quinta-feira, janeiro 28, 2010

AUGUSTO NUNES

VEJA ON-LINE

E$$e$ trê$ $abem da$ coi$a$

28 de janeiro de 2010

Eleito presidente do PT, o companheiro sergipano José Eduardo Dutra prometeu recrutar os melhores e mais brilhantes do partido para a composição do diretório nacional. O Brasil soube há dias que essa tropa de elite, se depender de Dutra, será liderada pelos craques José Dirceu, José Genoíno e João Paulo Cunha. Os três veteranos armadores também são titulares absolutos do Bando dos 40, denunciado pelo procurador-geral da República e instalado pelo Supremo Tribunal Federal no banco dos réus reservado aos protagonistas do escândalo do mensalão.

Por que Dutra estendeu acintosamente a mão amiga a três delinquentes juramentados?, quiseram saber os jornalistas. “Primeiro, para mim, não existe esse termo, mensaleiros”, começou o legítimo herdeiro de Ricardo Berzoini. “Depois, é um orgulho fazer parte da chapa ao lado de Dirceu, Genoino e João Paulo”, tentou terminar. Os jornalistas insistiram no assunto, o entrevistado perdeu a paciência: “Não tem sentido prescindir da experiência desses companheiros num momento tão importante como este, em que temos a pré-campanha da ministra Dilma Rousseff à Presidência”.

Na abertura do trecho encimado pelo subtítulo Quadrilha, a denúncia do procurador-geral Antonio Fernando Sousa fez um didático resumo da ópera:

O conjunto probatório produzido no âmbito do presente inquérito demonstra a existência de uma sofisticada organização criminosa, dividida em setores de atuação, que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes como peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta, além das mais diversas formas de fraude. A organização criminosa ora denunciada era estruturada em núcleos específicos, cada um colaborando com o todo criminoso em busca de uma forma individualizada de contraprestação. Pelo que já foi apurado até o momento, o núcleo principal da quadrilha era composto pelo ex Ministro José Dirceu, o ex tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, Delúbio Soares, o ex Secretário-Geral do Partido dos Trabalhadores, Sílvio Pereira, e o ex Presidente do Partido dos Trabalhadores, José Genoíno. Como dirigentes máximos, tanto do ponto de vista formal quanto material, do Partido dos Trabalhadores, os denunciados, em conluio com outros integrantes do Partido (um deles é João Paulo Cunha, copiosamente mencionado nas páginas seguintes), estabeleceram um engenhoso esquema de desvio de recursos de órgãos públicos e de empresas estatais e também de concessões de benefícios diretos ou indiretos a particulares em troca de ajuda financeira. O objetivo desse núcleo principal era negociar apoio político, pagar dívidas pretéritas do Partido e também custear gastos de campanha e outras despesas do PT e dos seus aliados”.

A releitura do texto permite enxergar as coisas com penosa nitidez. Enquanto o Brasil que presta faz escolhas baseado em biografias, a companheirada elege chefes pelo tamanho do prontuário. Basta retocar graficamente a última frase de José Eduardo Dutra para entender por que sente vontade de cantar o Hino Nacional quando vê a trinca por perto: “Não tem $entido pre$cindir da experiência de$$e$ companheiro$ num momento tão importante como e$te, em que temo$ a pré-campanha da mini$tra Dilma Rou$$eff à Pre$idência”.

É isso. Os bandidos já ensaiam a continuação da série ultrajante sem que o primeiro dos faroestes sequer tenha chegado ao fim.

PARA HIHIHI

念願だったんです、宿願だったんです。

マニュアルトランスミッションのツーシーターカーが。

雪解けから、探して探して探して。。。
遂に購入と相成りました(^^)

中古車なんですけど。。。
インターネットで検索して。。。

中古車といえば雑誌も発刊している、
の三つ巴でしょう。

購入する人によって条件が違いますよね。
いろいろ検索してみて
一番使い勝手がよかったのはgoo-netでした。

中古車業界の老舗カーセンサー.netは、
検索条件等も詳細に選べるのですが、
「複数の車種を同時に検索した場合
グレード別に表示できない」
これが痛い。。。
特に人気車種&多グレードの車種を検索した時には、
膨大な数の車がヒットしてしまいます。

カッチャオ.comは「詳細検索条件の中に4WD」がない。
致命的です。。。

というわけで、検索に関して条件を満たすのは、
goo-netとなるわけです。
掲載数も30万車とカーセンサーの20万車、
カッチャオの15万車を大きく凌いでいますし。

