terça-feira, junho 01, 2010

NICHOLAS D. KRISTOF

A excomunhão da freira
NICHOLAS D. KRISTOF
O Globo - 01/06/201
Finalmente temos um caso em que a hierarquia da Igreja Católica está respondendo rigorosa e velozmente à acusação de delito. Mas o alvo não é um padre pedófilo. Em vez disso, é uma freira que ajudou a salvar a vida de uma mulher. Médicos a descrevem como uma santa.

A excomunhão da irmã Margaret McBride, de Phoenix, reforça tudo o que sinto de moralmente obtuso em relação à hierarquia católica. Espero que um clamor popular possa retificar essa desfaçatez.

A irmã Margaret era administradora sênior do St. Joseph’s Hospital, de Phoenix. Uma mulher de 27 anos, mão de quatro filhos, chegou ao hospital no final do ano passado, no terceiro mês de gravidez.

Segundo reportagens de jornais locais e relatos de alguns membros da equipe do hospital, a mulher sofria de uma séria complicação chamada hipertensão pulmonar.

Isto criava alta probabilidade de que a tensão da gravidez acabasse por matá-la.

“Nesse trágico caso, o tratamento para salvar a mãe iria requerer a interrupção de uma gravidez de 11 semanas.

A decisão foi tomada depois de consultados a paciente, sua família, seus médicos e a Comissão de Ética”, informou o hospital.

A irmã Margaret integrava essa comissão. Ela não quis discutir o caso comigo, mas o bispo de Phoenix, Thomas Olmsted, decidiu que ela estava “automaticamente excomungada” porque aprovou o aborto.

“A vida da mãe não pode prevalecer sobre a da criança”, afirmou um comunicado do escritório do bispo.

Devemos lembrar que a hierarquia da Igreja Católica suspendeu padres que abusaram de crianças e, em alguns casos, expulsou-os, mas normalmente não os excomungou, permitindo que continuassem recebendo o sacramento.

Desde a excomunhão, a irmã Margaret deixou seu cargo de vice-presidente e não consta mais na lista de executivos no site do hospital. Este informou que ela se demitira “a pedido do bispo” e que ainda trabalha em outro setor do hospital.

Fui informado sobre o caso da irmã Margaret por um conhecido que é médico do hospital St. Joseph’s.

Depois do que aconteceu com a irmã, ele enviou um e-mail para os amigos lamentando a excomunhão de uma “freira santa”.

“Ela é uma mulher gentil, humilde, de fala mansa, cuidadosa e espiritualizada, cujo lugar no céu foi reservado anos atrás. A ideia de que pudesse ser excomungada após décadas a serviço da Igreja e da humanidade literalmente me provoca náuseas. Cristãos verdadeiros, como a irmã Margaret, compreendem que a vida real é cheia de questões moralmente difíceis e rezam para que tomem a decisão certa à luz dos ensinamentos de Cristo. Somente um grupo de homens isolados e mimados, em túnicas douradas num balcão muito acima do resto de nós, poderia negar esses dilemas”, escreveu o médico, em sua mensagem.

Uma declaração do escritório do bispo não negou que a vida da mãe estivesse em perigo — embora notasse que nenhuma previsão médica é cem por cento segura. A implicação é que a Igreja teria preferido que o hospital deixasse a natureza seguir seu curso.

A hierarquia da Igreja Católica tem direito a seus pontos de vista.

Mas o episódio reforça a percepção dos seus líderes como rígidos, dogmáticos fora de contato com a realidade — e muito desconfiados diante da independência do pensamento das freiras americanas.

A irmã Margaret fez um julgamento difícil numa emergência, salvou uma vida e foi humilhada e punida por um raio fulminante emitido por um bispo que levou 16 anos morando em Roma e que devotou muito menos tempo ao serviço dos oprimidos do que a irmã Margaret. Compare as duas biografias e a da irmã Margaret parecerá muito mais com a de Jesus que a do bispo.

“Todo mundo que conheço considera a irmã Margaret a consciência moral do hospital”, escreveu Dr.

John Garvie, chefe do serviço de gastroenterologia do St. Joseph’s, em carta ao editor do jornal “Arizona Republic”. “Ela trabalha incessante e abnegadamente como exemplo vivo e campeã do cuidado apropriado e misericordioso aos doentes e agonizantes”.

Dr. Garvie disse-me mais tarde, num e-mail, que santa é a palavra certa para a irmã Margaret e acrescentou: “Ela é a personificação viva de Deus em nosso hospital. Ela sempre se certificou de que nós entendêssemos que estamos aqui para ajudar os menos afortunados. Realmente não há quem possa assumir seu lugar”.

Escrevi várias vezes sobre o abismo entre os líderes da Igreja Católica e as freiras, padres e leigos que frequentemente vivem a essência do Sermão da Montanha. Estes representam a grande alma da Igreja, que não tem a ver com vestes, mas com abnegação.

Quando uma hierarquia em sua maioria de homens idosos agride e excomunga uma freira reverenciada, que estava meramente tentando salvar a vida de uma mãe, a Igreja me parece quase tão fora de contato com o mundo real quanto esteve nos dias cruéis e corrompidos dos Borgia, no Renascimento

