada um, e não os induzia a considerar a hipótese de lutar pela recuperação.

Ou a sequer considerar seu dia-a-dia na cracolândia, composto de síndrome de abstinência, mendicância, extorsão, indescritível imundície, animais peçonhentos, feridas expostas, assalto sexual permanente, estupro, gravidez, aborto, fome, doença e dor -tudo isso compensado pelos breves momentos de alívio produzidos pela droga. Não existe prazer na cracolândia, só alívio.

Uma ação como a da semana passada, cortando o elo entre o usuário e seus iguais, ou entre o usuário e o traficante, tende a ser algo desesperador para o dependente. Como ele não consegue passar muito tempo sem o produto, a quebra na cadeia, se repetida, pode levá-lo, num extremo, a tornar-se violento e ameaçador -e, em outro, a procurar ajuda, quem sabe internação e tratamento.

Expulsos de seu habitat, ainda que por algumas horas, esses dependentes têm uma chance de exercer a última centelha de razão que lhes resta.

Vá ao parque Dom Pedro! - RAUL JUSTE LORES

FOLHA DE SP - 11/01/12

SÃO PAULO - Gosta de almoçar no Mercado Municipal? Já levou os filhos para brincar na Fundação Catavento, no antigo Palácio das Indústrias? Faz compras na 25 de Março?

Centenas de milhares de pessoas circulam nessa região. Nas redondezas, ainda ficam o Brás (e a feirinha da madrugada) e vários terminais de ônibus.

O poder público despejou milhões de reais nas últimas décadas para revitalizar o entorno do parque Dom Pedro. Transformação do Palácio das Indústrias em prefeitura (Erundina), depois em Fundação Catavento (Serra); reforma do Mercado Municipal (Marta); implosão do São Vito (Kassab); e transformação da antiga Casa das Retortas em Museu da História de São Paulo (Serra-Alckmin).

Tente ir a pé da estação de ônibus ao Mercado ou ao Catavento. Todos estão de costas uns para os outros. Isolados. Separados por seis viadutos. Terminais de ônibus e estação final do Expresso Tiradentes, o fura-fila (Maluf-Pitta), não são interligados -e pobres dos passageiros que precisem fazer alguma baldeação.

O que sobrou do parque Dom Pedro é um campinho de futebol em ruínas. Grades para todos os lados. A única passagem para pedestres é chamada de "faixa de Gaza".

O cliente dessas obras, o poder público, permitiu que assim fosse. A construção de espaço público convidativo é a última das prioridades.

Existe um projeto belíssimo para a área, feito por um grande time de arquitetos e urbanistas (Regina Meyer, Marta Grostein, escritório Una, entre outros), que junta metrô, ônibus e fura-fila em um único terminal; que ressuscita parte do rio Tamanduateí em um lago; que ergue um Sesc e um Senac sobre os escombros do São Vito; e abre espaço para a construção de edifícios residenciais, que deixariam a área menos lúgubre à noite e aos finais de semana.

Muito melhor que a encalhada Nova Luz. Mas dá para imaginar algum dos pré-candidatos a prefeito conseguindo tirá-lo do papel?

Um Congresso sem democracia - ANDRÉ LEANDRO BARBI DE SOUZA


ZERO HORA - 11/01/12

O exame das leis federais, em 2011, demonstra a falta de um critério geral para a tramitação das matérias legislativas. Com exceção das leis que tratam de orçamento, que derivam de medidas provisórias e de algumas casuisticamente editadas, as leis federais promulgadas no ano passado tiveram um tempo médio de tramitação de três anos legislativos.
A demora da tramitação de proposições no Congresso Nacional não só revela a incompetência na gestão processual legislativa como contraria diretamente o interesse da sociedade. É inadmissível que um projeto de lei, proposto pelo TST, em 28 de novembro de 2008, com o objetivo de criar cargos de juiz do trabalho e varas do trabalho, no TRT da 7ª Região, converta-se em lei somente no dia 27 de maio de 2011 (Lei 12.411). Qual seria tecnicamente a justificativa para tal demora? Nenhuma! Ou o parlamento federal erra porque os regimentos internos de suas casas legislativas estão defasados, ou os deputados e Senadores não dão atenção às matérias em tramitação. De uma ou de outra forma, o erro demonstra o descomprometimento do Congresso com a democracia brasileira.
Mesmo as leis de pequeníssima repercussão apresentaram injustificável demora quanto ao seu ciclo elaborativo. A Lei 12.499, que declara o ator Paulo Autran patrono do teatro brasileiro, demorou quatro anos para ser promulgada. A Lei 12.502, que inscreve o nome do Barão do Rio Branco no Livro de Heróis da Pátria, demorou nove anos para ser promulgada... E, em 2011, com esse estilo, mais 50 leis. A dedução lógica, aqui observável, passa por um duo de afirmações cuja conclusão, em qualquer delas, desqualifica o trabalho do Congresso Nacional: ou as matérias legislativas propostas pelos parlamentares não foram importantes, ou os congressistas não deram importância às proposições em tramitação.
A questão é saber a quem interessa a falta de qualidade legislativa. Seria aos congressistas mal-intencionados, que se aproveitam da incompetência legislativa para agregar ganhos obscuros? Seria ao governo federal, que historicamente, pela fragilidade da organização institucional legislativa, interfere no tempo de tramitação das matérias, muitas vezes anulando a autonomia do parlamento? Seria aos "lobistas", que se aproveitam da inconsistência dos regimentos ou para inserir conteúdos normativos de interesses "devidamente" protegidos ou para evitar a votação de matérias que contrariem esses mesmos interesses? Seria dos partidos, que pela fragilidade do sistema de deliberação parlamentar, tendo em conta a construção das maiorias, instalam-se em cargos e em ministérios? Se não se sabe ao certo quem ganha, sabe-se, com certeza, quem não ganha com o atual cenário legislativo federal: a democracia brasileira.

Dias de superfície - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 11/01/12
Quando era adolescente, passava as férias de verão em Torres ou, na melhor das hipóteses, em alguma praia de Santa Catarina. Até que soube de uma amiga que viajaria para Morro de São Paulo, uma ilha no litoral da Bahia. Nunca tinha escutado falar do lugar.

Segundo ela, era um reduto de hippies, com difícil acesso, sem pavimentação, sem carros e sem luz elétrica. A energia vinha de um gerador a diesel que funcionava até as 22h (a luz elétrica chegou em 1986, e o telefone em 1988). Eu ouvia sobre esse paraíso pitoresco comovida com o desprendimento da minha amiga, mas, por dentro, pensava: nem morta.

Pois passei esse fim de ano adivinhe onde? Pois é. Já estendi minha canga em praias as mais diversas, mas poucas me impressionaram tanto como as de Morro de São Paulo. O mar verde esmeralda, a vegetação nativa, as fazendas onde se plantavam cocos, piaçava e dendê, a fortaleza e o farol que protegeram a ilha contra invasões no século 17, segue tudo lá, porém agora com luz elétrica e infraestrutura.

Carro ainda não entra, e não faz a menor falta. O sistema de transporte interno (dois ou três jipes inveterados, charretes e os próprios pés) dá conta do recado.

São cinco as praias principais, batizadas sem nenhum arroubo de criatividade: chamam-se Primeira Praia, Segunda Praia, Terceira Praia e Quarta Praia. A quinta escapou da simplificação e chama-se Praia do Encanto, um fim de mundo lindo e ermo, que faz você se perguntar: será que morri e fui pro céu? Nenhuma alma à vista. Ideal para quem está sendo procurado pela polícia.

Quem gosta de agito, luaus, balada, deve se hospedar na Primeira ou na Segunda. Os indecisos, na Terceira. Os que querem descanso de fato, com silêncio, tranquilidade, visual imaculado e apenas um ou dois botequinhos com mesas na areia vendendo lagosta como se fosse siri, vão para a Quarta, a eleita desta colunista.

Mas o que mais me chamou atenção nesse oásis foram as marés. Em Morro, nessa época do ano, o movimento das marés se dá com uma rapidez mágica – ou eu andei tomando muita caipirinha.

