domingo, maio 31, 2009

MERVAL PEREIRA

A evolução da China

O GLOBO - 31/05/09

A posição dos empresários chineses no recém encerrado Encontro Empresarial de Copenhagen sobre clima foi a maior surpresa do evento internacional. O reconhecimento por diversos líderes empresariais de que o desenvolvimento sustentável é uma "responsabilidade corporativa", e que o crescimento econômico da China tem que se compatibilizar com a proteção ambiental é uma mudança fundamental, juntamente com as metas governamentais de redução dos gases de efeito estufa. O governo está forjando uma agenda agressiva para atingir a meta de 15% de toda a energia renovável ser de eletricidade em 12 anos, e aumentar a eficiência energética em 20% em dois anos. Sem contar com o fato de que a China hoje já é líder em energia solar e eólica.

O empresário Paulo Protásio, que fez parte da delegação brasileira na reunião, ficou impressionado com a mudança. "Vamos tomar um banho de estratégia, inteligência e iniciativa a partir de agora daqueles que tinham uma imagem mais duvidosa do que a nossa no mercado", comenta.

Protásio acha que a crise financeira não se vai resolver "se não se apoiar em novos elementos para servir aos objetivos de um desenvolvimento limpo e sustentável".

Na mesma linha do historiador Jim Garrison, presidente da ONG State of the World, criada por Mikhail Gorbachev para a preservação do meio ambiente, que considera equivocada a política dos Estados Unidos e da Europa de jogar milhões de dólares nos bancos, como se a crise fosse apenas do sistema financeiro, e não do sistema como um todo.

"A única maneira de lidar com a crise financeira é lidar com o aquecimento global", diz Garrison. Sobre o encontro de Copenhagen, ressalta a importância da posição dos Estados Unidos, Índia e China, que respondem por 85% das emissões.

Outra questão, afirma, é a dos recursos que o Norte (ricos) precisa fornecer ao Sul (pobres) para que ele possa atingir as metas a serem definidas na conferência.

Embora não acredite que haverá grandes alterações na reunião de Copenhagen em 7 de dezembro, porque não vai dar tempo para o novo governo dos Estados Unidos estabelecer suas normas, Paulo Protásio está convencido de que o Congresso americano vai aprovar o substituto do Protocolo de Kyoto e os Estados Unidos entrarão nesse mercado de carbono mundial, cujos grandes compradores de certificados de emissão são o Japão e a Europa.

O mercado de carbono a nível mundial continuou a crescer em 2008, chegando a um total de transações de US$126 bilhões no final do ano, o dobro praticamente do volume de 2007.

O Brasil, que já foi líder, foi ultrapassado pela China, pela Índia e agora estamos ameaçados pelo México. A China está fazendo um sistema de aprovação de projetos de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) em quantidades semelhantes ou superiores ao do Brasil, mas com prazos mais curtos, sem grandes burocracias. Mais de 70% dos projetos são do mercado chinês.

Na definição de Paulo Protásio, ela está mandando um recado para o mundo de que vai adotar a política limpa por decisão própria, e está liderando o mercado. "Nós no Brasil, que já lideramos esse mercado, temos vantagens que não podemos desperdiçar. Nossa matriz energética é limpa", lembra Protásio.

Um dos projetos brasileiros é justamente o de transferir a tecnologia brasileira já existente para a África. O projeto prevê que entre 2009-2010 todo o continente africano seja mapeado por satélite para que seu potencial agrícola receba a tecnologia de baixas emissões de carbono com a assessoria da Embrapa.

Segundo o embaixador Sérgio Serra, representante do Brasil nas reuniões sobre o clima, o Brasil encara as presentes negociações (que levarão à COP-15 em Copenhague) com a maior seriedade. Queremos um resultado robusto e equitativo. Que leve:

1) a novos e mais profundos cortes de emissões no âmbito do Protocolo de Kyoto (é importante destacar aqui que o Protocolo não expira em 2012; o que expiram nessa época são as metas referentes ao seu primeiro período de cumprimento);

2) a compromissos comparáveis (aos de Kyoto) por parte dos EUA;

3) a ações efetivas de mitigação por parte dos países em desenvolvimento, apoiadas por financiamentos e cooperação tecnológica (por parte dos desenvolvidos), tudo de forma mensurável, "reportável" e verificável.

Segundo ele, estamos dispostos a ir além da parte que nos toca no que foi acertado em Bali: há ações de mitigação que pretendemos levar adiante por nossos próprios esforços, sem necessariamente contar com recursos financeiros e tecnológicos externos.

Quanto às sugestões do Jim Garrison, Serra vê perfeitamente o Brasil assumindo um papel de liderança em políticas públicas e ações tendentes a controlar ou reduzir emissões, induzindo um desenvolvimento cada vez mais sustentável.

Esse papel já é claro hoje na área dos biocombustíveis e no crescente uso de biomassa como fonte de energia. Essas e outras ações que estamos empreendendo ou iremos empreender no futuro próximo já farão com que haja uma queda significativa na curva de crescimento das nossas emissões totais - que é o que se espera, no momento, de economias emergentes como a nossa, diz o embaixador.

Quanto a antecipar para 2020 a adoção de metas de redução absoluta de emissões, o embaixador Sérgio Serra acha a data um pouco próxima. "Não sei se até lá já teremos superado nossas sérias e ainda pendentes dívidas sociais (um programa como o Luz para Todos, por exemplo, leva necessariamente a um aumento de emissões). Quem sabe 2030?"

O RATO IDIOTA


JOÃO UBALDO RIBEIRO

A nova monarquia

O GLOBO - 31/05/09

A gente tem a impressão de que o governo já entrou em campanha eleitoral faz algum tempo, mas ele nega, de forma que deve ser mentira, porque o governo não mente aos cidadãos. Contudo, assim ou assado, mentira ou não, o assunto tem sido bastante discutido, geralmente levando ao debate sobre o terceiro mandato do presidente Lula, que ele, com o ar docemente constrangido e aparentando, não sei se intencionalmente, uma convicção bem menos incisiva que em relação a quase tudo mais, diz que não quer. Na quase impossível hipótese de ele me dizer isso pessoalmente, eu fingiria acreditar por uma questão de educação e respeito ao cargo dele. Mas claro que, como venho dizendo há bastante tempo, não boto fé nessa negativa -para mim está feericamente estampada no semblante dele a vontade de ficar até quando Deus permitir. Acho que nunca vi alguém tão feliz da vida quanto ele, subindo e descendo em aviões e entrando e saindo de castelos e palácios, claro que ele está num barato permanente.

Também como antes, não acho tão improvável assim que um terceiro mandato se concretize, nos moldes de uma das muitas fórmulas a que se pode recorrer, inclusive um mandato-tampão, enquanto se elabora e vota uma nova constituição, seguido de ainda outro mandato para o mesmo ocupante, o que naturalmente, seria facultado pela nova carta. Surpresa nenhuma. Já aconteceu conosco e, em linhas gerais, acontece em toda parte, geralmente em países atrasados. Para mim, golpe; para outros, manobra legítima, contanto que respeitados os rituais que nos acostumamos a identificar com a democracia e que, muitas vezes, são tão democráticos quanto as eleições a bico de pena da Velha República, por exemplo.

Ouso oferecer a hipótese, que acredito ser amplamente corroborada pelos fatos, de que a verdadeira vocação do presidente Lula não é ser presidente. Para isso ele não tem muita paciência, ainda mais com esse negócio de sentar para despachar, estudar, debater, resolver. Deve ser por isso que tem tantos ministros. Aparece um problema e, se ele, muito implausivelmente, já não tem um Ministro Especial para Problemas que Aparecerem, cria um num piscar d´olhos. Acredito piamente que, se ele pudesse mandar sem governar, ficaria ainda mais feliz. Mandar é ótimo, ter poder é indescritível. Governar é que é chato, não só porque é trabalho, ainda mais para quem nunca trabalhou na vida, como também só traz dor de cabeça, provoca inimizades, chateia nas horas mais incômodas e assim por diante.