ARNALDO JABOR

Memórias da bactéria sem pai nem mãe
ARNALDO JABOR
O GLOBO - 01/06/10

"Eu comecei minha "vida" - chamemos assim - como bactéria; sim, uma daquelas primitivas de 2010. Eu já tinha sido um vírus, o PHI X 174, e acabei patenteado como uma espécie de micro "frankenstein", para os grandes lucros da Synthetic Genome Inc.
Mas, historicamente, tudo isso foi muito depois.
Antes de eu nascer, no início do século XXI, os cientistas apenas faziam um troca-troca de células entre espécies diferentes, coisa impensável durante 3 bilhões de anos, pois os seres vivos se encasulavam dentro de células impenetráveis. Isso provocou um Carnaval de mutações: genes de águas-vivas misturados com ratinhos brancos, cachorros iluminados como néon verde, minhocas coloridas com asas de borboletas, pequenos elefantinhos cruzados com pôneis para alegria da criançada, surgimento de seres até então considerados monstros como o anfiabaena, uma sucuri de várias cabeças, ou o humbaba, com garras de abutre, chifres de touro e pênis com cabeça de cobra, wufinicks, homúnculos-escorpiões.
O estranho de tudo isso era a coexistência dos gastos de bilhões de dólares nos laboratórios com a fome da África, com a boçalidade política destruindo o mundo, com a tecnociência fazendo milagres cercada de lixo, miséria e estupidez.
Nessa época, já se armavam nos desertos os confrontos nucleares no Oriente Médio, que poucos anos depois, como previsto, explodiram. Paquistão contra Índia, Israel contra o Irã, antrax na Broadway, arrasamento de Meca e Teerã.
Durante essas catástrofes descobriram o DNA sintético e começaram as mutações do nada em algo, a partir daquele meu remoto ancestral bacteriano de 2010, lembram? Era minha longínqua avó, a "mycoplasma genitalium", que habitava as paredes das vaginas e, "pour cause", evocava uma Eva dentro de uma boceta de Pandora, a gerar descendentes originais.
Isso fez a mídia esquecer toda a lixeira nuclear instalada, mares negros de petróleo, geleiras derretidas. O mundo se rejubilou: "Vida artificial! Somos deuses!..."
Grandes merdas, digo eu, hoje é tão óbvia a máquina da natureza...
Filósofos que meditavam sobre o ser mergulharam em depressões incuráveis, internados nos hospícios da Academia, assistindo em desespero invejoso a cientistas ganhando prêmios Nobel, tudo a partir daquele bichinho de onde eu vim, um puto que vivia em uretras e bocetas.
As mutações passaram a surgir em cascata. Das bactérias, os pesquisadores pularam para as algas, para os fungos, porque eles têm núcleo e cromossomos como animais, plantas e... nós... os supostos "homo sapiens". A partir daí, os progressos foram imensos e as combinações artificiais multiplicadas, sempre em nome da saúde, da medicina, do "bem" da humanidade.
Nasceram estirpes de seres "alienígenas" daqui mesmo da terrinha; era a Criação sem deus, a Criação ateia, a origem das espécies vindas do computador. Não mais os velhos macacos falantes do cruzamento de pigmeus com chimpanzés, não mais cangurus com cara humana, ou cavalos com asas de abutres, hidras domésticas ou sereias sexy em bordéis orientais. Isso era coisa do passado.
Apareceram os filhos do nada. E logo o mercado os cooptou. As elites se regalaram com escravos artificiais, como os Elois, artesãos incansáveis, vivendo sem comer, ou os Morlocks, operários cegos, trabalhando em subterrâneos e minas, ou os Golens, excelentes mordomos discretos. Também foi muito emocionante a renascença dos hominídeos Neandertal, que voltaram à vida, recriados a partir de um pedaço de unha fóssil. No entanto, o constrangimento foi grande logo depois; inicialmente utilizados como prostitutos, logo se descobriu que na realidade eles eram "homo sapiens", extintos há milênios, enquanto nós éramos os filhotes dos primitivos Neandertal. Prontamente, os "sapiens" incômodos foram exterminados por uma "epidemia" de laboratório.
A época foi um maná para terroristas genéticos, "hackers" da vida artificial, que criaram homens-bomba de nascença, que explodiam sozinhos, e vírus imensos que devoravam seus pesquisadores.
As maravilhas da ciência eram inócuas, dentro de uma sociedade fracassada. Nada de bom podia sair de raízes podres. Como não havia outra saída, a indústria do entretenimento (melhor dizendo, do esquecimento...) passou a produzir vida artificial para jogos e brinquedos.
A humanidade virou um parque temático de monstros inúteis, de videogames com seres vivos, criaturas perseguidas ao vivo por jogadores armados, criaturas-coisas, zoológicos de animais ornamentais nos mirando de olhos baços, numa idiotia de almas penadas.
Alguns cientistas ainda achavam que a Razão antiga poderia ser salva pela tecnociência. Mas a Razão nunca tinha havido, a não ser como um luxo francês e alemão no século XVIII. A insânia do mundo sempre fora invencível. Desesperados, eles entenderam que, no caos humano de 13 bilhões de desgraçados, o passado já tinha acabado e o futuro não chegaria nunca.
Foi nessa época que acabou o presente. Não havia mais presente - só um caldo borbulhante de nada. Não se tratava mais de bem e mal, de sensatez ou insânia, de causa ou efeito; nossa situação histórica e política era tão intrincada que ninguém mais tinha razão; as coisas tinham razões próprias e a vida era insolúvel, uma equação de mil incógnitas.
Só restava aos cientistas o acaso, quase a poesia. Continuaram a parir filhos dos algoritmos. Nasciam seres abstratos sem pai nem mãe, seres com algo de "anjos", metáforas vivas, fadas quase invisíveis, sentidas apenas por seus gemidos melódicos.
Surgiram formas líquidas como medusas, entidades compostas de calor como se viessem do início dos tempos, corações soltos no ar, sombras sem corpos. Os sábios entenderam então que tinham criado não a vida, mas o nada. A ciência era inútil. Tinha morrido a "falta", tinha morrido a morte, tinha morrido o vazio, o mistério; portanto, o desejo e a memória.Entre o ser e o nada, criáramos o nada, sob a luz impassível das galáxias sem rumo ou finalidade".

JOSÉ SIMÃO

Convoca o Frango do Carrefour!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 01/06/10


Um adolescente me disse que não vai votar na Dilma RouCHEFE porque ela vai estatizar o Playcenter!



BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta! Idoso faz sexo no ônibus e depois agride cobrador. Quero envelhecer assim! A aposentadoria não tá dando pra pagar o motel?
E, quando a pipa do vovô sobe, tem de aproveitar na hora, vai saber qual vai ser a próxima oportunidade! Balanço de busão dá um certo tesão mesmo! A culpa é do genérico do Viagra. E, como disse uma amiga: "Dá o telefone desse idoso. Tem 75 anos com toda essa bravura?". Temos de repensar a definição para idoso! Rarará!
E a Cópula do Mundo! A nova polêmica: A BOLA! Seleção reclama que a bola é leve. Então usa bola de boliche. Ou bola de bocha! E sabe como se diz ficar pelado em espanhol? EN BOLAS. Por isso o Maradona disse: "Se a Argentina ganhar, YO ME PONGO EN BOLAS!".
E fala pro Dunga levar o time de Vianas de São Bernardo do Campo. Goleiro: Icterícia. Zaga: Frango do Carrefour e Barrichello. O apelido do Frango do Carrefour é porque ele solta gases em campo e depois se desculpa: "Foi o frango do Carrefour! É que eu comi frango do Carrefour". Rarará! Meio campo: Manivela, Bin Laden e Zé Ruela. Laterais: Datena e Bundinha! E ataque: Salsicha, Arrombado e Gogoboy! Hexa garantido.
E saiu o novo slogan do Serra Vampiro: "Serra para presidente. DA BOLÍVIA!". E diz que, quando o Serra nasceu, a parteira olhou e empurrou: "Volta que ainda não tá pronto". Rarará! E um adolescente me disse que não vai votar na Dilma RouCHEFE porque ela vai estatizar o Playcenter! Rarará!
E o blog Sensacionalista mostra que o papa rebateu o Dunga: "Todo mundo gosta de sexo, até os padres". Aliás, eu digo: principalmente os padres. Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
Antitucanês Reloaded, a Missão! Continuo com a minha heroica e mesopotâmica campanha Morte ao Tucanês. É que no interior do Maranhão tem um bar chamado Barroca das Vacas. Ueba! Mais direto impossível. Viva o antitucanês. Viva o Brasil!
E atenção! Cartilha do Lula. O Orélio do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Fundo de pensão": lugar onde o companheiro guarda garrafa vazia, bicicleta e pneu velho! O lulês é mais fácil que o ingrêis. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã.
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

