sexta-feira, novembro 30, 2012

A traição do PT - MINO CARTA - EDITORIAL CARTA CAPITAL

E OS RATOS COMEÇAM A PULAR FORA DO PT



A traição do PT - MINO CARTA 



Dizia um velho e caro amigo que a corrupção é igual à graxa das engrenagens: nas doses medidas põe o engenho a funcionar, quando é demais o emperra de vez. Falava com algum cinismo e muita ironia. Está claro que a corrupção é inaceitável in limine, mas, em matéria, no Brasil passamos da conta.

Permito-me outra comparação. A corrupção à brasileira é como o solo de Roma: basta cavar um pouco e descobrimos ruínas. No caso de Roma, antigos, gloriosos testemunhos de uma grande civilização. Infelizmente, o terreno da política nativa esconde outro gênero de ruínas, mostra as entranhas de uma forma de patrimonialismo elevado à enésima potência.

A deliberada confusão entre público e privado vem de longe na terra da casa-grande e da senzala e é doloroso verificar que, se o País cresce, o equívoco fatal se acentua. A corrupção cresce com ele. Mais doloroso ainda é que as provas da contaminação até os escalões inferiores da administração governamental confirmem o triste destino do PT. No poder, porta-se como os demais, nos quais a mazela é implacável tradição.

Assisti ao nascimento do Partido dos Trabalhadores ainda à sombra da ditadura. Vinha de uma ideia de Luiz Inácio da Silva, dito Lula, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo até ser alvejado por uma chamada lei de segurança nacional. A segurança da casa-grande, obviamente.

Era o PT uma agremiação de nítida ideo­logia esquerdista. O tempo sugeriu retoques à plataforma inicial e a perspectiva do poder, enfim ao alcance, propôs cautelas e resguardos plausíveis. Mantinha-se, porém, a lisura dos comportamentos, a limpidez das ações. E isso tudo configurava um partido autêntico, ao contrário dos nossos habituais clubes recreativos.

O PT atual perdeu a linha, no sentido mais amplo. Demoliu seu passado honrado. Abandonou-se ao vírus da corrupção, agora a corroê-lo como se dá, desde sempre com absoluta naturalidade, com aqueles que partidos nunca foram. Seu maior líder, ao se tornar simplesmente Lula, fez um bom governo, e com justiça ganhou a condição de presidente mais popular da história do Brasil. Dilma segue-lhe os passos, com personalidade e firmeza.CartaCapital apoia a presidenta, bem como apoiou Lula. Entende, no entanto, que uma intervenção profunda e enérgica se faça necessária PT adentro.

Tempo perdido deitar esperança em relação a alguma mudança positiva em relação ao principal aliado da base governista, o PMDB de Michel Temer e José Sarney. E mesmo ao PDT de Miro Teixeira, o homem da Globo, a qual sempre há de ter um representante no governo, ou nas cercanias. Quanto ao PT, seria preciso recuperar a fé e os ideais perdidos.

Cabe dizer aqui que nunca me filiei ao PT como, de resto, a partido algum. Outro excelente amigo me define como anarcossocialista. De minha parte, considero-me combatente da igualdade, influenciado pelas lições de Antonio Gramsci, donde “meu ceticismo na inteligência e meu otimismo na ação”. Na minha visão, um partido de esquerda adequado ao presente, nosso e do mundo, seria de infinda serventia para este País, e não ouso afirmar social-democrático para que não pensem tucano.

O PT não é o que prometia ser. Foi envolvido antes por oportunistas audaciosos, depois por incompetentes covardes. Neste exato instante a exibição de velhacaria proporcionada pelo relator da CPI do Cachoeira, o deputado petista Odair Cunha, é algo magistral no seu gênero. Leiam nesta edição como se deu que ele entregasse a alma ao demônio da pusilanimidade. Ou ele não acredita mesmo no que faz, ou deveria fazer?

Há heróis indiscutíveis na trajetória da esquerda brasileira, poucos, a bem da sacrossanta verdade factual. No mais, há inúmeros fanfarrões exibicionistas, arrivistas hipócritas e radical-chiques enfatuados. Nem todos pareceram assim de saída, alguns enganaram crédulos e nem tanto. Na hora azada, mostraram a que vieram. E se prestaram a figurar no deprimente espetáculo que o PT proporciona hoje, igualado aos herdeiros traidores do partido do doutor Ulysses, ou do partido do engenheiro Leonel Brizola, ­obrigados, certamente, a não descansar em paz.

Seria preciso pôr ordem nesta orgia, como recomendaria o Marquês de Sade, sem descurar do fato que algo de sadomasoquista vibra no espetáculo. Não basta mandar para casa este ou aquele funcionário subalterno. Outros hão de ser o rigor, a determinação, a severidade. Para deixar, inclusive, de oferecer de graça munição tão preciosa aos predadores da casa-grande.

Veta, Dilma - ANCELMO GOIS


O GLOBO - 30/11

Ao deixar para hoje o anúncio de sua decisão sobre os royalties, Dilma proibiu assessores de falar.
Mas quem gosta do Rio saiu feliz da última reunião. Tomara.

Trenzinho carioca
Cabral sela segunda acordo para a francesa Alstom construir uma fábrica de material rodante em Deodoro.
A unidade, de cara, terá a tarefa de construir 20 novos trens para o Rio.

Segue...
A Alstom, que sonha fazer no Rio seu modelo de VLT para o Porto Maravilha, perdeu para os chineses as últimas encomendas de trens do Metrô Rio e da SuperVia.

Pela diversidade
Em tempos de Joaquim Barbosa no STF, a TV Justiça terá uma mulher negra dividindo a bancada da
primeira edição do “Jornal da Justiça” com um apresentador branco.

Pelé, Romário e Oscar
De Pelé, em possível nova polêmica com Romário, sobre o atual camisa 10 da seleção, Oscar, 21 anos, em
entrevista para a série “Brasileirinhos” do “Esporte Espetacular”, da TV Globo, que vai ao ar domingo:
— Romário, com todo o nome dele, não quis jogar com a 10. Jogou com a 11. Já o Oscar está encarando a 10.

Charity Day
Quarta, a corretora Icap, de Londres, presente em 22 países (aqui inclusive), doará 100% de seu faturamento do dia para 200 projetos sociais mundo afora.
No Brasil, o dinheiro vai para o Criança Esperança. A campanha é batizada de... “Charity Day”.

Só que...
“Charity Day” é o cacete. Com todo o respeito.

Tim Maia, ó pá
O produtor Sandro Chaim fecha uma temporada em Lisboa de “Tim Maia, o musical”, para maio de 2013, entre os eventos do Ano do Brasil em Portugal.
Tim (1942-1998) nunca esteve na terrinha, mas é muito conhecido lá, pelos discos e por aparições na TV. Seu grande sucesso no país foi “Dia de domingo”, em dueto com Gal Costa.

Thalita para adultos
Thalita Rebouças, depois do enorme sucesso de 13 livros infantojuvenis e um infantil, vai lançar um para adultos.
“Adultos sem filtro e outras crônicas” vai chegar às livrarias dia 12 de dezembro. O lançamento será na Argumento do Leblon, no Rio.

O outro lado
A direção do Hotel Royalty, na Barra, no Rio, diz que o jogador Renato Abreu, camisa 11 do Flamengo, foi impedido de subir para visitar um amigo, terça, como saiu aqui ontem, porque teria se recusado a preencher uma ficha de identificação, como é praxe em todos os hotéis, “independentemente de etnia, sexo, idade etc.”
O caso está na 16ª DP, na Barra.

Bandeira rasgada
Tudo bem que a CSA, agora à venda, está na maior pindaíba. Mas a dona da usina, a alemã Thyssen, deveria fazer uma vaquinha para mandar reparar esta Bandeira do Brasil, hasteada na entrada, em Santa Cruz, no Rio. Se precisar, a turma da coluna adere. Com todo o respeito.

Young Flu
O juiz Alberto Salomão, da 33ª Vara Criminal do Rio, marcou para quarta, dia 5, a audiência de instrução e julgamento de três dos 23 integrantes da torcida organizada Young Flu presos no entorno do Engenhão após agredirem dois vascaínos, em agosto.
A de outros seis será dia 26 de fevereiro. É que, como são muitos acusados, o juiz, para apressar o caso, desmembrou o processo e dividiu os réus em grupos.

Boletim médico
Na madrugada de ontem, a jogadora Marta esteve na emergência do Hospital Rios D’Or, em Jacarepaguá.

Um pé fora
A nova corregedora da Polícia Civil do Rio, delegada Márcia Pitta, já mostrou a que veio. Sugeriu, e a chefe de Polícia, Martha Rocha, aceitou: o delegado Célio Erthal vai responder a processo na Corregedoria Geral Unificada, onde o policial fica com um pé fora da casa.
Erthal foi preso no Paraná, acusado de manter quatro pessoas em cárcere privado.

Aliás...
O delegado já havia sido demitido em 2007, acusado de fazer blitz para extorquir dinheiro. Mas foi reintegrado por força de decisão judicial.

Imagens - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 30/11


RIO DE JANEIRO - Nelson Rodrigues deixou centenas de frases definitivas, você sabe. Mas Nelson morreu em 1980, e o mundo seguiu sem ele. Daí que, diante de algum novo escândalo nacional, sempre me perguntam o que ele diria se ainda estivesse por aqui. Respondo que esse é um tipo de suposição em que ninguém me pega -tentar adivinhar o pensamento de Nelson Rodrigues. Mas a política é dinâmica e, de repente, talvez até algumas frases de Nelson tenham de ser revistas.

Sobre Brasília, por exemplo -não a cidade, mas o poder-, ideal para o planejamento e prática de atos ao largo da nação. Em 1969, Nelson afirmou que lá "todos são inocentes e todos são cúmplices" -frase que, com a ressalva de um ou outro breve intervalo de decência, atravessou décadas e chegou até nós. Pois pode deixar de se aplicar, agora que o processo do mensalão abriu a tampa do vaso e expôs os "malfeitos" que uma rede de cúmplices produziu e deixou para trás.

Já outra antiga imagem de Nelson, adaptada ao noticiário recente, tornou-se materialmente visível: a de que a corrupção no Brasil "pinga do teto e escorre pelas paredes". Só assim Rosemary Noronha, simples secretária de certo órgão, poderia nomear pessoas para cargos tão acima de sua posição na hierarquia. O único a não se espantar com isso talvez fosse Nelson. Para ele, não havia pessoa insignificante: "O mais humilde mata-mosquito pode se julgar um Napoleão, um César, e agir de acordo". Como tinha costas quentes, Rosemary convenceu-se de que era a Cleópatra de si mesma.

