domingo, maio 26, 2019

PSDB acima de tudo, PT acima de todos - MARIO VITOR RODRIGUES

GAZETA DO POVO - PR - 26/05

Revelada a barafunda que é o governo Jair Bolsonaro, começam a surgir querelas em torno de quem são os responsáveis pelo rumo escolhido em outubro último. Como se sabe, ainda que doa admitir, a resposta para essa pergunta é simples: todos nós. Entretanto, é justo ponderar os pesos.

Quanto é culpado, por exemplo, o sujeito que na véspera do pleito resmunga pelo fato de ter de comparecer à zona eleitoral e só se preocupa em escolher os seus candidatos em cima da hora — contentando-se em resolver a questão por meio de indicações de amigos e parentes?

Qual peso deve recair sobre quem apenas atenta para os cargos de prefeito, governador e presidente, desdenhando em absoluto os mandatos de vereador, deputado e até o de senador da República?

Qual é a responsabilidade daqueles que, mesmo sendo experientes, cultos quando se trata de política, deixam-se levar por paixões, colaborando para o sucesso de verdadeiras seitas e o aprofundamento da dicotomia?

E o que dizer, por fim, de uma sociedade que ainda não percebeu a existência de um sistema político-eleitoral contrário aos seus interesses — do qual é vítima e mesmo assim sócia —, em que o voto é obrigatório, as candidaturas avulsas são proibidas, o populismo grassa e o divisionismo é usado como plataforma para projetos de poder?

Como se vê, um debate árido. Há inclusive quem possa tachá-lo de caça às bruxas. Eu, por outro lado, penso que só reconhecendo os nossos erros seremos um dia capazes de sair deste buraco onde nos enfiamos.

Isto posto, são dois os principais verdugos da democracia brasileira, no que diz respeito à sua acentuada degradação de 2013 para cá. Dois grupos protagonistas por décadas da cena política. Cada um contribuindo de maneira decisiva para a percepção que o brasileiro médio tem hoje dos seus representantes e, acima de tudo, para a radicalizações dos debates.

São eles o PT e o PSDB.

Começo pelos tucanos. Paira sobre eles uma altivez notável e desgraçadamente ainda incompreendida por boa parte da população. Refiro-me ao fato de terem sido liderados e representados no cargo de presidente da República por Fernando Henrique Cardoso. Simplesmente o mais bem-sucedido mandatário que já tivemos desde a reabertura democrática. Com folga o que melhor soube representar o Brasil no exterior, além de ter sido responsável direto por mudanças na economia somente diminuídas pelos invejosos, amargos ou ignorantes.

Todavia, também paira uma frouxidão e um grau de desunião inaceitáveis. Não tenho dúvidas em afirmar: o petismo jamais teria conseguido alcançar tamanho poder de influência e sucesso eleitoral se não fosse pelo PSDB. Caso tivesse rivalizado com um partido disposto a jogar duro quando fosse necessário, unido em torno de um projeto, Lula nunca teria sido alçado ao patamar de inimputável pelas massas. Tampouco teríamos experimentado aventuras inusitadas, como a presidência de Dilma Rousseff.

Já o Partido dos Trabalhadores dispensa comentários. Sim, o PSDB criou todas as condições para o seu apogeu, mas isso não absolve Luiz Inácio e grande elenco. Ao contrário, sublinha a perversidade, a sede pelo poder e o desperdício de uma oportunidade única.

Em momento algum o PT se contentou com o sucesso nas urnas. Era preciso ocupar todos os espaços e para isso foi fundamental a criação de inimigos. Dividir o país entre aqueles que desejavam o seu bem e quem ousasse desafiar o projeto. Os rotulados.

Assim, enquanto FHC entregava um país redondo, Lula falava em herança maldita. O resto é história. Samba de uma nota só em que o bolsonarismo é apenas mais um capítulo, embora impresso com as cores trocadas.

A óbvia inaptidão do presidente para governar o país justifica a aflição tangível em todas as conversas. Não é possível garantir que este governo dure até o fim. Seja como for, é fundamental entendermos como chegamos até aqui. E isso passa por identificar não só o caminho, mas igualmente os condutores.

Encarcerar bandido contumaz reduz crime; prender ladrão de galinha eleva - SAMUEL PESSÔA

FOLHA DE SP - 26/05

Parece somente que há uma crença na ineficácia do encarceramento


Reportagem publicada no caderno Cotidiano desta Folha, na sexta-feira (24), afirma que “a redução dos índices de criminalidade, em especial a queda das taxas de homicídio, não tem ligação direta com o aumento do encarceramento de pessoas nas duas últimas décadas, de acordo com especialistas”.

Trata-se de afirmação muito forte. Estabelece a ausência de relação causal entre encarceramento de criminosos e redução de homicídios.

Lendo a coluna, os “especialistas” ouvidos pela reportagem não parecem se basear em estudos quantitativos e estatisticamente controlados. Parece somente que há uma crença na ineficácia do encarceramento.

O tema é complexo. Hipótese muito difícil de ser testada. Há causalidade reversa. Provavelmente, maior encarceramento reduz crime, já retorno ao tema, mas, por outro lado, os encarceramentos ocorrem com maior frequência quando o crime se eleva.

Essa é a maior dificuldade em ciência social: separar correlação de causalidade. É possível que maior encarceramento cause redução da criminalidade e que simultaneamente a evidência empírica indique correlação positiva entre ambos, isto é, que encarceramento e criminalidade caminhem juntos.

Além da complexidade empírica, fruto da causalidade reversa, há complexidade teórica, isto é, há efeitos causais nas duas direções. A literatura identifica três efeitos sobre a criminalidade ligados ao encarceramento. O efeito incapacitação, o efeito dissuasivo e o efeito sobre a reincidência (a prisão como “escola do crime”).

Os dois primeiros estabelecem causalidade negativa entre encarceramento e criminalidade —maior encarceramento reduz a criminalidade—, e o terceiro, o contrário.

Em qualquer sociedade, poucas pessoas são homicidas contumazes. Ao encarcerar um homicida, este se torna incapaz de cometer homicídios, pois sai de circulação. Adicionalmente, a expectativa de ser punido o dissuade do ato criminoso.

Finalmente, o encarceramento de ladrões de galinha ou de adolescentes, que ainda não passaram pelo aprendizado do crime, eleva os homicídios pelo efeito de aprendizado.

Uma evidência robusta para a Itália sugere que o efeito incapacitação é significativo e decrescente quando os níveis de encarceramento crescem muito. Há evidência, para a Inglaterra, de que o efeito dissuasivo também é importante.

E, para a Argentina, de que o emprego de tornozeleira eletrônica reduz a reincidência em comparação com o encarceramento.

A conclusão geral vai ao encontro do senso comum: encarcerar bandidos contumazes e homicidas reduz a criminalidade, mas encarcerar mal, isto é, ladrão de galinha ou jovens que estão no período de aprendizado, deve elevar a criminalidade.

Está em tramitação no Congresso Nacional a medida provisória 881, conhecida por Lei da Liberdade Econômica. O texto precisa de inúmeros ajustes, caso contrário o resultado da nova legislação será o oposto do pretendido.

Por exemplo, no 3º inciso ao 3º artigo da legislação, lê-se que são direitos de toda pessoa “não ter restringida, por qualquer autoridade, sua liberdade de definir o preço de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda no mercado não regulado, ressalvadas as situações de emergência ou de calamidade pública, quando assim declarada pela autoridade competente”.

Fico a imaginar o intervencionismo sobre os preços de um governo populista.

Samuel Pessôa
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP

O STF insiste em legislar - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

Gazeta do Povo - 26/05Ao subordinar a questão jurídica à questão político-circunstancial que envolve Congresso e Supremo, Fux falseou o mérito da discussão


O principal argumento para que o Supremo Tribunal Federal julgasse a criminalização da homofobia, por meio do Mandado de Injunção 4.733 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26, era, como diz o próprio tipo de uma das ações, a suposta omissão do Congresso Nacional em legislar sobre o assunto. A própria ideia de que o Poder Legislativo estaria sendo omisso nesta questão, em si, já é controversa, pois a opção por rejeitar ou até mesmo não analisar determinado projeto de lei (como ocorreu com o PL 122/2006, sobre a homofobia) já é, por si só, um juízo que se faz acerca dessa proposição legislativa.

Mas, entre fevereiro deste ano, quando o Supremo começou o julgamento, e esta quinta-feira, quando a corte retomou o assunto, o Congresso não ficou parado. Na quarta-feira, dia 22, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou dois projetos de criminalização da homofobia, o 672/2019 e o 191/2017. O primeiro faz justamente aquilo que as entidades LGBT pediam ao Supremo: a inclusão da discriminação por sexo, orientação sexual e identidade de gênero na Lei do Racismo (7.716/89); o segundo inclui na Lei Maria da Penha a agressão contra transexuais. O Senado notificou o STF sobre a tramitação dos dois projetos, o que deveria ser mais que suficiente para que os ministros suspendessem o julgamento e aguardassem o fim da tramitação no Legislativo.