TUTTY VASQUES

Ora bolas!

Tutty Vasques 

O Estado de S.Paulo

Jogador de futebol que maltrata a bola não é novidade para ninguém. Que apanha dela, também não! Surpreendente nas notícias que chegam da África do Sul é a maneira rude como alguns craques que lá estão para comer a bola andam falando mal da parceira que vai rolar na Copa. Com fama de quem pega todas, Júlio César só faltou chamá-la de vagabunda em entrevista coletiva: "Parece dessas que você acha em supermercado!" - esculachou.
Se, como dizia Neném Prancha, "o goleiro deve dormir com a bola (se for casado, dorme com as duas)", Susana Werner pode ficar tranquila: seu marido está indo pra cama sozinho em Johannesburgo. Júlio César implicou, de cara, com a bola oficial do certame. "Coisa horrível!" Nisso, ele não está só: "Ela não te obedece!" - queixa-se o artilheiro Luís Fabiano. Palavra de "Fabuloso": "Essa bola tem vontade própria, ela é sobrenatural."
Armando Nogueira não previu nada disso quando escreveu "se Pelé não tivesse nascido homem, teria nascido bola". Não é, definitivamente, um bom momento para ser bola! O que estão pisando nela ultimamente é um exagero que pode trazer consequências desastrosas aos detratores. Vale lembrar a máxima de Muricy Ramalho: "A bola pune!"
A bola da vez
"O problema da bola da Adidas é que ela não é da Nike!"
WASHINGTON OLIVETTO, PUBLICITÁRIO

Mal comparando
"Meu carro é muito pior que esta porcaria de bola!"
RUBINHO BARRICHELLO, PILOTO
Cavalheiro
Felipe Melo comparou a bola da Copa a uma jovem "patricinha". Como assim? "Ela não quer ser chutada de jeito nenhum!" Resta ao volante da seleção bater nos adversários.

Jabulani é a...
O repentino descontrole da bola pode ter origem no apelido que ela ganhou na fábrica da Adidas. Jabulani - "celebrar", no dialeto zulu -, cá pra nós, é dose.

Implicância mútua
Júlio também achou a bola da Copa "muito ruim"! Precisa ver, no caso, o que a bola acha dele. Faz tempo que os dois não se dão!

Obrigação contratual
Kaká tem um motivo a mais para não fazer feio nesta Copa: já basta a seu patrocinador de chuteiras, a Adidas, o desgosto que vem amargando com as críticas à bola que fabrica para a Fifa.

Ele já sabia
De João Cabral de Melo Neto, que muito antes de Júlio César, Luís Fabiano, Felipe Melo e Júlio Baptista percebeu algo de estranho no comportamento da bola de futebol: "É um utensílio semivivo, de reações próprias como bicho, e que, como bicho, é mister (mais que bicho, como mulher) usar com malícia e atenção, dando aos pés astúcias de mão."
Última instância
William Bonner está que não se aguenta de curiosidade: "O que será que a Fátima Bernardes vai achar da bola quando chegar à África do Sul?" 

GOSTOSA

XICO GRAZIANO

Motosserra sem ideologia
XICO GRAZIANO 
O Estado de S.Paulo

''Há quem imagine que pequenos agricultores sejam mais ecológicos que grandes produtores rurais. Políticos que se julgam da "esquerda" propagam que a agricultura familiar faz bem à natureza, enquanto o agronegócio destrói o meio ambiente. Pura ideologia. Nunca nenhum estudo da realidade comprovou isso.

O equívoco desse pensamento mostra origens remotas. Desde 1775, quando o filósofo francês Jean-Jacques Rousseau, em seu famoso discurso sobre a origem da desigualdade, conceituou o "bom selvagem", constrói-se certa imagem de que o homem perdeu sua pureza no processo civilizatório. Antes, vivia em harmonia total. Depois, chegou a maldade sobre a Terra.

O raciocínio bem-aventurado procura se aplicar, hoje, aos indígenas. Ambientalistas argumentam que os povos da floresta, na Amazônia, por exemplo, vivem de forma ecológica. Avatar, belo filme, sublima essa questão, agradando sobremaneira aos defensores da natureza. Antropólogos, todavia, não corroboram facilmente tal ideia.

Orlando Villas Bôas, uma legenda nacional, afirmava serem os índios, que conhecia tão bem, nada ecológicos. Ao visitar a Unesp de Jaboticabal, nos anos 1980, contou uma pequena história aos alunos de Ciências Agrárias. Disse o grande indigenista que, certo dia, ao ver um índio derrubar uma palmeira de açaí para lhe retirar o cacho e colher os negros frutinhos, perguntou-lhe: "Por que você não sobe e corta apenas o cacho, sem derrubar a palmeira?"

O índio não entendeu: "Qual é o problema?"

"Ora", retrucou Villas Boas, "evitar a devastação da floresta!"

Mas o índio explicou: "Não se preocupe. Eu corto esta palmeira aqui, mas lá tem outra, outra lá adiante, tá cheio de açaizeiro por aí...". Para o índio, era infinito o estoque de palmeiras. Podia surrupiar à vontade.

Sem entender a História não se compreende a questão ambiental de nosso tempo. A pressão sobre os recursos naturais do planeta tornou-se um problema apenas após a intensa industrialização do século 19. Sua plena percepção ocorreu tão somente há 50 anos, quando a agenda da degradação entrou na preocupação pública. Quem criou o problema ecológico foi a explosão populacional humana.

