quarta-feira, janeiro 11, 2012

Economias e excessos do etanol - MAURILIO BIAGI FILHO


O ESTADÃO - 11/01/12

Você sabe quanto custam as gotinhas d"água que pingam dos escapamentos dos carros movidos a Etanol? Do início do Proálcool,em1975, até agora, tendo como base o preço atual- em torno de R$2 por litro de Etanol -, são cerca de R$ 28 bilhões. Esse é o valor atualizado dos quase 14 bilhões de litros de água contidos nos etanóis de cana nesse período.

No início,havia razões técnicas para a produção de álcool hidratado,que dava mais torque aos primeiros motores adaptados.Mas,como advento da frota flex, é preciso eliminar o oneroso "passeio da água", agora que o Etanol pode se tornar uma commodity global. Dos países que já adotaram combustíveis renováveis, o Brasil é o único a manter o Etanol hidratado,cabendo à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) avaliar a possibilidade de estabelecer um único padrão.

Até ser eliminada pelos carros,a água embebida no Etanol passa por sete "trasfegas": 1) das colunas de destilação para os tanques das usinas; 2) dali para os tanques dos caminhões; 3) depois, para os tanques das distribuidoras; 4) volta aos tanques dos caminhões; 5) destes, para os tanques dos postos de combustíveis; 6)das bombas para os tanques dos carros; 7) e destes para os motores.

O hidratado poderia ter sido extinto há alguns anos,quando o álcool foi rebatizado como Etanol. A imagem melhorou, mas perdeu-se a oportunidade de lançar o "Etanol mais puro". Mais de 30 anos depois dos primeiros motores adaptados para Etanol e quase uma década após a chegada dos motores flex - mais sofisticados -, é preciso melhorar a economicidade do nosso combustível renovável.O fim da duplicidade do Etanol ajudaria a compensar a quebra da paridade técnica Etanol-gasolina. Problema seriíssimo: enquanto o brasileiro foi condicionado a consumir Etanol apenas quando este for "vantajoso", o governo ignora que a cadeia produtiva do Etanol perdeu o horizonte econômico desde antes da crise de 2008.

Em 2011, reconhecendo a mudança dos parâmetros ambientais e econômicos, o governo reduziu a carga tributária de diversos produtos.A gasolina teve redução da Cide.

Para o setor sucroalcooleiro, "ferido de morte", o contrário, nem se quer foi dada isonomia.Pior,determinou- se a possibilidade de aumento da alíquota da Cide sobre o Etanol.

Sinal claro para bons entendedores.

Nunca pensamos em aumento de preço para a gasolina, mas,sim,que se resolva o impasse criado com o Etanol. Sem políticas públicas claras e efetivas para a matriz energética do País, continuará o enfraquecimento da cadeia produtiva do Etanol,queenvolve2milhõesdepessoas e teria plenas condições de dobrar de tamanho nesta década, com inegáveis benefícios ambientais, sociais e econômicos.

Como não costumamos valorizar o que é nosso, esquecemos,dentre outros fatores, a despoluição e a economia de divisas propiciadas pelo Etanol.

Segundo dados da Datagro,de 1975 a julho de 2011, o Brasil deixou de consumir o equivalente a 2,1 bilhões de barris de gasolina graças ao Etanol, uma economia de US$261,4 bilhões.

Boa hora de olhar o que ocorre lá fora.

Os EUA copiaram o programa brasileiro e fizeram uma adaptação eficiente.

Hoje produzem mais que o dobro de Etanol que o Brasil, e de milho,cujo processo é mais exigente do ponto de vista energético.Os produtores norte-americanos abraçaram o Etanol porque lá as regras são claras e oferecem horizontes previsíveis, sem oscilações sazonais ditadas por fatores conjunturais.

Etanol de lá é tratado oficialmente como produto estratégico,de alto valor econômico e ecológico,sem equivalência de preço com a gasolina.

Assim o consumidor assimila a ligação entre economia, saúde pessoal e meio ambiente.

Tempos atrás, ninguém imaginaria maços de cigarros com a frase Fumar faz mal à saúde. Portanto, ninguém estranharia se nas bombas dos postos constas se que Consumir gasolina prejudica o meio ambiente. Está na hora de encarar o Etanol com outros olhos, afinal, sem perspectivas de longo prazo,os novos investimentos não acontecem.

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