MUITO BOA

GOSTOSA

REGINA ALVAREZ

Truques fiscais

O GLOBO - 28/01/10

REGINA ALVAREZ



Em um ano de crise aguda, como foi 2009, o governo valeu-se de truques e muita criatividade para fechar as contas públicas. O resultado do Tesouro confirma que o superávit primário foi forjado a partir de caminhos muito pouco ortodoxos. Começando pelo uso do BNDES, um banco público de fomento, para reforçar o caixa da União, abrindo espaço para mais despesas, sem comprometer a meta.

De um lado, o BNDES recebeu empréstimo de R$ 100 bilhões do Tesouro em títulos da dívida pública — que não teve impacto fiscal, mas elevou a dívida bruta — para mitigar os efeitos da crise global. De outro, o bancão repassou um valor recorde de dividendos ao caixa da União: R$ 11 bilhões, quase o dobro de 2008; e ainda “comprou” mais R$ 3,5 bilhões de dividendos da Eletrobrás, também repassados ao Tesouro.

A lógica é a seguinte: o BNDES não contribui com o superávit primário da União, tudo que paga de dividendos entra no caixa do Tesouro como receita primária. Enquanto que o repasse direto dos dividendos da Eletrobrás ao Tesouro teria efeito neutro nas contas, já que a estatal contribui com a meta de superávit primário. Se paga dividendos, economiza menos e faz um superávit menor. A operação triangular garantiu mais recursos para a União no ano da crise.

Outro truque foi o uso dos depósitos judiciais para reforçar o caixa federal. No total, foram R$ 15,3 bilhões de depósitos tributários e não tributários. Neste caso, o governo foi com tanta sede ao pote que desconsiderou alguns detalhes importantes.

Primeiro, parte dos R$ 8,9 bilhões de depósitos judiciais tributários ainda estavam sem classificação. Quando forem classificados, dependendo do imposto que os originou, parte do bolo será dividido com estados e municípios (IR e IPI, no caso).

Especialistas em orçamento estimam que pelo menos R$ 1 bilhão dessa receita pertence aos demais entes e foi apropriada pela União. No caso dos depósitos não judiciais, R$ 6,2 bilhões, um detalhe pode complicar as contas de 2010. O valor que o governo computou como receita em novembro e dezembro de 2009 também entrou nas contas do relator de receitas do Orçamento de 2010, senador Romero Jucá, para acomodar o aumento de despesas aprovado pelo Congresso.

Finalmente, tem a história do Imposto de Renda das Pessoas Físicas. O governo prometeu que não reteria devoluções do IR para fazer caixa, mas o fato é que em 2009, pela primeira vez, mais de um milhão de contribuintes caíram na malha fina. E o mais estranho: em janeiro, no primeiro lote de restituições, foram devolvidos R$ 616 milhões a quase 400 mil contribuintes. Em janeiro de 2008, a devolução fora de R$ 75 milhões.

Nunca antes na história deste país a Receita trabalhou tanto e demonstrou tanta eficiência no primeiro mês do ano. Será que havia mesmo motivo para tante gente ter caído na malha? Com todos esses truques, o governo conseguiu um superávit de R$ 42,3 bilhões nas contas de 2009 e com o reforço dos investimentos do PPI/PAC — abatidos das despesas — a meta foi atingida.

Num ano de crise aguda, as receitas cresceram 3,2% e as despesas 15%. Não ocorreu aos equilibristas econômicos fazer o ajuste pela lado da despesa. As receitas “atípicas” viabilizaram o aumento dos gastos.

Herança maldita

No mercado, esses truques para obter superávit primário e o aumento da dívida bruta são vistos com preocupação. O economista Sérgio Vale, da MB Associados, prevê que haverá uma piora no perfil da dívida pública mais pra frente, em decorrência desses fatores.

— O perfil da dívida está diretamente relacionado à qualidade da política fiscal.

Quanto mais o governo cria subterfúgios para o superávit primário ou aumenta a dívida bruta, aumenta a probabilidade da qualidade do perfil piorar — afirma.

Este ano será muito ruim do ponto de vista fiscal, por conta do fator eleitoral, na visão do economista. A questão em aberto é 2011.