Nem os brasileiros coletores da floresta, nem os índios norte-americanos caçadores de bisões tinham pensamento ecológico. Estes, quando descobriram os rifles dos mercadores de peles, ajudaram a destruir, sem piedade, o rebanho dos peludos bichões. A tecnologia potencializou a destruição da natureza.

No Brasil, a discussão sobre ecologia e tamanho da propriedade permeia os estudos sobre reforma agrária. Os agraristas ortodoxos, normalmente de origem comunista, nunca mostraram nenhuma predileção pelo tema da preservação ambiental. Sempre propugnaram pela desapropriação das "áreas ociosas" no campo, pouco se importando se elas estavam cobertas com florestas originais. Sua visão produtivista se aproximava da manifestada pelos desbravadores do território, com a diferença, claro, de que a terra deveria estar dividida, não concentrada. Menos mal.

Na história da reforma agrária brasileira contam-se infindáveis casos em que os projetos de assentamento rural recaíram sobre valiosas áreas naturais, seja em florestas densas do Pará ou de Mato Grosso, seja nos remanescentes de mata atlântica interiorana, seja nos frágeis ecossistemas litorâneos do sul da Bahia ou no Rio Grande do Norte. Onde procurar se acha um estrago ecológico, cometido em nome do combate à miséria rural.

O complicado tema veio à tona da opinião pública em 1997, num relatório apresentado à CPI do Congresso Nacional que investigava a atuação de madeireiras asiáticas na Amazônia. O então deputado federal Gilney Vianna, do PT-MT, demonstrou que 50% do desmatamento da região advinha dos assentamentos de reforma agrária. Os pequenos desmatavam tanto quanto os grandes. Deu um quiproquó na esquerda.

Nota do núcleo agrário do PT desmoralizou o relatório e enquadrou seu político rebelde, baixando o silêncio sobre o assunto. A senadora Marina Silva, defensora dos assentamentos extrativistas, também se aquietou. Mas não havia como tapar o sol com a peneira. Os sem-terra, tanto quanto madeireiros e grandes fazendeiros, faziam arder a floresta sem dó. Machado e motosserra não têm ideologia.

Novos estudos, mais recentes, especialmente os conduzidos pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), comprovam que boa parte da pressão contra a floresta amazônica se origina da reforma agrária. Sem maldade. Nem exclusivo é da Hileia. Na caatinga nordestina, que sofre uma tremenda ameaça, a lenha vira cinza na cozinha das famílias pobres do Semiárido. Subsistência básica.

Meses atrás, quando Carlos Minc ainda ocupava o Ministério do Meio Ambiente, patrocinou-se uma proposta estranha que concedia brechas no Código Florestal para os agricultores familiares, discriminando os demais produtores. Nada indica que esse favorecimento ajude a preservação ambiental do País. Reservas florestais belíssimas são mantidas por grandes fazendeiros.

A ideia do "small is beautiful" serviu a Ernest Schumacher, um visionário escritor inglês de origem germânica que defendia, na década de 1970, as tecnologias brandas, menos intensivas em recursos naturais. Seu famoso livro com esse título inspirou esse viés do ambientalismo, ultrapassado pelo avanço da tecnologia. Qualidade ambiental independe do tamanho do negócio rural.

Passarinhos que o digam. Eles nunca perceberam distinção entre as crianças que os caçam impiedosamente com estilingue e os adultos que os aprisionam para cantar na gaiola. Quem faz a diferença é a consciência humana. Depende da educação.

AGRÔNOMO, É SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO.

MÔNICA BERGAMO

De igual para igual 
Mônica Bergamo 

Folha de S.Paulo - 01/06/2010

As construtoras Tenda, uma das maiores do país, e Civic estão sendo processadas pela Promotoria do Consumidor de SP sob acusação de realizarem práticas supostamente abusivas.
As empresas colocam em contrato uma tolerância de seis meses para o prazo de entrega dos imóveis -enquanto o mutuário está sujeito a juros e multa quando atrasa em um dia o pagamento das prestações. Só no caso de o recebimento das chaves atrasar um semestre é que o consumidor recebe indenização da Tenda. A Civic não prevê ressarcimento.

TOLERÂNCIA
A Tenda diz que não foi notificada, mas que seus contratos "estão de acordo com a lei vigente" e sua validade já foi "atestada" anteriormente pelo Ministério Público. A Civic não comenta.

ESQUEMA NA COPA
Susana Werner, mulher de Júlio César, goleiro da seleção brasileira, diz que não irá acompanhar o marido na África do Sul. "Aconselharam as famílias a só irem [para a África] se tiverem um esquema [de segurança]", diz.

SÓ PAGANDO
Enquanto o conselho do Corinthians discute mais um projeto de construção do futuro estádio do clube, seu presidente, Andres Sanchez, continua rejeitando, ao menos publicamente, a hipótese de arrendar o "Piritubão", arena que a prefeitura pode construir para a Copa de 2014, na zona norte de SP. "Ou o Corinthians faz um estádio próprio ou usa o da prefeitura ou de um clube coirmão, mas pagando aluguel. Ponto", diz.

ÁGUA PRÓPRIA
A presidente Cristina Kirchner, da Argentina, levou sua própria água ao almoço do 3º Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, na sexta, no Rio. Cristina exigiu que os garçons do Laguiole abrissem as garrafas de água Glacier na sua frente.

ARMAS DA PÁTRIA
O Instituto do Patrimônio Histórico, por meio do advogado Paulo Morais, entrou com ação pública na Justiça Federal pedindo liminar para que armas com valor histórico não sejam destruídas pela Polícia Federal. Muitas delas foram recolhidas pela campanha do desarmamento, iniciada em 2004.

TOCA RAMONES
Richie Ramone, ex-baterista dos Ramones, se apresenta no Vegas no dia 10. O show faz parte da comemoração de cinco anos do clube.

PULA A FOGUEIRA

Gilberto Gil realizou no sábado seu arraial, o São João Carioca, na Quinta da Boa Vista, no Rio. O músico contou que esteve com Lula na semana passada. Falaram de Irã e de outros temas, mas não tocaram em um assunto delicado: o apoio público do ex-ministro da Cultura à candidatura de Mariana Silva à Presidência. Indagado se havia falado com o presidente antes sobre a sua escolha, Gil respondeu: "Não tenho que declarar meu voto para ele. Já servi ao governo e fiz o meu melhor".

