quarta-feira, fevereiro 03, 2010

ILIMAR FRANCO

Dinheiro em caixa

O Globo - 03/02/2010

A Eletrobras vai antecipar para 26 de fevereiro o pagamento da primeira parcela de dividendos, em atraso, para seus acionistas. Serão R$ 2,5 bilhões, sendo 70% para os cofres do Tesouro. Hoje, o ministro Edison Lobão (Minas e Energia) tratará disso com o presidente Lula, durante viagem para o Rio. A empresa, que passa por processo de reestruturação, vai construir usinas hidroelétricas, para atender à demanda brasileira, na Argentina (1), na Bolívia (1), no Peru (1) e na Guiana (5).

PR manobra em favor de Dilma
Enfrentando problemas regionais para aprovar uma coligação com o PT na sucessão presidencial, o PR vai mudar sua direção em convenção convocada para abril. A presidência do partido será entregue ao ministro Alfredo Nascimento (Transportes), que já terá deixado o cargo para disputar eleições no Amazonas.

O partido quer reduzir o peso dos diretórios da Bahia, do senador Cesar Borges, de Minas Gerais, sob o domínio do governador Aécio Neves (PSDB), e de São Paulo, submetido à influência do prefeito Gilberto Kassab (DEM). Será uma prévia da convenção, em junho, que vai decidir sobre o apoio a Dilma Rousseff (PT).

O cara para ser líder do governo não pode fazer cirurgia de redução de estômago. Tem é que alargar, porque engole cada sapo” — Romero Jucá, líder do governo no Senado (PMDB-RR), sobre a cirurgia feita pelo líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP).

FIRME!?
Mesmo após a conversa do presidente Lula com o presidente do PSB, Eduardo Campos, Ciro Gomes diz que seu projeto é disputar a Presidência. “O presidente Lula nunca me pediu para retirar a candidatura. Ele já me disse que não tem como me pedir isso”, afirmou. Ciro discorda da tese da eleição plebiscitária. “Minha candidatura esteriliza essa polarização. A oposição defende a volta ao passado. O governo está fincado no presente. Quem vai defender o futuro?”, questiona Ciro.

Gafe
Em seu discurso de despedida, o ex-presidente da OAB, Cesar Britto, agradeceu ao vice José Alencar e o ministro José Toffoli (STF), pela lei que torna invioláveis os escritórios dos advogados. Mas ignorou o autor, o presidente da Câmara, Michel Temer.

Richa x Dias
Os tucanos alinhados com o prefeito Beto Richa (Curitiba) convocaram reunião do diretório estadual, na segundafeira, para aprovar apoio à sua candidatura ao governo. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) quer suspender a reunião

Aliados cobram fatura
O senador Osmar Dias (PDT-PR), pré-candidato a governador, está cobrando o apoio da ministra Dilma Rousseff para o cancelamento da multa cobrada pela União pelo pagamento de títulos comprados pelo Banestado, e não honrados pelo governo do Paraná. Sua demanda foi feita pessoalmente, semana passada, no almoço com a cúpula do PDT. Ele condiciona seu apoio à candidatura Dilma na sucessão à solução da pendência

Estímulos anticrise com dias contados
A tendência do governo é a de não renovar, a partir de agora, os estímulos concedidos à produção, para estimular as vendas e reaquecer a economia durante todo o ano passado, por causa da crise econômica internacional. A avaliação na coordenação de governo é a de que as medidas não se justificam mais e que, mantidas, podem provocar distorções na economia. Ontem, o ministro Guido Mantega (Fazenda) previu um crescimento de 5,5% do PIB para este ano.

O PRÓXIMO presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara será o deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS). Substitui Tadeu Filipelli (PMDB-DF).

DEPOIS de sete anos ininterruptos na liderança do PSDB no Senado, Arthur Virgilio (AM) deve ser substituído. No ano passado, Virgílio fez acordo de que não pleitearia novo mandato como líder.

COMISSÃO de cinco deputados federais embarca hoje para o Haiti. A missão tem como finalidade avaliar as ações de segurança da tropa brasileira naquele país.

CELSO MING

Freio nos bônus indecentes

O ESTADO DE SÃO PAULO - 03/02/10



O Banco Central anunciou que prepara um conjunto de regras para a remuneração dos dirigentes dos bancos brasileiros a entrar em vigor em 2011. Nisso segue recomendação do Grupo dos 20 (G-20, do qual faz parte o Brasil), que sugere a adoção do procedimento em escala global.

Uma avaliação superficial pode dar a entender que o critério de remuneração de um diretor de banco privado é uma questão de âmbito privado, portanto assunto que deve se ater às relações entre dirigentes e acionistas de cada instituição.

No entanto, o que se viu nesta crise foi que as fantásticas comissões pagas por desempenho promovidas pelos grandes bancos em benefício dos seus executivos estão entre as causas da derrubada do sistema inteiro, na medida em que levaram esses dirigentes a assumir riscos desproporcionais à capacidade de alavancagem dos próprios bancos.

Como os bancos operam com cobertura oficial, no redesconto e nos financiamentos de última instância, essa remuneração extra não pode ser desvinculada dos recursos públicos.

Não há dúvida de que é preciso definir limites para essas práticas, que os políticos passaram a chamar de "bônus indecentes", a critério dos legisladores e das instituições encarregadas da supervisão bancária.

Mas não se pode perder de vista que o principal objetivo de todo o corpo de regulação que vem vindo aí é garantir o saudável funcionamento do sistema financeiro para que possa atuar como instrumento do bom andamento do sistema produtivo, e não apenas o de dar o troco nos banqueiros.

Ainda está sem solução o restabelecimento da responsabilidade dos executivos dos bancos nas tremendas falhas nas tomadas de riscos. Não dá para esquecer que foi também uma recomendação do Grupo dos 20 (em novembro de 2008) que bancos grandes demais para falir sejam automaticamente resgatados pelas autoridades.

Se esse princípio for rigidamente aplicado, fica prejudicada a administração de qualquer instituição financeira que tenha alguma capacidade de produzir crise sistêmica - e, para isso, não é preciso que seja nem grande demais nem mesmo apenas grande; basta que tenha muitas conexões.

Se pode sempre contar com o guarda-chuva oficial, por que um diretor de banco haverá de evitar expor-se a riscos excessivos ou, então, haverá de desdobrar-se em combater lambanças que, afinal, lhe proporcionam tanto retorno pessoal?

Em consequência dos graves desastres que, no Brasil, envolveram o patrimônio dos bancos nos anos 80 e 90, as regras brasileiras de funcionamento do sistema bancário são mais conservadoras e mais firmes e a supervisão, bem mais rígida do que as que prevalecem nos Estados Unidos e na Europa.

Hoje, os grandes executivos das instituições financeiras nos Estados Unidos (e também em certos países europeus) são vistos como irresponsáveis e como aqueles que se refestelam no dinheiro público enquanto o resto da economia está mergulhada na recessão, no desemprego e na falta de futuro. Por isso, qualquer decisão que soe como punição a esses profissionais que as pessoas simples veem como gente sem coração e sem escrúpulos é recebida com foguetório político.

E o grande risco é que fique tudo nessa vingança e que a regulação do sistema financeiro global, que é o que realmente importa, fique para quando der.

Confira

Disse o Senhor - O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez ontem uma afirmação carregada de ambiguidade. Avisou que o crescimento econômico está ocorrendo acima da tendência de longo prazo do crédito, da massa salarial e do comércio.