Por exemplo: você senta dentro do mar com água pela cintura, curtindo os peixes coloridos que praticamente vêm comer na sua mão, e em poucos minutos está sentada na areia úmida feito uma criança, só falta o balde e a pazinha para começar a construir seu castelo. O mar se recolhe como se pressagiasse a chegada de um tsunami.

Lembrei de uma outra amiga que reclamava de pessoas que não tinham proa oceânica e viviam com água pela canela – uma metáfora poética para identificar aqueles que nasceram para a superfície, e não para mergulhar nas profundezas. Morro de São Paulo a desapontaria.

É preciso andar muitos metros mar adentro para encontrar algum tipo de profundeza. As piscinas naturais da Quarta Praia são rasas, e no raso ficam também nossos problemas. Um lugar onde não se corre o risco de pensar demais, de ir fundo em coisa alguma. Paz e amor, bebê. A herança dos hippies a maré nunca levou.

Um início de ano desafiador - CRISTIANO ROMERO

VALOR ECONÔMICO - 11/01/12

O primeiro trimestre de 2012 começa particularmente desafiador para o governo Dilma Rousseff. Três fatos espinhosos concorrem na área econômica para um início de ano tenso em Brasília.

São eles: já nos próximos dias, o Banco Central (BC) pode confirmar sinalização, feita no fim de 2011, de que o ciclo de corte da taxa básica de juros (Selic) terminará mais cedo do que se esperava; a equipe econômica prepara contingenciamento de despesas orçamentárias que deve ficar entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões; o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelará à nação que, no ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) pode ter crescido abaixo de 3%, o pior resultado em oito anos (excetuando-se, da comparação, a queda de 0,33% de 2009, ano da crise mundial).

2012 começa a ser delineado na próxima semana, quando ocorrerá a primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do ano. Se nada for dito até lá, o Comitê deve promover mais um corte, o quarto consecutivo, de 50 pontos-base (0,5 ponto percentual) na taxa de juros, reduzindo-a de 11% para 10,5% ao ano.

Ao divulgar o último relatório trimestral de inflação (RI), em dezembro, o BC deu sinais, entretanto, de que interromperá o ciclo de alívio monetário antes do que esperavam governo e mercado. Desde o último trimestre, a expectativa era a de que o Copom reduziria a taxa Selic para 9,5% ou 9% ao ano até meados de 2012. Agora, o orçamento total do corte de juros iniciado em agosto pode ficar em 250 ou 275 pontos-base (visão mais otimista), o que levaria a Selic para 10% ou, no máximo, 9,75% ao ano.

É possível que, já no comunicado do encontro da próxima semana ou na ata a ser divulgada no dia 26, o Comitê dê novas indicações sobre a diminuição do ritmo de queda dos juros. Está claro que o Banco Central tentou, com o RI, corrigir um certo exagero do mercado na chamada "precificação" da queda da Selic. Surpresos, alguns operadores consideraram a nova sinalização um verdadeiro cavalo de pau, o que é um exagero.

O Copom pode começar a colocar em prática a nova estratégia na reunião do dia 7 de março. Não será uma semana fácil. Dias antes, no fim de fevereiro, o governo deve anunciar um megacorte no Orçamento Geral da União de 2012, superior ao do ano passado, que foi de R$ 50,6 bilhões.

Contenção de gastos públicos sempre provoca desgaste político. Funcionários públicos ficam sem reajuste salarial, obras públicas deixam de ser feitas e programas governamentais não saem do papel. Em 2012, há um agravante. Como alertou o colunista Ribamar Oliveira, do Valor, despesas subestimadas no Orçamento aprovado pelo Congresso e arrecadação de tributos federais em processo de desaceleração desde o último trimestre devem obrigar o governo a promover um corte maior nos gastos.

O objetivo é permitir que o setor público cumpra, a exemplo de 2011, a meta cheia de superávit primário (algo como 3% ou 3,1% do PIB, excluído dessa conta o pagamento de juros da dívida). O esforço fiscal tem dois propósitos: ajudar a controlar a demanda agregada da economia e, desta forma, a evolução da inflação; e reduzir a dívida pública como proporção do PIB.

Em agosto, quando aumentou a meta de superávit primário em R$ 10 bilhões, e o BC iniciou o processo de queda dos juros, o governo deixou claro que estava mudando o mix de política econômica - a ênfase pró-crescimento viria agora da taxa de juros e não mais dos gastos públicos, como ocorreu em 2009/2010.

O BC, de fato, conta com o cumprimento da meta cheia de superávit. Como deixou claro no RI de dezembro, considera que um ajuste baseado em corte de despesas governamentais é mais eficaz para o controle da inflação do que um promovido por meio de aumento de receitas. Um experiente economista ouvido por esta coluna calcula que, se a meta de superávit caísse para 2,5% do PIB, por exemplo, o Copom teria que, em vez de reduzir, elevar os juros (para 12,5% ao ano até o fim de 2012), o que seria um retrocesso.

O problema é que, ao promover novo corte de despesas, o Palácio do Planalto espera que o BC siga com a política de redução dos juros, o que pode não ocorrer mais, pelo menos não na extensão esperada pelo governo. No calendário político, o risco é justamente o BC se tornar mais conservador na política monetária no momento em que o governo anunciar o contingenciamento de despesas.

Para completar um ambiente que já poderá estar exacerbado, em 6 março, um dia antes da segunda reunião do Copom em 2012, o IBGE divulgará o resultado das contas nacionais. Os mais realistas dentro do governo esperam um resultado magro do PIB em 2011 - crescimento de 3% ou menos. Evidentemente, haverá exploração política por parte da oposição e desassossego nas hostes do PT, o partido da presidente, em pleno ano eleitoral.

A dúvida é saber como a presidente Dilma enfrentará esse quadro. Pelo que demonstrou até agora e do alto de níveis recordes de popularidade - nem o presidente Lula foi tão popular no início de seus dois mandatos -, há uma chance razoável de ela manter o rumo definido. O mercado desconfia do compromisso com a meta cheia de superávit, mas é bom lembrar que fez isso também no ano que passou e errou.

O Banco Central, por seu turno, dá sinais de que vai priorizar o combate à carestia daqui em diante, depois de dois anos de inflação alta, bem acima da meta de 4,5% - 5,9% em 2010 e 6,5% em 2011. Um dos indícios disso é que voltou a privilegiar seus modelos econométricos tradicionais, dando mais transparência à sua ação. Justamente por causa dessa postura mais cautelosa do BC, não vai demorar muito para pipocar, dentro e fora do governo, uma forte pressão sobre o presidente da instituição, Alexandre Tombini.

Graças às incertezas da economia mundial, o cenário, evidentemente, pode se alterar nas próximas semanas e meses. O BC trabalha com um ambiente em que a situação econômica da Europa é ruim, mas não piora em demasia, ou seja, não se espera a quebra de bancos ou o calote de governos. Se ocorrer um evento, tudo muda e, aí, a depender do impacto sobre o Brasil, abre-se um novo espaço para redução dos juros. Este não é, contudo, o cenário central neste momento.

JAPA GOSTOSA


Contas & política - DENISE ROTHENBURG



Correio Braziliense - 11/01/12



Dilma vai dedicar 2012 a quitar as dívidas de 2011, os famosos restos a pagar, R$ 57 bilhões. Para os parlamentares, o recado está dado: as emendas individuais deste ano ficam para a gaveta. Com sorte, saem em 2013


Todos os anos o governo começa anunciando cortes no Orçamento Geral da União. Principalmente, quando as projeções do Banco Central apontam o rigor fiscal como um eficaz instrumento do controle inflacionário. E, como o presidente do BC, Alexandre Tombini, é sempre elogiado no Palácio do Planalto pelos acertos — coisa rara vindo da presidente Dilma Rousseff — os cortes virão com força. O governo espera apenas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, voltar das férias para anunciá-los. A poda promete ser maior do que a de 2011. A previsão, conforme noticiou o Correio, é de cortar R$ 60 bilhões. O efeito, entretanto, se a história se repetir, será mais psicológico do que qualquer outra coisa.