TIJOLO POR TIJOLO
Depois do Centro de Informações Turísticas (CIT) da rua Frei Caneca, para o público GLS, a prefeitura vai inaugurar novas unidades, menos segmentadas, no Mercado Municipal e na praça da República. A SP Turis também planeja abrir um CIT no aeroporto de Congonhas, mas enfrenta duas dificuldades: aluguel caro e falta de espaços disponíveis.

A DOR DE KAKÁ
De Kaká sobre a lesão que o deixou fora dos campos por um período, em entrevista à revista "ESPN", nas bancas hoje: "Eu treinava, treinava e parecia que as coisas não aconteciam. A lesão parece que nunca vai desaparecer. E a pubalgia é ruim, porque você sente no dia a dia. Levanta da cama e sente dor, sai do carro e sente dor".

PEDRAS ROLANTES
A exposição "Mulheres de Brecheret", do MuBE, irá para a Bélgica em 2011, como parte de uma série de eventos culturais sobre o Brasil no país. A mostra irá "desfalcada" de duas esculturas: "Torso" e "Morena", que pertencem ao Instituto Victor Brecheret e ficarão, em comodato, no museu paulistano.

NOVO TALENTO
José Geraldo, revelado no filme "Linha de Passe", de Walter Salles, será um dos protagonistas de "Corda Bamba", de Ugo Giorgetti. O longa fala da prisão da trupe americana Living Theatre, no Brasil, em 1971, durante a ditadura militar.

CURTO-CIRCUITO

A Fundação Gol de Letra comemora dez anos hoje com festa no hotel Unique, a partir das 19h30.

O empresário Eike Batista dá palestra para os alunos da Faap, hoje, às 10h.

A Fundação Bienal promove hoje, às 20h30, jantar no shopping Iguatemi para divulgar os artistas que participarão da 29ª Bienal, em SP.

O restaurante Le Marais Bistrot lança hoje novo cardápio com receitas feitas com trufas negras.

O livro "Esqueleto na Lagoa Verde", de Antonio Callado, tem lançamento hoje, às 19h, na Livraria da Travessa, no Rio de Janeiro.

BAR ZIL

LUIZ GARCIA

Nem pediram
LUIZ GARCIA
O GLOBO - 01/06/10

A maioria dos países mantém relações exteriores pela mesma razão que leva a maioria das pessoas a participar de reuniões de condomínio: a necessidade de ter paz e sossego em casa. O que não impede a existência de motivos subalternos: exibir prestígio e conquistar liderança, por exemplo.

A segunda hipótese parece ser o caso da inédita parceria entre o presidente Lula e o primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan. Não se discute a natural amizade entre os dois países, fortalecida por uma forte e bem-vinda emigração turca. Mas, na diplomacia mundial, eles têm em comum apenas a circunstância de serem, no momento, membros do Conselho de Segurança da ONU.

Em termos de pão, pão, queijo, queijo, a Turquia tem negócios que lhe interessam com o Irã: com o apoio pessoal de Lula, o Irã acaba de assinar um acordo com o país para a troca de urânio enriquecido.

O que ganhou o Brasil com isso? Notícia na mídia e, por enquanto, mais nada.

E isso pagando o preço de irritar o governo americano, nosso aliado natural e necessário. Segundo a secretária de Estado Hillary Clinton, existem, a propósito desse episódio, “discordâncias muito sérias” entre Washington e Brasília. Por motivo fácil de entender: o Irã — não por acaso, e sim devido à postura belicosa e ameaçadora dos aiatolás — não é considerado parceiro confiável pela comunidade ocidental (da qual, não deveria ser necessário lembrar, o Brasil faz parte).

Tanto o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, como Hillary reagiram mais ou menos da mesma maneira às negociações de Lula com os aiatolás: se levassem o Irã a adotar, de forma clara e confiável, uma política nuclear pacífica — em suma, muitas usinas e nenhuma bomba — parabéns para o brasileiro. Como isso não aconteceu, o Brasil está sendo cúmplice, ingênuo mas voluntário, de ações imprevisíveis de um país governado por fanáticos.

Lula respondeu à preocupação da secretária de Estado dos EUA e do secretáriogeral da ONU acusando-os do feio pecado da inveja: “Nós fizemos o que eles estão tentando fazer há muitos anos e não conseguiram.” É uma reação, para dizer o menos, ingênua.

A belicosidade e a arrogância dos aiatolás não foram inventadas pela CIA.

Negociar com o Irã não é inadmissível.

Mas depende do que se obtém em troca do que se oferece. Lula e Erdogan teriam direito à inveja do resto do mundo se tivessem obtido de Teerã a expressão de um desejo de paz e boa convivência com o resto do mundo. Não conseguiram nada disso. Pelo visto, nem pediram.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Cartão de crédito voltado para o público gay será anunciado hoje 
Maria Cristina Frias

Folha de S.Paulo - 01/06/2010



Será anunciado hoje, no evento de apresentação da edição 2010 da Parada Gay de São Paulo, um cartão de crédito voltado ao público GLS, o Arco Íris Card.

O banco emissor será o Ficsa, que está em negociação com uma importante bandeira de cartões.

O produto deve entrar em operação no segundo semestre deste ano, segundo Alessandra Botelho, executiva de marketing do banco.

"É mais um cartão de afinidade. O cliente não é necessariamente gay, é alguém sensível à causa. Não acreditamos que vá ter preconceito contra os portadores. Concluímos que o mundo já está aberto o suficiente e decidimos criá-lo", diz Botelho.

A meta é alcançar 120 mil cartões dentro de cinco anos.

Será criado um fundo para contribuição com estudos sobre cura da Aids e entidades ligadas à causa.

Também estão previstos benefícios como programa de milhagens, seguros e títulos de capitalização, afirma Carlos Rito, sócio da JJCL Brasil Cartões, responsável pela criação do produto.

"A ideia é aproveitar o crescente poder de compra deste público e criar benefícios que retornem à comunidade", afirma Rito.