E, ao ouvir os protestos vociferados de ex-grandes nomes da política contra suas condenações, alegando uma inocência de vestais, vem-me a imagem de Millôr Fernandes: "o rabo escondido, com o gato de fora".

Muito boa mesmo, exceto por não fazer jus à inteligência e à integridade dos gatos.

Viver impregnado de teatro - IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO

O ESTADÃO - 30/11


Quinze dias atrás, no Nordeste, recebi pelo iPhone (carrego o de minha filha, quando viajo) uma foto que me deixou contente. Enviada por Luciana Savaget, mostrava Alcione Araújo, Luciana e eu sentados na plateia da Jornada Literária de Passo Fundo, Rio Grande do Sul. Que gracinha, a Luciana, pensei. Uma foto tão gostosa! Não tinha lido o texto do e-mail. Dizia: "Um dos tenores se foi. Alcione acaba de morrer." Como? Alcione morto? Um sujeito forte, troncudo, com 67 anos, em pleno viço (esta é do interior)! Marina Colasanti, naquele estilo que todos gostaríamos de ter, definiu Alcione: "Era dois, esse homem, porque o corpo de ossos largos e o olhar seguro lhe garantiam um jeito taurino de ser, enquanto a alma delicada e a ternura do sorriso lhe conferiam uma finura de donzela".

Por um largo período, a cada dois anos, nos encontrávamos no palco da Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. Alcione Araújo, Julinho Diniz e eu. Por uma semana, à tarde e à noite, por horas coordenávamos palestras, mediávamos debates e, quando não vinham perguntas do público, inventávamos, criávamos e interagíamos alegremente com a plateia. Porque aquela é uma audiência única no Brasil, são pessoas que já leram os autores convidados e as questões são pertinentes. Alcione, robusto, voz de baixo tenor, severa, impositiva. Julinho, voz suave, físico mediano. Eu, com esta voz esquisita que me foi dada.

Então, um dia, alguém do público nos apelidou de os "três tenores", por inspiração (e ironia) de Pavarotti, Carreras e Plácido Domingo. Alcione era o único que tinha voz digna do canto. Uma vez, até cantamos uma sátira. O Haddad era ministro da Educação, tinha prometido ir à Jornada, não foi. A musiquinha era: Haddad, Haddad por que você não veio à cidade?

No palco, Alcione era imponente. Sério, sério e, de repente, soltava uma coisa engraçadíssima, espantava. Insuperável no momento de comentar as falas antes de abrir para as perguntas do público. Tendo estudado engenharia, depois teologia e filosofia, conhecedor de sociologia, fazia a análise certeira. Quantas vezes não falou melhor do que o palestrante? Dominava palco e plateia. O que se podia esperar de um homem com físico dominador, romancista, dramaturgo, cronista (O Estado de Minas) ensaísta, roteirista de cinema e de televisão? Autor de 13 peças teatrais e de 14 roteiros cinematográficos de longa-metragem.

Ao fim de cada noite no circo da Jornada (ela é realizada debaixo de uma lona gigantesca, que abriga 6 mil espectadores), saíamos pela balada passo-fundense, escassa, mas com um e outro restaurante com excelente massa e bom vinho. Certa ocasião, celebramos o aniversário de Frei Betto e o chef, animado e feliz, nos serviu paletas de cordeiro memoráveis, ali vimos o dia nascer. Porque Alcione engatava um caso atrás do outro, causeur incansável e ninguém queria perder a história seguinte. Depois, Julinho Diniz se afastou das coordenações e para o lugar dele veio Luciana Savaget.

A história da Jornada caminhava, abria-se. Luciana, escritora de infantis, jornalista (faz documentários culturais na Globo), tornou-se animadora e volta e meia nos roubava a cena. Uma vez (ainda época da novela O Clone), ela, inovadora e louca, entrou no palco com uma burca, como personagem misteriosa. Foi assunto dias e dias, até se revelar sua identidade. Saiu Julio, chegou Luciana, os "tenores" continuaram existindo.

No e-mail, ela contou que Alcione tinha acabado de morrer em Belo Horizonte, de enfarte fulminante. Com sua namorada Dulce, um amor de maturidade, ele tinha passado por Ouro Preto, pelo Fórum das Letras, promovido anualmente por Guiomar de Grammont, e estava em um hotel da Savassi, quando partiu. Um pensamento que me acompanha voltou. Um dos problemas da idade é perceber que o campo à nossa volta vai ficando deserto, se esvaziando de amigos.

Alcione disse um dia: "Como alguém pode viver sem escrever? Vivo impregnado de teatro, bêbado de literatura, encharcado de cinema, grávido de filosofia e gratificado por exercer o que, para mim, é a melhor profissão do mundo: a que permite ganhar a vida com prazer e oferecer ao leitor/espectador vivências do que ele não viveu". Como será sem ele no palco na próxima Jornada de Passo Fundo, ano que vem?

Também Hernani Donato partiu. Estava com 90 anos e era uma delícia ouvi-lo falar na Academia Paulista de Letras. Sabia tudo sobre a história do Brasil e a de São Paulo. Raconteur delicioso, erudito. Falava pausado, repleto de informações e uma memória privilegiada. Tinha a voz mansa e trazia fatos à margem, anedotas, casos, revirava a história do avesso. Trabalhamos juntos vários anos na Editora Abril. Seu romance Selva Trágica, adaptado ao cinema por Roberto Farias, tornou-se um filme clássico. Nos seus textos, na sua narrativa, história não era chata, acadêmica, pesada, era viva, agitada, carne e sangue. Como foi injusta a mídia. Falou-se tão pouco de Hernani. Ou é ignorância? Onde estão nossos críticos e ensaístas? Mais: será, mas será mesmo que é impossível enganar a morte? Ela é tão inteligente e esperta assim? Ou Deus a protege?

Fracassei - PAULO SANT’ANA

ZERO HORA - 30/11


Quase não dá para acreditar. Uma operadora telefônica fazia cair ligações dos usuários para cobrar mais pelas religações.

Ou seja, uma famosa operadora telefônica armou dispositivo mediante o qual instalou quedas automáticas nas ligações para lucrar com as novas ligações que os usuários tinham de fazer.

Eu não entendo como é que continua funcionando uma operadora que procede com essa fraude gigantesca.

Evidentemente, nós, usuários, agora vamos dizer que era por isso que caíam tanto as ligações.

Não dá para acreditar numa safadeza dessas.

Foi por isso, então, que a Anatel decidiu que ligação telefônica com duração de menos de dois minutos, daqui para diante, quando sofrer queda, não poderá ser cobrada novamente. Quantas vezes cair a ligação, doravante, terá de ser cobrada uma vez só.

Medida justa e humana com os consumidores.

Faleceu na madrugada de ontem Joelmir Beting, um dos maiores jornalistas brasileiros de todos os tempos.

Ele traduziu magistralmente para o noticiário a economia, antes dele inalcançável para os ouvintes e leitores.

Era dono de uma expressão enriquecedora do vocabulário, tinha uma inteligência rara.

Morreu um cara que vai fazer muita falta para as comunicações.

Para ser honesto, tenho de confessar aos meus leitores que devo ter fracassado na minha tentativa de deixar de fumar.

Em quatro dias de experiência, de segunda-feira passada até ontem, quando antes teria fumado 240 cigarros (três maços por dia), consegui fumar apenas 40 cigarros. Na verdade, para deixar de fumar, teria que não fumar nenhum cigarro nos últimos quatro dias.

Não foi possível, não consegui resistir à tentação. Eu já sabia que era dependente do cigarro, tanto que, quando comuniquei que iria tentar parar de fumar, não deixei de assinalar que não acreditava no meu sucesso.

Os médicos Carlos Barrios e Luiz Edmundo Mazzoleni, quando leram a minha promessa, imediatamente me telefonaram e praticamente me asseguraram que era impossível, sozinho, eu largar o cigarro. Queriam dizer que eu precisava de uma ajuda médica ou química.

Não sei agora o que vou fazer, tentarei manter essa redução significativa de cigarros fumados que obtive nesses quatro dias, mas nem isso talvez eu consiga.

Que vício triste. Não sei como pessoas como o Cláudio Brito e o Moisés Mendes conseguiram largar do cigarro sem ajuda de ninguém e de nada, é um milagre que eles atingiram e que eu desconfio que jamais atingirei.

Tenho três filhos e os três não fumam. Mas um neto meu de 25 anos já é fumante.

Que vício triste!

Economia caminha no ritmo de Collor - ROBERTO FREIRE

BRASIL ECONÔMICO - 30/11


A presidente Dilma Rousseff já se aproxima da metade de seu mandato, mas tem pouco a apresentar à população. Na economia, o país não avança e deve fechar o biênio 2011-2012 com a pior média de crescimento do PIB desde o governo de Fernando Collor.

De acordo com a pesquisa do Boletim Focus, do Banco Central (BC), que considera uma expansão da economia de 1,5% prevista para este ano, o crescimento médio anual do PIB deverá ser de apenas 2,1%.

Para efeito de comparação, no mesmo período dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, cujo legado é sistematicamente desconstruído pelos petistas, a média de crescimento foi de 3,2% e 2,3%, respectivamente.

Os índices de Lula, impulsionados por um cenário econômico internacional altamente favorável na época, são de 3,4% e 5,6%, ainda abaixo da média mundial no período. Só Collor, hoje notório aliado do petismo, teve média pior que Dilma (0,25%).

Os números raquíticos apresentados pelo atual governo deixam o Brasil em posição vergonhosa se comparado a outros países emergentes. Segundo levantamento do economista Alcides Leite, feito com base em projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), no acumulado de 2011 e 2012 a economia brasileira deve crescer cerca de um terço dos emergentes (4,2% a 11,8%).

No grupo dos Brics, ficaremos na lanterna, atrás de Rússia (8,2%), Índia (12%), China (17,7%) e até da África do Sul (5,8%), cuja taxa de desemprego chega a 25%. Em relação aos principais países da América Latina, novo vexame: o Peru deve fechar este biênio com uma expansão acumulada de 13,3%, seguido por Argentina (11,7%), Chile (11,2%), Colômbia (10,5%) e México (7,8%).