No ano passado, o governo começou cortando R$ 50 bilhões. Ao poucos, Dilma foi abrindo as comportas, uma liberação aqui, uma verba emergencial acolá. No fim de 2011, feitas as contas, a economia foi de menos da metade: R$ 21 bilhões. Por isso, é bem provável, na avaliação de políticos, que o remédio dos cortes não tenha tanto efeito. Até as obras de arte do Congresso e do Planalto já sabem que cortes anunciados no início do ano não são cumpridos à risca. Portanto, enquanto o que os economistas chamam de "mercado" trabalha com um corte de R$ 60 bilhões no Orçamento de 2012, a turma da política calcula no máximo R$ 30 bilhões.

O problema dos partidos aliados ao governo é onde cortar. E é aí que começa o estresse da classe política. Só as emendas de bancada ao Orçamento deste ano dão conta desse recado e ainda sobra um "troco". As bancadas estaduais propuseram emendas no valor de R$ 39,1 bilhões. Na avaliação dos políticos, é aí que a tesoura vai pegar. No caso das emendas individuais, algo em torno de R$ 8 bilhões, dos quais menos de R$ 4 bilhões saem do papel, até porque os restos a pagar de anos anteriores terminam ganhando um ar de prioridade sobre o Orçamento anual, especialmente em ano de eleições, quando os prazos para liberação e assinatura de novos convênios são menores.

Por falar em restos a pagar...
A tomar pelo total de restos a pagar de 2011 que ficaram para quitação este ano, o governo não terá muita margem de manobra para cumprir o Orçamento de 2012 ou apresentar novos investimentos. São R$ 57,3 bilhões. Nesse bolo, tem um pouco de tudo. Obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), estradas e, dada a correria dos deputados e senadores ao gabinete da ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, nos últimos dias do ano, estão aí as autorizações de gastos processadas naquele período. É nesses restos a pagar que o Poder Executivo vai concentrar o atendimento aos deputados e senadores este ano.

O corre-corre do fim do ano tem sido um dos fatores para que o governo chegue a dezembro sem cumprir o corte anunciado. E assim o ciclo se repete. Você, leitor (a), pode apostar que, no fim deste ano, os parlamentares voltarão em peso ao gabinete de Ideli em busca de um 2012 que só sairá em 2013 e assim sucessivamente. Infelizmente, ainda não foi em seu primeiro ano de governo que a gestora Dilma Rousseff conseguiu colocar um basta no orçamento paralelo, que faz com que o país passe o ano pagando as dívidas do ano anterior.

Por falar em gestão...
Fernando Haddad gostaria mesmo de sair do Ministério da Educação dia 16 deste mês e se dedicar à pré-campanha paulistana. Mas Dilma ficou até o último dia como ministra da Casa Civil e isso foi bom para a sua candidatura. O que funcionou para ela, avaliam seus principais interlocutores dentro do PT, pode funcionar para Haddad. Vem aí o Piso Nacional do Magistério, notícia boa para Fernando surfar. Melhor do que ter que ficar em São Paulo sendo procurado pelos jornais locais para falar sobre o crack no centro da cidade, as chuvas que costumam alagar tudo e ainda ter que criticar o neoaliado Gilberto Kassab.

Por isso, ao mesmo tempo em que trabalha um programa de governo nas horas de folga, Haddad continuará desfilando com status de ministro. E, para completar, ainda dá mais um tempinho para Dilma vislumbrar melhor como fica o outro Fernando, o Bezerra Coelho, da Integração Nacional. Depois do primeiro Fernando, o Pimentel, ter passado por uma tempestade, ela considera que Bezerra também tem tudo para passar. Ocorre que não se sabe o que vem pela frente. Por isso, a ordem no governo é aguardar. Talvez a reforma só saia lá pelo carnaval... A Esplanada em janeiro, ao que tudo indica, continuará no lema "a cada dia, a sua aflição".

Zumbi - SONIA RACY

O ESTADÃO - 11/01/12


Alckmin pediu à Secretaria de Justiça urgência no processo de reconhecimento de comunidades quilombolas do Estado. Com isso, as famílias comprovadamente descendentes de quilombos entram em programas sociais específicos.

A ordem do governador será repassada ao Instituto de Terras em reunião nos próximos dias.

Zumbi 2
Em 2005, no primeiro mandato, Alckmin liberou verba para o reconhecimento de dez dessas comunidades. Sete anos depois, apenas metade delas passou por estudos e foi reconhecida, segundo dados apresentados pela deputada Leci Brandão.

O documento diz ainda haver cerca de 40 comunidades, somando 5 mil famílias, na fila do reconhecimento.

Zumbi 3
Na me sma reunião, o governador prometeu campanha para dar mais publicidade à lei que criminaliza o racismo.

Ignorância
Na festa da Fifa, anteontem, Daniel Alves se esquivou de falar sobre as manifestações de racismo no jogo de domingo.

Sempre que o lateral do Barcelona pegava na bola,torcedores do Espanyol imitavam macacos: “Não quero comentar para não dar razão a quem faz isso”.

100% Jardim Irene
Cafu na organização da Copa do Mundo de 2014? Quem levanta a lebre é Umberto Gandini, diretor de futebol do Milan,que afirma ter recebido informação da Fifa.

Procurado, o jogador não retornou as ligações da coluna.

Dindim
Contas fechadas: em 2011, o total de ICMS repassado às prefeituras do Estado de São Paulo foi de R$ 20,1bilhões –R$1,9 bilhão a mais do que em 2010.

Monograma
A Louis Vuitton do Cidade Jardim abrirá em agosto. Prevista para ser a maior da América Latina,terá até roupas masculinas – inéditas em lojas brasileiras.

Cinderela
O filme sobre Margaret Thatcher, A Dama de Ferro, teve Salvatore Ferragamo na produção de acessórios.

Sapatos e bolsas usados por Meryl Streep no longa fizeram tanto sucesso que a marca pretende comercializá-los em suas lojas.

Pinga ni mim
A Presidência lançou edital de contratação de empresa para impermeabilizar as coberturas dos Anexos do Palácio do Planalto. Com a missão de Sanar as insistentes infiltrações e goteiras. A vencedora deverá trocar também calhas e telhas.

A justificativa presente no edital parece contundente: “As intervenções pontuais adotadas nos últimos anos não têm se mostrado eficazes, devido ao estado de comprometimento encontrado nas coberturas”.

Visão de negócio
Marcos Caramuru de Paiva, excônsul do País em Xangai, abriu empresa para fomentar investimentos e comércio entre Brasil e Ásia - – em especial, a China.

Chama-se Kemu. Ou, em mandarim, “poder ver”.

Rivalidade
Nove argentinos estão na lista das 50 transferências mais caras do futebol mundial.

Brasileiros? São oito. Em volume de euros, os hermanos também estão na frente: € 352 milhões contra € 314,3 milhões.

Na frente
O longa-metragem 2 Coelhos, com Alessandra Negrini e Caco Ciocler, estreia dia 20 em circuito nacional.

Jorge Aragão faz show, dia 10. No Credicard Hall.

É dia 25, no aniversário da cidade, o World Bike Tour São Paulo, passeio ciclístico que começa na Ponte Estaia da e termina na USP.

Estreia, no Espaço Parlapatões, a peça A Ilusão Cômica, clássico do francês Pierre Corneille. Amanhã.

Também amanhã começa a mostra O Retorno da Coleção Tamagni. No MAM-SP.

Correção: o desfile de maquiagens de O Boticário será privilégio só da SP Fashion Week. E não do Fashion Rio.

Interinos: Daniel Japiassu, Débora Bergamasco, Marilia Neustein e Paula Bonelli.

O resgate das escovas milenares - ANTONIO PRATA


FOLHA DE SP - 11/01/12

Como missão, o ditador Kim Jong-un poderia declarar que suas escovas de dentes são objetos sagrados


"Uma escova de dentes pode levar até mil anos para se decompor", disse o narrador do documentário, e eu senti um aperto no coração. Não por conta do dano ecológico causado pela luta contra o tártaro e a placa bacteriana, mas pela imagem criada em minha cabeça: todas as escovas que já usei, fiéis companheiras por dois ou três meses, abandonadas em distantes aterros sanitários, junto a tomates podres, calotas rachadas e carcaças de geladeira; as cerdas espanadas balançando ao vento ou servindo de morada às larvas na escuridão, "per saecula saeculorum".