CORTE E COSTURA
O grupo Dudalina expande fábrica e começa a confeccionar as próprias malhas. "Sempre fomos uma camisaria tradicional e agora resolvemos investir em quatro teares de malharia para fabricar todos os nossos produtos", diz Sônia Hess de Souza, presidente da Dudalina. Para abrigar as novas máquinas, foi construído um novo galpão de 2.000 m2 na fábrica de Luiz Alves (SC). O grupo, que conta com seis franquias no país, a Dudalina Concept, planeja abrir mais nove lojas até o final do ano que vem. "Estamos começando a aprender a conjugar o verbo "franquear", que é diferente do "fabricar'", diz Souza. Ainda em fase de desenvolvimento, está a abertura de uma loja própria na cidade de São Paulo até o final deste ano, segundo Souza.

MAU HUMOR NA ECONOMIA
A turbulência no cenário internacional já afeta os ânimos dos economistas no Brasil. O nível de confiança dos economistas caiu 6,7% em maio na comparação com o mês anterior, de acordo com o Índice de Sentimento dos Especialistas em Economia, realizado pela Fecomercio SP, em parceria com a Ordem dos Economistas do Brasil.

A crise na Grécia foi um dos principais motivos para a queda do indicador, que recuou para 102,7 pontos -quase no limite entre o otimismo e o pessimismo.

O índice é medido em uma escala que vai de 0 a 200 pontos. Acima de cem pontos, já denota otimismo.

TERCEIRIZADO
O Brasil alcançou mais de 31 mil empresas de serviços terceirizáveis que, juntas, faturam acima de R$ 43 bilhões ao ano, segundo levantamento da Asserttem (Associação Brasileira das Empresas de Serviços Terceirizáveis e de Trabalho Temporário).

A região Sudeste é a que concentra a maior parte desse montante, com R$ 22,52 bilhões em 2010, seguida pelo Sul. As duas regiões são as que mais contratam empresas especializadas na prestação de serviços terceirizados.

O país possui hoje mais de 8 milhões de trabalhadores terceirizados, segundo a entidade.

A remuneração mensal desses profissionais paga pelas empresas é de cerca de R$ 918.

Jovens em primeiro emprego representam 12,5% das vagas preenchidas.

MAPA DAS MINAS
O Tostes & Coimbra Advogados é o primeiro escritório do Sudeste a abrir uma filial no interior inóspito da região Norte.

Os advogados seguem a trilha da mineração e de grandes fornecedores que, ao se estabelecerem em Parauapebas, interior do Pará (834 km de Belém), levaram riqueza à cidade.

O município, onde está o Projeto Carajás, da Vale, foi em 2009 o que mais recebeu recursos da Cfem (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), de R$ 165,7 milhões, segundo o Ministério de Minas e Energia.

Além do minério de ferro, há na região importantes jazidas de manganês, níquel, cobre, estanho, alumínio e ouro.

A cidade enriqueceu de tal forma que o dono de uma borracharia alugou seu espaço por R$ 30 mil e passou a viver de renda, assim como o dentista, dono da casa onde o Tostes & Coimbra se instalou, conta Marcelo Tostes.

A inauguração do novo escritório permitirá um atendimento mais ágil.

"Será o nosso diferencial: um escritório grande, com atendimento local", diz Tostes.
Com escritórios em Belo Horizonte, Brasília, São Paulo e Itaúna (MG), a banca atua nas áreas de mineração, siderurgia, energia, transporte e infraestrutura.
DigitalQuatro anos após a aprovação de lei sobre a informatização da Justiça, um levantamento realizado nos 92 tribunais brasileiros identificou que 3,3 milhões de processos já foram digitalizados. O número representa cerca de 5% dos 70 milhões de processos existentes no país. A pesquisa é do advogado Alexandre Atheniense, titular do Aristoteles Atheniense Advogados, de Belo Horizonte.
Em altaA receita dos hospitais particulares cresceu 8,8% em 2009 (R$ 6,5 bilhões), na comparação com 2008, segundo levantamento da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados).

GOSTOSA

MERVAL PEREIRA

Transferência de votos 
 Merval Pereira 
O Globo - 01/06/2010

A vitória, na Colômbia, do candidato governista, Juan Manuel Santos, com mais do dobro dos votos do segundo colocado, o candidato do Partido Verde, Antanas Mockus (47% contra 21,5%), trouxe novamente para o primeiro plano político a discussão sobre a capacidade de transferência de votos de um líder político.

Como aqui no Brasil, onde Lula tem até 80% de aprovação, também na Colômbia o presidente Álvaro Uribe tem o mesmo nível de popularidade e, pelas pesquisas de opinião, até uma semana antes da eleição, parecia não estar conseguindo transformar em votos para seu candidato esse enorme prestígio popular.

As pesquisas, que indicavam empate entre os dois candidatos, erraram clamorosamente como se viu, mas este não é um ponto comum com as nossas eleições.

Domingo, logo que o resultado oficial foi proclamado na Colômbia, participei no Jornal das Dez, da Globonews, de um debate sobre os resultados, em que o professor de Relações Internacionais da UFRJ Marcelo Coutinho chamou a atenção para a diferença entre os institutos de pesquisas dos países andinos e os nossos.

Segundo ele, em geral, as pesquisas nos países andinos erram muito. Erraram nas eleições peruanas, bolivianas, equatorianas. Costumam ter uma margem de erro superior à dos institutos de opinião brasileiros ou chilenos, que são de melhor qualidade. A razão é a dificuldade de chegar a alguns recantos do país, especialmente no interior.

Outro erro grave foi o do terceiro colocado, Germán Vargas Lleras, que recebeu 10% dos votos e aparecia em quinto ou sexto lugar nas pesquisas eleitorais de uma semana antes da eleição.

Já o cientista político Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise, aponta outra razão para os erros dos institutos de pesquisa.

Com o voto facultativo, eles não conseguem prever quem vai e quem não vai votar, aumentando assim a margem de erro. O voto na Colômbia não é obrigatório, mas a abstenção de 45% acontecida na eleição de domingo está dentro da média histórica.

O candidato do Partido Verde, Antanas Mockus, disse na campanha que as políticas sociais do presidente Lula servirão de base para sua atuação, caso se eleja.

O professor Marcelo Coutinho comenta que, embora Mockus se espelhe em Lula, disse em outro momento da campanha que simpatizava com o tucano José Serra.

Ele é de uma vertente socialdemocrata que o aproxima de lideranças de esquerda que defendem uma maior intervenção do estado.

Chegou a dizer que é favorável ao aumento da carga tributária na Colômbia para apoiar políticas públicas.

O interessante é que essa vitória do candidato do presidente Álvaro Uribe é boa para a tese de Lula de que a popularidade se transforma em votos, mas ele e o PT estavam torcendo pela vitória de Mockus.