A verdadeira vocação dele, continua minha hipótese, é ser rei. Excetuando o feio hábito de não aparecer pessoalmente nos locais de calamidades públicas e tragédias, hábito este que acho que já começou a rever, ele faz com extraordinário gosto tudo o que um rei contemporâneo faz. Livre das amarras dos despachos e da burocracia, podendo até falar mal dos governantes, já que não administraria e seria vitalício e estes são passageiros, terá condição de dedicar-se em tempo integral ao que de fato gosta de fazer e, a seu modo, sabe fazer. Não deixa de ser uma idéia. Por que não, afinal? Somente porque alguns descompreendidos e eu não queremos? Creio (no meu caso, melhor trocar de verbo e botar ´receio´) que, se for realizado um plebiscito, também identificado bobamente com democracia, a idéia do terceiro mandato seria aprovada, talvez até retumbantemente.

E não há por que supor que, com essa permanência no poder, pois ninguém sabe hoje em quanto ela se prolongará, uma tal pressão internacional de que já ouvi da boca de um comentarista limitará a permanência do presidente no poder. Tampouco creio que vá haver pressão internacional alguma. Da mesma forma que velho rico é excêntrico e o mesmo velho, se pobre, é broco e chato, arranjariam logo um nome artístico para o novo regime que mascararia o fato de estarmos ingressando numa era neo-peronista, e dando um enorme passo atrás. ´Esse é o cara´, disse o presidente Obama e a exegese correta é a mais óbvia. Lula era um problema iminente, pois viria para reformar a fundo, para mudar e contrariar interesses arraigados e poderosos. Como se vê, não é nada disso, antes pelo contrário, é agir ´como sempre se fez neste país´. Quem era poderoso ficou mais, quem era rico ficou mais. Os ricos continuam a não pagar impostos e os pobres e remediados custeiam sem saber uma ´distribuição de renda´ que não existe para os ricos. Ou seja, ele passou de problema a solução, menos um peso enorme no já carregadíssimo balaio de preocupações, não apenas de Obama, mas dos europeus, dos banqueiros, das grandes empresas, de todo mundo que estava preocupado em ser incomodado ou contrariado com a ascensão da ´esquerda´ ao poder. Arrenego da esquerda. O presidente que nós temos é o que eles pediram a Deus.

Tudo bem, é uma, mas esquerda não. Lula talvez tenha vindo para reformar, mas, assim que se viu no poder, seu olhar mudou, numa prova viva de que a sociologia do conhecimento ainda tem terreno fértil para estudos de caso. A verdade tem uma cara quando se está por baixo, outra quando se está por cima. Nada como a posição social do indivíduo, dizia-se antigamente. Pois é, vista de cima a realidade é percebida por outra ótica e o operário utópico, visionário e agitador deu lugar ao bom burguês bonachão e paternal, que chegou, não para mudar, mas para conservar e aperfeiçoar o que já está aí. Tenho grandes reservas sobre como está sendo feita essa conservação e, notadamente, o aperfeiçoamento, que me parece somente adiar ou, ao longo prazo, agravar nossos problemas. Mas é melhor, por via das dúvidas, irmos nos acostumando à idéia de um terceiro mandato. E um quarto, um quinto, um sexto etc. 

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO


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MÍRIAM LEITÃO

Perdas e danos

O GLOBO -31/05/09

O estado das artes da crise econômica internacional agora é: o pânico, o mais assustador dos episódios recentes, foi vencido. Os bancos americanos receberam de ajuda direta mais do que valem hoje no mercado, apesar da recuperação do valor das ações. Na prática, são estatais. A GM será oficialmente estatizada nos próximos dias. No Brasil, de novo, os capitais desembarcam loucos por rentabilidade.

No final de abril, pouco mais de seis meses da quebra do Lehman Brothers, num debate em Nova York, o senador americano Bill Bradley disse que não acreditava que se pudesse falar em recuperação. Ele usou números: a ação do Citibank, que valia US$60, tinha caído para US$1, e, naquele 30 de abril, estava valendo US$3. "Eu não chamo isso de recuperação", disse ele.

Naquela época, o Citi poderia ser comprado por US$17 bilhões, e isso era menos de um terço do que o governo americano havia colocado no banco em ajuda direta. Sem falar das outras formas de ajuda, como a garantia dada ao banco, que soma US$340 bilhões. A situação melhorou mais um pouco em maio. Na última sexta-feira, a ação do Citi valia US$3,65, e o valor de mercado era US$20 bi, um terço do que deu o governo. O fato é que até agora, com todas as ferramentas inventadas pelo governo Obama para sanear os bancos, dando a impressão de estar usando de maneira diferente o dinheiro do contribuinte, ainda não foi possível separar a parte boa da parte ruim de cada instituição.

O historiador Niall Ferguson disse que o mundo está agora na fase da "terapia", depois de superada a fase do colapso nervoso que se seguiu à quebra do Lehman. Só que os remédios usados são contraditórios, porque os governos estão usando a expansão monetária que seria indicada por Milton Friedman junto com a expansão fiscal que seria receitada por John Maynard Keynes. - Não se pode ser monetarista e keynesiano ao mesmo tempo - disse Ferguson.
Nouriel Roubini discorda. Acha que sim, podem ser usadas todas essas armas e foi exatamente esse uso simultâneo de ferramentas monetária e fiscal, por tantos governos, que reduziu o risco de uma depressão como a que houve em 1929. Mesmo parecendo, por essa frase, que o famoso pessimista está mudando de lado, Roubini disse que está menos certo que seus colegas de que a economia americana vai se recuperar ainda este ano. Ele acha que, no máximo, a economia vai melhorar de -6%, que é o ritmo do primeiro trimestre de 2009, para -2%, que seria o ritmo do último trimestre do ano. Muitos economistas ainda acham que será de 2%, no positivo, portanto, o ritmo de crescimento do fim do ano. Apesar de apoiar o relaxamento monetário americano neste momento, Roubini prevê que US$9 trilhões serão acrescidos à dívida americana por causa da crise.

Paul Krugman assinalou que está havendo uma mudança histórica de comportamento das famílias americanas depois de perderem, segundo cálculos dele, US$13 trilhões em riqueza líquida. Agora, os americanos estão poupando. A taxa de poupança americana, que tradicionalmente é zero, está em 4%. E não é a China que está comprando a nova coleção de títulos do Tesouro americano lançados recentemente, mas sim as famílias americanas. O problema: essa poupança não está se transformando em investimentos porque o empresário americano não tem estímulo para investir diante da queda tão pronunciada do consumo.

George Soros acha que o mercado financeiro acabou, pelo menos como ele é conhecido atualmente.

- Ele entrou em colapso e agora está sendo mantido vivo por aparelhos - disse o antigo especulador.

Ele acredita que o impacto da crise bateu fortemente no setor real, que caiu em queda livre e de forma global.

O tamanho da dívida americano que virá como ressaca da crise começa a preocupar os economistas, os mesmos que apoiaram o aumento da expansão fiscal e monetária para evitar o pior, ou seja, a depressão. Krugman diz que no passado, após a Segunda Guerra, por exemplo, a dívida americana chegou a 100% do PIB e foi facilmente possível financiá-la. Mas ele não tem certeza de que agora será tão fácil. A crise provocará no futuro outros desequilíbrios. O que se aprende na leitura dos debates, como este, é que todas as lições sobre como evitar 1929 foram aplicadas. Naquela época, eles deixaram os bancos quebrar, 75% dos donos de imóveis deram calote em suas hipotecas, o Fed apertou a política monetária e isso levou à depressão. Mas agora, todos estão em terreno desconhecido. Evitaram o pior, mas como lidar com as consequências das decisões tomadas e toda a ressaca da crise?