No entanto, não foi o que ocorreu. Por nove votos a dois, os ministros decidiram seguir com o julgamento, usando argumentos como o de que a tramitação de projetos de lei pode ser um processo longo, e que não há garantia de aprovação. À exceção de Marco Aurélio Mello e do presidente da corte, Dias Toffoli, os ministros invocaram um precedente de 2007. Até então, a corte entendia – corretamente – que a existência de um processo em tramitação no Legislativo afastava a acusação de omissão; naquele ano, entretanto, o STF mudou seu entendimento. Diante disso, é preciso perguntar: o que seria preciso, então, para que não fosse caracterizada a omissão parlamentar? A impressão que fica, mas que não se diz às claras, é que haverá omissão sempre que o Congresso não decida da forma que os ministros julgam correta. E, diga-se de passagem, a acusação de lentidão no processo legislativo soa estranhíssima quando se sabe que a corte consegue procrastinar decisões importantes por anos – muitas vezes, bem mais tempo que o necessário para a aprovação de uma lei.

Alguns dos ministros não esconderam que havia outros fatores por trás da decisão de continuar com o julgamento sobre a criminalização da homofobia, apesar de o Senado estar tratando do tema. “Se esse requerimento não tivesse sido precedido desse episódio, eu confesso que ponderaria que nós deveríamos ponderar um critério de prudência política (…) Não se trata de retaliação, trata-se de postura judicial: ou o Judiciário é independente, ou o Judiciário é subserviente”, disse Luiz Fux. O requerimento que mencionava era a notificação do Senado, informando que já não havia omissão; o “episódio” que o precedeu foi o pedido coletivo de impeachment dos quatro ministros que já tinham votado a favor da criminalização da homofobia em fevereiro – Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.

Em outras palavras, o que Fux deixa evidente é que as considerações sobre haver ou não omissão parlamentar se tornaram um fator secundário; o principal, na sessão desta quinta-feira, era reafirmar a independência do Judiciário diante do que Celso de Mello chamou de “superlativa intolerância”, referindo-se ao pedido de impeachment protocolado por um grupo de deputados, que agiu dentro das regras estabelecidas pela Constituição, independentemente da sensatez ou não do seu pedido. Ao subordinar a questão jurídica – que, no STF, deveria ser o essencial – à questão político-circunstancial que envolve Congresso e Supremo, o que Fux faz é falsear o mérito da discussão. Já não se discute se há ou não omissão; trata-se apenas de decidir quem tem a palavra final.

A sessão desta quinta-feira deixou claro: há ministros do Supremo que realmente querem legislar. Querem fazê-lo mesmo quando o Congresso está cumprindo sua função e colocando projetos de lei para tramitar. E insistem no julgamento mesmo quando um dos projetos aprovados na CCJ, ao inserir a homofobia na Lei do Racismo – um equívoco que já comentamos neste espaço –, vai exatamente na mesma direção da maioria formada no STF, com os votos dados na quinta-feira por Rosa Weber e Luiz Fux. O que não fariam se o Congresso estivesse agindo, mas tomando uma direção oposta à convicção de ministros que, como já afirmou Barroso, querem “empurrar a história”? Na sessão desta quinta, o Supremo encontrou uma nova forma de desprezar o Legislativo. Antes, os ministros simplesmente legislavam; agora, também se dão o direito de dizer que o Congresso não está legislando mesmo quando projetos de lei tramitam e colecionam aprovações."

Os donos da rua - GUILHERME FIUZA

GAZETA DO POVO - PR - 24/05

E eis que o debate nacional, cada vez mais dominado pela picaretagem intelectual, chega à suprema impostura: em nome da democracia, as novas vozes da resistência cenográfica decretam que uma manifestação de rua – ou, mais precisamente, a ideia de uma manifestação de rua – é autoritária! Nunca se viu nada parecido em tempos democráticos. A rua agora tem dono, que decide quem pode sair de casa. Fascistas são os outros.

Nem Lula, que depenou o país e tentou transformá-lo em quintal do PT, ousou atacar a legitimidade de qualquer manifestação no país – fossem meia-dúzia de gatos pingados mandando-o ir para Cuba ou milhões de pessoas pedindo o impeachment de sua sucessora. Você jamais ouviu de Lula – de Lula! – uma palavra contra o direito de qualquer pessoa sair à rua para se manifestar sobre o que bem entendesse. Podia dizer que era coisa da elite branca, etc, mas jamais sequer alegou que um ato de protestar em público era expressão de autoritarismo.

Nem Fernando Collor de Mello, talvez o governante mais prepotente que o país já teve, vendo um número cada vez maior de pessoas ocupando as ruas pela sua queda, jamais se atreveu a dizer que havia algo de autoritário ou antidemocrático nas manifestações. E olhem que entre os manifestantes havia gente como José Dirceu, Lindbergh Faria e outros famosos impostores – o que não tirava a legitimidade do movimento popular que levou, de forma democrática, ao impeachment dele.

Pois bem. Essa democracia que já sobreviveu a prepotentes e larápios tem agora uma novidade quente: personagens que sempre se disseram liberais aparecem dizendo que a manifestação A pode, mas a manifestação B não pode. Como não têm coragem de dizer que não pode, dizem que um determinado ato público – que eles não poderiam saber o que é antes de acontecer – contém motivação autoritária; que pode ser um golpe contra as instituições; que é mais democrático ficar em casa.

Como eles sabem de tudo isso? Nem Dilma Rousseff, a famosa vidente que previu os tiros contra a caravana de Lula, ousou insinuar que qualquer das inúmeras manifestações de rua contra ela desaguaria num golpe institucional. Sendo que mesmo ela – Dilma, a única –, espalhando por aí até hoje que foi vítima de um golpe, jamais se atreveu a sugerir que as manifestações de rua fossem, em si, uma orquestração autoritária. Nem Dilma teve a petulância de intervir nas intenções alheias, de decretar qual protesto é legítimo ou não é.

Agora o mais grave (sim, é pior ainda): esses novos democratas de butique sabem muito bem que a agenda de reformas – que eles sempre defenderam – está em implantação (da forma que eles sempre pediram) e está também sob risco de sabotagem. Não por divergência de mérito, mas por disputa de poder. E quando surge a iniciativa de pressionar o Congresso contra a sabotagem da agenda que eles sempre pregaram, de que lado eles ficam?

Acertou, seu danado. Ficam do lado da sabotagem, dizendo que estão lutando contra a ameaça de fechamento do Congresso. A lógica personalizada é boa por isso: se o dono mandar, ela rebola até o chão, na boquinha da garrafa, e não tem que dar satisfação a ninguém.

Todo mundo viu o que a imprensa amiga do PT fez na época do impeachment: fotografava faixas de grupinhos pedindo intervenção militar no meio da multidão pedindo a deposição de um governo corrupto e botava na manchete “o viés antidemocrático” do protesto.

É horrível isso, não é? Covarde, canalha, etc, certo? Pois é exatamente o que vocês estão fazendo agora, caros liberais arrependidos. Aliás, vocês estão ajudando a esconder a agenda positiva da equipe do Paulo Guedes (que vocês veneravam até anteontem), com a sua chocante indiferença perante ações cruciais como a MP da Liberdade Econômica – engolida e soterrada em meio a esse falatório periférico que vocês travestem todo dia de crise governamental.

Parece que tem muita gente querendo protestar contra a sabotagem das reformas (que é um risco) e da informação (que é uma realidade). E, por mais que vocês queiram, essa gente não vai pedir licença a vocês.


Quando está sem rumo, governo e dinheiro, país fala de parlamentarismo - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 26/05

Vários senadores planejam lançar a mudança constitucional para o governo que começa em 2022


Quando a elite política está perdida, ressurge a conversa de parlamentarismo, seja “branco”, pingado, semidesnatado ou até integral, com mudança de fato de regime de governo.

Isso deu em nada ou jamais prestou, em 1961, 1988, 1993 ou 2016. No entanto, a pressão do presidente e do bolsonarismo contra o Congresso incita medo e revolta parlamentar, clima propício para o impasse, beco sem saída onde justamente vivem fantasmas ou fantasias como a do parlamentarismo.

Vários senadores, não apenas tucanos, planejam lançar a mudança constitucional para o governo que começa em 2022. Vários deputados, no limbo entre a falta de liderança do governo e a pressão de ruas e redes, se interessam pelo assunto.

Além desse devaneio, há o programa conhecido, mas ainda tateante, de limitar os desvarios de Jair Bolsonaro e de substituir a inoperância do governo. Como se tem sabido, a Câmara em particular pretende, imagina ou fantasia:

1) ter “pauta própria”, a começar pelas reformas da Previdência e tributária;
2) limitar o poder do presidente de baixar medidas provisórias;
3) evitar que Bolsonaro faça nomeações estrambóticas para agências de governo, Ministério Público e Judiciário;
4) derrubar decretos ilegais, ineptos ou repugnantes do presidente, que tem apreço especial pelo instrumento.

Apesar dessas vontadezinhas de poder, a voz esganiçada das redes e a ameaça das ruas assustaram deputados, como se notou nas votações da semana passada. O ronco das redes também fez aumentar na Câmara aquela raiva derivada do medo. Um dos principais motes das manifestações convocadas pela extrema direita neste domingo (26) é “Contra o centrão”.

Além disso haverá faixas e discursos pela reforma da Previdência, pela Lava Jato e gritos golpistas. Desse modo, o centrão e, em geral, o miolão do Congresso, mais de 300 deputados, ficam no triângulo das bermudas assim demarcado: a) pelos chinelos de Bolsonaro, que os detesta; b) pelas ruas adversárias da reforma; c) pelas ruas que os odeiam e os pressionam a votar com o presidente, até pela reforma.