Em seguida, deu a entender, como o Senhor Deus depois da Criação, que isso é bom: "O Brasil sai forte da crise."

A primeira parte da declaração é papo de falcão. Avisa que o ritmo está forte e que conviria dar uma brecada. Mas a segunda sugere que a economia está em condições de seguir nesse trem de corrida

BANDIDOS

MÔNICA BERGAMO

Sempre alerta

Folha de S.Paulo - 03/02/2010


Adriana Birolli, a irmã má de Alinne Moraes em "Viver a Vida", é capa da revista "Criativa" que chega hoje às bancas. Escoteira na infância, ela conta que soube que havia sido aprovada para a oficina de atores da Globo quando participava de um encontro com veteranos do grupo na Inglaterra, há três anos. Hoje, diz que está sempre alerta diante das broncas do público, às quais reage com o humor peculiar da personagem: "Falam: "A Luciana vai te pegar!" Dou risada e respondo brincando: "Não vai, ela não pode correr atrás de mim [porque a personagem é cadeirante]'".

Pressão
A Apetesp (associação dos produtores teatrais de São Paulo) e a APTI (dos produtores independentes) organizam caravana até o Congresso Nacional na segunda quinzena do mês. Irão em busca dos presidentes da Câmara, Michel Temer, e do Senado, José Sarney, e de líderes de partidos para pressionar contra a aprovação da nova Lei Rouanet, assinada pelo presidente Lula na semana passada.

Amigos do Rei
"O novo projeto acaba com a renúncia fiscal de 100% para o teatro e cria mecanismos subjetivos de análise. Vai ser tudo pela cara do freguês. Quem é amigo do rei vai ter 80% de renúncia [o máximo permitido pelo projeto]. Quem não for vai ter 30%", diz o ator Odilon Wagner, presidente da APTI.

Para outra porção da classe artística, a nova lei é mais justa por prever investimento direto em vários casos, sem necessidade de batalhar patrocínio.

Conexão Cabul
O presidente Lula promulgou acordo de cooperação técnica com o Afeganistão, que prevê facilidades (de vistos, impostos, entre outros) no trânsito de cientistas e materiais entre os dois países.

Dilma Garantida
A governadora Yeda Crusius (PSDB-RS) renovou a licença da ministra Dilma Rousseff da Fundação de Economia e Estatística do Estado até 2011. Dilma está afastada do órgão desde que foi para o governo Lula.

Evolução
As escolas de samba de São Paulo reforçam suas orações: começaram a levar para o Anhembi seus carros alegóricos, apesar do temor de que a chuva forte estrague o material, protegido por lonas. "É que algumas montagens são feitas lá no sambódromo. Se correr, o bicho pega, se ficar, o bicho come", diz Paulo Sérgio Ferreira, presidente da Liga SP.

Aparece Aí
E o prefeito Gilberto Kassab tenta convencer prefeitos de cidades-sede da Copa do Mundo no Brasil (Rio de Janeiro, Recife etc.) a deixarem suas cidades no Carnaval e virem ao camarote da prefeitura no Anhembi.

Homenagens
Além de dar a seu pátio o nome do professor Goffredo da Silva Telles Jr., a Faculdade de Direito do Largo São Francisco batizará a passarela que liga o prédio histórico ao edifício anexo com o nome do diretor Antonio Junqueira de Azevedo, que morreu no ano passado.

Beyoncé na Balada
A presença da cantora Beyoncé foi confirmada em festa no Club A, que acontece depois do seu show em SP, no sábado. A balada é promovida pela Nestlé, patrocinadora do show.

Cavalinho na Chuva
A expectativa de que Beyoncé dê uma esticadinha de mais uns dias no Brasil para o Carnaval é grande entre organizadores de festas e camarotes, mas as chances são praticamente nulas: depois do show em Salvador (no dia 12), ela se apresenta em Buenos Aires (no dia 14) e Santiago (no dia 16).

Bolão da Madonna
Jesus Luz vai tocar na sexta-feira de Carnaval na festa "Celebration", com o DJ Bob Sinclar, no Vivo Rio. A noite pode atrair Madonna, que deve estar no Brasil no dia. As chances diminuem caso se confirmem os rumores de que o namoro dos dois chegou ao fim.

Cinturão
O chef Cassio Machado inaugura no sábado mais um bar, o Ringue, inspirado em lutas de boxe, na rua Lisboa (Pinheiros), onde mantinha o restaurante Balneário das Pedras. "O boxe nos revela a capacidade de beijar a lona e recomeçar", diz ele, que passou por problemas de saúde no ano passado.

Indígena
A escritora Ruth Rocha teve seu livro infantil "A Primavera da Lagarta" traduzido para a língua dos índios myky, do Mato Grosso. Na nova versão, a obra se chama "Kiowy Kaataxoky" e foi ilustrada pelas crianças da tribo.

Cabide Acadêmico
O estilista Mário Queiroz é o novo diretor do curso de moda do Istituto Europeo de Design de São Paulo.

Curto-circuito
A BANDA Teenage Lobotomy é a atração da festa Hell on High Heels, hoje, a partir da meia-noite, no clube Hot Hot. 18 anos.

A CANTORA Jesuane Salvador faz show hoje, às 22h, em homenagem a Julie London, no bar All of Jazz. 18 anos.

A MOSTRA "Ocupação Chico Science", que conta a trajetória do músico pernambucano morto em 1997, tem abertura hoje, às 20h, no Itaú Cultural, apenas para convidados.

OS CONVIDADOS do 1º Fórum de Novas Energias, que começa hoje em SP, receberão blocos de notas feitos de papel semente, que pode ser plantado, e canetas biodegradáveis.

SILVIO SALES

Recuperação não impediu resultado negativo

O Estado de S. Paulo - 03/02/2010


O setor industrial chega ao fim de 2009, segundo os indicadores divulgados ontem pelo IBGE, assinalando queda de 7,4% ante 2008, a mais expressiva desde os 8,9% de 1990. Esse desempenho reflete os efeitos da crise mundial desencadeada a partir de setembro de 2008 que, no caso da economia brasileira, afetou particularmente a atividade industrial. Os impactos derivados da abrupta escassez de crédito e da imediata retração no comércio internacional se traduziram num inédito e intenso movimento de retração da atividade fabril: em apenas três meses, entre dezembro e setembro de 2008, o setor encolheu 20% e iniciou o ano de 2009 com elevados níveis de estoque, num ambiente marcado pela incerteza quanto à extensão desse processo de queda.

Ao longo de 2009, observou-se uma gradual e contínua recuperação do ritmo de produção fabril que, no entanto, não impediu um resultado muito negativo no índice global da indústria, tendo como setores mais atingidos o de bens de capital (produção de máquinas e equipamentos), cuja redução chegou aos 17,4%, e o de bens intermediários (-8,8%), não por acaso o de maior articulação com o mercado externo.

Por outro lado, setores industriais relativamente mais voltados para o atendimento da demanda interna de consumo, mesmo num quadro de queda, apresentaram resultados menos desfavoráveis: a produção de bens de consumo duráveis (automóveis, eletroeletrônicos, celulares, etc.) fechou o ano com redução de 6,4%, e a de bens de consumo semi e não duráveis (alimentos, bebidas, medicamentos e vestuário) ficou 1,6% abaixo da de 2008.