Nas economias do mundo inteiro este está sendo um ano difícil, mesmo quando começam a bater nas praias as espumas de uma extraordinária recuperação das bolsas, como os 80% que o Ibovespa subiu em sete meses, desde o pior momento da crise. A Bovespa que sobe assim está no mesmo país onde a Fiesp avisa que a produção industrial no ano pode ficar em -5%. Há quem estime queda maior.

Um dos sinais vem agora na segunda-feira, quando saírem os dados da produção industrial de abril. A Tendências Consultoria prevê alta mensal de 1,3%, o que levará a uma queda anual de 14,8%. Por muito tempo, o mundo ainda fará a contabilidade das perdas e danos desta crise.

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O PAC SEM RESULTADOS

EDITORIAL

O ESTADO DE S. PAULO - 31/5/2009

Não saiu do papel a maior parte das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a grande promessa de realizações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu segundo mandato. Nos primeiros dois anos, o governo concluiu só 3% das 10.914 obras previstas. No fim do ano passado, 23% estavam em andamento e 74% continuavam na intenção. Há menos de dois meses, no dia 6 de abril, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, mencionou as obras do PAC, num discurso em Montes Claros, como ações importantes para a superação da crise econômica. Outros ministros haviam usado a mesma retórica desde o ano passado: o Brasil, segundo eles, já dispunha de uma política anticíclica e isso ajudaria a enfrentar a recessão global. Se o País dependesse apenas desses investimentos para voltar a crescer, a recessão no Brasil seria muito mais longa. Neste ano, a execução dos projetos continua lenta e mais uma vez o valor investido ficará muito abaixo do total projetado oficialmente. 

As 319 obras concluídas até dezembro do ano passado, 3% das planejadas, absorveram R$ 47,7 bilhões, 7% dos R$ 646 bilhões previstos para o programa. A maior parte do investimento, segundo o cronograma oficial, deverá realizar-se até 2010, ficando um pequeno resíduo para o próximo governo. A maior parte do investimento ficará a cargo da Petrobrás e os avanços têm ocorrido principalmente nessa área. As obras terminadas nos chamados eixos de infraestrutura energética e logística receberam R$ 47,6 bilhões, quase todo o dinheiro aplicado em projetos concluídos, de acordo com levantamento divulgado pela organização Contas Abertas, uma respeitada ONG especializada no acompanhamento das contas públicas. No Rio de Janeiro, o Estado com maior valor gasto em obras prontas, só os investimentos da Petrobrás em 3 plataformas e na implantação de um terminal de gás liquefeito custaram R$ 11,4 bilhões. 

Quando se excluem os projetos da Petrobrás e de outras empresas, a lista de realizações fica reduzida a quase nada. O chamado PAC orçamentário, custeado diretamente pelo Tesouro Nacional e administrado pelo governo, continua emperrado. Neste ano, o governo empenhou até 26 de maio apenas R$ 9,8 bilhões, 19,9% dos R$ 49,3 bilhões programados para investimentos no PAC e noutros projetos. O desembolso, R$ 1 bilhão, ficou em 2% da verba total autorizada para o ano. Valores pagos além desse bilhão correspondem a restos de exercícios anteriores. 

No mesmo período, isto é, até 26 de maio, o governo central empenhou R$ 1,28 trilhão, 80% do total orçado para o ano, e desembolsou R$ 493,4 bilhões, 31,2% da soma prevista para 2009. Os gastos com pessoal e encargos sociais chegaram a 32,6%. As demais despesas de custeio alcançaram 33% do valor autorizado. Mas esses gastos são mais ou menos automáticos e dependem apenas da administração rotineira. A gestão dos investimentos - desde a concepção dos projetos até a sua execução - é muito mais complicada. Uma de suas dificuldades é a coordenação de atividades em diferentes áreas do governo. O licenciamento ambiental, frequentemente apontado como o grande entrave, é, no entanto, apenas parte do problema. Mas é uma boa ilustração de como funciona mal o mecanismo administrativo: os funcionários do setor têm trabalhado como se os seus cronogramas fossem independentes dos objetivos do governo e a sua missão não fosse conciliar desenvolvimento e conservação. 

Desde a primeira gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, esse trabalho de articulação foi atribuído à chefia da Casa Civil. O resultado foi quase nulo no primeiro mandato e não melhorou muito no segundo, quando foi entregue à ministra Dilma Rousseff o papel de gerente do recém-criado PAC. Essa gerência nunca foi mais do que um título quase honorífico. 

Até agora, o investimento público tem sido principalmente um componente da retórica política do presidente Lula e de seus companheiros. Essa retórica pode impressionar o público menos informado. Produtores, transportadores e exportadores conhecem muito bem, no entanto, os custos de uma infraestrutura deficiente, uma das principais desvantagens do Brasil no confronto com outras potências emergentes ou desenvolvidas. Palavrório não transporta carga, não fornece energia nem cria empregos. Mas o PAC, até agora, não é muito mais que palavrório. 

ELIO GASPARI

A previdência privada precisa da luz do dia

O GLOBO - 31/05/09


Rentabilidade de 12% ao ano é propaganda enganosa. Se fosse verdade, Wall Street teria se mudado para o Brasil



A REPÓRTER Samantha Lima deu o aviso: o benfazejo declínio das taxas de juros provocará uma queda no rendimento dos planos de previdência privada. Em alguns tipos de contratos os bancos deverão ficar com a conta. Em outros, os clientes pagarão mais ou receberão menos. Em qualquer situação, fingir que o problema não existe será o caminho para um desastre.
Numa simulação instrutiva, uma pessoa que aderiu a um plano de previdência em 2005, aos 30 anos, depositando R$ 200 mensais, podia esperar que aos 60 teria um patrimônio de R$ 539 mil, rendendo R$ 2.697 a cada mês. Essa era a equação oferecida quando a Bolsa Copom estava em 12%.
Se algum dia os juros caírem para 6% ao ano, o mesmo tipo de cidadão, depositando os mesmos R$ 200 mensais durante 30 anos, formará um patrimônio de R$ 120 mil, de onde sairá uma renda tipo INSS, de R$ 603.
É provável que o Brasil tenha sido o único país do mundo onde se venderam planos de previdência privada com a ilusão de rendimentos indexados. Em alguns casos, inclusive nos fundos estatais, ofereceu-se o IGPM mais 6%. Esse sistema só funciona num regime de juros e/ou inflação altos. Baseia-se na fantasia da criação de dinheiro por geração espontânea. Quando a inflação é baixa e os juros caem, a remuneração do investimento também cai. É o jogo jogado.
Em países verdadeiramente capitalistas, os fundos de previdência remuneram sua clientela pela qualificação de seus gestores. É a arte de investir com segurança em títulos e ações de empresas eficientes que diferencia os fundos e seus administradores. Mesmo assim, quando uma economia como a americana entra em parafuso, os fundos perdem dinheiro e seus clientes sabem que deverão esperar mais alguns anos para se aposentar. Novamente, é o jogo jogado.
Hoje há 12 milhões de contratos na rede de previdência privada aberta.
Eles formam uma poupança de R$ 148 bilhões e juntam dois tipos de investidores. Numa parte estão contratos em que a empresa se comprometeu com uma rentabilidade anual mínima de suas reservas. Quem ofereceu IGPM mais 6% terá que honrar a palavra. Em outros, como na simulação aí de cima, as mensalidades e os benefícios flutuam, frustrando expectativas baseadas em ilusões.
A normalização dos juros não é um problema, é uma solução. Uma economia com Selic baixa incentiva os investimentos que criam empregos e produzem renda. Essa solução só virará encrenca se o governo e a banca fingirem que os juros baixos não devem influenciar o desempenho dos fundos de previdência.
Lamentavelmente, por causa do hábito de varrer a realidade para baixo do tapete, o mercado de previdência privada brasileiro entra em colapso a cada 20 anos. Assim foi nos anos 60, na crise dos montepios, e assim foi nos 80, quando os planos econômicos e a inflação corroeram o valor do contratos. Nos dois casos, quem captou engordou e quem poupou emagreceu.
Quem tem plano de previdência, ou quem quer comprar um, precisa defender seu patrimônio. Dinheiro não gosta de quem não cuida dele. Há dois cuidados disponíveis. Se o plano cobra uma taxa de administração acima da média de 3% (que já é alta), deve-se sentir o cheiro de queimado. Gracinha: se o rendimento ficar em 6% brutos, a banca morde a metade.
Qualquer operador que ofereça planos atrelados a indexadores deverá avisar que o vento muda de direção. (Isso fazendo de conta que o governo não manipula os índices.)
Há bancos oferecendo simulações com opções de rentabilidade de até 12% ao ano. É propaganda enganosa, até mesmo porque logo adiante os doutores dizem que essa percentagem não é garantida. Claro que não é.
Se fosse, Wall Street já teria se mudado para a avenida Paulista.
O mercado nacional de previdência privada está sólido, mas a oferta de remuneração atrelada a indexações funciona como um narcótico ao tempo dos juros altos e vira veneno quando a situação se normaliza.