Não é só. Dados divulgados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que, apesar de sentirem os efeitos da desaceleração mundial, os emergentes crescerão mais que o Brasil em 2012. Na China, o PIB deve avançar 7,5%, contra 4,4% da Índia, 3,4% da Rússia e 2,6% da África do Sul.

O Brasil segue patinando no governo Dilma, também graças à irresponsabilidade e ao populismo desenfreado de seu antecessor. Apesar de números melhores nos oito anos sob Lula, é inegável que o país perdeu oportunidades, ficando muito atrás dos demais emergentes, mesmo em um período marcado pelo "boom" econômico da economia internacional, entre 2003 (quando o PT assumiu o poder) e 2008.

Na ocasião, houve absoluta falta de compromisso com um projeto de desenvolvimento nacional, fazendo com que hoje o país pague um preço muito alto, sobretudo pela falta de investimento em infraestrutura.

Não bastasse ter tolerado a corrupção do mensalão ou as fraudes de pareceres técnicos em favor de empresas - mais recente escândalo protagonizado pela ex-chefe da gabinete do escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary Nóvoa de Noronha, ligada a Lula -, além de tentado reabilitar politicamente o ex-presidente Collor, o PT termina o ano de braços dados ao ex-adversário no que diz respeito ao lamentável desempenho econômico sob seus governos.

Infelizmente, as perspectivas são desanimadoras também para 2013. A incompetência governamental é demasiada.

Inconstitucionalidade e burocracia nos royalties - CID HERÁCLITO DE QUEIROZ

O Estado de S.Paulo - 30/11


O projeto de lei, aprovado pelo Congresso Nacional, que estabelece novas regras de distribuição dos royalties do petróleo é um monumento à burocracia financeira, a par de violar disposição expressa da Constituição federal. O projeto compõe-se de mais de 150 novas regras, dispostas em 30 páginas do site da Câmara dos Deputados. Por causa dessa extensão, nenhum jornal ou revista pôde publicá-lo integralmente, para o conhecimento da população.

Ora, nenhuma lei desse tamanho pode normatizar matéria alguma com clareza e juridicidade. Ao contrário, textos legais dessa espécie, sobretudo por beneficiarem diversas unidades da Federação e prejudicarem outras, prestam-se a provocar numerosas questões nas vias judiciais. Aliás, várias unidades da Federação se sentem beneficiadas pelo projeto, quando, na realidade, poderão vir a ser prejudicadas, especialmente no decorrer do tempo - pela descoberta de novas jazidas e em face dos avanços da tecnologia na exploração dos recursos minerais em geral.

Todas essas 150 novas normas têm por objetivo - declarado em seu artigo 1.º, parágrafo único - regular um único dispositivo da Constituição da República, aliás, de clareza incontestável. Ou seja, o parágrafo 1.º do artigo 20 da nossa Carta Magna, que assim dispõe: "É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração".

Por mais estranho que possa parecer, essas 150 novas normas não regularão inteiramente a matéria. Tão somente modificarão duas leis anteriores!

Neste passo, é oportuno acentuar que, nos termos do disposto na Constituição federal de 1988, são bens da União, entre outros, não somente os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva, caso do pós-sal e do pré-sal, como também todos "os recursos minerais, inclusive os do subsolo" e os "rios e quaisquer correntes de água em terrenos do seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou que se estendam a Território estrangeiro ou dele provenham ..." (artigo 20, III, V e IX e parágrafo 1.º; artigo 176 e artigo 177).

O escopo do dispositivo constitucional, evidenciado pelo emprego do adjetivo "respectivo" - conforme o Dicionário Aurélio: "que diz respeito a cada um em particular ou separado"; e o Houaiss: "que concerne a cada pessoa, (...) em relação a outras" -, foi o de atribuir a "participação no resultado" ou "a compensação financeira" aos Estados e municípios a) em que esteja situado o subsolo ou o curso d'água ou b) que sejam fronteiros ao mar territorial, à plataforma continental ou a zona econômica exclusiva. Nesta última hipótese, tais bens se incluem no patrimônio da União justamente por serem fronteiros ao seu território. Essa mesma condição gera o direito dos Estados e municípios que também lhes sejam fronteiros - conforme o Dicionário Aurélio: "que está de fronte, situado em frente"; e o Houaiss: "adjacente, situado à frente de".

O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu, no julgamento do Mandado de Segurança (MS) n.º 24.312/DF, em que foi relatora a culta e talentosa ministra Ellen Gracie, que, "embora os recursos naturais da plataforma continental e os recursos minerais sejam bens da União (Constituição federal, artigo 20, V e IX), a participação ou compensação aos Estados, Distrito Federal e Municípios no resultado da exploração do petróleo, xisto betuminoso e gás natural são receitas originárias destes últimos entes federativos (Constituição federal, artigo 20, parágrafo 1.º)".

O senador Francisco Dornelles (PP-RJ), incansável defensor do respeito ao artigo 20, parágrafo 1.º, da nossa Carta Constitucional, já advertiu que "qualquer federação que se pretenda permanente deve evitar que seus membros digladiem entre si para obter vantagens a todo custo sobre seus pares, sem se preocupar com as consequências para o conjunto da federação" (in Jornal do Commercio de 25/10/11).

O único argumento razoável para justificar a alteração do atual tratamento constitucional da matéria seria o de que, na época da promulgação da nossa atual Lei Maior, os constituintes não imaginaram que 20 anos depois seriam descobertas as áreas do pré-sal, a 7 mil metros de profundidade do Oceano Atlântico.

A modificação dessa situação, no entanto, não pode ser objeto de um simples projeto de lei, mas de uma emenda constitucional, que respeite os direitos adquiridos - constitucionalmente protegidos - de Estados e municípios, no momento da promulgação da Constituição de 88, e considere as possibilidades futuras.

O certo é que o mencionado projeto de lei, pela forma como está redigido, viola, flagrantemente, os direitos constitucionais dos chamados Estados produtores - como Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo, fronteiros a áreas do pré-sal e do pós-sal, Sergipe, Paraná, Ceará e Rio Grande do Norte, fronteiros a áreas do pós-sal, Bahia e Amazonas, com áreas produtivas no subsolo, afora os que possam ser beneficiados pela descoberta de novas áreas produtoras.

Nessas condições, é de esperar que a presidente da República vete, integralmente, o referido projeto de lei. E incumba a especialistas competentes e imparciais a elaboração de novo texto, mais conciso e que não agrida a Constituição nem desagregue a união entre os Estados da Federação.

Nem tanto ao mar nem tanto à terra - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 30/11

Entre os estados produtores e não produtores de petróleo, a presidente Dilma Rousseff decidiu ontem comprar briga com a maioria. Vai vetar parcialmente a lei aprovada pelo Congresso, de forma a preservar os recursos de contratos já assinados aos estados produtores e, assim, evitar ações judiciais que possam paralisar a exploração de petróleo ou a implantação do sistema de partilha do combustível. E, na bagagem do veto, vem aí uma medida provisória para distribuir os royalties dos contratos futuros e preservar a receita dos estados produtores naqueles que já estão em vigor. De quebra, a ordem palaciana será ainda no sentido de remeter os recursos para educação, uma maneira de deixar uma parte da riqueza do pré-sal para as futuras gerações.

A decisão de Dilma já era esperada. Enquanto guardiã da ordem e da Federação, ela não pode desconhecer contratos vigentes. Tanto é que citou essa questão ao discursar ontem no Palácio do Planalto, durante a solenidade do programa Brasil Carinhoso. Tampouco pode deixar de atender as reivindicações dos municípios e estados não produtores, ávidos por mais recursos. Daí, a abertura da divisão dos royalties para contratos futuros. Para quem não tinha nada, já é alguma coisa.

A decisão de Dilma, entretanto, vai além do pré-sal ou do petróleo. Nas entrelinhas (literalmente!), traz embutida uma tentativa de conter outros movimentos por parte dos congressistas, sempre ansiosos por atender as bases políticas com mais recursos. Entre os analistas do governo, há um receio de que a distribuição de recursos relativos a contratos já assinados termine por abrir precedentes perigosos, no sentido de servir de pretexto para a distribuição de outros impostos e taxas hoje restritas a alguns estados ou mesmo à União. Os royalties do minério, por exemplo. Hoje, embora mais modestos do que os do petróleo, esses royalties da mineração estão restritos aos estados produtores. Ora, mas em termos de subsolo, nada impede que, daqui a alguns meses, surja um parecer dizendo que esses royalties devem ser divididos entre vários estados. E o governo teria, nesse caso, uma nova queda de braço no Congresso.

Outro quesito que preocupa o Poder Executivo se refere às contribuições exclusivas da União. A Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) é um exemplo. Esse imposto incide sobre a receita bruta das empresas em geral. A contribuição não é dividida com os estados e municípios. Mas, a partir da distribuição dos royalties de contratos já assinados, nada impediria que, daqui a alguns anos ou meses, os congressistas comecem um movimento exigindo a partilha dessa verba, da mesma forma que pediram a distribuição dos royalties do petróleo.

Por falar em futuro…

Os congressistas, aliás, há tempos reclamam da falta de equidade na distribuição dos impostos entre estados e municípios. As reclamações se acumulam e o governo sabe que, mais dia, menos dia, essa partilha será inevitável. O problema, entretanto, é que nenhum presidente da República até hoje demonstrou a grandeza de dividir receitas e deixar aos governadores e prefeitos a primazia pela distribuição de serviços à população. Daí o fato de a União concentrar tudo. Não por acaso, Dilma hoje segura os royalties dos estados produtores. É mais uma decisão no sentido de postergar a distribuição de outros impostos.

Politicamente, a presidente terá problemas com a decisão. No mês passado, publiquei aqui as considerações de um deputado sobre a candidatura de Dilma à reeleição. Ele dizia que, se ela fosse mesmo candidata, não vetaria a distribuição dos royalties, preservando a relação com o mar de prefeitos encarregados de replicar a campanha presidencial Brasil afora. A presidente, entretanto, não pensa assim. Afinal, a avaliação do Planalto é a de que, se o povo estiver com a presidente, os prefeitos não ficarão contra ela. Essa queda de braço entre Dilma e os prefeitos começa agora.