Na base do desempenho do segmento de bens de consumo estão fatores como a manutenção da massa salarial, a sustentação das boas condições de crédito e as medidas setoriais de estimulo a segmentos de bens duráveis por meio de redução de IPI (veículos, eletrodomésticos da linha branca e materiais de construção). Segundo a pesquisa mensal do comércio do IBGE, o varejo alcançou crescimento de 5,5% no acumulado de janeiro a novembro de 2009, tendo como destaques os segmentos de hiper e supermercados (8,2%) e o de veículos (9,6%). Pelo lado do comércio internacional, as exportações registram queda de 25% e as importações, de 29%.

Os índices para os meses do fim de 2009 apresentam a seguinte característica: uma ligeira desaceleração no desempenho de bens de consumo duráveis, provavelmente refletindo uma certa acomodação da demanda em razão da expectativa pelo fim das medidas de redução de impostos neste setor, que deve ter levado a uma antecipação no consumo desses bens; e um avanço mais rápido de setores ligados aos investimentos (produção de máquinas e equipamentos), movimento que traduz o aumento da confiança das empresas, que, assim, voltam à aquisição de bens para ampliar sua capacidade produtiva.

Entre agosto e dezembro passados, o setor de bens de capital experimentou crescimento de 17,4%, enquanto o segmento de bens de consumo duráveis, o de maior expansão até o início do segundo semestre de 2009, mostra redução de 3,8%. As reduções observadas no total da produção industrial em novembro (0,8%) e dezembro (0,3%) sugerem um momento de acomodação no ritmo industrial e não uma inflexão na trajetória de crescimento.

Isso porque há um conjunto de indicadores que configuram a manutenção de uma trajetória positiva da atividade econômica em 2010: mercado de trabalho, retomada de investimentos, inflação dentro da meta e percepção de empresas e consumidores sobre o cenário econômico no curto prazo. Mantido o nível de produção de dezembro, ou seja, supondo crescimento zero na margem, a indústria chegaria aos 5,5% de expansão em 2010. Na hipótese, factível, de expansão média mensal de 0,5% ao longo deste ano, a taxa final alcançaria os 9%.

*Silvio Sales é economista da FGV e ex-coordenador de indústria do IBGE

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

Bienal sem vermelho

O ESTADO DE SÃO PAULO - 03/02/10


Na linha "isto é inacreditável", Heitor Martins conseguiu captar R$ 20 milhões e pagar todas as dívidas pendentes da Bienal. Bancos, antecipação de duplicatas e fornecedores de bienais anteriores. Tudo. E mais. Escolheu o experiente Emilio Kalil como responsável pela produção do evento.
Na sexta, Martins pretende divulgar a primeira lista oficial dos artistas que participarão da mostra, que abre dia 21 de setembro.
Obras no prédio? "Estamos dependendo de aprovações da Prefeitura, mas vamos fazer alguma coisa até setembro. Reforma total só para a comemoração dos 60 anos da Bienal, em 2012."

Dívida vira mata?

O Brasil está a um milímetro de fechar renegociação sui generis. "Vamos converter US$ 25 milhões da dívida externa do Brasil com os EUA em contribuição para um novo fundo, o da Mata Atlântica", informou ontem Carlos Minc.
A novidade será gerida nos mesmos moldes do programa federal Arpa - Áreas Protegidas da Amazônia.

Unanimidade

Aloizio Mercadante, palestrante ontem de seminário Lide, de João Doria, juntamente com Henrique Meirelles e Guido Mantega, fez elogios rasgados ao presidente do BC. Todos aplaudiram, inclusive Mantega.
Deve ter sido por isso que, de manhã, fez até sol na cidade de São Paulo.

Pronto-socorro

Depois de ver sua tentativa fracassada em janeiro, cooperados da Unimed Paulistana tentam nova assembleia extraordinária dia 6.
Querem o afastamento total da diretoria que assumiu interinamente, sem eleição.

Quem és tu

A pesquisa Sensus deu gás para Lula pressionar ainda mais Ciro Gomes a disputar o governo de São Paulo - coisa que o deputado não quer de jeito nenhum.
A leitura, no Planalto, é que o presidente é capaz, sim, de transferir votos. E ele quer ligar Ciro e Dilma já.

Meia volta, volver?

Além das enchentes, do aumento dos ônibus, do recorde de roubos e da pesquisa Sensus, a economia indica que "nunca antes, na história", se criaram tantos empregos quanto os que aparecerão em 2010.
Serra tem consciência disto.

O dia do troco

Vai ser quase um "replay" da ditadura militar. A sequestrada Lilian Celiberti, 32 anos depois, frente a frente com João Augusto Rosa, o policial que ajudou a sequestrá-la.
Lilian será testemunha de defesa de Luiz Cláudio Cunha amanhã, no Fórum Central de Porto Alegre. O jornalista está sendo processado pelo policial, denunciado por ele em 1978 e depois no livro Operação Condor, O Sequestro dos Uruguaios.

Briga de foice

Carmelo Furci, ex-Telecom Italia da America Latina, assume cargo na Ongoing - ainda sem sede no Brasil. Isto sinaliza que a empresa de telefonia portuguesa deve entrar no País para disputar a Banda H.
A novíssima geração na linha da tecnologia 3G.

Olelê, olalá

Confirmados foliões pela Vai-Vai: Denílson, Vampeta e Cafu, no carro em ode ao futebol brasileiro.
E, na ala que homenageará a África, entram Milton Gonçalves e Neuza Borges.

Quem vem

Lee Breuer, diretor e fundador do grupo teatral Mabou Mines, de Nova York, chega hoje a São Paulo.
Aceitou o desafio de dirigir, ao lado de Denise Milan, a Ópera das Pedras - O Espetáculo da Terra. Com estreia marcada para dia 22 de abril, no Sesc Ipiranga.

O sem férias

Não foi por acaso que Lula acabou com pressão alta. Em sete anos de Presidência, tirou só 37 dias de férias.
A pedido da coluna, o Planalto fez o mapa das folgas presidenciais desde sua posse. Em 2003 e em 2005, ano do mensalão, não tirou nem um dia. O recorde foi batido em 2010, quando ele parou dez dias úteis inteiros.

NA FRENTE

Conhecido esportista paulista decidiu alugar uma embarcação para 100 convidados. Tudo para comemorar seus 40 anos em março.

Por onde anda Milton Nascimento? Incomunicável, de férias em Búzios há pelo menos duas semanas.

Viko Tangoda, banqueteiro paulista, leva delícias e técnicas da cozinha para o Camarote da Brahma no Rio.

O documentário Áurea, de Zeca Ferreira, será exibido simultaneamente em 20 cidades brasileiras, dentro do Festival do Júri Popular.

O Masp atingiu em 2009 sua segunda maior visitação da história: 679 mil pessoas.

Mauricio de Sousa fechou contrato com a Fundação Osesp. A Turma da Mônica vai ilustrar o material dirigido a 75 mil alunos e professores ligados a projetos da fundação.

Paraíso de Hades, romance de Fábio Porchat, vai para a telona. Com roteiro finalizado e direção de Tizuka Yamasaki.

Ginecologistas da França vão à guerra pelo ponto G. Organizaram uma conferência para rebater os ingleses e dizer que... sim, ele existe.

TODA MÍDIA - NELSON DE SÁ

A favorita?