ALOIZIO REX
O doutor Aloizio Mercadante está a um passo de uma proeza: legitimar a liderança de Renan Calheiros sobre uma banda do Senado.

RECORDAR É VIVER
Tratando da lambança ocorrida com livros didáticos no governo de São Paulo, seu secretário de Educação, Paulo Renato Souza, condenou o método de escolha das obras e mostrou quão boa é a opinião que tem de si próprio: "Quando eu estava no MEC nós nomeamos uma comissão formal para a escolha dos livros para as crianças". Faltou dizer que quando o doutor estava no MEC, com comissão e tudo, foi incluído no Programa Nacional do Livro Didático, para os alunos da 5ª e 8ª séries, um compêndio de história que qualificava Mao Tse-tung como "grande estadista e comandante militar". A Revolução Cultural que assolou o país entre 1966 e 1976 teria sido "uma experiência socialista muito original". No barato, a originalidade custou 1 milhão de vidas. O filho de Deng Xiao Ping, que viria a consertar o estrago de Mao, foi atirado do terceiro andar de um prédio da Universidade de Pequim. O primeiro hospital a que foi levado negou-lhe tratamento. Ele ficou paraplégico, está vivo e participou da organização da Olimpíada. Os sábios do tucanato recomendaram a obra em 2002 e o comissariado petista confirmou a escolha em 2005, mas cassou-a dois anos depois.

SINCERIDADE
De um grão-tucano paulista defendendo o voto de lista numa conversa paralela às negociações que resultaram na mumificação da proposta: "Eu não aguento mais pedir voto".

DEDO AMERICANO
Veio do FBI o sopro que resultou na prisão de um libanês residente no Brasil, casado com brasileira e pai de uma filha brasileira. Os comissários americanos precisam produzir um papel que formalize as acusações contra K., que teria ligações com a Al Qaeda.
Estranho episódio, porque o FBI e a polícia brasileira sabem trabalhar em silêncio. Em 2001, dois agentes americanos baixaram no Rio atrás de três originais do pintor Norman Rockwell, o gênio do realismo capitalista. As obras valiam US$ 1 milhão, haviam sido roubadas em 1978 numa galeria de Minneapolis e um mercador brasileiro tentava vendê-las a colecionadores americanos. Depois de uma conversa com os agentes do FBI, o marchand José Maria Carneiro foi à sua casa de Teresópolis, desengavetou os quadros e devolveu-os. Tudo dentro da lei, mas sem barulho. Passados oito anos, é o FBI quem conta o caso.

FICOU DIFÍCIL
A derrota da candidatura de Ellen Gracie para uma toga da OMC reduziu a possibilidade de o chanceler Celso Amorim disputar, mesmo discretamente, um cargo na burocracia internacional a partir de 2010.

COISA DE POBRE
Diante da gastança com mordomias do Judiciário, duas vinhetas de uma Corte inexpressiva, de um país miserável:
O juiz David Souter, que decidiu deixar a Suprema Corte dos Estados Unidos, dirige seu próprio Passat. Quando Souter chegou a Washington foi procurar apartamento para morar (à sua custa). Ao preencher a papelada, não sabia quanto ganhava no último emprego, nem no novo (US$ 10 mil por mês). Outro juiz da Corte, Henry Blackmun, chegava para o serviço dirigindo um fusca.

VAMOS REZAR


BRASÍLIA - DF

Água fria

Denise Rothenburg

CORREIO BRAZILIENSE - 31/05/09

Os técnicos da Câmara alertaram o presidente da Casa, Michel Temer, sobre o perigo de o Supremo Tribunal Federal, presidido por Gilmar Mendes, derrubar a proposta de os deputados e senadores eleitos em 2011 serem convocados para se dedicar à reforma política como um Congresso Constituinte unicameral. O raciocínio dos técnicos - compartilhado nos bastidores por alguns ministros da Suprema Corte - é o de que os constituintes de 1988 puderam optar por entre revisar o texto constitucional a cada cinco anos ou convocar uma única revisão para 1993. Venceu a tese de apenas uma revisão, a de 1993, que terminou incinerada pelo clima da CPI dos Anões e do caso Collor. Sendo assim, daqui para frente, qualquer alteração na Carta deve ser feita por emendas constitucionais que, para aprovação, dependem de 308 votos na Câmara e 57 no Senado. É essa tese que começa a ganhar voz no STF como um balde de água fria na emenda oferecida pelo deputado José Genoino (PT-SP) de convocar um Congresso em 2011. Pelo visto, essa novela das reformas que nunca saem terá mais capítulos do que muitos imaginam.

Quem rechaça o nome de João Pedro porque ele é suplente do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, e pode sair do Senado no final deste ano ou abril do ano que vem, logo recebe a seguinte resposta de governistas; "E quem disse que esta CPI irá até 2010?"

Teto baixo

Contemplado com a maior parcela dos R$ 6 bilhões destinados ao programa Minha Casa, Minha Vida, o Ministério das Cidades poderá desembolsar apenas R$ 496 milhões dos investimentos previstos. Esse é o valor máximo definido pela equipe econômica na contenção de gastos nestes tempos de crise. Se quiser elevar o limite, o governo terá de revisar a destinação de tudo o que a pasta irá investir este ano, uma tarefa não lá muito simples.

Conta gotas

Do R$ 1 bilhão negociado com o PMDB, o governo carimbou apenas R$ 300 milhões para beneficiar municípios com menos de 50 mil habitantes com recursos do Minha Casa, Minha Vida. Os outros R$ 700 milhões só devem ser liberados quando houver uma folga no caixa, avisou o governo aos peemedebistas.

O "cara"

O senador João Pedro (PT-AM) começa esta semana com as ações em alta para presidir a CPI da Petrobras. É muito mais ponderado que a líder Ideli Salvatti (SC) e não tem o senão do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), único representante do partido do presidente daAgência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, na Casa. E, para completar, como relator da CPI das ONGs, Arruda não investigou as organizações que receberam recursos da estatal.

No cafezinho

Puxador de voto/ O PDT descobriu um motivo a mais para filiar o delegado Protógenes Queiroz e lançá-lo candidato a deputado federal. Uma pesquisa recente do partido apontou que o policial conquistaria 3% do eleitorado paulista, algo em torno de 700 mil votos. A 17 meses das eleições, trata-se de um confortável colchão num estado onde os políticos têm de conquistar cerca 300 mil votos para serem eleitos. Protógenes puxaria, pelo menos, mais um por conta do tal coeficiente eleitoral.