Quem vai fazer o ajuste fiscal necessário e de que tamanho será, quando se sabe que há uma programação enorme de investimentos públicos programados — Copa, Olimpíadas, présal, infraestrutura, etc.?, pergunta.

— Não temos espaço para a festa fiscal que o governo está fazendo nos últimos dois anos de seu governo, tanto que descobriu o uso da dívida bruta para aumentar seus gastos. Essa dívida, que está em torno de 64% do PIB este ano, pode subir facilmente para 67% no final de 2010 e, dependendo do cenário fiscal de 2011, passar dos 70% — estima o economista.

Ecos da crise

A crise teve grande impacto no mercado internacional de aparelhos celulares. Segundo dados da Abinee, associação dos eletroeletrônicos, as exportações brasileiras em 2009 caíram 35% no faturamento (US$ 1,4 bi contra US$ 2,2 bilhões de 2008) e no volume (16,3 milhões contra 25 milhões). Para 2010, a previsão é de alta de 10% no volume, mas há uma grande insegurança nas estimativas porque nossos principais parceiros, Argentina (51%) e Venezuela (10%), estão afundados em crises políticas e econômicas.

COM ALVARO GRIBEL

e-mail: regina.alvarez@bsb.oglobo.com.br

KENNETH MAXWELL

O primeiro ano de Obama

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10



A MANCHETE escolhida pelo jornal "Guardian Weekly" para sua capa, na semana passada, refletia uma conclusão bastante sombria: "A mudança real ainda não chegou", dizia o texto.
O artigo, assinado por Gary Younge, fala sobre a cidade de Prestonbury, no empobrecido condado de Floyde, Estado da Virgínia Ocidental. A "narrativa" da posse de Obama foi um "conto de fadas", observou Younge, no sentido de que "um país dividido se uniu para celebrar a eleição de seu primeiro presidente negro". A realidade vem sendo muito diferente. Para muitos, a "mudança" prometida por Obama foi mudança para pior: o desemprego está em alta, os preços das casas estão caindo, as guerras impopulares continuam. Os índices de popularidade de Obama, ao fim de seu primeiro ano de mandato, são os mais baixos de qualquer presidente desde Eisenhower.
O condado de Floyde foi por muito tempo um baluarte do Partido Democrata. Em 2004, John Kerry venceu a eleição presidencial por margem de 25%, lá. Mas em 2008 John McCain venceu em Floyde por dois pontos percentuais, o primeiro republicano a fazê-lo em mais de uma geração. A nova oposição populista, no entanto, não se confina aos velhos partidos políticos ou à Virgínia Ocidental. O movimento que se opõe aos impostos altos e ao governo grande, encorajado pela rede de TV Fox News, transformou-se agora em uma formidável coalizão de oposição às elites. Em Massachusetts, o Estado democrata arquetípico, um desconhecido senador estadual republicano, Scott Brown, foi eleito para a cadeira que Teddy Kennedy ocupou no Senado Federal por décadas antes de morrer.
A perda do assento de Kennedy no Senado foi uma derrota marcante para os democratas, porque lhes custou um voto essencial para a aprovação do pacote de reforma da saúde da Obama; isso causou arrepios na liderança democrata em Washington. O senador eleito Scott Brown reiterou uma promessa de campanha, a de dar o voto decisivo para a derrota da reforma da saúde de Obama, que pelas normas do Senado requer 60 votos para ficar imune à oposição republicana.
Mas a verdadeira história talvez esteja na maneira pela qual a mídia convencional perdeu de vista a revolução que estava em curso em Massachusetts, e o mesmo vale para a Casa Branca. E isso a despeito dos 411 discursos, comentários e declarações públicas, e 158 entrevistas que Obama fez no ano passado, segundo o cômputo da CBS News. A desafiadora tarefa que o presidente Obama terá de enfrentar agora, como observou o jornal "Los Angeles Times", será convencer milhões de americanos zangados de que "suas políticas econômicas lhes propiciarão um futuro melhor". Não será nada fácil.

KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.

Tradução de
PAULO MIGLIACCI

GOSTOSA

NAS ENTRELINHAS

Asfixia eleitoral

Denise Rothenburg
Correio Braziliense - 28/01/2010

Que Lula queira ser o senhor do destino dos personagens da sua base, vá lá. Mas o viés do “faço o que quero” começa a romper a barreira do razoável quando se refere à retomada de obras irregulares

Capitaneada pelo presidente Lula, a pré-campanha da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência da República ingressa agora num patamar além das simples citações e presenças nos palanques de inauguração de algumas obras e lançamento de outras pelo Brasil afora. Chegou a hora do torniquete na base aliada. Segurar ou tirar oxigênio de todos aqueles que possam se opor à tese da eleição plebiscitária, de Dilma versus José Serra.