FOLHA DE SÃO PAULO - 03/02/10


Em destaque nas buscas de Brasil por Yahoo News, a Bloomberg deu que o "Eurasia Group vê Rousseff como favorita à eleição".
A "empresa de pesquisa de risco político de Washington", em relatório ontem, afirma que "a eleição certamente promete ser muito competitiva" e Dilma "não é carismática" como Lula. Mas é "a candidata do presidente" e a vitória será de "quem convencer os eleitores que os benefícios dos últimos poucos anos serão mantidos". Em destaque no iG, "uma mosquinha tucana que aparecesse no encontro de empresários do Lide" com Guido Mantega e Henrique Meirelles, ontem, "ficaria preocupada. A fala dos empresários que disputaram o microfone foi marcada pelo ufanismo".

No Terra, Antonio Lavareda, "estrategista de FHC", avaliou a pesquisa Sensus: "O que houve efetivamente foi uma transferência de votos de Ciro Gomes para Dilma", pois "as pessoas tomaram conhecimento de que é a candidata do presidente Lula".

POR NEGAÇÃO
Na manchete do G1, à tarde, "Ciro insiste na candidatura", pois "valoriza o eleitor dando-lhe mais uma alternativa e não aquele voto por negação". E mais, "discordo da avaliação [de Lula e] o trato como líder político e não como mito, santo, inquestionável".

PLEBISCITO
Na submanchete da Folha Online, "Aécio critica plano de fazer eleição plebiscitária". Diz que a campanha não pode se limitar a comparar Lula e FHC. "O momento é outro. Os desafios são outros", avalia. "Acho perigosa essa eleição plebiscitária que querem."

SHELL E O LOBBY
Os ingleses "Telegraph" e "Guardian", observando que a Shell perdeu há dias o posto de maior empresa europeia de petróleo para a BP, apontam a "esperança de promover o etanol nos EUA e na Europa", com a operação no Brasil.
"A Shell agora vai fazer lobby junto ao governo dos EUA para reduzir a tarifa sobre a importação". No "Financial Times", a coluna Lex elogiou o "controle conjunto" sobre "o maior produtor de etanol do Brasil".
Já o "Times" inglês criticou a associação com empresa acusada de trabalho análogo à escravidão.

CORRIDA
A Bloomberg noticia que as operações do "bilionário George Soros" no Brasil em "energia renovável", já com duas usinas, preparam um lançamento de ações, IPO, para financiar uma terceira, de US$ 700 mil, entre outros projetos. E que gigantes como a Bunge "também estão se expandindo em etanol".

ATÉ O IRÃ
Um jornal financeiro do Qatar, "Zawaya", citando a agência Fars, noticiou que "o Irã e o Brasil concordaram em produzir biocombustível conjuntamente". A "joint venture" proposta abrangeria troca de experiências. Nas conversas, outras áreas de cooperação seriam energia e biotecnologia.

UM TESTE PARA O PODER
Com a manchete "Uma década no vermelho" e a submanchete "Orçamento de Obama vê anos de déficits, um teste para o poder dos EUA", além do título interno "Grandes déficits podem mudar poder global", o "New York Times" avisou que "os EUA podem começar a sofrer da doença que afetou o Japão na última década", quando "a influência do país no mundo se corroeu". Exemplifica com uma pergunta do assessor econômico Lawrence Summers: "Por quanto tempo o maior devedor do mundo pode ser a maior potência?".

OBAMA E A BOMBA
Na manchete do Drudge Report, com foto de Obama, "Como ele aprendeu a amar a bomba", trocadilho com o título de "Dr. Strangelove". Linka longa reportagem da AP sobre o orçamento dos EUA, "Obama busca dinheiro para desenvolvimento de armas nucleares".

E OS ASSASSINATOS

Roger Cohen, colunista do "NYT", escreveu ontem que "estamos testemunhando o declínio do Ocidente". E lamentou que, no "estado da nação", Obama só tenha sido mais eloquente nas ações do que nas palavras ao anunciar "muito mais assassinatos" de membros da Al Qaeda.

QUE CRISE?
O site da "Economist" analisou os "tapas" trocados por EUA e China e concluiu que "existe menos 'crise' do que parece". Mas acrescentou: "Provavelmente". Por outro lado, a agência Xinhua noticiou ontem que o "Brasil planeja elevar relações comerciais com a China", no segundo encontro da Comissão de Cooperação de Alto Nível, em março. E o "Wall Street Journal" cobria ontem a visita a Pequim do ministro da energia da Venezuela, para "negociações sobre petróleo".

VINICIUS TORRES FREIRE

Estrangeiros pé de cana

FOLHA DE SÃO PAULO - 03/02/2010


Há um temor já velho de quase um século de que o Brasil se transforme em nada mais que um exportador de produtos ditos primários, na melhor das hipóteses uma Austrália gigante (se fosse possível, aliás, uma Austrália gigante seria uma boa pedida). Do outro lado do balcão mundial, a percepção é outra. As transações dos últimos dias e anúncios de aquisições e projetos dão conta de que os estrangeiros temem perder os melhores bocados do negócio brasileiro de recursos naturais. E que pretendem levar o agronegócio a outro nível.
China, Japão e Coreia do Sul, grandes importadores de minérios e/ou comida, anunciam desde o final do ano passado que vão passar a investir mais na América Latina. Vão usar fundos estatais para fazer parcerias com empresas privadas ou dar garantias a investidores nacionais (deles) que queiram apostar no coração das trevas dos mercados emergentes de mineiros e comida.
Grandes fundos privados ou de "private equity" começam a comer com dentadas pelas bordas o negócio de energia elétrica, cana e bioenergia. Ontem, a Adecoagro anunciou que pode vender ações a fim de levantar dinheiro para investimentos na agroindústria latino-americana, em especial no Brasil. Um dos maiores acionistas da Adecoagro é George Soros. A empresa começou em 2002 comprando muita terra na Argentina devastada pela crise.
No Brasil, tem uma usina sucroalcooleira em Mato Grosso do Sul, a Angelica, em 30% financiada pelo BNDES, e a Monte Alegre, em Minas Gerais, onde tem também a Alfenas Café. As duas usinas produzem energia elétrica e podem moer uns 5 milhões de toneladas. É menos de um décimo da Cosan-Shell, a líder do país, mas vão crescer. A Adecoagro ainda planta soja, algodão e café na divisa entre Tocantins e Bahia.
O fundo soberano Chinês, a China Investment Corporation (CIC), avisa que está negociando ou prospectando negócios na área de prata no México e de minérios em geral no Brasil -negócios para serem fechados este ano. O Japão tem uma agência estatal para fomentar a exploração de petróleo e minérios no exterior. Na verdade, a Jogmec é uma corporação de estratégia e finanças que tem como objetivo garantir o suprimento constante e a bom preço de petróleo e minérios.
Estão promovendo mudanças na lei a fim de permitir que a Jogmec se una a empresas na compra de negócios de recursos naturais. Um dos objetivos da mudança é ampliar a atuação dos japoneses no Brasil.
Parte importante do lucro da agricultura brasileira fica com as grandes "tradings", múltis como Cargill ou Louis Dreyfuss (não há empresas brasileiras com capacidade financeira e redes mundiais fortes o bastante para tocar o comércio). O negócio tão brasileirinho do álcool terá o mesmo destino? Uma empresa como a Shell tem tamanho, capacidade técnica e contatos bastantes para desenvolver novas tecnologias do álcool (como a pesquisa do álcool de celulose rentável, que já desenvolve em parcerias). Ou para fazer lobbies para abrir mercados para a produção nacional.
A British Petroleum também já chegou ao álcool. Dentre os atuais "players" do mercado, apenas a Petrobras teria tamanho e recursos para fazer coisa semelhante.