Ficam, pois, acuados, sem ter para onde correr e com dificuldade de fazer qualquer coisa. Mesmo com o bom senso de lideranças que querem evitar o colapso econômico e administrativo, o Parlamento não tem condições de governar no presidencialismo.

Em outra era geológica do Brasil, o parlamentarismo foi o meio de evitar um golpe militar, apenas adiado em 1961.

Na ruína de José Sarney (1985-90), o Congresso dominado pelo velhoMDB (incluía tucanos e “autênticos”) tentou controlar o governo —não evitou o naufrágio nem o descrédito das lideranças políticas, o que daria em Fernando Collor.

No começo dos anos 1990, depois de uma década de crise econômica, com o colapso de Collor (outro salvacionista populista) e com a perspectiva de um plebiscito, voltou a conversa parlamentarista, derrotada de lavada pelo eleitorado.

Pouco antes da derrubada de Dilma Rousseff, ainda se pensou em trocar impeachment por parlamentarismo. Depois do Joesley Day, Michel Temer falava em mudar o regime em 2018.

Essa conversa de parlamentarismo é sintoma de país desembestado, desgovernado, sem acordo nenhum do que deve ser feito, sem força hegemônica capaz de impor direção, desarticulado politicamente e com sociedade dividida e à deriva. Não é remédio, é diagnóstico. Errado.

Se a re-recessão vier, florescerão ainda mais flores de ideias malucas.

Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA)

Eleições colocam Europa entre o sonho e o pesadelo - CLÓVIS ROSSI

FOLHA DE SP - 26/05

Em risco, o modelo menos ruim até agora inventado


Se é fato que o modelo europeu corre riscos a partir da eleição para o Parlamento Europeu, que termina neste domingo (26), então está em risco o que, para o meu gosto, é a menos ruim de todas as fórmulas que o ser humano inventou até agora.

Por modelo, entendo não apenas o processo de integração, que agora abraça 28 países (ou 27, se o Reino Unido sair mesmo), mas também o sistema de bem-estar social. Não é comum a todos, mas cada país consegue preservar uma razoável coesão social.

Os caminhoneiros —que estão de novo na moda no Brasil— também deveriam gostar do que faz o Parlamento Europeu: aprovou regras para definir o tempo que cada motorista de caminhão pode dirigir e quanto deve descansar em países diferentes do seu próprio.

Não é mais saudável do que discutir a tabela de fretes?

Mais legislação que o Brasil deveria no mínimo copiar: em 2018, o Parlamento enfrentou o lobby da poderosa indústria automobilística alemã para obrigar fabricantes de veículos a cortar as emissões de poluentes mais do que havia determinado a própria Comissão Europeia (o braço executivo do conglomerado).

Para os muitos brasileiros preocupados com o vazamento de seus dados pessoais, outro exemplo: também em 2018, o PE negociou uma regulamentação de proteção de dados que limita os meios de cada empresa para coletar dados e o que fazer com eles.

Por fim, para a moçada e seus professores que foram às ruas contra os cortes na educação, saibam que os eurodeputados estão lutando bravamente para preservar polpudos orçamentos para pesquisa científica, educação e infraestrutura.

Para aqueles que adoram a Lava Jato e o combate à corrupção, a Europa também serve de modelo. Os países europeus ocupam os primeiros lugares em matéria de limpeza, no Índice de Percepção
de Corrupção da Transparência Internacional.

Dos cinco primeiros colocados, três são europeus (Dinamarca, a primeira, depois Finlândia e Suécia). Dos 28 países da UE, só cinco tiram nota inferior a 50 em uma escala que vai de 100 (limpinho, limpinho) a 0 (sujinho, sujinho). São Croácia, Romênia, Hungria, Grécia e Bulgária. Mesmo assim, a Bulgária, a pior de todas, tira 48 e fica no 77º lugar entre 180 países. Para comparação, o Brasil é o 105º, com nota 35.

A UE é também modelo de solidariedade, enquanto os países do Mercosul, por exemplo, vivem se estapeando uns aos outros. É verdade que a solidariedade foi esgarçada pela crise de 2008, a ponto de a
Europa ter esfolado a Grécia até limites insuportáveis.

Mas, mesmo assim, o Parlamento que está sendo eleito terá sobre a mesa para votação um pacotaço de € 330 bilhões (R$ 1,488 trilhão), a título do chamado fundo de coesão. São recursos para permitir ir fechando as brechas entre os países mais ricos e os mais pobres.

O fundo já representa um terço do orçamento europeu e, para o período 2021/2027, passará a ser o primeiro item, segundo o jornal italiano Il Sole 24Ore.

Dá para entender, pois, por que, na mais recente pesquisa do YouGov, 68% dos consultados disseram que a participação na UE é uma boa coisa, o mais alto índice em quase 40 anos. Dá para entender igualmente que uma maioria tema um colapso da Europa unida, sitiada pelos partidos eurocéticos.

O Parlamento que sai das urnas nestes dias será o grande campo de batalha entre o sonho e o pesadelo.

Clóvis Rossi
Repórter especial, membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

Angústia com o Brasil - GUSTAVO FRANCO

ESTADÃO - 26/05

Transformar o Brasil numa máquina de crescimento vai requerer muito mais reformas

O Brasil parece um exemplo perfeito do que os papas da chamada “economia comportamental”, a última moda na disciplina, designaram como “falácia do planejamento”, uma patologia que consiste em adotar um viés excessivamente otimista para quaisquer tarefas futuras, que sempre resultam mais demoradas e custosas que o previsto. Como se sempre olhássemos para o melhor cenário e nunca para a realidade, e não necessariamente por malandragem.

Nosso estranho otimismo talvez explique as razões de ocuparmos posições “europeias” em rankings internacionais de felicidade (chegamos a ser o primeiro em mais de uma centena de países em “felicidade daqui a cinco anos” entre 2006 e 2015, segundo o Instituto Gallup), a despeito de posições muito piores no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano, 79.ª posição em 2018) ou dos índices de competitividade ou de facilidade de fazer negócios, como bem sabemos.

Talvez, por isso mesmo, as leituras mais recentes revelando sinais de anemia no PIB brasileiro, e no crescimento do emprego, tenham sido recebidas com uma enorme dose de melancolia. Como se os exames estivessem trazendo indícios de uma doença muito mais séria do que pensávamos ter.

O IBC-Br, indicador de atividade econômica feito pelo BCB, e habitualmente descrito na imprensa como “prévia do PIB”, mostrou uma queda de 0,68% no primeiro trimestre de 2019 relativamente ao primeiro trimestre do ano passado.

Já as expectativas para o restante do ano ainda não estão tão ruins: nesta semana o Ministério da Economia publicou o seu relatório bimestral de execução orçamentária onde trabalha com crescimento de 1,6%, bem menor que o 2,2% da edição anterior.

O Relatório Focus, no qual o Banco Central publica semanalmente as expectativas de cerca de uma centena de especialistas, mostra, para pesquisa feita no dia 17 de maio, uma expectativa de crescimento de 1,24%, estimativa que vem caindo há 12 semanas seguidas.

A consternação diante desses números encontra certa base na “falácia do planejamento”, acima aludida, eis que a realidade está se mostrando pior do que o imaginado. Mas há algo mais, a mensagem é que transformar o Brasil numa máquina de crescimento vai requerer muito mais reformas do que as que estão sobre a mesa, e sob fogo cerrado.

Um relatório de pesquisa recente dá cores dramáticas ao nosso enredo: em duas das quatro últimas décadas, a renda per capita caiu, ou seja, não estamos tratando de apenas uma década perdida, e por culpa de um choque externo, mas de quatro décadas. E se fizermos a quina, ao continuar com hesitações nas reformas, vamos perder meio século.

Muitas coisas aconteceram nesses últimos 40 anos turbulentos, no centro das quais está a hiperinflação e o Plano Real. Lembro bem que uma das mais importantes verdades desagradáveis ditas naquela época foi que a hiperinflação não era mais que um sintoma da falência de um modelo de desenvolvimento baseado em duas turbinas obsoletas: inflacionismo e protecionismo (substituição de importações).

O diagnóstico era simples: não íamos terminar a hiperinflação com truques heterodoxos baratos, mas com reformas que, naquela época, se confundiam com os “fundamentos” da estabilização, e que também compunham a nova agenda do crescimento.

O desenvolvimento precisava ser reinventado e sua base devia ser o investimento privado e a produtividade e, para isso, era preciso haver mais concorrência, mercados e iniciativa privada. Simples assim. Nós andamos bem nessa direção durante os primeiros anos do real, mas veio o desgaste, a complacência e, em seguida, a Nova Matriz.

Cá estamos de volta à esta mesma agenda, agora abraçada com ardor pelo ministro Paulo Guedes. É imperioso avançar.

Os obstáculos são os mesmos e, às vezes, até os personagens. De forma ardilosa, eles manipulam o nosso otimismo patológico: como somos o país do futuro, e estamos destinados à riqueza, não há nada de muito errado conosco, os médicos estão exagerando, não existe déficit. Assim, vamos adiando o momento de parar de fumar, ou de começar a dieta, e deteriorando ainda mais a saúde do organismo.

EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA RIO BRAVO INVESTIMENTOS. ESCREVE NO ÚLTIMO DOMINGO DO MÊS

Recall diário - VERA MAGALHÃES

O Estado de S. Paulo - 26/05

Redes sociais e polarização criam clima de escrutínio permanente sobre governo


Jair Bolsonaro vive um clima de recall diário desde que assumiu a Presidência. O escrutínio permanente, longe de ser uma articulação perversa de forças ocultas, é reflexo da própria maneira de governar do presidente, da atuação de seu núcleo mais próximo e da forma como ele se relaciona com a sociedade, a imprensa e o Congresso.

As manifestações do dia 15, contra os cortes na Educação, foram um produto desse clima de enquete constante quanto às realizações ou os fracassos de um governo que ainda não completou um semestre. Os atos marcados para hoje têm a mesma natureza, e passaram a ser organizados como uma tentativa de dar uma resposta aos anteriores, como se o governo necessitasse prematuramente buscar uma legitimidade que acabou de lhe ser dada pelas urnas.

É o segundo presidente a entrar num ciclo de contestação e reafirmação de mandato em tempo real.
Dilma Rousseff enfrentou o primeiro de uma série de panelaços em 22 de fevereiro de 2015. A partir dali, foram atos de rua cada vez mais volumosos, à medida que as revelações da Lava Jato e a incapacidade de compor politicamente e conduzir a economia para fora do poço a que ela a levou ditaram o caminho para sua queda, em abril de 2016. As pedaladas fiscais, que ocorreram, foram só a justificativa jurídica para um alinhamento de astros que incluiu povo, economia e política.

Bolsonaro foi eleito como produto desse caldo de crises que se iniciou em 2013 e fermentou até 2018. Vitorioso graças ao desgaste incontestável do revezamento entre PT e PSDB como forças hegemônicas, prometeu levar a cabo uma agenda liberal, mas, desde que assumiu, seu governo é um embate permanente entre essa pauta e um chorume revanchista e ideológico que divide alas da própria administração, trava a relação com o Congresso e anima as arquibancadas pró e contra com muito falatório e pouco debate.

É nesse ambiente que os apoiadores do governo estão sendo chamados a ir às ruas hoje. Devem estar confusos. Primeiro, foram instados a protestar contra os arbítrios do Supremo Tribunal Federal. Sim, porque o dia 26 foi marcado na folhinha antes de tudo como uma data para protestar contra o famoso inquérito vale-tudo do STF, que censurou veículos de imprensa e conduziu coercitivamente pessoas a depor pelo fato de terem postado meia dúzia de impropérios contra os ministros nas redes.

Depois, o ato foi avançando contra o Centrão, transformado por Bolsonaro e seus aduladores num bicho-papão que estaria disposto a impedir o “mito” de governar. Dali passou rapidamente a flertar com a ideia de fechamento do Congresso. Diante do evidente embuste narrativo e da escalada autoritária, os organizadores (quem são? quem fala oficialmente por eles? não se sabe) dos protestos fizeram um retrofit na sua fachada para vendê-los como uma jornada das pessoas de bem em favor das reformas.

A guinada é tão óbvia que não seduziu nem setores conservadores que inicialmente apoiaram Bolsonaro e, agora, temem ser engolfados caso ele derive para essa sanha populista de conclamar o povo contra as instituições.

São os acólitos de Bolsonaro que o levam a esse clima em que recall, parlamentarismo branco, impeachment e outras palavras que remetem a solavancos institucionais foram trazidos de volta à ordem do dia.

Qualquer que seja o volume e o saldo dos atos de hoje, não há como um governo que precisa aprovar reformas que exigem quórum constitucional, fazer uma economia estagnada voltar a crescer e pacificar uma sociedade cindida achar que pode viver na base do escrutínio diário. Instigar isso e apostar no clima de conflagração não é uma estratégia inteligente com menos de seis meses de governo.

Oportunidades - ARMÍNIO FRAGA

FOLHA DE SP - 26/05

Criar chances de sucesso para os menos favorecidos é papel dos estadistas

A desigualdade da renda do trabalho vem aumentando desde 2012. A piora tem a ver em parte com a profunda recessão que nos assola desde 2014, mas a coisa é bem mais estrutural do que conjuntural. Esse quadro demanda respostas em várias frentes. Me concentro hoje no campo das oportunidades.

Um certo grau de desigualdade é natural, pois talentos, preferências e energia não são distribuídos uniformemente entre as pessoas. São parte da loteria da vida. Em uma economia de mercado tais diferenças se manifestam na renda das pessoas, o que estimula a iniciativa individual e coletiva e, desde que dentro de limites que variam de acordo com cada cultura, contribuem para a criação de riqueza.

Mas algumas rendas têm má origem, repugnante até. Aqui no Brasil os problemas datam do modelo colonial extrativista e da escravidão e foram reforçados ao longo de séculos por fatores que incluem corrupção, troca de favores com dinheiro público, pressão política para obtenção de vantagens fiscais e afins etc. Ou seja, tem prevalecido a captura do Estado por grupos de interesse, em detrimento da maioria das pessoas.

E mais, a desigualdade se reproduz naturalmente por meio das estruturas sociais e de família, como por exemplo a riqueza e, sobretudo, a escolaridade dos pais de cada um. No geral, grupos protegem os seus desde sempre, e a discriminação segue solta.

A corrupção inevitavelmente leva a políticas públicas ineficientes e, portanto, prejudiciais ao crescimento. Um bom exemplo recente aqui em nossas bandas é a chamada "Bolsa Empresário", com os subsídios do BNDES sobre preços em contratos, lucros de monopólio e vantagens tributárias, na maioria dos casos desprovidos de lógica econômica ou social. Essa combinação de rapinagem com incompetência foi decisiva na construção do colapso econômico e social que nos assola. Vale notar aqui que algumas correções de rumo vêm ocorrendo desde o mensalão e a Lava Jato.

É verdade que a partir da Constituição de 1988 e seus direitos houve queda importante da desigualdade, que no entanto segue elevada. Isso se nota a olho nu e aparece com clareza nas comparações internacionais, nas quais o Brasil permanece perto da lanterna.

Portanto, a criação de oportunidades para os menos favorecidos deveria ser prioridade na resposta de todo estadista a essa condição. Concretamente, trata-se aqui de reforçar as políticas públicas em áreas como educação, saúde, saneamento e transportes.

Para que isso ocorra, será imprescindível redirecionar recursos e também fazer mais com menos, melhorando as práticas de gestão no setor público, parte crucial de uma reforma do Estado.

De onde virá o dinheiro? Em primeiro lugar, da eliminação das instâncias de captura do Estado, que além de liberar recursos para melhores causas, teria impacto direto sobre a desigualdade.

Mas dá para fazer bem mais. Os gastos do governo (em todos os níveis) atingem um terço do PIB, muito superiores ao que se vê em países semelhantes ao Brasil. Desse total, 80% cabem ao funcionalismo e à Previdência, outra vez bem mais do que nossos pares. Gastamos nessas duas áreas pelo menos uns 10 pontos do PIB a mais por ano do que o fazem Chile, Colômbia e México. Há, portanto, muito espaço para economizar por meio das reformas da Previdência e do Estado.

O caminho aqui proposto, além de inclusivo, favorece o crescimento, pois capacita as pessoas, aumenta a produtividade e reduz desperdícios.

Arminio Fraga
Economista, é ex-presidente do Banco Central

Entendendo o cenário Guedes - MIRIAM LEITÃO

O Globo - 26/05

Há grandes riscos no cenário de não aprovação da reforma da Previdência, mas é melhor entendê-los sem os exageros do ministro Paulo Guedes


O ministro Paulo Guedes tingiu com cores fortes o futuro sem a reforma da Previdência. Disse na entrevista à “Veja” que o mercado fugiria, e o país seria “engolfado”. Num primeiro momento, viraria a Argentina, que tem hoje uma inflação de 40%, depois viraria a Venezuela, cuja economia está em colapso. Há riscos adiante de nós, de fato, mas é melhor entendê-los sem exageros nem soluções mágicas.

O que o ministro tentou explicar é que a reação natural do mercado financeiro é se antecipar aos riscos. Mas os bancos, corretoras e fundos não estão desligados da população em geral, que tem aplicações financeiras. Quando Paulo Guedes diz que “o mercado foge”, ele está falando que investidores vão procurar outros tipos de ativos, reduzindo o dinheiro disponível para os títulos da dívida pública. Os grandes investidores no Brasil são os fundos, de pensão ou formados pelos bancos para seus clientes. Essa fuga não será de meia dúzia de banqueiros. Ela só ocorrerá se os investidores brasileiros, pequenos, médios ou grandes, começarem a ter dúvidas sobre a capacidade de o Tesouro pagar a dívida.

A reforma da Previdência não é nem a solução milagrosa se for aprovada, nem o estopim da bomba atômica caso não seja aprovada. Mas o Brasil está diante de um cenário realmente perigoso. A dívida pública bruta subiu muito nesta década. Estava em 52%, em 2011, está agora em 78%, e terminará o ano que vem em 79%, se a reforma for aprovada. A dívida é cara, a dinâmica do seu crescimento é acelerada, os papéis têm prazos curtos, os déficits anuais alimentam a alta do endividamento público.