O cerco começou por aqueles que, em tese, poderiam ser parceiros do PSB de Ciro Gomes no bloco de esquerda que engloba PDT, PCdoB, PMN e outros. Os atos são quase que simultâneos. Há alguns dias, Ciro Gomes informou aos comandantes de seu partido que não deseja concorrer ao governo paulista e que prefere continuar como candidato a presidente da República. Na terça-feira, esteve em Recife para conversar sobre isso com o presidente do partido, Eduardo Campos.

O PSB, por sua vez, considerou que Ciro deveria buscar aliados ao projeto. Ciro cogitou inclusive buscar os antigos companheiros de bloco parlamentar e, assim, tentar organizar um palanque alternativo ao do PT. O que fez, então, o PDT do ministro do Trabalho, Carlos Lupi? Marcou um almoço para anunciar ainda hoje o apoio à candidatura da ministra Dilma, antes mesmo de o PT lançar oficialmente a candidata. E faz questão de divulgar esse encontro justamente no dia em que Lula está em Recife, para uma conversa olho no olho com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, a respeito do destino de Ciro.

O movimento do PDT, combinado com o Planalto, nada mais é do que uma forma de dizer a Ciro que ele não terá onde lastrear a candidatura presidencial. Lula, com todos os abrigados no governo, deu um jeito de colocá-los sob o guarda-chuva da candidata oficial. E Lupi, como ministro, já havia dito que não teria meios de ficar em outro palanque que não fosse aquele abençoado pelo presidente da República. O PCdoB em breve fará o mesmo.

Com a antecipação do apoio pelo PDT, a tendência é que vários partidos aliados sigam o mesmo caminho. Há um sentimento generalizado na base de que, depois da oficialização do casamento do PT com o PMDB, não sobrará o que negociar nos estados, uma vez que o PMDB é um grande partido e tem apetite voraz por espaços de poder. E na política vale a regra do quem chega primeiro bebe água limpa.

Os gestos políticos registrados neste nascedouro do ano eleitoral indicam que até aqui o presidente conseguiu o que queria. Aos poucos, do alto de uma aprovação monumental, Lula vai se tornando uma espécie de senhor do destino da maioria dos personagens principais das eleições de 2010. Faz o que quer e todos se rendem aos seus apelos. Queria uma eleição plebiscitária e, ao que tudo indica, terá. Quer apresentar as obras e passou por cima do Tribunal de Contas da União na maior pose.

Até aqui, só duas pessoas dentro da base tentaram se opor aos desejos de Lula para a sucessão presidencial: Marina Silva, que terminou saindo do PT depois de um desentendimento por conta das licenças ambientais, e Ciro Gomes, que, aos trancos e barrancos, vai quase como um cavaleiro solitário empunhando a bandeira de uma candidatura que Lula não quer e trabalha contra.

Que Lula queira ser o senhor do destino dos personagens da sua base, vá lá. O chefe é quem manda. Mas o viés do “faço o que quero” começa a romper a barreira do razoável quando se refere à retomada de obras irregulares. Afinal, ninguém se esquece do que houve no TRT de São Paulo, depois da lupa que a CPI do Judiciário colocou sobre as obras do edifício-sede. Quando o tribunal paulista estava em construção, o TCU reclamou, mas a obra continuou. Descobriu-se depois que o juiz Nicolau dos Santos Neto, que era o bambambã do TRT, viveu dias de magnata do petróleo em Miami num carro importado. Nicolau foi preso. O ex-senador Luiz Estevão, do Distrito Federal, à época aliado do governador Joaquim Roriz e suspeito de ser um dos que atuava nos bastidores da obra do TRT, também passou uns dias no xilindró, depois de ter o mandato cassado.

Esse caso foi o mais exemplar de uma obra que caiu na malha fina do TCU. Deu no que deu. Se daqui a alguns anos alguém descobrir um ninho de cobras sob as obras do PAC, quem mandou tudo prosseguir sem investigar a fundo as suspeitas pode terminar manchando uma biografia que até aqui vem embalada pelo alto apoio popular. Afinal, o presidente pode até achar que, por ser popular, pode tudo. Mas, se ultrapassar o limite da lei, não estará a salvo de ver o feitiço virar contra o feiticeiro.