No mais…

Vencido mais um capítulo dos royalties a 22 dias do recesso parlamentar, a perspectiva é a de que uma nova discussão sobre esse tema fique para 2013, abrindo a temporada do Congresso, depois de escolhidos os presidentes da Câmara e do Senado. Até lá, o governo vai se dedicar a vencer a crise deflagrada com a Operação Porto Seguro e o imbróglio das novas regras de concessão na área de energia elétrica. Esta semana se encerra com o governo acenando em aumentar a indenização às empresas. Mal ou bem, serve para ajudar a diminuir a tensão no Executivo e, de quebra, a pressão sobre o Parlamento.

Educação - SONIA RACY


O ESTADÃO - 30/11

Depois de Cleuza Repulho recusar convite para a Secretaria da Educação, Haddad procurou Lisete Arelaro, diretora da Faculdade de Educação da USP. Sem sucesso.

Seu contrato com a universidade só termina no fim de 2014.

Com educação
Selada, em almoço esta semana,amizade entre o prefeito eleito e Neca Setubal. O Cenpec, capitaneado pela socióloga, estará à disposição da Prefeitura.

Sem gol de letra
Raí, que também conversou longamente com Haddad, elencou como prioridade, hoje, seus projetos sociais.

Tempos modernos
E Dilma ultrapassou Joana D’Arc, Cleópatra e Anita Garibaldi... no imaginário de estudantes do ensino médio. Foi citada como exemplo de mulher forte em metade das redações que concorreram a prêmio sobre igualdade de gênero.
Promovido pelo governo federal e pela ONU.

Etapa judicial
O Tribunal Regional Federal paulista manteve decisão judicial que condena Marcia Cid Ferreira a pena de 5 anos e 4 meses de prisão por desvio de recursos do Banco Santos.

Procurado, o advogado Arnaldo Malheiros Filho não retornou ligação. Mas tudo indica que deve recorrer ao Superior Tribunal de Justiça.

Sem success
Em comum acordo, Eike Batista desfez acerto coma Success For Kids Brasil. Dos R$12 milhões prometidos quando da passagem de Madonna por aqui, em 2010, o empresário depositou... R$1 milhão.

Explicação? Segundo a ONG, houve mudança de foco no processo, e Eike desistiu.

Success 2
Não há notícia de que Madonna, de volta hoje ao País, vá repetir apelos para contribuições em prol da SFK – como fez há dois anos, quando doou US$1 milhão.

A ONG avisa: o dinheiro de ambos ajudou 6 mil alunos de escolas da rede pública.

Ho, ho, ho!
O Inmetro inicia segunda-feira, em todo o País, fiscalização de lojas de brinquedos e luzes pisca-pisca.
Além da apreensão de produtos, a multa varia entre R$ 100 e R$1,5 milhão.

De olho no Oriente Médio
Um dia antes de a Palestina ser reconhecida como Estado Observador da ONU, Chemi, filho de Shimon Peres, passou pelo Brasil para promover dois fundos por ele criados. O de investimentos, o Pitango, e o Al Bawader, para projetos de árabes-israelenses, Chemi conversou com a coluna após palestra na Hebraica, anteontem.

•O Al Bawader pode ajudar a montagem de negócios com países árabes?
Claro. Queremos atingir o mercado de maneira global. Estamos de olho no desenvolvimento da internet em árabe, pois é a língua que mais cresce na rede social. Em Israel, temos grandes empreendedores e engenheiros árabes. São parte da comunidade israelense, capacitados para desenvolver, ao lado dos judeus, essa parceria. Temos de entrar neste mercado árabe. A começar pelos palestinos e jordanianos, seguidos por Egito e Líbano. Bem como a Síria, no futuro.

Coração selvagem - DAVID COIMBRA

ZERO HORA - 30/11


Esse senhor de basto bigode que zanzou feito um fantasma por Porto Alegre dias atrás, Belchior, esse senhor estranho é um símbolo. Belchior é uma estátua viva à juventude, à inconformidade, à contestação reflexiva e, também, à imaturidade.

Você pode aprender muito, se conhecer Belchior, se prestar atenção no que ele escreveu e no que ele se transformou. Belchior foi um poeta inexcedível. Repare neste verso:

“Meu bem, guarde uma frase pra mim dentro da sua canção.

Esconda um beijo pra mim sob as dobras do blusão”.

Não é uma bela imagem, o beijo que ela leva escondido nas dobras do blusão?

Em outro poema, Belchior tomou emprestada a verve de Olavo Bilac:

“Ora, direis, ouvir estrelas! Certo perdeste o senso. Eu vos direi, no entanto: enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não, eu canto”.

Bonito.

Mas o importante de Belchior não é a beleza das suas composições. O importante é quando ele confessa que a sua alucinação é suportar o dia a dia. É a alucinação de todos, certo, mas Belchior não está exagerando sobre si mesmo. Em outra canção ele diz a um parceiro:

“Se você vier me perguntar por onde andei

No tempo em que você sonhava,

De olhos abertos lhe direi: Amigo, eu me desesperava”.

Ele se desesperava com o dia a dia, ele se desesperava ao perceber que a juventude do seu coração era perversa, uma juventude que só entendia o que era cruel, o que era paixão, porque assim é a juventude.

Belchior sabia que a felicidade é uma arma quente, mas isso não lhe serviu de consolo. A fama, o sucesso e o dinheiro não foram suficientes para aplacar a dor existencial de Belchior. Ele não se conformou. Prova-o o seu futuro, que o futuro dele está acontecendo hoje.

Prova-o esse ser humano enigmático que vaga pelo sul do continente meio que sem rumo, hospedando-se em hotéis sem ter dinheiro para pagá-los, doce e arredio ao mesmo tempo, parecendo ora aflito, ora sereno, sendo hoje o que foi sempre.

Belchior ficou congelado nos anos 70. Jamais saiu de sua própria juventude e, suponho, jamais sairá. Em uma de suas grandes composições há uma frase que diz tudo sobre ele, uma frase que resume o que é o coração selvagem de quem começa a se conhecer:

“Ainda sou estudante da vida que eu quero dar”.

É isso. Belchior sabia que a vida de uma pessoa é dada a outras pessoas. Mas que vida ele queria dar? Para quem? Essas eram as perguntas que o inquietavam, e que inquietam a quem quer que pense. Olhando para o Belchior pálido de hoje fico pensando se ele, enfim, descobriu as respostas.

Um homem é homem - CARLOS HEITOR CONY

FOLHA DE SP - 30/11


Se há um povo que não tem necessidade de rotular seus filhos pelas características raciais, esse povo é o brasileiro


Eugênio Hirsch, nascido na Áustria, mas vivido na Argentina e, mais tarde, no Brasil, era um artista gráfico de prestígio mundial, responsável pelos catálogos de alguns dos museus mais importantes da Europa e capista de grandes editoras 
internacionais.

Era um mestre na arte visual. Sua capa para a edição brasileira de "Lolita", publicada pela antiga Civilização Brasileira, ganhou o prêmio internacional e foi consagrada pelo próprio Nabokov, que a considerou a melhor interpretação de sua personagem, superando até mesmo o filme de Stanley Kubrick baseado em seu romance.

Durante os anos em que viveu no Rio, casou-se com uma negra escultural da qual ele nem sabia o nome, tratando-a simplesmente de Azeitona, pela cor aveludada de sua pele extraordinária.

Um amigo perguntou se era verdade que ele havia se casado com uma negra. Hirsch respondeu na bucha: "Não, eu me casei com uma mulher". Este caso teve um replay de outro amigo meu, que se casou com uma judia. Perguntado se era verdade, ele respondeu: "Não. Casei-me com uma mulher".

Relembro os dois casos toda vez que fazem referência ao ministro Joaquim Barbosa, considerado o primeiro negro a ocupar a presidência do Supremo Tribunal Federal. Pensando bem, é um resquício quase inocente do preconceito racista, negado veementemente pelos nossos sociólogos e demais entendidos, mas existente na prática sob diversas formas, algumas delas até que inocentes.

O ministro é, acima de tudo, um cidadão como outro qualquer, não deve o cargo que ocupa atualmente a uma cota racial, é um brasileiro nascido em Paracatu, que se destacou no ofício que escolheu e para o qual se preparou ao longo da vida, vencendo dificuldades que, de uma forma geral, todos nós enfrentamos, uns mais, outros menos, no desafio clássico do "struggle for life", a luta pela vida.

Se há um povo que não tem necessidade de rotular seus filhos pelas características raciais, esse povo é o brasileiro, formado e formatado pela miscigenação do branco europeu, do negro africano e do índio nativo. Gobineau e Chamberlain abasteceram os nazistas e os demais racistas, condenando a mistura do sangue como o maior inimigo do gênero humano.

No caso brasileiro, apesar da discriminação que ainda existe, embora atenuada em relação a outros tempos (fomos o último país a abolir a escravidão), há motivos de sobra para não nos admirarmos quando um negro ou afrodescendente (detesto essa classificação pretensamente correta) ocupa na sociedade o lugar que mereceu.

Basta citar que três dos nossos maiores artistas foram negros: Aleijadinho, na escultura, Machado de Assis, na literatura, e padre José Maurício, na música erudita. Isso sem falar na arte dita popular, bastando citar Pixinguinha, sem falar em vultos históricos como José do Patrocínio, Cruz e Souza, André Rebouças, em nossos atletas e artistas em todos os setores.

Não constituem uma exceção, são produtos naturais daquilo que podemos chamar de "civilização". Claude Lévi-Strauss fez um diagnóstico cruel de nossa formação social, dizendo que o Brasil começou na barbárie pré-colombiana e passou para a decadência, sem conhecer o largo e profundo estágio da civilização propriamente dita. Daí o adjetivo que usou para nomear seu livro mais famoso: "Tristes Trópicos".

Em termos europeus, ele podia ter razão: os bárbaros atravessaram um largo período histórico de civilização (incluindo a Idade Média) para chegarem a uma potencial decadência cujos sintomas atualmente começam a se manifestar de forma algumas vezes dramática.

E para recuar ainda mais a constatação da negritude como elemento civilizatório, lembrarei aquele hino atribuído a Salomão: "Nigra sum sed formosa, ideo dilexit me Rex et introduxit me in cubiculum suum" (Sou negra, mas formosa, por isso o rei me amou e me introduziu em seu cubículo).

Na realidade, o rei não introduziu uma negra em sua alcova. Introduziu uma mulher que lhe deu prazer e descendência.