A reforma da Previdência diminui o ritmo de aumento das despesas com aposentadorias e pensões, permitindo que a dívida suba mais devagar. Se outros passos forem dados, a economia retomará o crescimento. Portanto, é fato que uma reforma que enfrente o déficit da Previdência melhorará o quadro econômico. Mas existem outros obstáculos a serem superados. E, mais importante, o cenário de fim do mundo traçado por Paulo Guedes não se concretizará porque o país vai agir antes.

Quando a inflação chegou a 10%, o governo Dilma caiu. O Brasil não toleraria conviver com inflação crescente como a Argentina tem feito. Os índices subiram no período Kirchner, caíram um pouco no governo Maurício Macri e voltaram a subir. Desde 2011, a inflação por lá está em dois dígitos. No Brasil, dois meses foram suficientes para derrubar a popularidade da então presidente. Se voltar a ocorrer, o governante da vez terá queda forte de popularidade e, provavelmente, perderá o mandato.

O cenário Venezuela é ainda mais longínquo. O ministro está ameaçando com um fantasma que, felizmente, não ronda o Brasil. Uma crise tão profunda quanto a que atinge o nosso vizinho demora a ser construída. Foram anos de erros sequenciais na condução da política econômica, do uso da fonte do petróleo para comprar uma base de apoio entre os pobres e corromper as Forças Armadas, de truques seriais para minar as instituições democráticas. O Brasil não toleraria tal dissolução do tecido social. O governo Bolsonaro sempre fala da Venezuela quando quer assustar os brasileiros e dizer que o vizinho está assim porque o chavismo é de esquerda, e ele, Bolsonaro, nos salvará deste destino. Primeiro, o chavismo se diz de esquerda, mas é apenas um governo incompetente e autoritário. O erro da esquerda brasileira é cair na armadilha de defender o indefensável governo de Caracas. Segundo, se o Brasil precisar de uma única pessoa para nos salvar do destino venezuelano já estaremos no destino venezuelano. O que fez aquela tragédia foi o salvacionismo populista.

A reforma da Previdência é fundamental, mas não é o fim da crise. Nas próximas décadas teremos que voltar a esse tema. A que foi proposta por Paulo Guedes reduz algumas desigualdades, mas não é verdade que o governo está “propondo fechar a fábrica de privilégios”. Muitos deles vão permanecer. O principal recado que o ministro quis passar foi o de que ele pode deixar o cargo, caso não seja aprovada a reforma que ele quer. “Pego avião e vou morar lá fora.” O que falta no raciocínio dele é a compreensão de que o governo terá que trabalhar melhor se quiser a reforma aprovada.

Bolsonaro, o infiltrado - ASCÂNIO SELEME

O GLOBO - 26/05

O presidente assumiu o comando da nação depois de anos produzindo declarações contra a democracia e a favor de qualquer barbaridade que lhe parece apropriada


Algumas poucas vezes ao longo dos seus primeiros cinco meses de governo o presidente Jair Bolsonaro surpreendeu positivamente. Sua declaração contra os que querem ir ao ato deste domingo para atacar oSupremo Tribunal Federal e oCongresso Nacional foi uma dessas vezes. Bolsonaro fez a afirmação durante café da manhã com jornalistas, o quinto encontro desse tipo marcado pelo presidente, e que também podem ser incluídos na sua lista de bola dentro. Quem defender o fechamento do STF e do Congresso “estará na manifestação errada”, disse. “Isso é manifestação a favor de Maduro, não de Bolsonaro”, concluiu o presidente.

Não podia estar mais correto. Os Poderes constituídos são a base da democracia. Pode-se até criticar o Supremo e o Congresso por decisões que tomarem, mas jamais pregar o seu fechamento. Os que acusam o Judiciário e o Legislativo pelos problemas de Bolsonaro estão equivocados. Os que sugerem que a saída é interromper o funcionamento das duas casas maiores são pessoas de baixa qualificação cognitiva e falam da boca para fora sem medir consequências.

O próprio Bolsonaro já atacou o Supremo mais de uma vez. Ele também defendeu, pouco antes da eleição, aumentar de 11 para 20 o número de ministros do STF. “Para equilibrar as coisas”, nas palavras de seu filho Eduardo, o ideólogo da família, sugerindo um viés de esquerda dos membros da casa. Bobagem, claro, mas enfim, era assim que os Bolsonaro pensavam no ano passado. O mesmo filho disse, algum tempo antes, que bastariam um soldado e um cabo para fechar o Supremo.

O presidente também já bateu à vontade no Congresso. Outro dia mesmo afirmou que o grande problema do Brasil é a classe política. Nesse caso o ataque era generalizado, e ele ressaltou que incluía-se dentro da citada classe problemática. Em momentos mais remotos da sua atividade política, Bolsonaro defendeu a ditadura, estado que pressupõe um Executivo forte que funcione sem fazer consultas e sem sofrer avaliações, com o fechamento ou a submissão dos outros Poderes. Esse é o problema do presidente. Ele diz uma coisa num dia e outra diferente no dia seguinte.

No café com jornalistas, o presidente disse também que, embora condene os ataques, nada impede que durante o ato “apareça um infiltrado defendendo essas ideias e usando a camisa amarela”. Quer dizer, ele condena quem ataca, mas admite que haja, no meio da manifestação a seu favor, gente gritando pelo fechamento do STF e do Congresso. Trata-se do famoso “morde e assopra”. Condena, mas não tanto assim. E, ao que parece, perdoa os que se equivocarem.

O presidente é ele próprio um infiltrado. Assumiu o comando da nação depois de anos produzindo declarações contra a democracia e a favor de qualquer barbaridade que lhe parece apropriada. Como a tortura, por exemplo. O presidente Jair Bolsonaro é um infiltrado no jogo democrático. Nenhuma dúvida. O importante é que agora, com o poder que obteve das urnas, continue produzindo considerações como aquela do café da manhã.

Jogar a favor dos Poderes constituídos é obrigação do presidente da República. Ao defender o Supremo e o Congresso, Bolsonaro estava simplesmente cumprindo uma de suas principais atribuições constitucionais. Mesmo assim pode-se dizer que, vindo de quem veio, ele fez muito bem.
História implacável

Nunca fez bem aos presidentes do Brasil tentar governar atacando o Congresso ou sem apoio parlamentar. Todos os que foram por esse caminho, dentro da normalidade constitucional, se deram mal. Pela ordem, Getulio se suicidou; Jango foi destituído; Jânio renunciou; Collor e Dilma sofreram impeachment.

Vinte anos
Parece fixação de político, mas todo governo que se instala logo começa a falar em projeto de 20 anos de poder. O primeiro a fazer planos longos foi o ex-presidente Collor. Seu projeto de 20 anos naufragou na metadedo seu mandato. Depois, na era FH, o mesmo discurso. Durou oito anos. Com Lula e o PT, de novo. “Vamos ficar duas décadas e mudar a cara do Brasil”, dizia José Dirceu. O PT ficou 14 anos e saiu varrido do poder. Agora vem a turma do Bolsonaro.

Bons ares
O ambiente de diversidade de ideias e propostas do Congresso tende a democratizar até mesmo os parlamentares que chegam fortemente ideologizados e radicalizados. É o que se vê diariamente nos corredores e plenários das duas casas. Por isso, os sorrisos e tapinhas nas costasque se viu quarta-feira entre Kim Kataguiri (DEM) e Paulo Teixeira (PT) não surpreenderam ninguém. São raros os que entram duro e saem duro do Congresso, como Jair Bolsonaro.

A solidão do Valente Ivan
O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) foi incansável durante o debate da reforma tributária na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Como apenas o PSOL se opunha à reforma, Valente fez sozinho o papel de obstrutor da pauta.

Obviamente não conseguiu impedir que a CCJ aprovasse a admissibilidade da proposta de reforma, mas usou todos os minutos disponíveis para falar democraticamente contra a proposta. Com o tempo somado, Valente deve ter falado mais de uma hora. Teve gente dormindo e almoçando durante os intermináveis discursos do deputado solitário.

Neutro é melhor
A insistência de Bolsonaro em atacar Cristina Kirchner mais atrapalha do que ajuda a candidatura à reeleição de Maurício Macri. Já tem gente na Casa Rosada sugerindo ao presidente argentino que ligue para Bolsonaro para pedir neutralidade.

O medo passou
O ambiente no Itamaraty está mais leve.

O pavor causado pelo chanceler Ernesto Araújo nos diplomatas acabou. Hoje, nos corredores da casa as pessoas já falam mal e debocham do ministro sem cochichar. Mas sempre com todo respeito à instituição, claro.

Sua excelência a vaidade
Para atender demanda da Ordem dos Advogados do Brasil, o deputado Carlos Bezerra (MDB-MT) apresentou projeto de lei na Câmara para alterar parte do Estatuto da Advocacia. São acrescentados dois artigos.

O primeiro exige que servidores públicos dispensem ao advogado “tratamento compatível com a dignidade da advocacia”. Precisava? Acho que não. Interessante mesmo é o segundo. Ele determina que os advogados presentes em audiências de instrução e julgamento sejam posicionados “no mesmo plano topográfico” do juiz que presidir os trabalhos. Quer dizer, na mesma altura do magistrado e da sua própria vaidade.

Dinheiro vivo
Com a ajuda de parlamentares de diversos partidos, inclusive do PT, o governo de Minas Gerais tenta fazer um acerto técnico sobre a qualidade do nióbio retirado das minas de Araxá pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), empresa da família Moreira Salles. Segundo o debate em curso na Assembleia Legislativa, o teor do mineral retirado é maior do que se supunha, por isso, os royalties também devem ser mais elevados. Só em atrasados, o governo mineiro imagina ser credor de R$ 5 bilhões.