GOSTOSA

REGINA ALVAREZ

Duas visões

O GLOBO - 03/02/10


Qual a contribuição que o resultado da produção industrial de 2009 pode trazer na avaliação da conjuntura econômica em 2010? O comportamento do setor é crucial para medir o ritmo de recuperação e identificar gargalos que podem reforçar a disposição do Banco Central de elevar os juros no curto prazo. Mas não há conclusões prontas e acabadas a respeito dos números divulgados ontem.

O recuo na produção industrial de 7,4% em 2009 e a queda de 0,3% em dezembro, na comparação com o mês anterior, são os dados que, destrinchados, permitiram aos analistas fazer leituras distintas sobre a trajetória futura da indústria.

Debruçados sobre os mesmos números, especialistas do mercado e do setor produtivo enxergam o futuro de forma diferente.

Para o economista Sérgio Valle, da MB Associados, o resultado de 2009 reforça a percepção de que a indústria caminha em ritmo acelerado. Ele não considera que o resultado de dezembro é indicativo de desaceleração.

Prefere a comparação de dezembro contra dezembro, que registrou alta de 18,9%.

— Não dá para olhar os dados na margem e dizer que indústria foi decepção.

Este é um indicador pontual, que não indica tendência — afirma.

Leandro Padulla, da MCM Consultores, diz que o desempenho da indústria em dezembro foi melhor do que as expectativas da consultoria. Para ele, há sinais fortes de recuperação.

A queda estaria concentrada em alguns setores. E o uso da capacidade instalada, acima dos níveis históricos, seria uma sinal de alerta para os riscos de pressão inflacionária futura.

— A atividade continua forte no começo do ano. A aposta é no aumento dos juros já em abril — afirma.

Já o economista Júlio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda — que mantém fortes laços com o setor industrial — acha que o resultado de dezembro só confirma a avaliação de que não há superaquecimento na indústria, mas o que chama de “overdose de antecipação de consumo”, resultado das políticas de incentivo do governo.

Na visão de Luciana de Sá, diretora de Desenvolvimento Econômico da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), os dados de dezembro mostram uma acomodação no setor industrial. O ano de 2010 será bom, mas não há risco de superaquecimento, prevê.

— O aumento dos juros é altamente negativo e desestimulante para quem quer investir.

Será um balde de água fria sobre o otimismo do empresariado — conclui.

Estímulo externo

Enquanto o volume total de Investimento Estrangeiro Direto (IED) teve queda de 29% em 2009, o setor de infraestrutura registrou alta de 18% nesses investimentos, que pularam de US$ 4,4 bilhões, em 2008, para US$ 5,2 bilhões.

O resultado foi puxado principalmente pelos gastos dos estrangeiros no setor de petróleo, que cresceram 100%, saindo de US$ 1,3 bilhão, em 2008, para US$ 2,6 bilhões, em 2009. Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), também está otimista em relação ao futuro.

— Há bons projetos, uma necessidade gigantesca de expansão da infraestrutura e temos ainda as reservas do pré-sal para exploração.

A necessidade de financiamento, interno e externo, será grande — destaca.

Estímulo interno

O setor de infraestrutura também foi beneficiado pelo aumento dos desembolsos do BNDES, que cresceram 79%, segundo a Abdib, saltando de R$ 37,9 bilhões, em 2008, para R$ 68,1 bilhões no ano passado. Também neste caso os recursos foram para a área de petróleo. Os mercados de infraestrutura foram destino de 50% — ou R$ 68,1 bilhões — dos R$ 136,4 bilhões desembolsados pelo bancão de fomento em 2009. Esse resultado considera o aporte que o BNDES fez à Petrobras, que a Abdib computa como investimento em infraestrutura.

Boi pirata

Foi baixa a adesão de fazendas do Pará ao Cadastro Ambiental Rural, iniciativa conjunta do Ministério Público, governo e empresas da região para combater o desmatamento promovido pelos bovinos.

Apenas 5% das 110 mil fazendas do estado foram cadastradas.

O prazo expirou na segunda-feira.

O cadastro é o primeiro passo para regularizar a propriedade pelo aspecto ambiental.

Na visão do Greenpeace, a baixa adesão é sinal do descaso com que uma parte do setor trata o problema do desmatamento.

“Os proprietários continuam relutantes em fazer o cadastro, pois sabem que o mapeamento das fazendas facilita o monitoramento de novos desmatamentos pela análise de imagens de satélite”, diz a entidade.

Cabe agora ao MP fiscalizar as empresas que assinaram o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e punir aquelas que comprarem gado dessas fazendas irregulares. Segundo o Greenpeace, cerca de 80% da área desmatada da Amazônia está sendo usada para a criação de gado.

BALANÇO DA CRISE: A indústria têxtil fechou 2009 com queda de 6,38%. Para 2010, a expectativa é de crescimento de 4%, com alta de 6% no consumo interno.

COM ALVARO GRIBEL

CLAUDIO WEBER ABRAMO

Justiça gramatical

O ESTADO DE SÃO PAULO - 03/02/10


Imagine o eventual leitor que um agente da Polícia Federal de plantão em algum aeroporto brasileiro, num certo dia, receba um telefonema durante o qual alguém informe sobre a presença de um bombardeador suicida num avião que esteja prestes a decolar. Imagine ainda que, ao ser indagado sobre sua identidade, o denunciante decline de fornecê-la. Imagine também que, com base na informação recebida, o agente decida sustar a decolagem para averiguar a questão. Suponha, por fim, que a diligência resulte na confirmação da informação: o passageiro denunciado efetivamente veste um colete recheado com bananas de dinamite.

Pergunta-se: qual pode ser a consequência legal para o terrorista?

Resposta: nenhuma, ao menos segundo o entendimento do sr. Cesar Asfor Rocha, presidente doSuperior Tribunal de Justiça (STJ).

Conforme o ministro, denúncias anônimas não podem motivar iniciativas de agentes públicos. O certo seria o policial nada fazer a respeito. Pior, uma vez que teria cometido um ato ilegal, o agente poderia sofrer punição administrativa e mesmo ser processado. Quanto ao terrorista, seria libertado com desculpas. Poderia ainda processar o policial federal por danos morais.

Essa, sem tirar nem pôr, foi a decisão de Asfor Rocha ao conceder liminar a mandado de segurança impetrado por investigados na Operação Castelo de Areia contra a própria existência da ação penal contra eles. Para o ministro, parte dos indícios de práticas de corrupção de que são acusados executivos da empresa Camargo Corrêa e que informam o processo decorrente da Castelo de Areia seria inválida, porque a denúncia original foi anônima.

É claro que a responsabilidade dos executivos em questão teria de ser confirmada judicialmente antes de se poder afirmar que eles, de fato, cometeram crimes de corrupção.

No entanto, caso a liminar concedida por Asfor Rocha não seja derrubada no STJ e se recursos posteriormente apresentados ao Supremo Tribunal Federal forem rejeitados, não haverá decisão judicial alguma, porque não haverá processo.