Sereias lusitanas - NELSON MOTTA

O GLOBO - 30/11


As novas cantoras lusitanas são mulheres muito bonitas. Confira no You Tube. Nunca mais você vai falar em portuguesa bigoduda



Na atual crise, Portugal deveria abandonar a União Europeia e se unir ao Brasil de papel passado na República Federativa Brasil-Portugal, revertendo o formato colonial. Cada um tocaria sua vida soberanamente, mas eles teriam acesso a nosso mercado continental — e parte do território brasileiro seria na Europa. A sugestão é de um ex-ministro português, um querido amigo muito inteligente e culto, e mestre da ironia.

Piada de português, ou de brasileiro, rimos muito com essa revolução geopolítica tão louca que poderia até dar certo. Mas o fato é que nem sequer conhecemos o fado de hoje — como os portugueses conhecem o samba e a MPB de sempre. Em 2013, a metáfora da integração será o Ano de Portugal no Brasil, simultâneo ao do Brasil em Portugal, para aproximar as nossas culturas, ciências, tecnologias, economias e esportes.

Eles já conhecem o melhor, e o pior, da nossa música, e já entendem o brasileiro falado nas novelas. Mas nós ainda desconhecemos grandes artistas portugueses e temos dificuldades com a língua cantada. Menos mal que o sensacional Buraka Som Sistema, afrolusitano, arrebentou no Rock in Rio, onde também brilhou o guitarrista e bluesman Rui Veloso. E o kuduro angolano virou febre em “Avenida Brasil”.

Nos últimos tempos a jovem fadista Carminho e o excelente António Zambujo têm se apresentado com muito sucesso no Rio e em São Paulo. A maravilhosa Ana Moura brilhou no CD dos 70 anos de Caetano Veloso cantando uma arrepiante “Janelas abertas”.

Aos poucos, os brasileiros começam a conhecer as novas cantoras portuguesas, com um pé na tradição e outro no moderno, e uma característica em comum: são mulheres muito bonitas, como Cristina Branco e Cuca Roseta, uma das estrelas do filme “Fados”, de Carlos Saura. Confira no You Tube. Nunca mais você vai falar em portuguesa bigoduda.

Assim como Caetano já cantou “Coimbra” em português, e eles amaram, neste ano de encontros, adoraria ouvir essas novas fadistas cantando clássicos da nossa música, em brasileiro, como já fez a cultuada Teresa Salgueiro, com um sotaquezinho quase imperceptível, que lhe deu ainda mais charme.

O mal encarnado - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 30/11


O que temos não parece ser preconceito ou disputa com a oposição. Tem mais é cara de briga de cachorro grande


Onde está o bombeiro Paulo Okamotto? Marilena Chaui, a senhora não vai se manifestar?

Deve estar rolando um pau de ma­carrão forte lá em São Bernardo. E só agora eu entendi a ausência dela no jantar da Pirelli, no Rio.

Em situação normal, é óbvio que dona Marisa Letícia estaria senta­da, feito a rocha de Gibraltar, entre seu marido Lula e a Sophia Loren. Que "Antaq" que eu sou!

O que o pessoal queria, que a ami­ga do Lula ficasse para trás na fila da Imigração dos EUA, enquanto ele já estivesse instalado no Waldorf Astoria conferindo a vista? Sem passaporte azul não dá, né não? Questão de ordem prática. Se fosse amiga do FHC ou do Serra, ninguém chiava, né?

E é claro que eu acredito na Rose quando ela diz que não gastou em plástica, mas em operação no ouvi­do. Como é que alguém pode ser BFF ("best friends forever", melhores amigos) do Lula se não for completamente surda? Já imaginou ficar ouvindo aquele monte de barbaridades diariamen­te? Só mesmo sendo ruim de ouvido.

Aliás, acho que a Rose sempre teve ouvido bom. A operação que fez foi para não ouvir mais. "Por favor, doutor, diminua minha audição em 98%, que meu ouvido não é penico!"

Não é à toa que ela se chama Rosemary Noronha. É só começar a ladainha da analogia ludopédia, ela corre ao aeroporto, embarca pa­ra a ilha homônima e só liga na che­gada: "Oi, morzão, pode falar!".

Ué? Uma das amigas de FHC foi ainda mais longe, mudou de conti­nente! Imagino que ele tenha se posto a falar aquele francês empo­lado dele e ela tenha reagido: "Olhe, Fernando, vou ali na 'confiserie' comprar brioches e já venho".

Bem, cada um tem a Monica Le­winsky que merece, e vida privada que fique na privada de cada qual. Se formos analisar, uma não difere muito da outra, quem pode atirar a primeira calcinha ou sunga?

O que me intriga é saber por que agora, por que assim e por que ta­manha insistência. É claro que o esforço para acabar com a corrup­ção é legítimo e louvável, mas não terminaram recentemente de sangrar o PT até a entrada do necrotério? Quem estaria sedento por mais?

Tudo bem que os deputados con­denados vão manter os cargos, um exercício de surrealismo que não passaria nem mesmo pela mente de Buñuel. E está certo que o siste­ma, afinal, acabou recompensando a delação, o que mostra que, se nos­sa democracia está sendo talhada de acordo com o o caráter nacional, nós não valemos nada.

Mas será possível que exista um "esprit de corps" de várias institui­ções interligadas para varrer, na fi­gura do ex-presidente, o mal encar­nado do mapa? Não parece viável, não é mesmo? Até porque isso não representaria a temperatura atual do país. Nem Lula caberia nesse pa­pel. Questão moral ou de ordem profilática também não seria, uma vez que as entranhas já estavam po­dres antes da chegada dele e o ho­mem vem de uma doença, gente!

Algo me diz que estamos diante de algo maior do que o velho precon­ceito nutrido pela elite ou de dispu­tas com a oposição -de resto, cada vez mais combalida. Percebe-se uma disputa de titãs em curso.

O curioso é que, nos anos em que esteve no poder, Lula só fez agradar bancos, construtoras e grandes conglomerados das telecomunica­ções. Ou não?

Pode ser só uma coincidência. Ou coisa de um clone de Roberto Jef­ferson ou de algum admirador se­creto de dona Marisa disposto a chamar sua atenção, vai saber. Mas que é muita sincronicidade a paulada da Por­to Seguro vir na esteira de um julga­mento de viés político e resultado tão implacável, isso lá é.

Aulas de história de volta - GILLES LAPOUGE


O Estado de S.Paulo - 30/11


Há dois anos o ministro da Educação Nacional da França, Luc Chatel, expulsou a história e a geografia do ensino médio.

Ele se dizia um homem "moderno", eficaz, prático: essa Idade Média, com seus reis, suas damas, seus construtores de igrejas, seus camponeses malvestidos e até analfabetos, tudo isso era antiquado. A data de prescrição já tinha passado. Para o lixo com a Idade Média!

E, além disso, por que perder tempo com a Renascença? Todos esses papas libertinos, esses Bórgia, esses "condottieri", esse tal Da Vinci, esse Giotto, não servem para nada, não vão ajudar a encontrar petróleo. Não rendem um tostão.

Quanto à Revolução Francesa de 1789, foi um bando de desaforados. E mesmo Napoleão era um bom soldado, de acordo, mas, enfim, para que serve narrar o seu gênio e sua loucura para alunos que, mais tarde, vão dirigir bancos, arrebatarão "partes do mercado" dos chineses ou construirão estradas do século 21? Ou somos modernos ou não, que diabo!

A história não se deixou envolver. Percebeu-se que os franceses adoram história. Um jornal popular, o Journal du Dimanche, aumentou sua tiragem quando promoveu o ensino da história e da geografia. Um protesto reuniu 28 mil assinaturas de pessoas indignadas.

Retorno. Hoje, depois de dois anos de abstinência, a história retorna graças ao novo ministro da Educação Nacional, Vincent Peillon. Ela será novamente ensinada até o último ano do ensino médio e será uma das provas obrigatórias do exame de admissão à universidade. Como nos velhos tempos.

A retirada do estudo de história era particularmente escandalosa num país como a França, como se a soma de 20 séculos tivesse sido segregada, cristalizada. Paris, Roma, Bahia, Londres ou São Luís do Maranhão, o que são senão uma caminhada trágica e luminosa pela memória do mundo?

E como compreender os arcanos da "modernidade" se o passado não pode ser percebido, um pouco como uma imagem que brilha atrás de um cristal?

Em 1939, foi dito ao grande historiador Marc Bloch que era inútil vasculhar o passado, quando eclodiu a 2.ª Guerra. Bloch respondeu: "Eu me informo sobre Carlos Magno e Robespierre para compreender a guerra que Hitler acabou de nos declarar".

Toda a pintura clássica, de Michelangelo a Picasso, de Cranach ou Dürer a Turner ou Paul Klee, é simplesmente uma maneira suntuosa de folhear os séculos que nos fabricaram.

Excesso de informação. Ocorre que o currículo escolar de um aluno do século 21 é tão avassalador que excede a capacidade de um adolescente comum. Como conseguiria ele amontoar na sua cabecinha todas as matemáticas, as ciências físicas e a economia, a ortografia e o inglês, a química, o estudo das leis, etc?

Se continuarmos a abarrotar os cérebros dos estudantes, eles acabarão explodindo. Esse é um dos grandes desafios do ensino. Esse desafio, a França acreditou tolamente que havia superado há dois anos, suprimindo numa penada uma disciplina julgada "inútil".

Não teria sido mais inteligente refletir sobre novas maneiras, novos métodos de ensino? Essa é uma missão sutil. Talvez seja até uma "missão impossível".

Contudo, mesmo impossível, ela merece ser levada adiante, em vez de demolir a grandes marteladas 2 mil anos da memória dos homens. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Guerra dá novo impulso à luta palestina - RASHEED ABOU-ALSAMH

O GLOBO - 30/11


Viver numa fortaleza, rodeado de ódio e ressentimento, não é uma fórmula para uma longa vida do Estado judeu



A recente guerra entra os palestinos do grupo Hamas na Faixa de Gaza e Israel deu novo impulso à luta dos palestinos para um país independente, e também deu novo respaldo ao líder do Hamas, Khaled Meshal, que somente este ano voltou a Gaza de Damasco depois de discordar da matança de Bashar al-Assad contra o povo sírio.