Vox populi - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 26/05


Pesquisa sugere que, com cinco meses de mandato, a paciência dos que ainda esperam alguma coisa positiva do governo Bolsonaro está acabando rapidamente.


Com apenas cinco meses de mandato, a aprovação ao governo de Jair Bolsonaro derrete a olhos vistos. Pesquisa da XP/Ipespe mostra que, numericamente, a avaliação negativa do presidente já supera a positiva. Segundo o levantamento, feito entre os dias 20 e 21 de maio, com margem de erro de 3,2 pontos porcentuais, subiu para 36% o número de entrevistados que consideram o governo ruim ou péssimo – há duas semanas, eram 31%. Já o porcentual de entrevistados que consideram a gestão ótima ou boa passou de 35% para 34% no mesmo período. Ou seja, em duas semanas, Bolsonaro perdeu seis pontos porcentuais de aprovação.

O derretimento tem sido constante desde fevereiro, quando a desaprovação a Bolsonaro estava na casa dos 17%. Já a aprovação ao presidente oscilou menos – saiu de 40% em fevereiro para 34% agora, indicando que pode haver uma espécie de “núcleo duro” de apoio ao governo. O grosso do eleitorado que passou a condenar a gestão do presidente provavelmente saiu da parcela que considerava Bolsonaro “regular” – que passou de 31% há duas semanas para 26% na última pesquisa. Isso sugere que a paciência dos que ainda esperam alguma coisa positiva do governo está acabando rapidamente.

Exemplo disso é o quadro sobre as expectativas para o restante do mandato. A parcela dos otimistas, que estava em 63% em janeiro, hoje está em 47%, enquanto os entrevistados mais pessimistas já somam 31% – eram 15% em janeiro e fevereiro.

Tal cenário não surpreende, pois a maioria dos indicadores econômicos sofreu forte deterioração ao longo dos cinco meses de mandato de Bolsonaro, eleito justamente com a promessa de deflagrar um amplo e vigoroso processo de recuperação do crescimento do País. A pesquisa mostra que, embora a maioria dos entrevistados (49%) ainda atribua aos governos petistas a maior parte da responsabilidade pela crise econômica – sinal evidente da vitalidade do antipetismo manifestado nas urnas na eleição passada –, dobrou, de 5% para 10%, em apenas duas semanas, a parcela de eleitores que responsabilizam Bolsonaro.

Tal percepção começa a tomar corpo porque o presidente tem sido até aqui incapaz de adotar medidas que de alguma forma ajudem a reverter o clima de desconfiança. Aparentemente mais preocupado com os radares nas estradas e com a moralidade no carnaval, Bolsonaro limitou-se até aqui a encaminhar uma proposta de reforma da Previdência ao Congresso, a respeito da qual não mostra grande convicção e por cuja aprovação não parece interessado, já que não se empenhou em formar uma base parlamentar que pudesse defendê-la. Quando resolveu mencionar outras iniciativas, como um certo projeto tributário que, segundo Bolsonaro, trará uma economia maior do que a reforma da Previdência, ficou definitivamente claro que o presidente da República não tem a menor ideia do que está falando – o que naturalmente contribui para o aumento do ceticismo.

Mais de uma vez, nos últimos dias, Bolsonaro declarou que governa conforme os desejos do “povo”. Se realmente está interessado em ouvir a voz do povo, e não apenas a dos devotos de sua seita, o presidente faria bem em ao menos observar a opinião expressa nas pesquisas. No levantamento mais recente, por exemplo, cresceu de 37% para 48% a parcela de entrevistados que consideram que, nas relações com o Congresso, o presidente deveria “flexibilizar suas posições para aprovar sua agenda, ainda que isso signifique se afastar do discurso inicial”. Apenas 31% – parcela que possivelmente corresponderia ao “núcleo duro” do bolsonarismo – entendem que Bolsonaro deve “endurecer suas posições e seu discurso, ainda que isso signifique dificuldades na relação com o Congresso”.

É claro que nenhum chefe de governo deve basear sua gestão em pesquisas de opinião, pois muitas vezes é preciso tomar decisões impopulares para resolver os problemas nacionais. No entanto, fica cada vez mais evidente que Bolsonaro parece contar com o apoio somente daqueles que o veem como “messias” e como um mártir do “sistema”. Aos demais brasileiros, que não se deixaram encantar pelo palavrório salvacionista de Bolsonaro, resta o pessimismo.

Um presidente reativo - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 26/05

Há a impressão de que Bolsonaro não tem um plano para atingir seus objetivos


Jair Bolsonaro se meteu numa encrenca. Não, não falo de ele ter assumido a Presidência, mas da convocação de seus apoiadores para participar de manifestações pró-governo neste domingo. Do nada, o presidente criou para si o que os americanos chamam de “lose-lose situation”, isto é, colocou-se numa posição em que, não importa o que ocorra, ele sairá perdendo.

Se as manifestações não reunirem um público grande, ou seja, se der para carimbar que foram um fracasso, o governo terá dado uma inédita demonstração de fraqueza —e com apenas cinco meses de mandato.

Se, por outro lado, os protestos ficarem apinhados de gente, a pressão sobre o Congresso e o STF tornará mais tenso o relacionamento entre os três Poderes, dificultando o futuro de sua administração, que depende do Legislativo e do Judiciário para concretizar praticamente todos os seus projetos.

Mesmo no mais verossímil cenário de copo meio cheio, meio vazio, no qual as manifestações não possam ser classificadas nem como fiasco nem um retumbante sucesso, Bolsonaro não sai incólume. Ele já perdeu pontos ao expor divisões entre seus apoiadores. Grupos fortemente vinculados ao presidente, como o MBL e o Vem pra Rua, anunciaram publicamente que não estariam nos atos. O próprio Bolsonaro pulou fora, e proibiu ministros de participar.

A estratégia de atiçar as massas contra o Legislativo e Judiciário só faria sentido se o presidente tivesse planos reais de investir contra os dois Poderes. E, mesmo assim, a abordagem racional teria exigido que atacasse com carga total, não que, no instante seguinte, se pusesse a contemporizar e esvaziar os protestos.

A sensação que fica é a de que o presidente não tem um plano muito definido do que fazer para lograr seus objetivos. Ele apenas reage, com base em instintos, aos acontecimentos. Como nada indica que mudará de atitude, devemos esperar três anos e meio de muitos sobressaltos e inconstâncias.

Passeata é inútil quando o problema é o despreparo - ROLF KUNTZ

O Estado de S. Paulo - 26/05

O recuo no caso das armas foi só mais um, desde a bobagem sobre a embaixada em Israel


Vai mal um presidente quando precisa de grupos na rua em manifestações de apoio. Collor precisou. Pode ir mal um país quando seu presidente recomenda aos apoiadores evitar ataques ao Congresso e ao Judiciário. Que apoiadores são esses? Estarão enganados quanto às convicções democráticas de seu líder? Podem ter-se enganado, talvez, quando esse líder repassou em rede um texto sobre a impossibilidade de governar com as instituições. O tom do texto era golpista, mas ele declarou, depois, havê-lo simplesmente repassado. Por que repassou, se discordava, e sem adicionar uma palavra de rejeição? Isso nunca foi explicado, mas explicar nunca foi o forte desse presidente. Ele comprovou essa qualidade, mais uma vez, ao anunciar um projeto capaz de render mais que o trilhão de reais pretendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, com a reforma da Previdência. O projeto, soube-se depois, é uma fórmula para o governo ganhar dinheiro com a atualização de valor de imóveis incluídos na Declaração de Renda. Na prática, seria uma antecipação do imposto pago depois da venda. E se esse bem nunca for vendido? A ideia básica já foi rejeitada em países do mundo rico. Para o presidente e alguns de seus auxiliares, deve ser uma grande novidade. A propósito: o ganho para o Tesouro, se houver, ficará muito longe do trilhão, segundo fonte do próprio governo.

Enquanto o presidente se ocupava da manifestação, estranhamente descrita por alguns como um “protesto a favor do governo”, congressistas ocupavam espaço político, aprovavam na Câmara a medida provisória de recomposição dos ministérios e punham em tramitação um projeto próprio de reforma tributária.

Para alguns, a movimentação na Câmara foi um recuo do Centrão, pressionado pelo governo e por seus apoiadores. A visão oposta parece mais adequada. Afinal, os deputados, além de mostrar serviço, negaram a transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o Ministério da Justiça e se anteciparam ao projeto governamental de mudança dos impostos e contribuições. Pode-se discutir o alcance de cada um dos projetos, o da Câmara e o do Ministério da Economia, mas o Executivo foi inegavelmente atropelado – e sem invasão de atribuições, acusação dirigida ao presidente no caso do decreto sobre porte de armas. Mais importante ainda, parlamentares de peso, a começar pelos presidentes da Câmara e do Senado, já se declararam comprometidos com a reforma da Previdência, com ou sem atuação do Executivo.