As pessoas, quando morrem, morrem; as escovas, não. Ficam por aí. Desde a primeira que eu tive, aquela usada por minha mãe para limpar um único dente, em 1978, até uma Colgate branca e azul, que deixei no lixinho do banheiro em Paraty, no dia 2 de janeiro. Agora, sempre que fecho os olhos, vejo as pobrezinhas, condenadas a um milênio de solidão.

Seria possível resgatá-las? Digamos que eu tivesse muito dinheiro, que eu fosse o Bill Gates e contratasse cientistas da Nasa, criasse ferramentas, pusesse uma legião de trabalhadores a peneirar lixões... Não, impossível, mesmo que encontrasse todas as escovas do país, em meio a sacolas plásticas, pitangas e Ataris, como saber se aquela TEK vermelha, macia, tamanho médio, modelo 1987, é a mesma que eu usei durante a quinta série ou outra qualquer? Só daria para identificá-las se eu tivesse marcado nos cabos, digamos, com uma ponta de faca quente, as minhas iniciais. Mas que tipo de pessoa faria uma coisa dessas?

Taí: Kim Jong-un, o novo ditador norte-coreano, talvez seja capaz de recuperar suas escovas, caso queria. Ou você não acha que os ditadores têm escovas de dentes personalizadas, com seus nomes gravados, belas insígnias em dourado e frases encorajadoras como "Bom dia, ó raio de sol que brilha para o universo!"? Bastaria a ele, portanto, tirar umas 500 mil pessoas do campo e das fábricas e botar para garimpar os aterros do país, até que separassem, das montanhas de escovas proletárias, todas as escovas ditatoriais.
Seria até bom para Kim Jong-un: uma meta, uma missão, totalitarismos precisam disso. O déspota poderia declarar que suas escovas de dentes são objetos sagrados, ou que, através delas, os sequazes do capitalismo conseguiriam obter seu DNA e criar um veneno para matá-lo. "Nem uma escova deixada para trás!", seria o slogan. Ou: "Até a última cerda!".

Durante a busca haveria mortos contaminados por lixo hospitalar e atômico, por leptospirose e vítimas de inanição, claro, mas para estes seriam erguidas estátuas e se cantariam hinos, até o dia em que, décadas mais tarde, Kim Jong-un declarasse a busca terminada, e fizesse o Grande Museu das Escovas de Kim Jong-un, e o povo choraria de felicidade, pois saberia que, se fora capaz de recuperar todas as escovas do majestoso líder, seria capaz de tudo.

Isso, o Kim Jong-un, claro, não eu, pois minhas escovas são iguais às de todos os outros, e ficarão mil anos por aí, em lixões em Sapopemba e Perus, e sobreviverão a mim, a você, aos ditadores coreanos, à própria Coreia e a sabe-se lá mais o quê. Ê, mundo estranho da porra!

Ação preventiva - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 11/01/12


O presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, e o advogado-geral da União, Luís Adams, vão ingressar amanhã na Justiça Federal com ação de ressarcimento contra 300 ex-prefeitos que perderam seus mandatos. Na ação, eles vão pedir que o cassado arque com as despesas das eleições suplementares. Além de reaver esses gastos, acreditam que a iniciativa inibirá candidatos ficha-suja e irregularidades durante a campanha eleitoral.

O peso das redes sociais
O livro "A privataria tucana" invadiu as redes sociais. Por isso, o PSDB, que num primeiro momento tentou ignorar a publicação, decidiu reagir. O Instituto Teotônio Vilela está enviando a militantes tucanos um texto defendendo a privatização. Ele diz que, com elas, "a economia brasileira ingressou num novo ciclo de prosperidade", "nas telecomunicações e na siderurgia, saímos da estagnação para a vanguarda mundial", e, que, "após anos de oposição sectária, o PT passou a patrocinar novas desestatizações (estradas e aeroportos)". E receita mais privatizações: "O peso do Estado na economia permanece enorme. O governo controla 276 empresas e é sócio minoritário de 397."

"Se a família do ministro for grande, ele não terá fôlego para chegar até fevereiro” — Roberto Jefferson, exdeputado (PTB-RJ), sobre a nomeação de parentes pelo ministro Fernando Bezerra (Integração Nacional) 

CONTRA A IMPUNIDADE. Criador do Conselho Nacional de Justiça, quando era presidente do STF, o ex-ministro Nelson Jobim vai ser o principal orador do ato em defesa do conselho, dia 31, em Brasília, promovido pela OAB nacional. Jobim criou o CNJ para romper o corporativismo das corregedorias dos tribunais de Justiça. Agora, age contra as associações profissionais de juízes, que querem restringir a ação do conselho.

INSS
O novo modelo de perícias médicas, que entraria em vigor este mês, foi adiado para junho. Nele, quem pedir afastamento por doença, de até 60 dias, será dispensado de realizar a perícia médica. Bastará apresentar um atestado.

Encomenda
A presidente Dilma pediu à ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) que se reúna com os governadores e entidades empresariais do Sul do país para elaborar um plano plurianual para minimizar os efeitos das secas que assolam aquela região.

Gabinete de crise
A assessoria do governador Eduardo Campos (PE), padrinho político do ministro Fernando Bezerra (Integração Nacional), está divulgando o áudio do discurso feito pela presidente Dilma, no dia 30 de agosto do ano passado, na cidade de Cupira. Na ocasião, ela assinou autorização para a construção de três das cinco barragens previstas para a região e anunciou convênio para a reconstrução de casas atingidas pela enchente de 2010. "Estamos aqui para impedir que a região seja assolada de novo por essa catástrofe", afirmou Dilma.

O sucessor
O ministro Fernando Bezerra (Integração) não é o favorito do governador Eduardo Campos (PE) para ser seu sucessor. Os preferidos são os secretários Geraldo Julio (Desenvolvimento), Tadeu Alencar (Casa Civil) e Danilo Cabral (Cidades).

Mercosul
Parlamentares brasileiros e empresários organizam uma viagem ao Paraguai para tentar convencer o país vizinho a aprovar a entrada da Venezuela no Mercosul. Argentinos e uruguaios foram convidados a integrar a caravana.

RECONDUÇÃO. O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) quer ser o novo líder do partido na Câmara, mas a maioria da bancada quer a reeleição do deputado ACM Neto (BA).

MULHERES. O Ministério do Desenvolvimento Agrário quer garantir que 30% dos projetos de assistência técnica tenham mulheres como titulares dos benefícios.

A BANCADA do PT no Senado está irritada com a senadora Marta Suplicy (PT-SP). Ela não quer cumprir o acordo para ceder a vice-presidência da Casa ao senador José Pimentel (PT-CE).

Catástrofes vergonhosas e gastanças obscenas - ROBERTO DaMATTA


O Estado de S.Paulo - 11/01/12


O início de cada ano-novo nos apresenta as mesmas imagens das catástrofes causados pelas secas e chuvas. Acidentes ocorrem em todos os lugares e são hoje agravados pela incômoda presença de uma não prevista "razão planetária" dentro do nosso mundinho individualista, construído debaixo do pressuposto de que somos motivados por uma racionalidade de interesses e desejos ilimitados. Alguém já disse que o individualismo só existe para ser perseguido pelo seu contrário. E o oposto de um individualismo consumista que beira a irresponsabilidade e o crime contra plantas, animais e clima é essa Terra que nos pariu, como diziam nossos esquecidos ancestrais, e que reage como uma totalidade na forma daquilo que chamamos de catástrofes porque a nossa cosmologia (fundada numa paradoxal fé científica) nos impede de concebê-la como uma pessoa.