Como de hábito, essa guerra foi desigual e assimétrica, com o Hamas lançando centenas de foguetes não muito sofisticados diariamente contra Israel, e o Estado judeu respondendo com ataques de mísseis americanos de ultima geração, lançados do ar, mar e terra contra a densamente povoada Faixa de Gaza, deixando seus alvos pulverizados. No final, pelo menos 140 palestinos foram mortos em uma semana de combates, mais de metade deles civis, contra cinco israelenses mortos. A diferença desta vez foi que alguns dos mísseis, os Fajr-5 fornecidos pelo Irã, atingiram a maior cidade israelense, Tel Aviv, e os arredores de Jerusalém. Isso deu um susto na população israelense, e forçou as Forças Armadas israelenses a usar intensamente o seu sistema de proteção antimíssil chamado de Cúpula de Ferro. Há estimativas de que Israel gastou US$ 40 milhões somente com isso.

O presidente palestino, Mahmoud Abbas, que lidera a facção palestina de Fatah na Cisjordânia e que é o queridinho dos israelenses e americanos por sua política de cooperação passiva com Israel, foi praticamente esquecido nesse episódio que realçou a política de resistência armada do Hamas contra a ocupação e o bloqueio israelense dos territórios palestinos. A maioria dos palestinos aplaudiu o lançamento dos foguetes do Hamas contra Israel, mesmo muitos daqueles morando na Cisjordânia, trazendo mais dúvidas sobre a relevância de Fatah e Abbas na luta palestina de mais de 60 anos por um Estado independente. Abbas, na semana que vem, vai tentar de novo conseguir o status de Estado para a entidade palestina na Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York, onde terá que conseguir uma maioria absoluta dos votos a favor. Se conseguir isso, Abbas certamente vai conseguir resgatar um pouco do prestígio que tem perdido o Hamas.

Mas além de realçar as diferenças entre Hamas e Fatah, essa guerra mostrou o quanto as alianças estratégicas estão mudando rapidamente no Oriente Médio, que continua muito instável com os efeitos das ondas de revoluções da Primavera Árabe ainda se desdobrando. O Hamas tem se desligado de sua aliança com o Irã por causa da guerra civil na Síria, voltando-se em vez disso para Catar, Egito e Turquia.

Algumas semanas antes de Israel assassinar o líder militar do Hamas, Ahmad Jabari, no dia 14 de novembro, o sheik Hamad bin Khalifa al-Thani, o líder do Catar, visitou a Faixa de Gaza — o primeiro líder árabe a fazer isso por algum tempo — e levou a promessa de ajuda na forma de investimentos no valor de US$ 400 milhões.

O presidente egípcio, Mohammed Mursi, desempenhou um papel muito importante nas negociações de cessar-fogo entre Israel e o Hamas, usando suas credencias islamitas com o Hamas e o desejo de resguardar o tratado de paz de Camp David entre Israel e o Egito. O Hamas prometeu não lançar mais foguetes contra Israel, por enquanto, e Israel também prometeu não assassinar mais líderes do Hamas, e disse que relaxaria o bloqueio da Faixa de Gaza. Agora só nos resta saber quanto tempo tudo isso vai durar.

O que me incomodou com essa guerra foi o jeito habitual de os israelenses se posicionarem como as vítimas em tudo isso, botando toda a culpa e a maldade nas cabeças dos palestinos. A vida na Faixa de Gaza tem sido extremamente difícil, um tipo de inferno, com quase nada entrando por causa do bloqueio israelense. É fato que a maioria dos israelenses não quer uma vida compartilhada com os palestinos, e ficam contentes em viver em uma Israel fortaleza, rodeados por povos que não sentem qualquer carinho por eles. Mas acho que a opinião pública mundial viu que a luta era desleal e que desta vez foi Israel quem começou a briga.

Com isso o Irã ficou ainda mais isolado no mundo árabe; a preferência dos EUA por Israel, como sempre, foi realçada de novo, e Mursi ficou empenhado numa batalha complexa contra os restos do regime do Mubarak que não querem ver Mursi e a Irmandade Muçulmana vencerem a sucessão no Egito.

Os israelenses vão ter que aceitar um Estado palestino ao lado de Israel, se querem viver em paz na região. Israel vai ter que tirar os assentamentos judaicos da Cisjordânia, e dividir Jerusalém com os palestinos. Viver numa fortaleza, rodeado de ódio e ressentimento, não é uma fórmula para uma longa vida do Estado judeu. Os palestinos, por sua parte, vão ter que desistir de vez do direito de retorno à antiga Palestina. Em troca, Israel deverá ceder a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, com algum tipo de corredor ligando os dois territórios para viabilizar um Estado palestino. O Hamas e o Fatah vão ter que resolver suas diferenças e pendências para beneficiar seu povo.

Mursi, agora mais do que nunca, está sob pressão para tentar conter o Hamas, já que o Egito tem uma fronteira estratégica com a Faixa de Gaza. Com o turbilhão de protestos diários no Cairo contra a suposta tomada de poder por Mursi, o presidente egípcio está tendo um batismo de fogo nos corredores do poder.

As armas que salvam vidas - MOISÉS NAÍM

FOLHA DE SP - 30/11


Se os foguetes do Hamas tivessem tido mais êxito, hoje estaríamos falando em milhares de mortos


As armas são para matar. Mas a surpresa é que às vezes algumas delas salvam vidas. É esse o caso dos mísseis antimísseis que Israel usou para proteger-se dos foguetes lançados pelo Hamas da faixa de Gaza.

E não me refiro ao fato de esse sistema, chamado "Domo de Ferro", ter evitado a morte de inocentes civis israelenses. Isso ele fez, sem dúvida. Mas também evitou a morte de milhares de inocentes em Gaza. Conseguiu ainda evitar uma desestabilização ainda maior nessa região conturbada e, possivelmente, até mesmo um perigosíssimo conflito armado entre Israel e Egito. Como pode uma arma fazer tudo isso?

Nos oito dias que durou o conflito, os partidários do Hamas lançaram 1.506 foguetes de Gaza contra Israel. Mais da metade caiu em áreas despovoadas. Mas 84% dos 421 foguetes que teriam explodido em centros urbanos foram destruídos no ar pelo sistema antimísseis israelense (que é capaz de detectar os que cairão em áreas despovoadas sem causar baixas e os ignora). Cinquenta e oito foguetes palestinos atingiram áreas povoadas, matando cinco israelenses e ferindo 240.

O que teria acontecido se os foguetes do Hamas tivessem tido mais êxito, caindo em Tel Aviv e outras grandes cidades e causando não cinco, mas mil, 3.000 ou mais mortes na população civil?

A resposta é óbvia: o governo de Israel -como o de qualquer outro país- teria invadido Gaza. Isso teria envolvido um ataque de infantaria e carros blindados e a luta casa por casa em uma das áreas urbanas mais densamente povoadas do mundo, com civis impossibilitados de sair do campo de batalha. Hoje estaríamos falando em milhares de mortos e numa violenta reação em cadeia em todo o mundo árabe.

O novo presidente egípcio, Mohamed Mursi, em vez de atuar como intermediário nas negociações de paz, como efetivamente fez, muito provavelmente teria sido obrigado a mandar seus soldados para combater ao lado do Hamas, um grupo que, assim como Mursi e o atual governo egípcio, pertence à Irmandade Muçulmana.

Os demais países árabes e o resto do mundo muçulmano não poderiam ter se limitado a ser espectadores passivos. Os EUA tampouco. A veloz escalada do conflito e suas inúmeras e imprevisíveis consequências teriam sido enormes e globais.

Embora tenha sido possível limitar o número de civis mortos e feridos em Israel nesse novo conflito, o mesmo não aconteceu entre os habitantes da faixa de Gaza. De acordo com as Nações Unidas, morreram em Gaza pelo menos 90 civis (segundo fontes palestinas, os mortos foram 105, e outras fontes estimam que foram 177).

A Força Aérea de Israel disse ter realizado 1.500 ataques a alvos em Gaza, destruindo quase todos os centros de comando do Hamas, 26 fábricas de armas, depósitos de armamentos, foguetes e explosivos, assim como centenas de túneis.

Não é o final dessa tragédia, mas um capítulo a mais. Um capítulo triste e doloroso. Mas, para situar as coisas numa perspectiva ainda mais dolorosa, basta recordar que na Síria já há 40 mil mortos. Ali não há armas que salvam vidas.

Súditos ou cidadãos? - GUILHERME AFIF DOMINGOS

O ESTADÃO - 30/11


Em artigo no Estadão do dia 22/11, o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega questiona a lei, aprovada recentemente pelo Congresso, que determina que os consumidores sejam informados, mediante estimativa constante da nota fiscal, do montante de impostos incidentes sobre os produtos que adquirem. Para o ex-ministro, "tal exigência não existe em lugar algum, pois seus custos superam os supostos benefícios". Argumenta, ainda, que a medida não teria influência no comportamento dos consumidores em relação à carga tributária. Ele também discute as dificuldades técnicas para a apuração da tributação e os custos dela decorrentes, mencionando ainda a possibilidade de que alguns possam "recorrer ao Judiciário para contestar o valor".

É lógico que, numa democracia com liberdade de imprensa, se podem levantar dúvidas e objeções em relação ao projeto aprovado, mas parece que o ex-ministro Mailson da Nóbrega exagerou e se equivocou nos argumentos contrários à transparência dos tributos.

Em grande parte dos países na zona do euro, o valor do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) é destacado separando o preço de produto do valor dos impostos. Nos Estados Unidos, os preços são mostrados sem o imposto e, depois do "plus tax", o preço total. Nesses países, a carga tributária sobre o consumo é bem menor. Aqui, no Brasil, o nosso IVA é o ICMS, que é calculado sobre um preço de produto que carrega, embutida e escondida, uma parafernália de tributos e taxas que oneram os produtos até chegarem ao consumidor.

O ex-ministro acenou com a possibilidade de que alguém questione na justiça o cálculo da tributação constante da nota fiscal. Ele considera que essa estimativa tem efeito fiscal e servirá para apuração do tributo a ser pago. É um argumento absurdo!

Quanto à opinião de que a transparência do tributo não terá nenhum impacto sobre o comportamento da população, ele subestima a inteligência do cidadão brasileiro que se manifestou a favor da exposição dos impostos na nota, com mais de 1,5 milhão de assinaturas de apoio ao projeto de lei que regulamentou o parágrafo 5.º do artigo 150, de minha autoria na Assembleia Nacional Constituinte.