Contestado no Parlamento e no Judiciário, o presidente acabou forçado a editar um novo decreto sobre o assunto, para restringir, por exemplo, o acesso a certo tipo de fuzil. Um dia antes, as ações da Taurus haviam disparado na bolsa paulista, depois de anunciada pela empresa uma fila de 2 mil pessoas interessadas na compra daquela arma. Entre outras mudanças, o segundo decreto reduziu as facilidades para crianças ingressarem nas escolas de tiro e iniciarem a vida no mundo do bangue-bangue, tão valorizado entre muitos bolsonaristas.

Mais um recuo foi incluído, portanto, na lista bolsonariana. O presidente já havia recuado, por exemplo, da tentativa de controlar o preço do diesel. Não parece ter abandonado totalmente a ideia, mas foi forçado a amaciar sua atitude depois de uma desastrada pressão sobre a diretoria da Petrobrás. Recuou também da decisão de impor seus critérios, formalmente, à publicidade das estatais. A bobagem estava claramente encaminhada, na área de Comunicação, quando o secretário de Governo, general Santos Cruz, chamou a atenção para a Lei das Estatais. Não pode o Executivo, segundo essa lei, meter-se em decisões administrativas como a publicidade estritamente mercadológica.

No começo do mandato o presidente já havia abandonado, ou pelo menos adiado, o plano de mudar para Jerusalém a embaixada em Israel. Advertido para o custo de uma encrenca com países muçulmanos, grandes importadores de alimentos produzidos no Brasil, reviu sua ideia e substituiu a mudança da embaixada pela instalação de um escritório comercial. Mais que uma decisão econômica, esse remendo foi uma tentativa de mostrar-se fiel ao compromisso de seguir, algum dia, seu líder Donald Trump e ao mesmo tempo contentar os apoiadores evangélicos. Nenhum desses motivos tem relação com os interesses políticos e econômicos de uma diplomacia de respeito.

O Executivo brasileiro recuou também do anunciado abandono do Acordo de Paris sobre o clima. Deu mais um passo atrás ao confirmar, depois de havê-la negado, a realização, em Salvador, de uma conferência regional preparatória para uma grande reunião sobre a questão climática em Santiago do Chile. Alguém próximo do presidente deve ter-lhe apontado os enormes custos diplomáticos e comerciais de suas bravatas anticonservacionistas. Os custos internos do empobrecimento ambiental deveriam ser suficientes, mas a esses o presidente e vários de seus auxiliares parecem absolutamente insensíveis.

Enquanto o presidente passava mais uma semana tropeçando, perdendo tempo e sendo forçado a recuar mais de uma vez, o vice Hamilton Mourão participava de reuniões em Pequim, era recebido pelo presidente Xi Jinping e tentava anular os danos causados por seu chefe e pelo ministro das Relações Exteriores na relação com a China, maior cliente das exportações brasileiras.

Além de ser grande compradora, a China tem um importante programa internacional de investimentos em infraestrutura. É preciso, sim, avaliar a conveniência de cada projeto, mas isso é função normal de um governo tecnicamente preparado, competente na ação diplomática e levado a sério pelas autoridades estrangeiras.

Sem essas qualidades, nenhuma passeata de apoio será suficiente para fortalecer um presidente e sua equipe. A ruindade será do governo. Não adianta culpar a democracia.

JORNALISTA

Auxiliares de Bolsonaro já veem risco em choques com Congresso - BRUNO BOGHOSSIAN

FOLHA DE SP - 26/05

Até assessores diretos do presidente criticam comportamento do PSL nas votações

A ficha começou a cair em alguns gabinetes do Planalto. Parte dos auxiliares de Jair Bolsonaro considera um risco o comportamento do partido do presidente e acredita que a estratégia de apostar na pressão das ruas contra o Congresso pode levar o governo ao precipício.

O primeiro teste da bancada lacradora, que usa a gritaria das redespara constranger os demais deputados, mostrou aos assessores presidenciais que esse modelo é insustentável. Enquanto blogueirinhos do PSL festejavam os 210 votos obtidos na derrota que tirou o Coaf de Sergio Moro, outros aliados de Bolsonaro assistiam a um desmoronamento.

A sigla se tornou um problema para os articuladores que estão verdadeiramente interessados em aprovar os projetos de interesse do governo. Em um par de dias, os parlamentares conseguiram descumprir acordos firmados dentro do palácio e ofenderam até colegas que estão dispostos a votar a favor de Bolsonaro.

Ainda que o tumulto tenha forçado a Câmara a desistir de criar um novo ministério, assessores do presidente entendem que é impossível governar dessa maneira. Se cada votação exigir uma balbúrdia do tipo, em poucas semanas não restará de pé nenhuma ponte com o Congresso.

Alguns deputados já levaram a queixa a Bolsonaro. Eles disseram ao presidente que a situação é grave, pediram que ele imponha disciplina ao PSL e interrompa os conflitos com os parlamentares.

Com o receio da deterioração completa das relações políticas do Planalto, cresceu entre assessores presidenciais a defesa de uma reforma ministerial imediata. A ideia é aproximar siglas e políticos que possam dar sustentação ao governo e reduzir sua dependência do caos.

Ainda que conselheiros mais sensatos tentem convencer Bolsonaro de que é preciso mudar, o resultado é incerto. Eles temem que asmanifestações deste domingo empurrem o governo de volta ao caminho anterior. Embora possa se sentir mais forte, o presidente fica cada vez mais vulnerável em seu castelo de areia.

Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA)

Os militares e Bolsonaro - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 26/05

Para o cientista político da FGV do Rio, os militares terão um papel central numa crise terminal do governo


A relação do presidente Jair Bolsonaro com os militares, corporação da qual saiu para a política e à qual dedicou prioritariamente seu trabalho parlamentar por 27 anos, tem sido conflituosa devido à intromissão dos que, no núcleo duro do bolsonarismo, vêem no grupo que está no governo o desejo de tutelar o presidente.

O filósofo online Olavo de Carvalho, orientador intelectual dos Bolsonaro, identificou no vice-presidente Hamilton Mourão um elemento desagregador no governo, e passou a atacá-lo, na suposição de que se oferece como alternativa a Bolsonaro.

Em seguida, o ministro Santos Cruz passou a ser o alvo, numa disputa pessoal com Olavo de Carvalho que teve até a clonagem de supostas mensagens de whattsapp em que o general criticava duramente o presidente. Estava em jogo o controle do sistema de comunicação do governo.

A veracidade dos diálogos foi negada por Santos Cruz, que provou ao presidente que é muito fácil montar diálogos fakes no celular. O general teve a ajuda de um filho que trabalha na área de tecnologia em uma empresa israelense de segurança.

São cerca de cem militares nos diversos ministérios e estatais, sendo que oito, além do presidente e do vice, estão no primeiro escalão do governo. Esse grupo, não por acaso, trabalha junto há anos, tendo a maioria feito parte de missões de paz da ONU.

Bolsonaro, que saiu do Exército como capitão, foi punido por questões disciplinares, já então assumindo a posição de porta-voz da corporação nas reivindicações salariais. Na campanha presidencial, quando já havia se tornado o candidato dos militares contra o PT, foi tido, simpaticamente diga-se, como “incontrolável” pelo General Villas Boas, comandante do Exército à época, e hoje assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo General Augusto Heleno, tido como o mais influente assessor junto ao presidente.

O professor da Professor da EBAPE da FGV do Rio, cientista político Octavio Amorim Neto, acaba de publicar um trabalho intitulado “Cenários para as Relações Bolsonaro-Militares”, onde esboça cenários para essas relações, depois de elas haverem "trincado" com os insultos dirigidos pelo bolsonarismo radical aos generais que trabalham no Palácio do Planalto.

Jair Bolsonaro não se solidarizou com os generais que servem à sua gestão, ressalta Octavio Amorim Neto, lembrando que “um dos seus auxiliares da caserna deixado claro que não afundarão com o governo”. O cientista político considera que “se o atual governo se tornar mais ou menos normal de centro-direita, os militares deverão ir gradativamente saindo da administração para dar lugar a políticos do Centrão”.

Octavio Amorim Neto acha que “escaldados pelas intrigas do bolsonarismo radical, e temerosos dos custos inerentes ao exercício do poder, os militares dariam sua missão por cumprida”. Esse cenário, contudo, é de baixa probabilidade, avalia Octavio Amorim Neto, e, com o cenário atual, “a presença dos militares no governo deverá permanecer alta”.

A continuar o que se vê, “Bolsonaro consegue apenas maiorias pontuais no Congresso, a centro-direita dividida não logra tomar decisões consistentes nem moderar os ímpetos disruptivos do chefe de Estado, a oposição se radicaliza, tudo isso resultando numa competição política com caráter marcadamente centrífugo”.

Octavio Amorim Neto acredita que “as frequentes crises e os contínuos fracassos do governo” vão criar um círculo vicioso: quanto mais o governo precisa dos militares, mais esses são combatidos tanto pelo bolsonarismo radical (abertamente) quanto pelos políticos do Centrão que querem seus cargos (veladamente); quanto mais agudas as tensões entre os militares e esses dois grupos, mais o governo erra e fracassa, e mais acaba recorrendo aos militares.

Embora considere que esse continua sendo o mais provável, Octavio Amorim Neto teme o cenário pessimista, “a degeneração da dinâmica centrífuga em crise de governo, por conta de um Executivo francamente minoritário e desastroso”. Nesse caso, analisa, “Bolsonaro vai para a ofensiva, atacando duramente o Congresso e outras instituições (Judiciário, imprensa, universidades, etc...)”.