Mas se todos os lugares estão sujeitos a acidentes nem todos respondem aos imprevistos de modo tão catastrófico como ocorre no Brasil. Para tanto, basta olhar o Japão ou qualquer país consciente de sua honra nacional. Pois se há acaso, deve haver prevenção, exceto no caso paradoxal desse nosso país abençoado por Deus, cuidado pelo lulo-petismo, e bonito por natureza. Somente aqui as chuvas nos mesmos lugares e períodos resultam no vergonhoso desamparo de suas vítimas. Esses dependentes de larápios que não têm o menor pudor em embolsar os recursos destinados a reparar o seu sofrimento. O que os acidentes revelam no Brasil é uma gastança obscena e clientelisticamente direcionada. Elas expõem a gulodice eleitoral cujo alvo é enriquecer e permanecer no poder. Seu traço típico é distribuir pelo parentesco e pelos elos partidários. E assim jamais conseguimos sair do reagir para o proagir. As catástrofes desmascaram uma obscena gastança.

* * *

Elas também exibem a nossa profunda alergia ao republicanismo, pois os atingidos são sempre os "pobres": os que vivem na passividade cívica e que, graças a autoridades irresponsáveis, vivem em locais arriscados. Eles são o espelho de nossa alergia a igualdade que - levada a sério - nos obrigaria a optar por planejamentos urbanos destinados a todos. É ofensivo descobrir que "conjuntos populares" são construídos sem infraestrutura! Insulta testemunhar a ladainha dos aflitos conformados com a "vontade de Deus", sem a revolta contra os que foram eleitos para administrar a sua cidade e o seu Estado. Esse conformismo de raiz, mostra quanto somos penetrados por valores hierárquicos que constroem o mundo como sendo feito por superiores e inferiores - aqueles mandando em tudo; estes, destinados ao sofrimento e à dor.

* * *

No Brasil, até a ideologia política moderna que, a partir da Revolução Francesa dividiu o mundo, como mostra o desconhecido estudo de J. A. Laponce entre "direita e esquerda", dentro de um projeto igualitário, foi desmantelada pelas hierarquias que desintegram ministérios inventados para integrar a nação. Tudo em nome do povo, mas, de fato, operando vertical e pessoalmente: em favor do partido X ou de Sicrano ou Beltrano. Mas, eis que surgem as catástrofes naturais para mostrar como as antigas verticalizações, que Laponce situa como típicas dos sistemas tradicionais (divididos entre os que lutam e governam, os que rezam e salvam e os que trabalham; entre irmão, parente, compadre, amigo e o resto), retornam e canibalizam as orientações de índole mais igualitária que estão nas leis e organogramas republicanos, mas que jamais foram inscritas no coração dos que mandam. Daí o absurdo quando se descobre que o ministério destinado a socorrer o País, apenas ajuda a região à qual pertence o seu ministro. E a vergonhosa revelação de que tudo o que foi construído - barragens, estradas, diques, etc... - se desmantelam nas primeiras chuvas porque foram malfeitas e sem dúvida (com as notáveis exceções de praxe) hiperfaturadas e construídas por empresários amigos de infância.

* * *

A despeito de toda enxurrada modernizadora que tem corrido debaixo da ponte brasileira, continuamos a viver o dilema de construir uma sociedade coerente com uma nação republicana (como está no papel) ou de deformar a igualdade numa perversa hierarquia, na qual - como naquele famoso livro de Orwell, certos cargos são mais iguais do que outros. E, mais que isso, certos papéis sociais se confundem com seus ocupantes de modo que qualquer planejamento a longo prazo é impossível. O critério de nomeação é a família e a confiança; jamais a competência. Essa é a chave mestra - em que pese as ideologias - da administração pública à brasileira. O chamado nepotismo é o maior inimigo das rotinas administrativas responsáveis pelos ideais de justiça social. E sem rotinas, não há como ter instituições. Pois as instituições são animadas e dirigidas por meros mortais que passam, mas elas, como o Brasil, não devem morrer.

As eleições de 2012 - MARIO MESQUITA

FOLHA DE SP - 11/01/12

Em que pese a relevância dos pleitos municipais deste ano, em especial a "prévia" entre o PT e o PSDB em São Paulo, para os investidores internacionais as eleições mais importantes na região ocorrerão no México.

O noticiário sobre o país tem sido dominado de longe pela questão do narcotráfico e da violência. Mas o México merece atenção, visto que é a segunda maior economia da América Latina e, no momento, tem desempenho bem melhor do que a primeira.

O PIB mexicano cresceu 1,3% no terceiro trimestre (ou 5,5% em termos anualizados), ante estagnação no Brasil. A inflação encontra-se em 3,5%, acima da meta, que é de 3%, mas bem abaixo da nossa (6,5%).

É fato que, ao contrário da recuperação em "V" vivida pelo Brasil, o México sofreu recessão profunda e prolongada, o que, ao menos em parte, explica seu crescimento mais intenso na margem -em 2009, por exemplo, o PIB do México caiu 6,1%, ante 0,3% no Brasil.

A recessão de 2009 teve muito a ver com o impacto da crise dos EUA, país com o qual o México tem fortes vínculos econômicos e financeiros (as exportações para os norte-americanos correspondem a cerca de um quarto do PIB mexicano).

Fatores idiossincráticos, como a epidemia do vírus H1N1, também contribuíram para a contração do PIB. Adicionalmente, cabe notar que o problema dos derivativos cambiais exóticos nas empresas parece ter tido efeito mais intenso sobre a atividade econômica do que se observou no Brasil.

Mesmo com esse choque profundo, a política econômica mexicana não sofreu descontinuidade, talvez por conta da crença de que as alternativas ao tripé ortodoxo de metas para a inflação (e um BC formalmente autônomo), câmbio flutuante e superavit primário seriam deletérias.

A política econômica no México tem sido conduzida por um grupo de tecnocratas, que funciona em torno do presidente do Banco Central, Agustín Carstens. O mandato de Carstens vai até o final de 2015, e os dos vice-presidentes do BC terminarão entre 2013 e 2019. Dessa forma, não deve haver grande modificação na condução da política monetária nos próximos anos.

Mas, evidentemente, o próximo presidente poderá substituir os ministros e redesenhar a agenda de reformas do país -centrada no setor de energia.

O cenário político-eleitoral parece apontar para a vitória da oposição nas eleições, que ocorrerão em turno único, marcado para 1º de julho, com o candidato do PRI, Enrique Peña Nieto, obtendo cerca de 45% das intenções de voto em pesquisas recentes. Mas a vitória não é garantida, pois há resistência ao PRI em segmentos do eleitorado, e o candidato tem dado mostras de fragilidade -como aparentemente desconhecer o valor do salário mínimo vigente no país.

No campo governista (PAN) a situação é indefinida. O presidente Calderón apoia o ex-ministro da Fazenda Ernesto Cordero. Mas este tem popularidade sensivelmente mais baixa do que a da deputada Josefina Vázquez Mota (ex-ministra da Educação), que tem conseguido 20% de apoio em simulações de eleições presidenciais -há ainda um terceiro postulante, o senador Santiago Creel.

Do ponto de vista dos mercados, o maior interesse, pois tem o potencial de influenciar de forma mais decisiva os preços de ativos, recai sobre o candidato das esquerdas, Andrés Manuel Lopez Obrador, conhecido pela sigla Amlo.

Lopez Obrador tem procurado passar uma imagem de moderação, semelhante, de fato, com a bem-sucedida estratégia do então candidato Lula em 2002. Mas há, até o momento, considerável ceticismo entre o empresariado e investidores locais quanto à nova posição de Amlo -isto é uma constatação, sem julgamento de mérito.

Por enquanto, tal ceticismo ainda não afeta os preços dos ativos e as cotações do peso mexicano, visto que o apoio a Amlo se encontra próximo de 15% das intenções de voto. Mas isso pode mudar caso o candidato, que tem inegável carisma pessoal, passe a ter desempenho melhor.

Se Amlo mostrar sinais de que pode vencer, a saída para acalmar os mercados pode ser uma "Carta ao Povo Mexicano".

Sentimentalismo relinchante - MARCELO COELHO


FOLHA DE SP - 11/01/12

O filme "Cavalo de Guerra", do cineasta Steven Spielberg, é um desastre estético e moral


Todo mundo conhece (a coisa começou em 1930, mais ou menos) aquele personagem meio idiotado, amigo do herói do filme, que desde a primeira cena já está marcado para morrer.