Para apresentar esse projeto, quando presidente da Associação Comercial de São Paulo, procuramos, com a ajuda de especialistas, fazer o cálculo estimativo do valor dos impostos para informação do consumidor de forma simplificada.

Vários institutos e auditorias renomadas já vêm fazendo essas estimativas. As grandes cadeias de varejo e supermercados, por meio de suas entidades, foram consultadas e aprovaram a sistemática, muito simples para quem tem todos os seus sistemas informatizados.

No caso das micro e pequenas empresas, já se prevê a possibilidade do uso de tabelas, mas seria possível tornar voluntária sua adesão, com base no princípio do tratamento diferenciado, previsto no artigo 179 da Constituição, também de minha autoria.

Tenho certeza de que todos aderirão ao direito de serem informados sobre a tributação, previsto no texto constitucional, que visa a permitir o exercício pleno da cidadania, com o consumidor tendo clara a noção de contribuinte, com seus deveres e direitos. Muitos cidadãos humildes, por estarem isentos do Imposto de Renda e do IPTU, consideram que não pagam tributos e que os precários serviços públicos que recebem são um favor do Estado pelo qual têm de se mostrar agradecidos, em vez de exigirem seus direitos. Comportam-se como súditos.

Vamos assegurar a transparência da tributação e deixar que a população tome suas decisões com base nessas informações. O lema da campanha para a coleta de assinaturas em favor do projeto Pago, logo exijo significa o direito de saber o quanto paga de impostos e o direito de exigir o retorno compatível com esse pagamento.

Com nosso projeto aprovado e com a sanção da presidente Dilma, vamos transformar súditos em cidadãos.

LONGO CIRCUITO - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 30/11

A viagem de Lula a Paris, anunciada ontem, incluirá outras três metrópoles: Berlim (Alemanha), Doha (Qatar) e Barcelona (Espanha). Ele parte na próxima sexta-feira, 7, e fica quase duas semanas fora do Brasil.

BEM PERTO
Na primeira parada, Berlim, Lula participará do aniversário do Sindicato dos Metalúrgicos da Alemanha. Em Doha, fará uma palestra para empresários. E em Barcelona receberá um prêmio do governo catalão.

BEM PERTO 2
Dona Marisa estuda sua agenda para saber se acompanhará o marido.

É provável que ela vá a seu encontro em uma das cidades do circuito.

EM NOME DO PAI
Reynaldo Gianecchini vai criar uma ONG com o nome de seu pai, que morreu de câncer no ano passado. O ator destinará os lucros da venda de sua biografia, "Giane - Vida, Arte e Luta" (ed. Primeira Pessoa), para a entidade. O livro será lançado na próxima terça-feira.

EM CASA
A sede do Centro de Apoio Professor Reynaldo Gianecchini, voltado para crianças e adolescentes, será em Birigui (SP), terra natal do ator. "O interior é muito carente. Minha ideia é apoiar os jovens não só na questão de saúde, mas de cultura, educação e formação profissional", explica ele.

PELÉ PARA DEPOIS
O Museu Pelé, que tinha inauguração prevista para abril de 2013, deve abrir só no meio do ano. A reforma do prédio tombado em Santos (SP), onde será a instituição, está prevista para terminar no fim de janeiro. Depois disso vem a instalação dos equipamentos, que deve levar mais cinco meses.

CUECA DE PLANTÃO
Alessandra Ambrósio, 31, é a primeira mulher a estampar a revista "Made in Brazil", dedicada a modelos masculinos. Ela aparece de cueca na capa do sexto número.

O editorial, com 46 fotos, foi inspirado em ensaio que a modelo gaúcha realizou aos 17 anos, com o mesmo fotógrafo, o inglês Stewart Shining.

As fotos foram feitas em uma praia privada de Amagansett, a duas horas de Nova York, em setembro. Dias depois, a tempestade Sandy destruiu casas na região.

ENDEREÇO POSTAL
Uma escola de formação de atores sem sede fixa está contestando cobrança de R$ 50 mil de Taxa de Fiscalização de Estabelecimento pela Prefeitura de SP.

"A taxa é cobrada de estabelecimentos com ponto físico, o que não é o caso", diz a advogada Renata Sucupira, que representa a escola itinerante. As aulas são dadas na casa dos alunos. A Secretaria Municipal de Finanças diz não poder se pronunciar.

ABAIXA O SOM!
Após motim na vizinhança, com direito a berros e xingamentos, os moradores da rua Padre João Manuel, nos Jardins, e os sócios do Bagatelle Bistrot, novo restaurante da área, chegaram a um acordo: a casa concordou em reduzir o som até que a manta acústica fique pronta. "Foi no grito", diz uma moradora. A briga agora é com clientes bêbados que fazem barraco na calçada de madrugada.

BELEZA ETERNA
Na primeira fila do desfile da Mares, Ivo Pitanguy defendia a beleza natural das modelos. O cirurgião plástico criticava os excessos de intervenções estéticas. "Houve evolução grande. Mas parte da boa cirurgia é procurar a naturalidade", afirma. Ele aconselha fugir de profissionais que não prezam a dignidade do envelhecimento.

MADRINHA GIMENEZ
Paulo Ricardo fez uma versão em português de "Miss You", dos Rolling Stones. Para conseguir gravar ou veicular a canção, batizada de "Vício", o brasileiro precisava da autorização dos autores, Mick Jagger e Keith Richards. O vocalista do RPM pediu ajuda para a amiga Luciana Gimenez, que tem um filho com Jagger.

O OK dos Stones chegou na semana passada e o RPM incluirá a música como bônus no álbum "Clássicos".'

MODA É MARÉ
A nova primeira-dama de SP, Ana Estela Haddad, foi a desfile da grife Mares no hotel Hyatt, anteontem. O cabeleireiro Marco Antonio de Biaggi e a escritora Alessandra Safra foram conferir.

HÁ ALGO DE NOVO
O diretor e dramaturgo americano Bob Wilson estreou no Brasil sua montagem de "Macbeth". A apresentadora Silvia Poppovic e Silvinha Tinoco estiveram na plateia do Theatro Municipal de SP.

CURTO-CIRCUITO
Guilhermina Guinle será uma das madrinhas do camarote da Renner nos shows de Madonna no Morumbi, na semana que vem.

O grupo Pitanga em Pé de Amora se apresenta amanhã, às 21h, e domingo, às 19h, no teatro Fecap. Classificação etária: 14 anos.

Roberto Stelzer inaugura amanhã a mostra "Robografia", às 14h, na galeria Mezanino, na Liberdade.

Miriam Belchior participa de almoço da Cámara Española de Comércio.

O Letuce faz show hoje, às 22h, no Beco 203. 18.

As más notícias - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 30/11


SÃO PAULO - Em sua coluna do último domingo, a ombudsman Suzana Singer sugere que o jornal deveria destacar mais as boas notícias. Em princípio, concordo, mas me pergunto até que ponto é possível fazê-lo sem ir contra a natureza humana.

O problema é que fomos desenhados para ser otimistas locais e pessimistas globais, na feliz expressão de Peter Diamandis. Em relação a nós mesmos, objeto sobre o qual exercemos certo controle, é útil nutrir autoconfiança. Se eu imaginar que consigo pular o fosso tenho mais chance de ter sucesso do que se achar logo de saída que fracassarei. Somos descendentes diretos das pessoas que acreditavam em si próprias. Não é coincidência que 98% dos americanos julguem dirigir melhor do que a média dos compatriotas.

As coisas são mais sombrias em relação àquilo que não controlamos, isto é, a quase tudo no mundo. Aqui, a estratégia mais eficaz é esperar sempre o pior cenário. Se eu estiver errado, fiz o papel de bobo, mas, se estiver certo, aumentei minhas chances de sobrevivência. Ao longo do passado darwiniano, aqueles que não saíam em disparada ao ouvir um estalido no meio do mato não deixaram descendentes.

Hoje em dia, já não dependemos tanto de reações rápidas para continuar vivos, mas os mecanismos cerebrais que nos fazem monitorar possíveis ameaças e imaginar o pior seguem firmes e atuantes. Destacam-se aqui as amígdalas, estruturas localizadas nos lobos temporais associadas à memória e ao aprendizado emocionais, notadamente o medo.

Sem muitos perigos silvestres para vigiar, as amígdalas se voltam para o que estiver a seu alcance. E, num contexto em que centenas, talvez milhares de notícias disputam diuturnamente nossa atenção, são justamente aquelas que despertam nossos instintos de defesa -isto é, as negativas- que acabam vencendo.

Basicamente, estamos programados para procurar as más notícias.

Mais alto o coqueiro - DORA KRAMER


O Estado de S.Paulo - 30/11


Dos 40 inicialmente denunciados pela Procuradoria-Geral da República restaram 37 réus, 25 condenados, 13 em regime fechado.

Em princípio esse resultado oferece à sociedade uma resposta além da esperada em termos de rigor no trato de ilícitos ocorridos nos altos escalões da República.

Se inovações houve por parte do Supremo Tribunal Federal, uma das mais importantes foi o entendimento de que quanto mais alto o coqueiro maior pode ser o tombo.

Não se trata de condenar o cargo, mas de levar em conta as agravantes decorrentes do poder de mando. Desde a responsabilidade final sobre os atos até a disposição de impor critérios rígidos de conduta que, se ausentes, deixam prosperar a permissividade.

Prevaleceu no STF percepção contrária à regra até então vigente na cultura do privilégio e da aceitação do lema de que detentores de mandatos, de influentes cargos e posições políticas de prestígio não são pessoas comuns, devendo a elas ser conferido tratamento especial.

Pela posição que ocupam ou mesmo pela "trajetória de luta", quando pegas transitando à margem da lei, só seriam punidas mediante o impossível: a apresentação do recibo do crime.

Ao (quase) fim e ao cabo de quatro meses de julgamento do processo do mensalão o Supremo disse que não é bem assim. Ou pelo menos nesse caso não foi.

Será daqui em diante? É uma pergunta a ser respondida mais adiante. Por enquanto o que se tem de certo é um aumento no grau de confiança no Judiciário.

Um passo e tanto nesses tempos de supremacia majestática do Executivo e de descrédito crescente no Legislativo.

Impõe-se agora a seguinte questão: isso representa o início de um processo ou será apenas um momento fugaz, cujo efeito se dilui ao longo do tempo sem produzir nenhum avanço?