Segundo round/ Conhecidas as cidades que vão sediar os jogos da Copa do Mundo de 2014, começa a disputa acirrada pela abertura dos jogos, uma vez que a final no Maracanã é considerada pule de 10. Voltaram a crescer as chances de Brasília e de Belo Horizonte, depois que o projeto do Morumbi, em São Paulo, foi vetado pela Fifa. Só que os paulistas estão correndo atrás do prejuízo e vão rever rapidinho tudo o que a Fifa não gostou.

Sem estresse/ Os tucanos respiraram aliviados quando souberam que o anúncio da cidade-sede da aberturada Copa ficará para 2011. Assim, deixa de ser mais um ingrediente na guerra entre o mineiro Aécio Neves e o paulista José Serra pela candidatura presidencial de 2010.

Se eu fosse você.../ Autor do pedido de criação da CPI da Petrobras, o senador Álvaro Dias dava entrevista dia desses quando passou o líder do PMDB no Senado, Romero Jucá (RR). Chamado pela repórter, o provável relator respondeu: "Pergunte ao Álvaro, ele fala por mim!". O tucano não deixou a peteca cair: "Queria falar por você é na CPI!" 

COISAS DA POLÍTICA

O arco-írisdo Ocidente

Mauro Santayana

JORNAL DO BRASIL - 31/05/09

O relatório da Anistia Internacional vai além das denúncias, dolorosas em sua rotina, da violação dos direitos humanos no mundo. Em seu texto, a secretária-geral da organização, Irene Khan, aponta o perigo de que, com suas medidas para vencer a crise econômica mundial, os governos ampliem a miséria, desrespeitem ainda mais os direitos humanos. Segundo sua análise, trata-se de uma situação explosiva.

É do comodismo intelectual o vezo de pluralizar a ideia de crise. É assim que falamos em crise ambiental, em crise econômica, em crise da educação, em crise da saúde. Na realidade só há uma crise, que é a crise do homem em sociedade. A sociedade é o que ela quer ser. Em determinados momentos, os homens conseguem sofrer menos do que em outros. São os escassos intervalos em certas regiões do mundo e sob determinados tipos de civilização, quando o ser humano, ao respeitar os direitos de seu semelhante, vê os seus próprios direitos respeitados.

Vivemos, nestes quase dois séculos de desenvolvimento tecnológico acelerado, em duas direções antagônicas. A ciência médica – para os que dela podem valer-se – conseguiu dilatar a expectativa média de vida para além do imaginável. Ao mesmo tempo, a existência cotidiana do homem ultrapassou os limites de espaço e tempo, mediante as comunicações velozes. A difusão das informações permite, aos interessados, o dom da ubiquidade, que era atribuído aos deuses. Estamos em todos os lugares, em todas as horas. Talvez por isso mesmo nos sobre pouco tempo para conviver com a própria consciência e para filtrar, de tantas imagens e ruídos, os sumos da vida. E nunca tivemos tanto medo de viver.

Sempre fomos uma espécie amedrontada, mas o medo aumenta, da mesma forma que aumenta a desigualdade e evolui a tecnologia. Temos medo das ruas, da invasão violenta dos nossos lares, dos vírus, das enfermidades corriqueiras, dos hackers, das interceptações telefônicas, das viagens, das imagens cotidianas da morte, em Gaza, na África ou nas favelas do Rio, trazidas pela televisão. O medo agrava a iniquidade. Não nos damos conta que os direitos humanos são os direitos dos outros.

A vida dos homens depende de duas tênues películas: o envoltório gasoso do planeta, dentro do qual as condições de pressão atmosférica, de temperatura e umidade limitam a reprodução dos seres vivos; e a que se encontra na mente de cada um de nós e separa os instintos primitivos da inteligência criadora e solidária que permitiu, apesar de todos os conflitos sangrentos, a sobrevivência da espécie. Essas duas películas – a física e a mental – estão próximas da esgarçadura, de acordo com os avisos da ciência e do humanismo. A nossa única esperança é que ainda haja tempo para a salvação.

Os banqueiros ocuparam quase todos os governos, para que os Estados renunciassem ao poder e ao dever de impor a justiça nas relações econômicas. Foi uma irrupção do instinto predador contra a inteligência ética. Homens tidos como respeitáveis, com vistosos títulos universitários, substituíram as regras pelo "vale tudo", e se tornaram larápios. Ainda agora, a bancada do sistema financeiro no Congresso Nacional conseguiu infectar medida provisória que tratava de outro assunto, ao aprovar a impunidade dos "agentes públicos" que, em intervenções para assegurar "solvência e liquidez" ao sistema bancário, causem prejuízos ao erário. O presidente Lula, em boa hora, vetou o enxerto, que tinha também efeito retroativo e visava a proteger os responsáveis por bilhões de prejuízos causados ao povo brasileiro, entre 1995 e 2002. Esses guardiães da moeda têm o fundado temor de que os cidadãos honrados os levem a tribunais também honrados – e à cadeia.

A secretária da Anistia Internacional prevê crise humanitária sem precedentes se o problema dos direitos humanos não for enfrentado com decisão. Depois de examinar a situação, país por país, Irene Khan pediu aos líderes mundiais que busquem um new deal, com compromissos e medidas concretas dos governos, a fim de "desarmar esta bomba", e os conclamou a investirem nos direitos humanos, com a mesma determinação com que buscam restaurar a economia.

Há mais de 40 anos, o escritor haitiano René Depestre, no poema Arco-íris para um Ocidente cristão, previa a revolta mundial e definitiva dos pobres, com a ocupação das propriedades e a vingança sangrenta contra os opressores. Com outras palavras, Irene Khan nos mostra que essa profecia pode cumprir-se.

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DANUSA LEÃO

Sobre a coragem

FOLHA DE SÃO PAULO - 31/05/09


Você já ouviu falar de algum homem que seja capaz de dizer a uma mulher que a relação acabou, que não quer mais



VOCÊ se acha uma pessoa corajosa? A resposta provavelmente vai ser "mais ou menos", até porque se pode ser corajoso para umas coisas e covarde para outras.
Os homens costumam ser mais que as mulheres; eles não têm medo de trovoada, são capazes de matar uma barata na maior tranquilidade e se aparecer uma cobra sabem exatamente que atitude tomar. Mulher não faz nada disso, mas em compensação faz coisas de que raros homens são capazes. Você já ouviu falar de algum que seja capaz de dizer a uma mulher que a relação acabou, que não quer mais? Aquele "tudo acabado entre nós já não há mais nada" é coisa que só mulher faz; não com prazer, mas faz.
Os homens - todos -, se pudessem, apertariam um botão para a mulher sumir e assim não terem aquela conversa penosa; não aquela para discutir a relação, mas para botar um ponto final e definitivo. Não há um, um só, que cumpra esse ritual de maneira mais ou menos decente; se puderem, eles viajam, disfarçam, mentem e até fingem um infarto, para não precisarem falar.
Eles não suportam essas conversas, e se a mulher chorar, aí então a coisa pega. Já se foi o tempo em que as lágrimas de uma mulher comoviam os homens. Ainda sobre a coragem: você para no sinal em seu carro fechado, com ar-condicionado, ouvindo um belo som; um menino vem pedir um troco ou tenta te vender um drops, você diz não. Por acaso já reparou que diz não sem olhar nos olhos dele? Algum dia se deu conta disso ou muda de assunto mentalmente com a maior rapidez e começa a pensar em outra coisa? Não é assim mesmo que acontece? Mas se tiver coragem, olhe nos olhos do próximo menino, dando ou não o dinheiro que ele está pedindo. Tenha a coragem de olhar - só isso - e talvez, a partir daí, sua vida mude.
Ah, a coragem; a coragem de reconhecer que, grande parte das coisas que te acontecem, você é que foi buscar. Está sozinho? Será que a culpa é dos outros, que não conseguiram enxergar todas suas fantásticas qualidades? O trabalho vai mal? Mas será que você se esforçou o suficiente, vestiu a camisa da empresa em que trabalha, ou só foi levando, e não fica nem bem tocar nesse assunto? E a mediocridade de sua relação, digamos assim, é culpa só do outro? Será?
Tenha coragem e pense: você tem tido um comportamento correto em sua vida pessoal, com todos os que te cercam? Mudar de assunto não vale: é para pensar, e se for preciso, sofrer e se arrepender. Aliás, se arrepender só, não: ter a firme intenção de procurar ser um pouco melhor. Os anos vão passando e cada um vai escrevendo sua biografia, pensando e agindo do jeito que quer. Pense que, cada ato que pratica, poderá ser, cedo ou tarde, conhecido por seus amigos, seus filhos, seus companheiros de trabalho. É preciso ser correto o tempo todo - pensar corretamente, agir corretamente; só assim se pode ter coragem, a verdadeira, que raros têm. A coragem de chegar diante do espelho e se olhar nos olhos; se olhar e pensar em alguns momentos de sua vida, momentos em que foi menos leal do que deveria ter sido, menos sincera do que teria a obrigação de ser, mais interesseira do que o aceitável. Pensar em tudo isso e até em outras coisas, aquelas que prefere nem lembrar.
Vamos, coragem: deve ter um espelho aí perto. Mas seria um pouco ridículo, se levantar de onde está para ir se olhar nos olhos; talvez seja melhor deixar para fazer isso em casa, antes de dormir, com mais calma. Claro.