Ele ri bastante, é ingênuo, é feliz e não fará falta nenhuma para o desenvolvimento da trama. Anuncia algum sonho banal para o futuro: "Quando eu voltar da guerra, quero cuidar do meu posto de gasolina"; "quando sairmos desta maldita ilha, vou me dedicar ao plantio de alfaces".

Seu sonho morrerá com ele na primeira carga da cavalaria inimiga ou no segundo ataque de tubarões voadores. Não quero contar muito de "Cavalo de Guerra", o mais recente filme de Spielberg, mas, se estiver contando, acho que não estrago a surpresa de ninguém. A razão é que não há surpresas nesse filme.
Ou melhor, há sim. É que, além do amigo idiotado do herói, Spielberg introduziu uma inovação bizarra nessa história de um cavalo atravessando os campos de batalha da Primeira Guerra Mundial.

Ele criou o amigo do cavalo. Que é outro cavalo, evidentemente -e ganha um doce quem adivinhar quais as suas chances de sobrevivência até o final do filme.

Seria uma perfeita paródia dos clichês hollywoodianos, se a intenção de comover não fosse tão explícita. A música é um clichê do começo ao fim, e o fim é um clichê à parte, com vermelhidões de crepúsculo, no modelo de "...E o Vento Levou": um céu de "technicolor" contra o qual se recortam as silhuetas dos heróis da história, cavalo inclusive. Faltou um relincho de triunfo, para deixar a plateia definitivamente de quatro.
"Cavalo de Guerra" constitui, além do mais, uma verdadeira aberração moral. Verdade que os massacres de 1914-1918 já se perderam um bocado no tempo.

Mas contar sentimentalmente as desventuras de um cavalo nas trincheiras, enquanto seres humanos morriam como moscas, seria o equivalente a um filme que mostrasse a comovente sobrevivência de um hamster num campo de extermínio nazista. Tento matizar, em todo caso, esse julgamento. Nos depoimentos de antigos soldados da Primeira Guerra, fala-se de muita compaixão pela sorte dos animais.
Cavalos foram ainda muito importantes naquele conflito: transportavam alimentos e munição para as tropas. Era frequente entrarem em pânico no meio das bombas e que agonizassem, mutilados, ao lado das vítimas humanas.

A piedade dos soldados se justifica, acho, pelo fato de que os animais nem mesmo sabiam o que estava acontecendo; e não tinham escolhido, é claro, integrar os batalhões de combatentes.

Dessa dupla inocência não participavam os soldados, por mais iludidos que estivessem ao se alistar.
Haveria sentido, então, no tema do filme. Não seria propriamente um clichê, embora o recurso já tenha sido utilizado muitas vezes (desde Swift, por exemplo): mostra-se a "humanidade" de um cavalo em meio a uma guerra humana e, por isso mesmo, bestial.

O foco de "Cavalo de Guerra" não seria, por si só, escandaloso e ilegítimo. Mas a sentimentalidade cavalar de Spielberg, se não for simples exemplo de que o diretor está gagá, exigiria outra explicação.
Claro, Spielberg muitas vezes foi sentimental, apelativo, o que quisermos. Mas não era, hum, burro; e não estou entre seus inimigos jurados.

Em "Cavalo de Guerra", talvez exista um argumento oculto capaz, não de salvar, mas de explicar o seu desastre estético e moral.

A tragédia de 1914-1918 marcou a passagem de um modelo de guerra ainda galante, de cavalarianos com a espada em punho, para um conflito principalmente tecnológico, baseado em tanques, aviões e armas químicas.

O verdadeiro antagonista do cavalo, no filme, é o canhão, a metralhadora, o tanque de guerra.
Esse domínio "desumanizador" da tecnologia é também o que se vê na própria indústria cinematográfica, na qual o que conta são os efeitos digitais e o virtuosismo milimétrico das tomadas.

Diante de um cinema tão perfeito tecnicamente, Spielberg talvez queira recuperar o "sentido humano" da história. Mas, no seu vocabulário, isso significa mais sentimentalismo. Que o sentimentalismo privilegie as emoções em torno de um cavalo é sintoma, sem dúvida, que da humanidade hollywoodiana não resta mais nada a esperar.

Irã e crise nos EUA - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 11/01/12

DESDE O ÚLTIMO dia de 2011, os Estados Unidos podem retaliar instituições financeiras que fizerem negócios com o banco central do Irã. Na prática, Barack Obama ameaça asfixiar o Irã por meio de um embargo financeiro aos pagamentos das vendas de petróleo.

O motivo da pendenga, claro, é a suposta produção de material nuclear que pode ser utilizado na fabricação da bomba iraniana.

Ninguém está ligando muito. Só um pouco. O preço do petróleo em Nova York subiu pouco mais de 20% em três meses, entre outros motivos devido à crise iraniana. Mas o grosso da alta se deveu a uma baixa relativa do pessimismo econômico.

Obama na prática tem quatro meses para decidir sobre o fechamento das finanças americanas a instituições que façam negócios com os iranianos. Além do mais, pode não aplicar as sanções caso não exista ameaça à segurança nacional.

Ainda assim, o governo americano ligou o botão de uma máquina de crise; precisa administrá-la, sem parecer molenga.

Até o final do mês, a União Europeia decide quando e como vai implementar o embargo ao Irã. O Reino Unido, a reboque dos EUA, como de costume, quer logo partir para a ignorância. Espanha, Itália e Grécia, clientes do Irã com contratos em andamento, querem um acerto que não abale ainda mais suas economias em parafuso.

Os EUA esperam que Japão e Coreia do Sul entrem no jogo de sufocação do Irã. Dizem o mesmo à China, que, no entanto, faz o que lhe dá na telha. A Rússia vai na mesma linha e, de resto, pode triangular pagamentos de países para o Irã.

Tensão vai haver. Sabe-se lá o que Israel pode fazer. Extraoficialmente, há gente no Irã a dizer que, vindo embargo, fecha o estreito de Ormuz, por onde passam 20% do petróleo mundial.

Pode ser bravata, mas no Irã há centros de poder descoordenados, um tanto independentes, e alguém pode fazer besteira (soltar um míssil no estreito, ao menos). Mas, apesar da tensão, o script mais razoável da história é de escalada sobre controle, segundo entendidos.

A Arábia Saudita forneceria óleo para europeus e asiáticos aliados dos EUA (embora essa abertura de torneira não seja assim tão simples, tanto em termos logísticos como contratuais). A China daria um alívio para o Irã. A Rússia serviria de banco para empresas de outros países comprarem óleo do Irã.

Cerca de 65% do petróleo iraniano vai para a Ásia (China, Japão, Índia e Coreia levam 52% das vendas do Irã); 18%, para a União Europeia.

Se os americanos apertarem a cota e produzirem uma crise feia, o preço do petróleo sobe. Os EUA quase recaíram em recessão em 2011, quando o preço do petróleo subiu devido às guerras civis no mundo árabe (e também porque sofreu efeitos do terremoto no Japão, de enchentes horríveis e, claro, da baderna europeia).

Obama vai provocar carestia da gasolina em ano de eleição? Uma bravata guerreira nacionalista compensaria o efeito negativo nos bolsos americanos?

O Irã, por sua vez, atiraria no pé, talvez na cabeça, se fechasse o estreito de Ormuz. Não exportaria nada. Na verdade, se o Irã tomar tal atitude alucinada, vai haver coisa muito pior, mas passemos.

GOSTOSA


Vender melhor - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 11/01/12



O ano passado foi o ponto mais alto do preço de várias commodities que o Brasil exporta, e para 2012 a previsão é de redução nesses valores. O preço médio da soja foi US$ 495 a tonelada e este ano deve cair 13% e ficar em US$ 430, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). O minério de ferro ficou em US$ 126 e deve cair para US$ 105. A AEB prevê queda no saldo comercial.