O Brasil já viveu outros episódios em que a euforia se confundiu com a esperança. Campanha das Diretas-Já, fim do regime militar, Assembleia Nacional Constituinte, impeachment de Fernando Collor, CPI do Orçamento e tantos outros momentos.

Isoladamente, nenhum deles virou o País de cabeça para baixo (ou para cima), mas, juntos, um ativo que se expressa no casamento entre a opinião do público e a posição da Corte guardiã da legalidade.

Bom cabrito. Roberto Jefferson fez a linha sóbria diante da condenação à prisão em regime inicialmente semiaberto. Não se queixou, não se explicou nem se desculpou, citando Disraeli ("nunca se queixe, nunca de explique, nunca se desculpe") ao se manifestar sobre o inevitável.

Realizou o prejuízo. Sempre soube dos riscos. Quando fez a denúncia do mensalão avisou logo: "Sublimei o mandato".

O PT berrou na tentativa de salvar a reputação do coletivo. Jefferson, em matéria de partido fez a sua parte: não disse para quem repassou o dinheiro recebido do valerioduto, evitando arrastar o PTB para o processo.

Sobre a pena de sete anos, existe a chance de ser transformada em prisão domiciliar na Vara de Execuções Penais, devido ao debilitado estado de saúde do condenado.

Tangente. A estratégia da tropa avançada do Palácio do Planalto no Congresso em relação ao episódio Rosemary Noronha é tentar circunscrever os fatos ao campo da "vida pessoal" do ex-presidente Lula.

Mais ou menos como aconteceu com o então ministro da Fazenda Antonio Palocci em relação à casa de lobby frequentada por ele em Brasília. Até que apareceu Francenildo Costa e surgiu a (má) ideia de quebrar o sigilo bancário do caseiro.

Peixe. Calado, Lula exerce o sagrado direito de não dizer nada que amanhã ou depois possa se voltar contra ele.

Atenção para as contas externas - MARIA CLARA R. M. DO PRADO


Valor Econômico - 30/11


O Brasil poderia pagar hoje, se quisesse, toda a dívida externa registrada no Banco Central (BC) no valor de US$ 308,5 bilhões com os recursos das reservas internacionais que somaram US$ 377,8 bilhões, na posição de outubro, e ainda sobraria dinheiro. Sem dúvida, esse é um bom indicador da situação externa do país. Não é, no entanto, suficiente para assegurar tranquilidade nos meses vindouros.

Pode-se dizer que em matéria de estoque - aquilo que se tem disponível de imediato para enfrentar eventuais transtornos cambiais - o quadro atual não requer maiores preocupações. Mas estoque é o saldo em reserva observado em determinado momento do tempo. Relevante é o fluxo, ou seja, o comportamento de entradas e saídas de moeda estrangeira do país, pois dele dependerá o acúmulo ou a queda das reservas internacionais em estoque.

E é justamente no âmbito dos fluxos que as contas externas do país estão a merecer atenção redobrada. Os dados do balanço de pagamentos do país referentes à evolução mensal deste ano, acumulados até outubro, acusam uma acentuada queda na entrada dos recursos externos que alimentam a conta de capital. Esta é a parte do balanço de pagamentos que trata do dinheiro de mais longo prazo, como investimentos e empréstimos. A outra parte é chamada de conta corrente. Nela se registram os fluxos mais imediatos de entradas e saídas como pagamentos de exportação e importação, remessa de lucros e dividendos, despesas como royalties, entre outras. Um país com consumo interno em expansão, seja público ou privado, como é o caso do Brasil, tende a apresentar déficit na conta corrente. Depende de produzir superávit na conta de capital para não ter de recorrer ao estoque das reservas internacionais ou a fontes externas, na ausência daquelas - como ocorreu no passado - para fechar as contas em equilíbrio.

Estoque é o saldo em reserva observado em determinado momento do tempo. Relevante é o fluxo.

Nota-se nos dados divulgados pelo Banco Central que a conta corrente tem mantido neste ano comportamento muito parecido com o de 2011. Até outubro deste ano, o déficit acumulado foi de US$ 39,5 bilhões com projeção de chegar a US$ 53 bilhões em 12 meses, no final de 2012. Valor praticamente igual ao de 2011, quando o déficit em conta corrente chegou a US$ 52,480 bilhões.

Os números da conta de capital, porém, não acompanharam a evolução do ano passado. Em verdade, acusam uma defasagem ao redor de 30% a 40%. O fluxo naquela conta teve este ano uma queda de mais de um terço, ou 36,4%, quando comparado a 2011. O que era até outubro do ano passado US$ 97, 5 bilhões virou US$ 62 bilhões este ano. A projeção do BC aponta para fluxo de US$ 75,7 bilhões acumulado na ponta de 2012, muito abaixo dos US$ 112 bilhões registrados ao final do ano passado naquela conta. A relação entre a conta de capital e a conta-corrente caiu de 2,5 para 1,5.

Um olhar mais detalhado facilmente detecta que a deterioração na conta de capital não se originou no fluxo do investimento direto estrangeiro (IDE). De fato, os valores do IDE mantém-se no nível de 2011. Até outubro, entraram por aquela via US$ 55,3 bilhões com projeção de chegar a US$ 60 bilhões no acumulado do ano. Muito próximo, portanto, dos dados de 2011, com US$ 66 bilhões de investimento direto. Alguns analistas acreditam que a piora da economia na Europa e a relutância dos Estados Unidos em retomar um crescimento mais robusto explicam o relativamente alto volume de ingressos de IDE no Brasil quando comparado com anos anteriores, mesmo a despeito do valor não ter aumentado nos dois últimos anos. Os investidores estariam atrás de mercado e buscariam internamente as oportunidades que se tornaram escassas em seus países de origem.

Esta análise merece uma reflexão maior. Quando se olha para as demais contas de capital percebe-se uma significativa queda dos recursos captados pela modalidade de empréstimo, seja direto ou por meio da venda de títulos. Para se ter uma ideia dos grandes números daquela modalidade, observa-se que, de janeiro a outubro deste ano em comparação a igual período de 2011, a captação de recursos por meio de títulos privados atingiu US$ 9,8 bilhões, menos da metade dos US$ 21,750 bilhões do ano passado, até outubro. A projeção para o fim deste ano não passa de US$ 10,5 bilhões, em comparação com US$ 25,4 bilhões na posição do final do ano passado.

Com relação aos empréstimos diretos, obtidos junto a instituições financeiras, o fluxo caiu de US$ 32,2 bilhões em 2011, até outubro, para US$ 18,8 bilhões no mesmo período deste ano. No acumulado em todo o ano de 2012, a estimativa aponta o valor de US$ 20,4 bilhões, algo como 40% a menos do que no ano passado. Também na rubrica demais empréstimos (que engloba dinheiro de agências, organismos multilaterais e outros) a situação piorou: apenas US$ 7,9 bilhões entraram este ano, até outubro, 50% menos do que o mesmo período de 2011.

A queda na captação de empréstimos no exterior é a mais clara evidência de que o Brasil não está imune aos efeitos da crise internacional. A perdurar a grave situação da economia no mundo, o país caminhará para números cada vez mais apertados nas contas externas. Se não quiser gastar as reservas internacionais para cobrir futuras defasagens entre os gastos da conta corrente e o ingresso líquido na conta de capital, só restará como alternativa ao governo a redução do consumo interno, do setor público e do setor privado.

Joelmir - CELSO MING


O Estado de S.Paulo - 30/11


Há quem o tenha admirado pela facilidade com que criava metáforas engraçadas, como a do sujeito que, lá pelas tantas, metia "o pé 42 em sapato 38". Outros, pela fluência com que se expressava - ainda mais elogiável quando se soube que teve de superar uma séria gagueira na infância. Outros mais, pela especial capacidade de compreensão de um mundo tão complicado.

Depois de ter sido noticiada a sua morte, na madrugada desta quinta-feira, muita gente lembrou a grande contribuição que o jornalista Joelmir Beting deu à tarefa de traduzir o hermético economês para o brasileiro comum.

Ele deu, sim, enorme contribuição para isso quando soube explicar com palavras simples o que acontecia no jogo da produção, do emprego e das finanças pessoais. Mas sua maior contribuição foi anterior. Foi ter quebrado a resistência das pessoas, das mais simples às de escolaridade superior, para as coisas da economia, que sempre pareceram tão complexas. Quem ouvia o Beting se sentia mais seguro para navegar em águas que antes pareciam tão turbulentas, mesmo não tendo entendido o assunto.

Pelo menos até meados dos anos 60 a economia era o que a física quântica é hoje para tanta gente: assunto enfrentado quase exclusivamente por iniciados. O noticiário de economia nos jornais quase se limitava a passar recado do governo federal para as chamadas classes produtoras e o destas para o governo. Era o produtor de café que forçava o governo federal a fazer mais estoques e era o empresário têxtil a pressionar por mais liberação comercial para a matéria-prima e por mais proteção para o produto acabado.

A partir de 1967 veio o chamado milagre brasileiro. As classes médias precisaram entender as reviravoltas do seu orçamento. As editorias de economia tiveram, então, de abrir espaço para comunicadores que se empenhassem em ajudar as pessoas a enfrentar situações novas.

Logo em seguida, o primeiro choque do petróleo, em 1973, e o segundo, em 1979, pegaram o País no contrapé, atolado na dívida externa. Foi um tempo de crises recorrentes e enorme inflação, quando o assalariado recebia no dia 30 menos da metade do salário combinado com o patrão no início do mês. Um vacilo na administração do patrimônio familiar podia provocar uma tragédia.

Foi também quando surgiram os comentaristas, cuja principal função foi ajudar o brasileiro a lidar com esse mundo adverso. Foi uma época em que até mesmo o Jornal Nacional da TV Globo teve de veicular comentários quase diários sobre o comportamento da economia.

Foi nesse cenário que Joelmir se notabilizou e foi nele que passou o recado diário ao leitor, ao ouvinte e ao telespectador - sempre com boa dose de bom humor, qualidade rara em desbravadores. Beting foi um pioneiro também na comunicação multimídia. Não foi eficiente só na produção de textos. Tornou-se grande comunicador ainda no rádio, na TV e nas apresentações para públicos mais restritos.

"O sapo não pula por boniteza, mas por precisão", já filosofou Guimarães Rosa. E foi também a necessidade criada pela crise econômica que ensinou o brasileiro a lidar com ela. O titular que me antecedeu nesta Coluna do Estadão teve grande mérito nessa boniteza.