LYA LUFT

REVISTA VEJA

Lya Luft
É o fim do mundo

"Se a menininha da televisão puder voltar a ser criança, os bugios forem deixados em paz, os gordinhos não se sentirem os últimos da face da Terra, quem sabe o fim do mundo ainda demore um pouco para chegar"

Fui uma das primeiras meninas a usar calças jeans na minha pequena cidade. Uma de minhas avós, luterana fervorosa, embora fosse uma mulher culta, exclamou: "Isso é o fim do mundo!". Nem o mundo acabou nem deixaram de acontecer coisas bem mais esquisitas, a me recordar aquele episódio, que na hora achei muito engraçado.

Ilustração Atômica Studio


Lembro-me dessa expressão com certa frequência. Por exemplo, quando uma criança de 6 anos serviu de atração num programa de TV, eventualmente chorando de medo, nervosismo ou cansaço. Ninguém interveio logo. Se levassem a um programa desses, semana após semana, um filhote de cachorro para fazer gracinhas, as sociedades protetoras dos animais já estariam reclamando. (Quem cuida dos humanos?) Finalmente, uma promotora impediu a criança de exercer esse "trabalho". Parabéns – e que não haja recurso.

Lembro-me de minha avó espantada quando assisto ao sofrimento de mulheres magras, muito magras, constantemente lutando para perder mais uns gramas, olhos ávidos da eterna dieta, sorriso forçado de automutiladoras. Para alegria de quem sempre foi fora do esquadro, leio (eu já sabia) que alguns já arriscam dizer que se pode ser saudável e feliz com algum sobrepeso. Não precisamos nos odiar, mas ser naturais, ser quem nos fez a mãe natureza. Porém, a nova onda é a gente se torturar, por falta ou excesso: a bunda pequena, o nariz grande, a barriga balofa, os peitos caídos, os bíceps insuficientes (o ralo QI não preocupa tanto). Aí nos matamos de fome, ou ostentamos um novo nariz estranho à estrutura do rosto em que foi metido, damos uma lipinho de presente de 14 anos a nossa filha. Nós mal conseguimos falar, com uma boca ginecológica, nada sensual. Um terço do nosso dia transcorremos suando e sofrendo muito além do recomendado em academias: não para ser saudáveis, mas para estar em forma, enquanto a alma passa uma fome danada e o tempo passa, a vida encolhe, nós nos desperdiçamos perseguindo modelos impossíveis e burros.

Minha avó acharia que o mundo está por acabar diante da confusão entre pessoa pública e propriedade do público: agora o normal é querer que o outro baixe até as calças da alma e mostre as feridas. Algumas chamadas celebridades parecem forçadas a anunciar o que fazem na cama, e com quem. Elas nem são "vistas" na rua, são "flagradas": o seu mero existir já é suspeito.

O mundo vai acabar, diria minha severa avó luterana, vendo que a política se troca por politicagem, o jogo de interesses infinitamente acima do bem do povo, a calúnia como ferramenta geral. Gente atirada como bicho (bicho, não, aí viria a defesa dos animais!) em pseudo-hospitais é fato menos comentado do que mosquitos, que podem trazer febre amarela (por isso pessoas assustadas e ignorantes matam saudáveis bugios no interior). Meu amigo atropelou um simpático tatu e quase pegou cadeia; se matasse uma pessoa, sendo réu primário aguardaria em liberdade. Viva o tatu. Abaixo as pessoas. Também se comenta que moradores de rua e pseudocolonos vão ganhar Bolsa Família. Quem ainda vai querer pegar na enxada ou lavar o chão de uma casinha?

O mais novo anúncio do fim do mundo pode ser a recomendação de fazermos xixi no banho. É questão ambiental? Enquanto for só xixi que nos recomendam, estamos salvos. Sou a favor de um ambientalismo sensato, que harmonize o convívio entre natureza e humanos, não dê mais atenção a baleias do que a crianças e aceite o progresso, fomente a educação e a higiene. A gente passa anos ensinando aos filhos: não façam xixi no banho nem na piscina. Xixi no chuveiro (e na banheira também?), sinto muito: aqui em casa, não.

Nesse cenário de absurdos, às vezes falta o botão para trocar de canal. Mas, se a menininha da televisão puder voltar a ser criança, os bugios da minha mata forem deixados em paz, os gordinhos não se sentirem os últimos da face da Terra, a gente não for multada por fazer xixi no vaso, quem sabe o fim do mundo ainda demore um pouco para chegar.

PREVISÃO DO TEMPO


CARLOS EDUARDO NOVAES

Uma cesta de emoções


JORNAL DO BRASIL - 31/05/09

Em algumas noites uso a televisão para deixar de pensar em besteira e pegar no sono. Ela funciona como um sonífero, um sedativo, um tranquilizante. Vou percorrendo os canais e quase sempre estaciono no History Channel para conhecer a história da manteiga ou do parafuso em Maravilhas Modernas. Às vezes porém me ligo num programa e a televisão faz um efeito contrário. Foi assim quando dei de cara com um jogo pelos playoffs do campeonato americano de basquete (NBA). Fiquei com os olhos pregados na telinha até às duas e meia da madrugada para ver Lebron James fazer uma cesta mágica no finalzinho da prorrogação dando a vitória ao Cleveland Cavs sobre o Orlando Magic. Se você acha que um gol no ultimo minuto é quase impossível, imagina uma cesta no ultimo segundo!

Paixões à parte, não tenho duvidas de que o basquete é um jogo muito mais emocionante do que o futebol. A bola não pára, não tem aquela emprenhação para formar barreira, os jogadores não podem ficar ensebando por mais de 24 segundos e ainda assim – pasme – o jogo de basquete às vezes demora muito mais do que uma partida de futebol. É verdade que as equipes podem pedir vários tempos – e nós, espectadores também precisamos deles para ir ao banheiro, à cozinha – mas não são esses minutinhos a mais que prolongam o jogo de basquete. O que ocorre é que – por um desses fenômenos inexplicáveis – o tempo em uma quadra de basquete custa muito mais a passar do que num campo de futebol. Outro dia uma prorrogação – que é de cinco minutos – levou 22 minutos para chegar ao fim.