Para o cientista político da FGV do Rio, os militares terão um papel central numa crise terminal do governo. O cenário pessimista, cuja probabilidade é crescente para Octavio Amorim Neto, e a ruptura dos militares com Bolsonaro são as duas faces da mesma moeda.

O inimigo adulador - ROBERTO ROMANO

O Estado de S. Paulo - 26/05


Saibamos discernir, rápido, o joio do trigo, pois nossas lágrimas serão de tormento



O século 20 gerou a noção do inimigo político. O nazismo identificou-o com os judeus, os ciganos, os homossexuais. Mas também integrou na lista os liberais, o sistema financeiro e os socialistas. A União Soviética perseguiu os “inimigos do povo”.

Carl Schmitt, aceito por setores ideológicos vários, teve a glória duvidosa de teorizar a tese sobre o inimigo. O jurista recusa a doutrina liberal sobre o Estado e criminaliza adversários. Ele usa o Léxico de Forcellini para expor o conceito de inimigo como “hostis”. Mas nas mãos de Schmitt a polissemia, exposta por Forcellini, some em proveito do sentido ideológico almejado. Refutando a leitura universal do amor cristão, diz o reacionário germânico: “Na luta milenar entre o cristianismo e o Islã, nenhum cristão teria a ideia (ao ler Mateus, 5, 44 e Lucas 6, 27, RR) de que seria preciso, por amor aos Sarracenos ou Turcos, entregar a Europa ao Islã, em vez de a defender”. Tal ideia do inimigo levou o Estado alemão a declarar guerra mortal (e como foi mortal!) aos inimigos. Dos judeus aos “seres degenerados” – homossexuais, socialistas, liberais, católicos que não apoiaram o regime, protestantes –, todos foram tratados como inimigos.

Quem deseja conferir o campo usado e distorcido por Schmitt leia o Lexicon Totius Latinitatis, de Egidio Forcellini (1775, reprint 1940). É relevante o livro de Fernando Bianchini Democracia Representativa sob a crítica de Schmitt e Democracia Participativa na apologia de Tocqueville (2014).

Ninguém precisaria usar o conceito tóxico de Schmitt por falta de conhecimento sobre o tema. Na relação amigo/inimigo (assumida pelo atual ocupante do Planalto) consultemos o padre Antonio Vieira no Sermão da Primeira Sexta-Feira da Quaresma (1651). O inimigo, diz ele, não é o que cerca as cidades e faz a guerra contra o nosso Estado. “Os que nos fazem guerra (...) não se chamam propriamente inimicos, chamam-se hostes. Inimicos são os inimigos por inimizade e ódio, como costumam ser os de dentro: hostes são os inimigos por hostilidade e por guerra, que só podem ser os estranhos e os de fora”. Se o estrangeiro não pode ser inimigo, quem o seria? Sábios cristãos e do paganismo “ensinam concordemente que os inimigos dos reis, e os maiores inimigos, são os aduladores”. Os palacianos assumem tal posição. “E se isto não veem claramente todos os reis, é porque é tal o doce veneno da lisonja que, entrando pelos ouvidos, lhes cega também os olhos.” Agostinho “ensina que há dois gêneros de inimigo: uns que perseguem, outros que adulam; mas que mais se há de temer a língua do adulador que as mãos do perseguidor”.

Vieira termina: “A adulação é aquele perpétuo mal ou achaque mortal dos reis, cuja grandeza, opulência e impérios muitas mais vezes destruiu a lisonja dos aduladores que as armas dos inimigos (...). E, se em algum dos que servem ao rei se provasse que ama mais o seu interesse que o rei, provado estava que este tal é inimigo do rei”.

Símile derradeiro: “A aranha não tem pés e, sustentando-se sobre as mãos, mora nos palácios dos reis”. Ela sobe “a um canto dessas abóbadas douradas e a primeira coisa que faz é desentranhar-se toda em finezas. Com estes fios tão finos, que ao princípio mal se divisam, lança suas linhas, arma seus teares, e toda a fábrica se vem a rematar em uma rede para pescar e comer”. E o que os aracnídeos adulões pescam? “As melhores comendas, os títulos, as presidências, os senhorios, e, talvez, (...) pescam o mesmo dono da casa. As palavras brandas do adulador são redes que ele arma para tomar nelas ao mesmo adulado. (...) E como ninguém pode servir a dois senhores sem amar a um e ser inimigo do outro, provado fica, sem réplica, e concluído, que quantos forem em palácio os amigos de seus interesses, tantos são os inimigos dos reis (...) um dos sete sábios da Grécia, perguntado qual era o animal mais venenoso, respondeu que, dos bravos, o tirano, dos mansos, o adulador.”

A distinção entre inimigo externo e interno domina a geopolítica do século 20. Carl Schmitt foi relevante nas formulações estratégicas de muitos Estados ocidentais (leia-se de Schmitt La Guerre Civile Mondiale, essais 1943-1978). Mas o nosso Vieira identificou (com Plutarco no tratado Sobre Como Distinguir o Amigo do Bajulador) o inimigo interno que tece intrigas e adulação. O palaciano impede o exercício regular do poder. Ele aumenta com desmesura o ego do governante e o torna cego, mudo, surdo aos reclamos da República. Como diz Plutarco, o filósofo (profissão hoje expulsa do Brasil): ninguém condena uma pessoa porque ela ama a si mesma. Condenável, no entanto, é pensar que ela pode ser bom juiz em causa própria: o amante é cego aos defeitos do amado.

Infelizmente a corte de Brasília está repleta de turibulários. O caso mais lamentável é o do chanceler, que, em data recente, colocou o governante nas alturas do ser divino. “Ernesto Araújo chorou e comparou o presidente Jair Bolsonaro a Jesus Cristo. Em referência ao presidente da República, que estava presente na cerimônia de formatura, Araújo citou trecho do Evangelho que diz que a pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular” (Estado, 3/5). A terrível blasfêmia foi recebida mornamente por cristãos e nenhum padre ou pastor protestou. Caso um ente humano seja posto como divino temos duas escolhas: ou regredimos ao Império Romano, quando os césares eram numes, ou avançamos para uma religião herética do Estado. A bajulação hiperbólica é máxima inimizade política.

Do momentâneo delírio aracnídeo governamental parece afastado apenas o setor militar, não por acaso atacado com violência pelas seitas que dominam o palácio. Saibamos discernir, rápido, o joio do trigo, pois as nossas lágrimas serão de tormento, ao contrário das vertidas pelo chanceler.

PROFESSOR DA UNICAMP, É AUTOR DE 'RAZÕES DE ESTADO E OUTROS ESTADOS DA RAZÃO' (PERSPECTIVA)

Algazarra autoritária - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 26/05

Instituições impediram Bolsonaro de engrossar o coro de manifestações anômalas


Os atos marcados para este domingo (26) no país estão envolvidos numa névoa de incerteza. Não se sabe bem a que vieram, nem tampouco quem exatamente os estimula.

Fala-se em reafirmar respaldo ao presidente Jair Bolsonaro (PSL). Cogita-se criticar o chamado centrão e a “velha política”. Ensaia-se um grito em defesa da Lava Jato.

Parte dos agitadores hostiliza o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. Um líder caminhoneiro prometeu que haverá tumulto de norte a sul e um cerco de veículos à sede do Legislativo federal, qualificado por ele de “câncer”.

Em mais de três décadas de regime, pela primeira vez as instituições democráticas no Brasil têm de lidar com rebentações políticas abertamente autoritárias. A situação se complica porque o presidente elegeu-se com o apoio desses grupos, os quais adulou.

Não se pode perder de vista, no entanto, a dimensão ainda diminuta desses nichos de truculência e, sobretudo, a repulsa crescente que suas invectivas têm despertado em organizações civis e estatais.

Após testar as águas, Bolsonaro parece ter percebido o risco de isolamento em que incorreria se contribuísse para inflamar as manifestações deste domingo. Afirmou que não iria aos atos e desestimulou a participação de seus ministros. Também criticou os vitupérios contra o Supremo e o Congresso.

Instinto político, mais que convicção, motivou o presidente, pois o quadro não favorece aventuras.

Enquanto o governo exibe desnorteio, o Congresso tolhe prerrogativas e desejos do Planalto e vislumbra uma agenda própria de votações. O vice-presidente toma distância cautelar das confusões promovidas ou toleradas pelo titular.

O Ministério Público avança na investigação de atividades atípicas no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador. O Parlamento alerta para o desbordo do Executivo no decreto das armase ameaça derrubá-lo.

Multidões foram precocemente às ruas desafiadas pela boçalidade de um ministro destrambelhado.

As instituições reprimem, assim, o elemento despótico associado à ascensão de Bolsonaro. Reiteram ao presidente que o caminho para realizar seu plano de governo não admite desvio do Estado de Direito.

A convocação temporã de atos em prol do presidente da República é uma anomalia. “Protestos a favor” de quem detém o poder raramente se revestem de intenções virtuosas. Com frequência objetivam enfraquecer os mecanismos de controle que impedem o chefe circunstancial do Executivo de atuar como se fosse um imperador.

Graças a esses mecanismos, Bolsonaro não pôde engrossar o coro dos radicais que prometem ir às ruas hoje. Ainda assim, é preciso estar atento à escala e às mensagens dessa algazarra autoritária.