No ano passado, a mediana das previsões de mercado previa US$ 8,7 bilhões de superávit, a AEB previu US$ 26 bi, e terminou o ano em US$ 29 bilhões. O mercado errou redondamente, e a associação se aproximou bastante. Agora, o presidente em exercício da entidade, José Augusto de Castro, fala em US$ 3 bilhões de saldo para 2012, mas diz que não se surpreenderá se for um resultado negativo.

O economista Winston Fritsch, sócio da Oriente Investimentos, acha que isso pode ter uma pressão sobre o dólar, mas lembra que não se pode usar apenas o comércio exterior, ou o déficit em transações correntes, para tentar prever a taxa de câmbio no Brasil. Segundo ele, o dólar será definido pela crise da Europa, porque em momentos de tensão não há porta de saída possível que não seja a moeda americana; nesse caso, ela se valoriza em relação a todas as moedas do mundo.

Na semana passada, entrevistei Winston Fritsch e José Augusto de Castro na Globonews. O presidente da AEB me deu também dados de um estudo que está preparando sobre o comércio exterior brasileiro em que mostra que, apesar do bom resultado do ano passado, as exportações brasileiras continuam patinando, e que a alta é resultado de elevação de preços.

Em 2001, o café estava sendo vendido a US$ 964 a tonelada; no ano passado, foi a US$ 4.463. Esse é um dos poucos produtos da nossa pauta cuja previsão é de nova alta este ano, para US$ 4.600. A soja, que no ano passado chegou a US$ 495, era vendida a US$ 173 em 2001. Em dez anos houve um aumento de 186%. Açúcar saiu de US$ 197 a tonelada para US$ 573, e este ano o preço previsto é de US$ 530. Carne bovina saiu de US$ 2.006 para US$ 5.077 em dez anos, e este ano a previsão é ficar em US$ 5.000. Minério de ferro deu um salto de US$ 18 para os US$ 126 do ano passado.

O Brasil foi muito beneficiado pelo boom de commodities. Isso produziu um salto impressionante nas receitas com esses produtos. De café, o Brasil tinha receita de exportação de US$ 1,2 bilhão e foi para US$ 8 bi. Soja saiu de US$ 2,7 bilhões para 16,3 bi entre 2001 e 2011. Para 2012, a previsão da AEB é que não chega a US$ 14 bilhões. De açúcar e açúcar refinado, o Brasil vendeu US$ 2,2 bilhões em 2001, e US$ 5,8 bi no ano passado. No minério de ferro, deu um salto fenomenal, de US$ 2,9 bilhões, em 2001, para US$ 41,8 bi, no ano passado, 14 vezes mais. Em 2012, a previsão é de US$ 332,6 bilhões de exportações totais. Nesse período, houve aumento da quantidade exportada também, porque a demanda cresceu, mas o preço subiu mais rapidamente.

Quando se comparam com os outros países se vê que o Brasil mal saiu do lugar.

- As exportações brasileiras foram 1,4% das exportações mundiais no ano passado, o mesmo número de 1985. O Brasil é o 22o- do mundo em exportação. Alguma coisa está muito errada com o comércio exterior, porque o Brasil mudou muito de 1985 até agora - afirma Winston Fritsch.

O histórico do ranking mundial montado pela AEB registra que o Brasil em 1970 era o 20º lugar. Depois, caiu vários pontos nessa classificação e em 2000 era o 28º. Em 2012, voltará ao lugar em que estava em 1970. A Índia era o 30º e em 2012 será o 16º. A maior parte da exportação da Índia é de produtos industrializados. A China era o 29º e agora é o primeiro. A Coreia em 1970 era o 49º e agora é o sexto maior exportador mundial.

Em resumo, os preços dos produtos que o Brasil exporta deram saltos; o volume vendido aumentou, mas o país continua vendendo relativamente a mesma coisa. Vários países mesmo sem as vantagens de grandes produtores de matérias-primas e alimentos tiveram desempenho melhor do que o do Brasil.

O que os dois especialistas disseram é que falta ao país muita coisa: cultura exportadora, infraestrutura de qualidade, inovação, esforço para exportar produtos com maior valor agregado, educação, redução de custos, aumento da eficiência.

- Os nossos problemas são todos internos; se melhorarmos a infraestrutura, a carga tributária, o custo financeiro, o sistema previdenciário, a excessiva burocracia seriamos muito mais eficientes. Temos 17 ministérios para tratar do comércio exterior e cada um fala uma língua diferente; não temos política de governo, temos políticas de ministérios - diz José Augusto de Castro.

Enquanto José Augusto está preocupado com a reprimarização da economia - em 1995 os produtos básicos eram 22,61% do que o Brasil exportava, no ano passado foram 48% - Winston acha que o Brasil tem também que incentivar aquilo que já se faz bem.

- A infraestrutura no Brasil é uma porcaria; temos que investir em corredores para certas commodities, para as quais o frete é fundamental - afirma Winston.

O Brasil tem sido levado pela onda de valorização dos produtos que exporta, mas não tem qualquer visão estratégica em comércio exterior.

Maiores em conflito com a lei - EDUARDO GRAEFF


O Estado de S.Paulo - 11/01/12


A lei exige transparência no trato da coisa pública, mas o costume ampara quem leva vantagem. A tensão entre esses dois princípios é o pano de fundo da novela da corrupção que se arrasta, há anos, diante dos nossos olhos.

Do fim da censura à imprensa, em 1978, passando pela Constituição de 1988, até a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2004, e a Lei de Acesso à Informação recém-sancionada, o Brasil muniu-se de praticamente todos os instrumentos legais necessários para a gestão democrática, transparente e responsável do Estado.

Por que, então, prevalece a sensação de que a corrupção aumentou, em vez de diminuir?

De um lado, porque as instituições funcionam. A imprensa toca o alarme, a polícia, as comissões parlamentares e os tribunais de contas investigam, o Ministério Público denuncia, a Justiça instaura processos. Tudo isso gera notícia e aumenta a percepção pública de irregularidades, que antes da democratização ficariam escondidas. De outro, porque as instituições não funcionam como deveriam: expõem a corrupção, mas raramente chegam à punição dos culpados.

Oito anos depois de aparecer num vídeo achacando um, por assim dizer, bicheiro, Waldomiro Diniz, então subchefe da Casa Civil, ainda não foi formalmente acusado - responde a processos, mas por outros fatos. O número de servidores federais demitidos por improbidade aumentou bastante depois da criação da Corregedoria-Geral da União, em 2001. Mas o risco de um servidor demitido sofrer alguma sanção penal é de apenas 3%, constatou Carlos Higino Ribeiro de Alencar num estudo sobre a eficácia da Justiça no combate à corrupção.

Para o mau funcionamento das instituições há remédios legais. Alguns já aplicados, como a súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal. Outros em discussão, como a "PEC dos Recursos", defendida pelo ministro Cezar Peluso. Se eles tiverem o efeito esperado, de desemperrar as engrenagens da Justiça, a impunidade pode diminuir e com ela, em alguma medida, a corrupção.

A corrupção e a impunidade têm outras causas, porém, mais culturais do que institucionais. A nossa herança patrimonialista, morta e enterrada na letra da lei, ainda vive na prática. Agentes públicos comportam-se como se fossem donos de pedaços do Estado. Os apadrinhados, movidos pela lealdade ao chefe político, acima de tudo. Os concursados, blindados por seus direitos adquiridos, começando por uma estabilidade no emprego equivalente à vitaliciedade que outros países reservam aos membros do Judiciário. Uma consequência direta disso é a manutenção de privilégios legais, mas injustificáveis. A obtenção de vantagens ilegais é um efeito secundário inevitável. Quem não vê nada de errado em lesar o público por uma coisa não se deve escandalizar tanto com a outra.

O aprendizado democrático da sociedade pode apertar o cerco aos privilégios encastelados no Estado. A aplicação contínua e mais rigorosa da lei pode diminuir a tolerância com a corrupção. Em que prazo? Não sei. Mas se já investimos tantos anos nessa possibilidade, mais vale insistir do que desistir antes de ver resultados.