Ainda lamento que na minha meninice só tenha sido apresentado ao basquete depois de me apaixonar pelo futebol. Talvez a família tenha tido alguma responsabilidade nessa ligação precoce com o futebol porque ainda me lembro de uma foto minha com menos de um ano de idade envergando uma camisa do América (tamanho G) que era do meu pai – e não fui eu que a pedi para vestir.

Penso que o futebol ganharia em emoção se aproveitasse algumas regras do basquete. Por exemplo: o jogador não poderia devolver a bola ao seu campo depois que ultrapassasse a linha central. Nada de ficar recuando a bola, fazendo cera, esperando o tempo passar... O público quer ver jogo e o basquete sabe disso! Outro exemplo? Por que não se cria uma linha de três pontos ali entre a intermediária e a grande área? Um gol daquela distância valeria por dois. Quando nada obrigaria os jogadores de soccer a treinar a pontaria. Os atletas da NBA passam seis, oito horas treinando arremessos de três pontos. Quanto tempo nossos jogadores treinam chutes a gol de longa distância? Alguém dirá que o pessoal do basquete precisa treinar mais porque a bola é maior do que a de futebol e a cesta é menor que a baliza. Em compensação não há goleiro no basquete.

A decisão na NBA começa nesta quinta-feira e pode se estender por sete partidas. Assim, sugiro que quem usa o mesmo método que eu para dormir ou quem tiver que acordar cedo no dia seguinte que não aperte a tecla da ESPN no seu controle remotíssimo.

VALDO CRUZ

Jogo pesado

FOLHA DE SÃO PAULO - 31/05/09

BRASÍLIA - Ninguém quer admitir publicamente, mas, nas últimas semanas, senadores de oposição foram procurados por diretores de grandes empresas que trabalham com a Petrobras.
Gente graúda, que costuma participar das decisões de quem recebe doação de campanha eleitoral. Segundo relatos obtidos dos dois lados, foram conversas de cavalheiros, sem ameaças diretas, mas o objetivo era exatamente esse.
Num estilo educado e cortês, o que foi dito poderia ser traduzido livremente da seguinte maneira: "Se vocês colocarem nossa empresa sentada no banco da CPI sem bases concretas, esqueçam doações no próximo ano".
Não faltaram ainda queixas para o que estão classificando de "criminalização" das doações legais para campanhas eleitorais. Mais uma forma de pressão.
Esses encontros começaram a ocorrer depois que grandes empresas trocaram informações há duas semanas e concluíram que precisavam agir para evitar que virem o centro das investigações.
Todos garantem que não há um desvio em seus contratos com a Petrobras. E que, se forem denunciadas por alguém na comissão do Senado, será por conta de interesses contrariados. Pode ser, afinal não podemos condenar ninguém a priori. Por outro lado, uma boa investigação é, sem dúvida, o melhor selo de idoneidade.
Bem, depois de conversar com diretores de várias dessas empresas, um senador da ala governista firmou uma convicção: há grande risco de a comissão virar a CPI do Forró, com investigações de temas laterais, como patrocínios de festas juninas, passando ao largo de contratos milionários da empresa.
Em resumo, a CPI da Petrobras será um bom teste para medir até onde vai operar o lobby dos grandes fornecedores da estatal. O jogo, caro leitor, será pesado.

GOSTOSA


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VINÍCIUS TORRES FREIRE

China, Bolsa Família, BC e o real

FOLHA DE SÃO PAULO - 31/05/09


Pacto luliano de estabilidade econômica e dependência da China anestesiam o país e dificultam mudança maior



É MAIS DIFÍCIL isolar um Banco Central de pressões políticas de origem popular em democracias pobres. Altas de juros degradam as condições de vida, o que pode suscitar protesto político. Em economias mais arrumadas, o impacto do aperto monetário pode ser menor. Menor ainda se houver um amortecedor, um colchão social.
Programas de transferências sociais de renda, muito incrementados no governo Lula, providenciaram tal colchão. Assim, de certo modo e talvez inadvertidamente, comprou-se o relativo isolamento do BC, também chamado de autonomia.
Note-se que políticas dessa natureza eram recomendações do esquecido "Consenso de Washington", o decálogo do "perfeito idiota neoliberal", diriam petistas, que hoje comem nesse prato em que cuspiam.
Há decerto mortos, feridos, queixas teóricas e a crítica da indústria, por exemplo. Mas esse caldo não engrossa "nas bases" e, assim, não induz políticos com poder de decisão ou pressão a intervir de modo significativo na ilha tecnocrática do BC. Ou no grosso da política econômica.
Este é só um aspecto do pacto de estabilidade luliano. Lula logrou ainda tanto reduzir a dívida pública (fez superávits fiscais primários suficientes) como elevar a despesa do governo, em parte destinada à compra do colchão social. A alta do gasto público, do consumo privado e até do investimento não acabou em inflação e/ou déficit externo desagradáveis ou em suspeitas a respeito da solvência externa do país devido: a) ao crescimento sino-asiático, que incrementou nossas exportações; b) à política de redução da dívida externa e/ou acumulação de reservas.
O "modo de produção asiático", digamos, com seus trabalhadores mal pagos, ainda barateou bens de consumo pelo mundo e por aqui. Juros baixos e a louca expansão do crédito mundial também ajudaram. O conjunto dessa obra (a atitude do BC "alemão" do Brasil, a alta das commodities e o capital sobrante no mundo) valorizou o real, o que significou um aumento adicional do poder de compra da população.
Então chegamos a meados de 2008, quando o BC elevava os juros devido ao excesso no gozo dessa dita bonança. Haveria então redução no crescimento, menor talvez que a hoje imposta pela crise. Como nem a recessão tem suscitado revolta, menos ainda o faria a contenção do PIB ditada pelos juros. Mas não foi possível testar a retomada do "business as usual" no Brasil, pois veio a crise.
A despiora na economia mundial, porém, criou uma situação que replica, de modo caricato, os dias finais do período de bonança de 2008, de alta especulação. Há discreta melhora na China. Cai o medo de novo desastre financeiro (há "apetite por risco"). Há excesso de dinheiro barato (juro zero no mundo rico), mas EUA e cia. não consomem. O tsunami de dinheiro então sobrante derruba o dólar, encarece o real, infla commodities: desembestam os capitais à procura de rentabilidade.
Não se sabe se tal bolhinha vai estourar. Mas o resumo da ópera é que o Brasil segue flutuando nessas marés, anestesiado pelo pacto luliano e pela dependência da China. Mudar tal situação (e pois a "armadilha cambial") implica mudar um pacto político interno e a relação com o resto do mundo. Nada simples.

FERNANDO CALAZANS

A força e o peso

O GLOBO - 31/05/09

Não tenho certeza se, no momento em que vocês me leem, alguém já tem conhecimento de quanto tempo Adriano pretende jogar hoje no Flamengo, contra o Atlético Paranaense, no Maracanã. 
O bom senso recomendaria que ele não fosse escalado, pelo menos de início. Nem é preciso ver Adriano de corpo inteiro para compreender que ele ainda está fora de forma, ainda está acima do peso.
Basta ver o seu rosto, ainda bem roliço. O time, que já esteve sem artilheiro por muito mais do que 90 dias, poderia passar sem ele por mais 90 minutos — sem precisar correr o risco de que Adriano sofra alguma contusão, sinta dor num músculo ou coisa até pior, que deixe o Flamengo mais 90 dias sem contar com um homem para decidir as jogadas de gol.

Adriano passou muito tempo parado, enquanto se divorciava da Itália, enquanto reatava seu romance com o Rio, enquanto se aposentava momentaneamente do futebol, enquanto passava as noites na ativa, enquanto passava os dias na favela soltando pipa, enquanto desfrutava a companhia dos amigos da meninice.