O caso do ministro-presidente do STJ é exemplar de um particular tipo de disfuncionalidades da Justiça brasileira - a tendência manifestada por muitos magistrados de considerarem que a Justiça não passa de um jogo de formalidades sem relação com a vida. Para eles, a literalidade dos textos legais é muito mais importante do que a administração de justiça. Não atentam para o fato de que, se as situações concretas levadas aos tribunais devessem sempre ser decididas por aplicação mecânica de dispositivos legais, então, não existiria justificativa para a existência de juízes. Máquinas poderiam cumprir a tarefa, o que, aliás, fariam melhor do que seres humanos, pois a vantagem das máquinas é fazerem sempre tudo do mesmo jeito.

Justiça é outra coisa. As leis não são formuladas como exercícios sintáticos destinados a tertúlias entre operadores do Direito, mas para enfrentar situações concretas. Os códigos legais refletem, no limite, as expectativas de justiça emanadas da sociedade.

É claro que as leis mudam muito mais devagar do que as aspirações sociais. Isso não é mau, pois é necessário proteger o arcabouço jurídico de mudanças intempestivas, que no longo prazo se podem revelar contraproducentes. De toda maneira, um dos motivos pelos quais juízes existem é abreviar a distância entre as leis e as expectativas da sociedade.

É claríssimo que a formulação constitucional que proíbe a denunciação anônima (e, por consequência, também proíbe ao Estado ocultar a identidade de denunciantes) é demasiado abrangente e anacrônica. A base desse preceito são relações privadas: uma pessoa física não pode sofrer processo (por exemplo, por danos materiais) movido por alguém que permaneça não identificado.

Não é de modo algum o caso de processos movidos por agentes do Estado, como são os promotores públicos. Estes não agem anonimamente.

Observe-se que as convenções internacionais de combate à corrupção de que o Brasil é signatário explicitam a necessidade de se montarem mecanismos de recepção de denúncias sem exigência de identificação do denunciante. Isso é muito importante para se obterem informações, principalmente, de agentes do Estado e de funcionários de empresas envolvidas em corrupção (ou de seus concorrentes, claro), os quais de outra forma se sentiriam justificadamente vulneráveis. Sem esse tipo de proteção a investigação de possíveis atos de corrupção de alto coturno se torna quase impossível.

Vários órgãos brasileiros aceitam denúncias anônimas, como, por exemplo, a Controladoria-Geral da União (CGU). No sítio da CGU na internet podem-se denunciar suspeitas de corrupção sem necessidade de identificação. A CGU processa internamente essas denúncias e quando considera serem, em tese, plausíveis abre processos de investigação. Faz isso de ofício, quer dizer, o procedimento é desencadeado pelos agentes do próprio órgão.

O mesmo acontece com os serviços de Disque-Denúncia, que se espalham com grande sucesso por vários Estados do País e têm sido responsáveis pela redução de certos tipos de crimes, como sequestros.

Se dependesse de Asfor Rocha, tudo isso seria considerado ilegal.

No caso em questão, é evidente que o ministro poderia ter ponderado que tanto a Polícia Federalquanto o Ministério Público agem de ofício, e que, portanto, a denúncia contra os réus da Camargo Corrêa não foi anônima.

Ao não reconhecê-lo, o ministro-presidente do STJ emite o sinal claríssimo de que, se depender dele e daqueles que pensam como ele, no Brasil a investigação de corrupção deve ficar restrita a casos triviais.

Claudio Weber Abramo, bacharel em Matemática e mestre em Lógica e Filosofia da Ciência, é diretor executivo da Transparência Brasil, organização não-governamental dedicada ao combate à corrupção no País

GOSTOSA

FERNANDO RODRIGUES

No PT, nada ao vosso reino


Folha de S. Paulo - 03/02/2010

BRASÍLIA - Ciro Gomes reapareceu ontem em Brasília. Reafirmou sua decisão de ser candidato a presidente. Lembrou a todos ter acertado com Lula uma avaliação do quadro no final de março.


O PSB, partido de Ciro, só tem a ganhar com a manutenção da candidatura própria a presidente. Terá mais chance de eleger governadores, senadores e deputados. Pode sair maior das urnas.


Os socialistas herdeiros de Miguel Arraes até poderiam abrir mão desse projeto. O enrosco é a falta de contrapartida. Na oração do PT, só há espaço para o "venha a nós", e nada para o "vosso reino". Tal como está formatada, a coalizão petista é um ativo tóxico para o PSB. Eis os detalhes da proposta lulista:
1) Sacrifício: Ciro Gomes desiste de disputar o Planalto. Apoia Dilma Rousseff. De quebra, o PSB aceita enfrentar calado a oposição do PT em alguns Estados;


2) Missão: o PSB despacha Ciro para São Paulo para perder a eleição para o Palácio dos Bandeirantes. Ex-candidato a presidente duas vezes, dono de mais de 10% nas pesquisas nacionais e o primeiro a aderir incondicionalmente a Lula no segundo turno de 2002, Ciro também teria de servir de boca de aluguel do PT: passaria a campanha vituperando contra o PSDB em solo paulista, pois os petistas de modos atucanados como Aloizio Mercadante, Marta Suplicy e Antonio Palocci fazem de tudo, menos se indispor com José Serra;


3) Prêmio: nenhum. O PSB fica de mãos abanando e se dando por feliz com ministérios de segunda classe e sem expressão política. Assim é o tipo de aliança oferecida pelo PT. É também um prenúncio da voracidade e da hegemonia petista a partir de 2011 se o grupo de Lula vencer a disputa em outubro.


Antonio Palocci não desistiu de ser candidato ao governo de São Paulo. Foi "desistido" por Lula.

FERNANDO DE BARROS E SILVA


"Big Brother" eleitoral

FOLHA DE SÃO PAULO - 03/02/10



SÃO PAULO - É preciso confessar logo de início: este colunista nunca acompanhou o "Big Brother Brasil". Não seria capaz de citar o nome ou identificar um único integrante do parque de diversões orwelliano da Rede Globo, atualmente em sua 10ª edição. Ok, "cada um na sua", mas ainda dispomos de maneiras menos ofensivas (e inofensivas) de perder tempo e embromar a vida.
Num país de pouca escola, o "BBB" atua no imaginário popular como veículo de ascensão social e fama instantâneas. Tornou-se uma usina de reciclagem de celebridades para o submundo do showbizz.
À distância, o "BBB" parece um circo behaviorista. Nele, Pedro Bial vai se superando como animador. É uma espécie de tiozinho juvenil, de Orlando Orfei em versão pop. Cada piada infame que sai da sua boca é uma chicotada a estalar na tela.
Mas por que o "BBB" agora? Voltou a circular pela internet uma sugestão atribuída a Rita Lee. Diante da reconhecida inutilidade do programa, a cantora defende que, no lugar dos anônimos, os candidatos à Presidência sejam trancados numa casa para debater seus respectivos programas e ideias para o país.
Segundo a cantora, não seriam permitidos marqueteiros, assessores ou discursos ensaiados. Nus na "Casa dos Políticos", os presidenciáveis acabariam revelando o seu verdadeiro caráter. O público votaria a cada semana, eliminando um deles. No final, o sobrevivente seria nomeado presidente da República.
Trata-se, é óbvio, de um deboche. Bom demais para ser viável. A sugestão, aliás, parece nascer mais da insatisfação com o artificialismo das campanhas do que como simples reação à estupidez do "BBB".
Além de ir contra o jogo de cena da política, o engessamento dos debates, a ditadura das pesquisas e as manobras do marketing, o devaneio de Rita Lee toca ainda em outro ponto. Ele exprime o desejo de submeter os candidatos a situações de desconforto, até o limite da tortura física e/ou psicológica, como se o eleitor devesse extrair a fórceps algo neles oculto ou dissimulado. Não é má metáfora para a democracia.