ELIANE CANTANHÊDE

Fim da crise pega Brasil sem ter o que dizer

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10

ANÁLISE


O governo brasileiro acertou ao participar ativamente da condenação internacional ao golpe em Honduras. Mas errou ao radicalizar e recusar o resultado da eleição que levou o atual presidente, Porfírio "Pepe" Lobo, ao poder, abrindo as portas para o fim da crise política no país centro-americano.
Resultado: o Brasil se inviabilizou como mediador e ficou fora da competente articulação de um governo de união nacional, liderada por Pepe Lobo e acatada pelos presidentes Manuel Zelaya, deposto, e Roberto Micheletti, que o sucedeu "de facto".
Esse recomeço tem as bênçãos dos Estados Unidos e da maioria da América Central, mas é rejeitado pelos países da Alba (Aliança Bolivariana para as Américas), que orbitam em torno da Venezuela. A Honduras de Zelaya era da Alba. Desde ontem, deixou de ser.
O início do novo governo e o aparente fim da crise, portanto, pegam o Brasil sem ter o que fazer e o que dizer.
"Não podemos ser mais realistas do que o rei, vamos dar tempo ao tempo", declarou ontem por telefone o assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, jogando qualquer posição oficial brasileira para a reunião do Grupo do Rio, em 25 de fevereiro, no México.
Zelaya foi deposto pela Justiça e expulso pelos militares na madrugada de 28 de junho de 2009, voltou clandestinamente ao país em 21 de setembro e desde então mora, come, dorme e convive com centenas de parentes e aliados na Embaixada do Brasil.
No primeiro momento, a escolha da embaixada foi saudada como demonstração da força crescente do Brasil na política da América Latina. Mas logo ficou claro que isso engessava a atuação brasileira, e sucederam-se os erros.
Em resumo, o Brasil errou ao aceitar uma figura jurídica inexistente internacionalmente -a de "abrigado", em vez de "asilado"; ao permitir que Zelaya usasse a embaixada como palanque para conclamar à rebelião; ao não reconhecer a eleição presidencial (marcada antes do golpe); e, por fim, ao passar ao largo dos esforços de pacificação.
Agora, os mentores da política externa deverão se recolher, para refletir e ver se Pepe Lobo será capaz de consolidar o processo de distensão e de atrair de volta ao país os programas de cooperação e os investimentos internacionais. O golpe é página virada, mas o que vem a seguir ainda é uma incógnita.

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO

CELSO MING

Participação nos lucros


O Estado de S. Paulo - 28/01/2010

A participação do funcionário nos lucros da empresa em que trabalha tem tudo para ser uma boa ideia se for o resultado da negociação entre as partes. Mas tende a ser um desastre se passar a ser obrigatória por lei.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, ontem reconheceu que o projeto existe e que está sendo examinado pelo Ministério do Trabalho. Antes, preferira dizer que não há nada decidido, provavelmente porque pressentira que, neste momento, provocaria mais prejuízos do que lucros para os planos eleitorais do governo federal.

E começa por aí o problema. Trata-se de projeto eleitoralmente oportunista cujo objetivo não é melhorar as condições de vida do trabalhador, mas arrancar o maior número de votos para a candidata do governo.

A questão constitucional e legal, já aventada pelo ex-ministro do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto, fica para os especialistas. Esta Coluna limita-se hoje a apontar as contraindicações mais sérias a esse projeto.

A primeira delas tem a ver com os efeitos que produziria sobre a estrutura dos encargos trabalhistas. Um dos maiores problemas que afetam a competitividade do produto brasileiro aqui e no exterior é o peso do custo social e trabalhista do sistema produtivo nacional sobre o preço do produto final. Os técnicos podem divergir à vontade sobre a magnitude desse custo e sobre o que significa tanto sobre os preços como sobre o nível do emprego, mas estão de acordo em que já deveria ter ocorrido uma profunda reforma nessa área.

Se o setor produtivo tivesse que encarar uma obrigação adicional que proviesse de nova lei, o produto brasileiro teria ainda maiores dificuldades para competir aqui e lá fora com o produto chinês e com o da maioria dos países asiáticos, onde não há essas esquisitices. E com menor capacidade de venda e de expansão das atividades é inevitável que a empresa acabasse contratando menos gente.