A função pedagógica da lei, contudo, não depende somente de bons textos. Requer bons professores: lideranças, autoridades que deem lições de integridade pelo exemplo de seus atos, mais do que palavras.

Acontece que a maioria dos exemplos vindos de cima nos últimos anos transmite a lição oposta: a de que levar vantagem à custa do erário pode ser não apenas tolerável, mas defensável, se for pelo partido, pela classe ou pela causa certos. Se figuras de proa da República dão um jeito de driblar ou torcer a lei em proveito próprio, o que esperar dos seus subordinados?

O conflito entre a magistratura e o Conselho Nacional de Justiça escancarou essa tensão ali, onde as suas implicações são mais dramáticas. Acredito que a maioria dos juízes cumpra a lei com o mesmo rigor com que a aplica. Mas a força com que seus representantes esperneiam contra a fiscalização dos atos administrativos dos tribunais indica que eles ainda não incorporaram realmente, profundamente, o princípio da transparência democrática.

Manter ou limitar as funções de fiscalização do Conselho Nacional de Justiça tem tudo para vir a ser um desses atos exemplares, capaz de acelerar ou atrasar a mudança de mentalidades, além de fixar jurisprudência. Prestação de contas é uma obrigação que vale para todos os agentes públicos? Ou ela admite ressalvas quando os guardiães da lei estão em causa? Queira ou não a nossa Corte Suprema, é assim que sua decisão será entendida pelo público e pelos próprios magistrados.

Ironia ou armadilha da História: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz jus ao título de pai do CNJ, dentro da reforma do Poder Judiciário que ele estimulou. Ao mesmo tempo, Lula carrega o estigma - do qual gostaria de se livrar - de padrinho do mensalão, o maior escândalo de corrupção destes anos, que o Supremo Tribunal Federal também está em via de julgar. O legado institucional da sua Presidência estará em causa no julgamento dessas duas, digamos, realizações tão contraditórias. A própria composição do Supremo Tribunal Federal leva a sua marca, aliás - na medida em que Lula nomeou a maioria dos seus integrantes.

Transparência ou opacidade da Justiça? Punição exemplar ou prescrição penal para os mensaleiros? Não sei para que lado Lula usará a influência que inegavelmente tem nesses dois julgamentos. Prefiro nem pensar.

Os próximo capítulos da nossa novela política serão emocionantes, em todo caso.

Dilma falhou no que se dizia melhor - ROSÂNGELA BITTAR


Valor Econômico - 11/01/12


Apagões pequenos, médios e grandes, do Oiapoque ao Chuí; epidemia grave de dengue; mortes novamente por catástrofes da natureza esperadas mas não prevenidas por governos municipais, estaduais e sobretudo federal, a quem compete muito; caos aéreo persistente, resultado de incipientes medidas; erros repetidos na administração da Educação; baixa execução de PACs I ou II; reforma agrária sem resultados; invisível avanço em desempenho na área de segurança. Problemas, esses e muitos outros, do primeiro ano do governo Dilma, todos, de gestão.

A presidente da República gastou seis meses iniciais na montagem do governo e os seis meses finais na desmontagem. Perdeu, na tessitura, dois pilares, Antonio Palocci, chefe da Casa Civil, e Nelson Jobim, ministro da Defesa, dois mais importantes colaboradores. Titubeou, demorou, negaceou, até trocar ministros política e administrativamente inviabilizados nos cargos, levando o governo à paralisia. Quando tomou providências o fez de forma acanhada - pois ainda há áreas no vácuo -, e já era o fim da primeira etapa.

Isso não influiu na popularidade, na capacidade de reeleição, no apoio popular, como citam governistas profissionais, a provar que a aceitação é prova de que o governo foi bom. Não se pode dizer, porém, para o bem do realismo, que se o mau governo não atingiu o voto, não existiu. Com altos índices de aprovação no último Ibope do ano, maior até que seus antecessores no mesmo período, Dilma seria reeleita gloriosamente se o pleito fosse hoje. Mas não poderá dizer que recebeu, para isso, contribuição decisiva de sua performance de gestora, fama que adquiriu já na equipe de transição do governo Lula, antes até de ser ministra.

O governo começa o segundo ano no mesmo ponto que começou o primeiro: tendo que ser remontado, exigindo nomeação de ministros que possam ter competência para executar programas que a presidente venha a apontar como seu projeto de Brasil. Em janeiro de 2012 estão todos no ponto do janeiro de 2011: à espera de que ela diga a que veio e para onde vai.

Dilma terminou em empate, inclusive, no quesito de preservação da democracia e das instituições, ainda necessitadas de cuidados especiais no Brasil. Para cada avanço, houve um retrocesso. Iniciativas como a criação da Comissão da Verdade, ou mudanças dos princípios de política externa para preservar o respeito aos direitos humanos, por exemplo, tiveram seu contraponto na censura a programas de TV e peças de propaganda ensaiadas sem pudores pela ministra da Mulher, Iriny Lopes, e na pressão do partido presidencial, o PT, para que promova o controle da imprensa. Houve outras ameaças que não chegaram a configurar risco real, mas promessas de autoritarismo, como o abuso do governo por medidas provisórias, o que anula o contraditório do Congresso, e renovadas tentativas de eliminar controles do Tribunal de Contas da União.

A timidez administrativa da presidente inibiu até mesmo o grupo criado para ajudá-la a romper o imobilismo da gestão do Estado, a Comissão de Gestão Pública. Jorge Gerdau, empresário coordenador do grupo que levaria para o governo os instrumentos modernos de administração na iniciativa privada, não logrou resultados. O grupo não deu respostas sobre como melhorar a gestão de áreas de administração difícil e, às vezes, dramática, como a da saúde e, principalmente, dos hospitais públicos. Nem da educação, uma gestão perdida entre erros administrativos repetidos, por exemplo, na aplicação de exames nacionais, e equívocos da política universitária expansionista que criou instituições fantasmas pelo interior afora.

O problema é que esses setores de gestão em colapso têm se tornado numerosos, a eles se somando a segurança, o combate ao uso de drogas, a prevenção de desastres ambientais, o abastecimento de energia.

A oposição, se disse neste espaço ao fim de 2011, foi um fracasso retumbante no ano em que deveria se renovar e reafirmar um projeto alternativo para o eleitorado. O governo não ficou à frente, embora, ao contrário da oposição, que nem número teve, contasse com os instrumentos para fazer e acontecer.

O ministério foi formado para atender ao projeto do ex-presidente Lula de preparar candidatos de cara nova para o PT disputar eleições municipais e estaduais. Deu errado no federal, e pode continuar nessa má trilha a julgar-se pelas especulações que cercam a substituição dos ministros candidatos. A troca de Fernando Haddad por Aloizio Mercadante - e não vai aqui nenhum lobby das corporações que lotearam o MEC a favor do secretário-executivo (Henrique Paim) e candidato preferencial de Haddad - continua dentro do projeto de formação de candidatos do PT a eleições traçado por Lula.

As corporações, que governam por intermédio de conferências, ONGs e greves, por sinal, tomaram mais de uma das áreas fundamentais para o sucesso do projeto deste governo. Na saúde tentou-se estabelecer base de alguns programas novos, voltados para a classe média, segundo orientação expressa da presidente, mas foi incipiente. Exemplo de fim de linha nesse setor acontece na porta do governo federal. Brasília, governada pelo PT, que tem na saúde o problema mais grave entre tantos, continua mergulhada na incompetência e falta de perspectiva de soluções. A última do governador Agnelo Queiroz foi criar o ciclo-socorro, as "bikelâncias" que, como o nome indica, são isso mesmo, ambulâncias em bicicleta. Não se tem notícia de reações de perplexidade, terror ou providências no Ministério da Saúde.

O governo parece amarrado, impedido. Com esse fraco e pouco criativo desempenho, Dilma está no topo das pesquisas de popularidade, apoio e aceitação do eleitorado, repetem como um mantra seus acólitos. O ex-presidente Lula já disse, nos idos do pós-mensalão, que um governo começa mesmo no terceiro ano, portanto, esse início não conta. O pior dos mundos será a marquetagem convencer Dilma da desnecessidade de reações firmes neste segundo ano.