O ABILOLADO E A MENTIROSA

PAINEL DA FOLHA

Terceiro tempo

Renata Lo Prete


Folha de S.Paulo - 03/02/2010


Dois dias depois da canetada de Lula para liberar quatro obras da Petrobras que, segundo o Tribunal de Contas da União, apresentam "irregularidades graves", a consultoria de Orçamento da Câmara produziu parecer contestando os argumentos do Planalto, que estariam baseados em "raciocínio simplista".

Os técnicos afirmam que a decisão do presidente pode gerar "danos irreversíveis" aos cofres públicos e sugerem que o Congresso tente revertê-la por meio de um decreto legislativo. Integram a lista de obras as refinarias Abreu e Lima (PE) e Presidente Getúlio Vargas (PR), o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro e o terminal de Barra do Riacho (ES).

Continuidade
Dilma Rousseff chegou ao Congresso ontem para a cerimônia de abertura do ano legislativo quando a execução do Hino Nacional já estava em curso. A oposição não perdeu a piada: "A ministra está fazendo mesmo de tudo para ficar igual ao Lula", notório atrasador.

Alma do negócio
As quase 400 páginas da mensagem presidencial ao Congresso trazem diversas menções à meta de erguer um milhão de moradias, até o final do ano, no programa Minha Casa, Minha Vida. Hoje há cerca de 300 mil unidades contratadas. Estados como Bahia e Mato Grosso já atingiram o teto de operações possíveis.

Ondas
A mensagem ao Legislativo inclui levantamento da EBC (Empresa Brasileira de Comunicação) segundo o qual o programa semanal "Café com o Presidente" é reproduzido por 1.200 rádios.

Me aguarde
Para minimizar a importância de sua desidratação nas pesquisas, Ciro Gomes disse que, a esta altura, os percentuais refletem o volume de exposição na mídia. "A minha safra volta agora." Em 18 de fevereiro, irá ao ar o programa do PSB.

Quem sabe?
Em conversas reservadas, Aloizio Mercadante já não exibe mais a mesma resistência peremptória diante da possibilidade de abdicar da reeleição ao Senado e se tornar, como quatro anos atrás, o candidato do PT ao governo de São Paulo.

Grid
Pesquisa do instituto GPP encomendada no final do ano passado pelo senador Wellington Salgado (PMDB) para testar cenários ao Senado em Minas Gerais aponta o governador Aécio Neves (PSDB, 52,8%) em primeiro lugar na disputa, seguido do vice-presidente José Alencar (PRB, 36,6%) e do ex-presidente e ex-governador Itamar Franco (PPS, 32,3%).

Em campo
Dilma visita na sexta o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça (PMDB), que enfrentará o PT na disputa pelo governo gaúcho. A pauta oficial é a Copa de 2014.

Racha
Capitaneada por Renan Calheiros (AL), uma ala do Senado tenta desbancar Romero Jucá (RR) da corrida pela vaga de vice-presidente do PMDB. O grupo tenta emplacar Valdir Raupp (RO). Argumentam que Jucá anda alinhado demais com a turma da Câmara. A eleição é sábado.

Muralha
Advogados frequentadores do TSE protestam contra uma porta de vidro instalada para reduzir o acesso aos gabinetes de ministros no ano eleitoral. O assunto foi tema de uma reunião ontem com o presidente tribunal, ministro Carlos Ayres Britto, que anunciou já ter mandado removê-la.

Distância
Enquanto o governo tentará derrubar a partir de hoje a chamada emenda Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que altera as regras da partilha dos royalties do pré-sal, o deputado embarcará com uma comitiva para o Haiti.

Nunca antes
O brasileiro Artur Avila Cordeiro de Melo, 30, está no páreo para receber a Fields Medal, espécie de Nobel da matemática.

Tiroteio
A comissão da verdade que o governo quer instituir é a maior mentira política que este país já conheceu.

Contraponto

Outras palavras
Na cerimônia de abertura do ano legislativo, José Alencar contou que, ao assumir a vice-presidência da República, no início do governo Lula, enviou à secretaria-geral do Senado carta na qual "abdicava" de sua cadeira na Casa.

-Eu tenho problemas com a palavra "renúncia"- explicou o mineiro, acrescentando que o documento não foi aceito pelo Senado por causa do termo utilizado.

Mas ele não se deu por vencido.

-No dia seguinte, mandei a carta novamente, com teor idêntico, mas grampeei nela uma página do dicionário "Aurélio" com o verbo "abdicar". E aceitaram!

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Cresce deficit comercial de máquinas pesadas

FOLHA DE SÃO PAULO - 03/02/10


O setor de bens de capital sob encomenda fechou 2009 no vermelho. A tendência de saldo negativo na balança comercial de máquinas pesadas produzidas sob encomenda, chamadas de não seriadas, começou a aparecer em 2008, com os primeiros sintomas da crise.
O deficit registrado ficou em US$ 1,5 bilhão no ano passado, de acordo com a Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base). Em 2008, o saldo negativo havia sido de US$ 11,4 milhões.
Em 2009, tanto importações quanto exportações apresentaram queda, mas as vendas ao exterior registraram recuo mais expressivo.
As importações somaram US$ 4,37 bilhões em 2009, montante 14% inferior ao número registrado em 2008. As exportações, por sua vez, fecharam em US$ 2,85 bilhões, o que representa queda de 44% em relação ao volume exportado no ano anterior.
Além da crise, que esfriou a demanda externa, o Brasil acumula expressiva perda de competitividade em relação aos fabricantes chineses, segundo Paulo Godoy, presidente da Abdib. Em 2009, o setor insistiu com o governo por medidas de desoneração tributária.
Para melhorar a competitividade das companhias brasileiras, seria necessário ter redução de tributos e de custos de logística, assim como incentivos em inovação, diz Godoy.
"Além da questão cambial e da retração do mercado internacional, temos a competição da China. O país precisa investir em logística, além de reduzir custos tributários e trabalhistas", afirma ele.

Empreendedor brasileiro retoma otimismo, diz pesquisa
Os pequenos e médios empresários dos mercados emergentes estão otimistas para o primeiro semestre de 2010. Pela primeira vez após o início da crise, muitos começaram a sinalizar intenção de aumentar investimentos e recrutamento, segundo estudo do HSBC, divulgado hoje.
O Brasil registrou um dos maiores índices de confiança entre os emergentes. O país aparece como o segundo mais confiante da América Latina, atrás do Panamá.
No cenário global, a Índia ficou em primeiro lugar, seguida de Oriente Médio, China e América Latina. O cenário indica que os mercados com maior foco na economia interna apresentam nível maior de confiança nos negócios, enquanto os mercados abertos, mais dependentes de exportação, são menos otimistas, de acordo com análise feita pelo banco.
"O estudo mostra um viés positivo no Brasil. A parcela que espera uma redução do PIB é pequena", afirma Daniel Zabloski, diretor de pequenas e médias empresas do HSBC no Brasil.
"Também há muita expectativa de alta no investimento e em expansão e consequentemente na contratação."