Começou a recuperar a forma há pouco tempo, nos treinos do Flamengo. Sua volta tem que ser muito bem estudada, tem que ser aos poucos, sem precipitações, mesmo que o time sinta a falta de um atacante de peso e de força.
Justamente por isso, é mais importante a presença de um Adriano em plena forma — na força e, sobretudo, no peso.

O presidente do Fluminese, Roberto Horcades, talvez até com atraso, tomou as medidas necessárias para pôr um mínimo de ordem na casa, que estava de pernas pro ar.
Vândalos não deveriam poder entrar no clube, como tampouco deveria poder entrar em campo um cidadão armado e, ao que parece, preparado para dar tiros para o alto. 

Pior é Fernando Henrique (não sei se outros jogadores também) defendendo a presença e a atitude do atirador, que ele diz ser seu despachante e que chamou também de seu “salvador”. Despachante, segurança, motorista, secretário, seja o que for — um campo de futebol ou de qualquer outro esporte não admite a presença de gente armada de 
revólver.
Não sei se a suspensão por um jogo — este de hoje, contra o Náutico — é a punição certa para Fernando Henrique (acho até que não é, porque prejudica o time), mas que ele merecia uma punição, merecia. Ao menos, quem sabe, para começar a escolher melhor as companhias.

Paulo Calçade, comentarista da ESPN Brasil que prima pelo bom gosto na sua apreciação do futebol, chamou a minha atenção para um dado estatístico. 
Barcelona 2 x 0 Manchester United, na grande final da Liga dos Campeões. Sabem quantas faltas houve? Dezessete faltas ao todo. Vejam só: 7 faltas do Barcelona, 10 faltas do Manchester United no jogo todo.
Observem bem: era uma decisão, era o jogo final da mais importante competição da Europa!

O vencedor — e grande campeão — fez apenas 7 faltas. Quem fez mais faltas perdeu: o Manchester United. Mas cometeu apenas 10 faltas, e assim mesmo porque o marrentíssimo Cristiano Ronaldo ficou nervosinho no segundo tempo e desandou a entrar de forma desleal nos adversários, sobretudo em Puyol, que sofreu nas mãos, quer dizer, nos pés de Cristiano.

Enquanto isso... aqui, continuamos com 40, 50 faltas, às vezes 60 numa partida, mesmo com a moda de “deixar o jogo correr”, “deixar pra lá”, haja o que houver. 
O problema, meus caros exegetas do futebol, não está só no juiz. Deem uma olhadinha no comportamento dos técnicos, os “comandantes”, e nos jogadores, seus “comandados”. 

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CLÓVIS ROSSI

O G8 morreu, o G20 respira pouco

FOLHA DE SÃO PAULO - 31/05/09

SÃO PAULO - O governo brasileiro está batalhando, sem sucesso, para entronizar o G20, o clubão das maiores economias do planeta, como gerente informal das finanças mundiais, o que lhe asseguraria um posto na linhas de frente.
Mas, por desinteresse de países ricos, entre eles o que preside o G20 no momento, o Reino Unido, o grupo não saiu do lugar desde a cúpula de Londres. Todo o trabalho de coordenação e definição da reforma da arquitetura financeira global ou não caminha ou fica a cargo de iniciativas isoladas. Estados Unidos e União Europeia já divulgaram seus planos para regular os derivativos e para vigiar os bancos, respectivamente.
Mas nada coordenado, o que combina com o abandono da tese, que o Brasil defendeu, de que deveria haver um sistema supranacional de regulação.
Até aí, no entanto, o governo brasileiro não se preocupa. Aceitou que as resistências a que estranhos xeretem Wall Street ou a City londrina são grandes e poderosas demais para serem vencidas. O que incomoda o governo é que o G20 não se dotou de um processo próprio de trabalho sobre a regulação do sistema financeiro desde a cúpula de Londres, realizada já faz dois meses (2 de abril).
O que há é apenas um calendário de reuniões que serve para reforçar a sensação de paralisia do grupo. A próxima reunião ministerial será apenas em setembro, em Londres, três semanas antes da nova cúpula, a terceira do G20, marcada também para setembro, nos EUA.
Reuniões de cúpula, como sabem todos os que as acompanham, são apenas a cereja de um bolo que tem que ser preparado antes pelos técnicos. Não há ninguém batendo esse bolo, o que cria um vácuo de gerenciamento financeiro global: o G8 morreu, mas ainda não foi enterrado, e o G20 nasceu, mas não consegue sair da incubadora.

TOSTÃO

Meu modelo é outro

JORNAL DO BRASIL - 31/05/09

Luxemburgo, no empate do Palmeiras contra o Nacional do Uruguai, e Sir Alex Ferguson, pisaram na bola no meio da semana. Não sei qual dos dois foi pior. Na derrota do Manchester United para o Barcelona, não foi surpreendente a escalação e a estratégia do time inglês, dirigido há 23 anos por seu vitorioso treinador.

Vi várias vezes o Manchester ganhar e ser elogiado com o mediano sul-coreano Park no lugar de outro muito melhor. Park é chamado de jogador moderno, que vai e volta, defende e ataca. Fora isso, não faz mais nada.

Vi várias vezes o Manchester ganhar e ser elogiado com Cristiano Ronaldo de centroavante e com Rooney atuando pela ponta, correndo atrás do lateral. Um desperdício. Não há nenhuma justificativa para colocar os dois melhores jogadores do time fora de suas posições.

Mesmo quando jogava mal e/ou era mal escalado, o Manchester raramente perdia. Chelsea, Liverpool e Arsenal, grandes times ingleses, destaques mundiais, são adversários bem conhecidos. Não surpreendem. As equipes médias e pequenas da Inglaterra são fracas, iguais às pequenas e médias equipes da Espanha e da Itália.

Desta vez, o Manchester, que tem um grande time, enfrentou uma equipe diferente, que coloca a bola no chão, troca muitos passes, faz somente sete faltas em um jogo decisivo e que possui o melhor jogador do mundo (Messi) e os dois melhores armadores do mundo (Xavi e Iniesta). Os dois comandaram também a seleção da Espanha, brilhante campeã da Eurocopa.

São três baixinhos fenomenais. Os talentosos baixinhos, de todo o mundo, de quem diziam não terem condições de enfrentar os grandalhões do futebol moderno, estão novamente por cima.

O Barcelona e a Espanha jogam em um estilo próximo das grandes equipes do Brasil do passado. Já o São Paulo e a maioria dos times brasileiros e de todo o mundo atuam no estilo das antigas e medianas equipes da Europa, com excesso de marcadores, bolas longas, pouca troca de passes e muitas jogadas aéreas. É o "chuveirinho" moderno.

O São Paulo, tricampeão brasileiro por seus méritos e por executar bem o que é planejado, influenciou bastante a maioria dos técnicos e grande parte da imprensa. Passou a ser modelo de como ser vitorioso, como se houvesse apenas uma maneira de vencer.

Alguns times reagem contra essa mesmice, mesmo que ela seja eficiente, como o Cruzeiro, que procura jogar um futebol leve, envolvente e bonito. A dificuldade do time mineiro é não conseguir jogar tão bem fora do Mineirão.

Na quarta-feira, vi talentos no meio campo, como Xavi, Iniesta e Marquinhos Paraná, e também alguns brucutus, como Eduardo Costa. Ele, Fabrício e Richarlyson distribuíram pontapés. Nenhum foi expulso. Os brucutus continuam fortes e com prestígio com os treinadores.

Não será tão surpreendente se o São Paulo ganhar do Cruzeiro hoje e na segunda partida pela Libertadores, vencer o Brasileiro, a Libertadores e até o Mundial de Clubes. Se isso acontecer, vou exaltar novamente seus méritos, mas não vou mudar minha preferência. Gosto de ver outro futebol.