Assim como Chávez, da Venezuela, que anunciou seu apoio ao candidato do Partido Verde da mesma maneira que fez com a candidata petista Dilma Rousseff.

O professor Marcelo Coutinho destaca que Mockus conseguiu 21% dos votos, e, em 2006, a oposição, liderada pelo Polo Democrático Alternativo, teve os mesmos índices, o que demonstra que não houve um aumento do número de oposicionistas.

Uma característica da eleição colombiana foi que, dos nove partidos que lançaram candidatos à Presidência, apenas um se diz de esquerda, todos os outros são de direita.

É justamente o Polo Alternativo Democrático, que hoje está, junto com os partidos Conservador e Liberal, fora do centro político depois de terem dominado a política colombiana por muitos anos.

Por isso, Coutinho destaca como fator decisivo da vitória de Santos, além da popularidade de Uribe, a hegemonia do grupo político conservador, que vai além do próprio Uribe.

Juan Manuel Santos tem uma história política que remonta ao ex-presidente Andrés Pastrana, de quem foi ministro da Fazenda. Esse grupo está há muitos anos no poder, e há uma hegemonia conservadora na Colômbia.

Esta seria uma diferença fundamental em relação à candidata de Lula, que não tem tradição política, nem mesmo dentro do PT.

E nem está ligada aos pontos de sucesso do governo Lula, embora ele tente transformar o PAC em um sucesso, e fazer de Dilma a responsável por tudo em seu governo.

Outra diferença básica é que, na eleição brasileira, todos os candidatos principais são de esquerda.

Mas a maioria do eleitorado brasileiro se declara de direita ou no máximo de centro, como demonstrou uma pesquisa do Datafolha. Nada menos de 37% das pessoas se dizem entre a centro-direita e a extrema-direita. E só 20% entre a centro-esquerda e a extremaesquerda.

Dos eleitores de Dilma Rousseff (PT), 35% se dizem de direita, 26% de esquerda e 16% de centro. No caso de José Serra (PSDB), há 43% de direita, 17% de esquerda e 18% de centro.

A transferência de votos de um presidente popular, como Lula ou Uribe, estava em xeque depois de outra eleição envolvendo um presidente popular, Michele Bachelet, do Chile, que não conseguiu eleger seu candidato.

No Chile, porém, Bachelet não se meteu na campanha no primeiro turno, e quando decidiu pedir votos para seu candidato no segundo turno, Eduardo Frei subiu com força e ficou somente a dois pontos de distância de Sebastião Piñera no placar final.

Na Colômbia, Uribe tem feito campanha à beça, e, no Brasil, Lula está empenhado na eleição de Dilma Rousseff, ressalta o cientista político Alberto Carlos Almeida.

Outra semelhança entre a eleição da Colômbia e do Brasil é que em ambos os pleitos os dois presidentes estão disputando um terceiro mandato por intermediários.

Uribe só não disputou diretamente por que o Supremo proibiu. Lula não chegou a pleitear formalmente continuar no poder, mas está tentando convencer seus seguidores de que Dilma será ele no governo novamente.

PAINEL DA FOLHA

Contrato de gaveta
RENATA LO PRETE

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/06/10

Ainda que as cúpulas do governo e do PT tratem o acordo que fará de Hélio Costa o candidato único do lulismo em Minas como líquido e certo, o PMDB tratou ontem de deixar claro que precisa desta definição antes da convenção do partido, em 12 de junho, destinada a sacramentar a aliança nacional e a aclamar Michel Temer como vice de Dilma Rousseff.
O PMDB quer que o petista Fernando Pimentel formalize a retirada da disputa mineira até dia 6. Do contrário, ameaça adiar a convenção para dia 26. "Não se trata de pressão indevida", diz o líder do partido na Câmara, Henrique Alves. "Isso foi combinado."


Hora de retribuir. Na cúpula da campanha petista, é dado como certo que, resolvida a questão mineira, aumentará a pressão sobre o PMDB no Pará, onde Jader Barbalho lançou um correligionário para enfrentar a petista Ana Júlia, e em Estados onde candidatos a governador flertam com os tucanos, caso do Rio Grande do Sul.

O passado... Na tentativa de demover o governador Orlando Pessutti de se lançar candidato no Paraná, abrindo espaço para uma composição entre o seu PMDB, o PT e o PDT do senador Osmar Dias, que encabeçaria a chapa, coloca-se à mesa o argumento de que denúncias relativas à passagem de Pessutti pela Assembleia Legislativa, mergulhada num escândalo de desvio de recursos públicos, podem vir à tona durante a campanha.

...te condena. Pessutti conversa hoje com Michel Temer em Brasília. Amanhã, será recebido por Lula.

Sorria! O PT montará um pequeno estúdio no centro de eventos onde acontecerá a convenção da sigla, em 13 de junho, para que Dilma tire fotos com candidatos a deputado e a governador, petistas e de siglas aliadas, além de prefeitos que serão instados a se engajar na campanha.

Pilha. Coordenador da campanha de Serra, o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, convocou a bancada de deputados do partido para reunião amanhã, na qual cobrará mobilização nos Estados em prol da convenção do próximo dia 12 em Salvador.

Monólogo. Novo atrito entre PSDB e DEM: este último queria aproveitar a convenção que vai aclamar Serra para lançar, no mesmo ato, a chapa de Paulo Souto (DEM) ao governo da Bahia. O deputado tucano Jutahy Jr., próximo de Serra e historicamente anti-Souto, foi contra.

Em coro. Sem a presença de Lula, as centrais sindicais escalaram seis políticos do bloco pró-Dilma para discursar no megaevento de hoje em São Paulo: Edinho Silva (PT), Luiza Erundina (PSB), Miguel Torres (PDT), Renato Rabelo (PC do B), Washington Santos (PMDB) e Miguel Manso, do nanico PPL.

Profissional. No evento será anunciada a recém-concedida autorização do MEC para a abertura da Escola Dieese de Ciências do Trabalho, que oferecerá bacharelado para um público mais amplo e cursos de extensão para formar dirigentes sindicais.