COPA 2014
A ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e os ministros Orlando Silva Jr. (Esporte) e Luiz Barretto (Turismo) estarão presentes na semana que vem na Assembleia Legislativa de São Paulo para participarem do evento "Seminário Internacional de Futebol: Copa do Mundo de 2014 no Brasil e em São Paulo". O seminário irá acontecer nos dias 9, 10 e 11. A ministra Dilma irá falar sobre os "Desafios e Soluções do Governo Federal na Copa 2014" na quarta-feira, dia 10.

ÁGUA
A construção da hidrelétrica de Estreito, entre Maranhão e Tocantins, inicia neste mês a terceira etapa da obra. Começa a ser erguida a barragem, que ligará duas estruturas já prontas: a casa de força, em que ficarão as turbinas, e o vertedouro, por onde será escoado o excedente de água no período de cheias. A barragem deve ficar pronta ainda neste semestre, e a primeira turbina deve entrar em operação em fase de teste no final do ano. A usina tem capacidade instalada de 1.087 MW.

NAVEGANTES
O Rio de Janeiro aparece apenas em quarto lugar em volume de dinheiro recebido por passageiros de cruzeiros neste Carnaval, segundo levantamento da Abremar (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos). Salvador é a primeira, com 19 mil turistas que atracarão na cidade. Com gasto médio de R$ 200 por turista, a cidade receberá aporte diário de R$ 3,8 milhões. Depois de Salvador, vêm Búzios e Ilhabela.
com JOANA CUNHA e ALESSANDRA KIANEK

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO

JOSÉ NÊUMANNE

A redenção passa pela dúvida, não pela fé

O ESTADO DE SÃO PAULO - 03/02/10


A morte do escritor americano J. D. Salinger, na semana passada, remete-nos a uma evidência que passou despercebida no último meio século: a era da rebeldia começou de fato na época de ouro, ou seja, contrariando a cronologia, os anos 60 tiveram início em 1951, ainda no comecinho do decênio anterior, o dos 50. Naquele ano foi lançado o romance O Apanhador no Campo de Centeio, um dos maiores êxitos de crítica e de vendas do mercado editorial mundial e, sem dúvida, uma obra de importância capital no cenário conturbado do século 20, que começou com uma carnificina nas trincheiras da Europa e terminou com a nova ordem mundial configurada na Guerra nas Estrelas. Além de ter vendido mais de 60 milhões de exemplares no planeta, ela exerceu em seus leitores influência comparável à de outros clássicos recentes, como O Estrangeiro, do franco-argelino Albert Camus, e Eichmann em Jerusalém - Relato sobre a Banalidade do Mal, da judia alemã Hannah Arendt.

A obra-prima de Camus, principal razão para que o autor se tornasse, aos 44 anos de idade, o mais jovem escritor a receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1957, foi editada em Paris nove anos antes da de Salinger. Graças a esse texto de qualidade incomparável, o filho de colonos brancos franceses (pés-pretos) na Argélia, de população de maioria árabe, foi recebido em Paris como um igual pelos filósofos existencialistas, que conquistariam mentes e corações no pós-guerra. A saga do protagonista, Meursault, entre o dia em que a mãe morreu e a data de sua execução por haver matado um árabe na praia, encantou o cosmopolita Jean-Paul Sartre, de quem Camus se tornaria amigo fraterno e, depois, desafeto figadal. Tuberculoso, este morreria aos 47 anos num acidente de automóvel, deixando a impressão de que sobreviveria como genial escritor, mas não como o pensador contestado por Sartre, que terminou trocando seu pensamento original pelo radicalismo do marxismo chinês de Mao Tsé-tung. Passados 50 anos da morte de Camus e 30 do concorrido enterro de Sartre, sobrevive a ética camusiana, que rompeu com o comunismo e execrou o terrorismo como uma forma de barbárie, meio século antes da derrubada das Torres Gêmeas pela Al-Qaeda de Bin Laden.

O Estrangeiro antecedeu na ficção a condenação de Camus, em artigos de sua autoria e editoriais que escreveu para o jornal da resistência à ocupação da França pelos nazistas, o Combat, ao sacrifício de vidas inocentes a pretexto de vingança política. O homicídio gratuito (atribuído ao sol inclemente na praia onde se deu o crime), principal evento da novela, é profético quanto aos atentados a bomba usados como represália ao colonialismo francês na libertação da Argélia e ao terrorismo suicida cometido pelos fundamentalistas muçulmanos no Oriente Médio e pelo resto do mundo afora. A equivocada adesão de Sartre à utopia sangrenta de Stalin, Mao, Fidel e Pol Pot em nada desvaloriza a importância de sua obra filosófica e muito menos a qualidade literária rara de um texto primoroso como As Palavras. Mas dos confrontos entre os ex-amigos ficou patente a razão profética do proletário pé-preto sobre o engano do nobre mestre-escola.

A amarga constatação do absurdo da condição humana, registrada na obra-prima de Camus, repetiu-se no texto seminal de Salinger, com uma diferença. Meursault era um cínico. E o niilismo de Holden Caulfield, o protagonista de 16 anos de idade de O Apanhador no Campo de Centeio, propagou a ilusão de que a juventude seria atributo suficiente para aprimorar o mundo e a humanidade. A capacidade do romancista americano de reproduzir, por escrito, a angústia dos adolescentes de seu tempo num dialeto de tribos até hoje reproduzido em praticamente todas as línguas faladas na Terra fascinou leitores e produziu prosélitos dessa crença no poder reformador da puberdade. O isolamento radical que o romancista se impôs por mais da metade de sua vida talvez possa ser o sinal do próprio inconformismo com os resultados funestos da semeadura de Caulfield. Ou não. Mas o fato é que Salinger não pode ser inculpado pelas consequências dela.

A saga política dos estudantes enfurecidos de Paris em 1968 não resultou no aprimoramento dos mecanismos do velho Estado Democrático de Direito das Revoluções Gloriosa e Americana, mais de dois séculos antes, mas em brutais tiranias de direita e esquerda. Símbolos cruentos da transformação do sonho em pesadelo foram o Khmer Vermelho, na Ásia, e a guerra suja da esquerda armada contra as ditaduras militares na América Latina.

A decantada revolução dos costumes lançada pelos requebros de Elvis Presley na América e pela eletrificação dos instrumentos dos Beatles e dos Rolling Stones na Velha Albion foi outro fiasco de Caulfield, simbolizado no assassínio do beatle John Lennon, na frente do prédio onde morava, em Nova York. O autor do lema que sintetizou o dilema - "o sonho acabou" - foi baleado por um fã que se disse inspirado no adolescente inconformado que Salinger inventara 29 anos antes. Ainda vale, pois, a lição de Nelson Rodrigues aos jovens: "Envelheçam, meus filhos!"

Nos anos 60, Hannah Arendt cobriu para a revista The New Yorker o julgamento do carrasco nazista Adolf Eichmann, capturado pelo serviço secreto israelense na Argentina. O livro resultante da cobertura, Eichmann em Jerusalém - Relato sobre a Banalidade do Mal, pode ter a resposta para as questões que atormentaram Camus e Salinger sobre o absurdo da condição humana e a dificuldade para superá-la. O mal não resulta da exceção monstruosa, mas é banal. Ao contrário do que escreveu Sartre, o inferno não são os outros, mas o fascínio doentio e irresistível que o próprio reflexo no espelho exerce sobre cada um de nós. A redenção passa pela dúvida desarmada, não pela fé cega, faca amolada.

José Nêumanne, jornalista e escritor, é editorialista
do Jornal da Tarde