Pode deixar. Em almoço na semana passada no apartamento de Paulo Maluf (PP) em Brasília, o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) ouviu do deputado que a candidatura de Celso Russomano ao governo paulista será mantida a todo custo. Isso é música para o PT. Quanto mais nomes na disputa, mais a chance de levar Aloizio Mercadante para um segundo turno com Geraldo Alckmin (PSDB).
com LETÍCIA SANDER e DANIELA LIMA

tiroteio

Daqui a pouco o Serra aparecerá no programa de seu próprio partido e dirá que não sabia da gravação.
DO VEREADOR JOÃO ANTONIO (PT-SP) em resposta ao tucano, que justificou seu protagonismo no programa do DEM alegando que "botaram minha imagem lá".

contraponto

Arquivo confidencial

José Serra relatou em seu Twitter diálogo travado com uma secretária de Saúde durante recente evento da área realizado no Rio Grande do Sul.
-Qual é seu município?- indagou o candidato.
-Segredo- respondeu a moça.
-Mas por que você não me conta?- insistiu ele.
-É segredo- repetiu ela.
-Mas por quê?- tentou ele outra vez.
Ela então resolveu pôr fim ao interrogatório:
- José Serra, Segredo é o nome da minha cidade!

ISRAEL

BRASIL S/A

Ambição limitada
Antonio Machado

CORREIO BRAZILIENSE - 01/06/10

Sem ajustes, faltará ao sucessor a folga fiscal e financeira que projetou a popularidade de Lula


Dos problemas fiscais do final do governo Lula, não há nenhum que se desconheça. Foi generoso com o gasto corrente, conciliando com todos os grupos que poderiam lhe trazer dissabores — de ruralistas ao funcionalismo federal, de industriais, sem distinguir origem do capital, aos sindicalistas, dos partidos aliados aos militares.

Das reformas que poderiam criar-lhe desconforto político, ele as largou pelo caminho depois da reeleição — da previdenciária, que foi estudada em profundidade durante a gestão do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, à sindical e trabalhista, ambas tratadas a certa altura como certezas pelas sindicalistas ligados ao PT.

As reformas estancaram, mas a estabilidade fiscal pôde ser tocada sem sobressaltos, graças ao superavit primário do orçamento, com o qual se manteve a trajetória de queda da dívida pública em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), que basicamente é o que importa aos financiadores dos papéis do Tesouro. Tal relação subiu, devido à crise global, de 38,4% do PIB em 2008 para 42,9% no ano passado.

Em 2009, o superavit considerado ideal pelo próprio governo para que a dívida sobre o PIB desenhe uma curva de queda, 3,3% do PIB, não só não foi alcançado, como não foi zerado por magia contábil. Este ano permanecem dúvidas, mas a arrecadação voltou a disparar.

Se o presidente Lula deixar sua condescendência com os aliados, vetando pelo menos parte do derrame de despesas inventadas pelo Congresso, há chances de que a meta seja cumprida e até a exceda.

Esse cálculo é político: o que não abalar as alianças partidárias em torno da candidatura de Dilma Rousseff nem comprometer os votos que possam fazer falta nas eleições em outubro deverá passar pela navalha da Presidência. O resto fica. São maiores as chances para o aumento de 7,7% das aposentadorias do INSS acima de um salário mínimo aprovado no Congresso, contra 6,14% do projeto do governo.

A partir daí começam as incertezas fiscais. Não de solvência, que a rigor não preocupa, mas sobre o que será possível fazer em 2011.

Os mimos devem rarear
É provável que o QG de Dilma, que tem o handicap do acesso aos números, já tenha idéia sobre o que a aguarda, elegendo-se, em termos de autonomia política, prioridades e estilo de governança.

A liberdade para gastar será menor, o que dificultará a política partidária de distribuir mimos para enfraquecer opositores. Mas não é nesse plano que se põem as diferenças entre Lula e sucessor. Não há ninguém na praça capaz de emulá-lo do alto de um palanque.

A questão é que o sucessor não terá o cimento sobre o qual Lula construiu a sua popularidade amazônica: fartura de financiamentos nos bancos federais e folga orçamentária. O ativismo empreendedor do governante depende destas variáveis. E elas serão limitadas.

Um mínimo de confusão
O sucessor terá de começar sua gestão com cautela já ao tratar do aumento do salário mínimo (SM), que será fixado no orçamento deste ano. A sua regra de correção implica confusão para 2011. E ruídos em 2012. O SM está indexado à variação do PIB de dois anos atrás, quando houve recessão, e à inflação pelo INPC do ano anterior.

Este ano a inflação pode ir a 6%. Mas o PIB de 2009 caiu 0,2%. Ou seja: pela regra vigente não haverá aumento real em 2011. A folga relativa desaparece para 2012, quando, pela mesma regra, aplica-se a variação do PIB este ano, prevista pelo mercado em torno de 7%, mais a inflação — 4,5%, se voltar ao centro da meta até lá.

Legitimidade para agir
Fazendo a conta, constata-se que já está contratado quase 12% de aumento do SM para 2012, que vai reajustar as aposentadorias e os salários-base sobre os quais são calculadas as gratificações e as bonificações na área pública. É um dinheirão. Se a arrecadação não crescer acima de tais gastos, o novo governo nem sairá da estação.

O risco de que os frutos do crescimento escoem para o ralo é uma perspectiva medíocre para 2011 em diante. Isso não deve acontecer.O sucessor de Lula terá legitimidade e espaço fiscal para segurar o gasto público, sem criar tumultos. É o que se espera que faça. Se não o fizer, os investimentos em infraestrutura vão secar, com o agravante de que o sucessor não terá a favor a economia global.

Para onde Dilma vai
Os limites fiscais para o crescimento insinuam as reformas que já estão sendo pensadas pelos candidatos à cadeira de Lula. Crescer e distribuir são as diretrizes consensuais. As variações de ênfase é que os diferenciam. Nenhum candidato as explicitou, e é improvável que o façam em campanha. O relevante é que não há como continuar o crescimento à base de 5% ao ano sem o aumento dos investimentos em relação ao PIB, bem como de sua contraface, a poupança doméstica.

Nesse figurino, a variável-chave é o deficit nominal do orçamento fiscal, que influencia a formação da taxa de juros. Sem pressão do Tesouro no mercado para financiar a dívida, os juros caem. E juros menores condicionam a afluência do mercado de capitais.

Outros ajustes, envolvendo impostos e o Banco Central, ajudariam a liberar o crédito privado, permitindo à banca atuar em paralelo ao BNDES no financiamento de longo prazo da indústria. E à CEF no mercado imobiliário. Tal agenda, que já frequenta o discurso de Dilma, esvazia a importância do BC sem tirar seus atributos, o que é diferente de fazê-lo de vilão, conforme a retórica da oposição.