Duas perguntas: entre aplicar seus recursos no Brasil, onde tivesse de repartir os lucros com seus funcionários, ou aplicá-los em países que não fizessem essa exigência, qual seria a decisão do grande investidor? E qual seria, no Brasil, o impacto de longo prazo de uma escolha assim sobre a atividade econômica e sobre as condições de emprego?

A segunda contraindicação é o aumento das diferenças entre empregado e desempregado. Num país onde é enorme o número de pessoas que não encontram trabalho e onde os sindicatos não estão nem um pouco interessados em melhorar as condições de vida de quem está alijado do mercado, uma iniciativa dessas certamente contribuiria para piorar as condições dos excluídos.

A participação obrigatória nos resultados implicaria mais duas consequências: exigiria alguma forma de auditoria nos livros da empresa com o objetivo de determinar se a contabilização dos resultados e a distribuição dos lucros estão corretas. E parece encaminhar-se também para alguma forma de cogestão, na medida em que um grande número de decisões pode afetar o desempenho de uma empresa. E, outra vez, a qualidade dessas consequências seria uma se essa decisão fosse o resultado de negociação entre Capital e Trabalho, e seria bem diferente, obviamente para pior, se fosse simplesmente o resultado de imposição legal.

TODA MÍDIA - NELSON DE SÁ

Erguendo tijolos

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10



De Davos, o "Wall Street Journal" noticiou que Nouriel Roubini voltou a prever problemas para os países ricos, mas foi "inusitadamente otimista quanto aos Brics".
Já o "Financial Times" abriu até home page para os Brics (logotipo abaixo), "Construindo Brics" ou, no trocadilho, erguendo tijolos. Na chamada, com a foto acima, o jornal pergunta se, quando terminar a crise, "O centro de gravidade da economia global vai mudar para Brasil, Rússia, Índia e China?".
O "FT" destacou duas reportagens sobre os Brics, ontem. Na primeira, os quatro, segundo a Thomson Reuters, "lançaram recorde de ações desde o início do ano", com US$ 6,7 bilhões em 26 IPOs.
A segunda compara os quatro e conclui que houve "grande mudança no cenário de pesquisa científica", com China, Brasil e Índia passando a Rússia. A China, com o maior salto mundial em pesquisa, estaria perto até de "tomar a liderança" dos EUA.

A PETROBRAS SOBE

Mais do "FT". A PetroChina passou a Exxon e é "o maior grupo de energia do mundo". A Petrobras é quarta, e a russa Rosneft, a 13ª. "As duas viram sua capitalização de mercado mais do que dobrar."
Os dados da consultoria PFC "sublinham a nascente mas cada vez maior mudança do domínio, das companhias ocidentais para as estatais de China, Brasil e Rússia".

LAR DE LONGO PRAZO

O problema para Exxon e outras é como concorrer em produção, sublinha o "FT", sem novos campos. Nesse sentido, o "WSJ" noticiou do Rio que a também americana Chevron decidiu desenvolver o campo de Papa Terra, que divide no Brasil com a Petrobras. A decisão "transforma o Brasil em lar de longo prazo para a Chevron", segundo seu vice.

"HERO"

No alto das buscas de Brasil no Yahoo News, da AP, com reprodução pelo site do "New York Times", "Silva, do Brasil, é recebido como herói em Fórum Social". Segundo o enviado, "foi saudado como um 'rock star' por ativistas, num estádio". E "ganhou mais aplausos ao prometer uma bronca nos banqueiros do Fórum Econômico".
Por outro lado, também no "NYT", Lurian, a filha de Lula, publicou carta questionando o correspondente do jornal por escrever que o filme "Lula, o Filho do Brasil" "falhou ao não mencionar que abandonou sua namorada, Miriam Cordeiro, quando está grávida". Lurian diz que sua mãe não foi abandonada.

DE VOLTA

Depois do Twitter, o publicitário Nizan Guanaes abriu blog no iG, de Davos, e saudou os dez anos do portal que ajudou a criar

ANO ANÔMALO

O blog Radar postou que "a cobertura das chuvas em São Paulo levantou o ibope do 'Jornal da Record'". Antes em um dígito, na terça-feira "alcançou 13 pontos, melhor resultado desde agosto de 2008". Além dos alagamentos, "foi ajudado também pela novela das sete da Globo, que não empolga". Nem a das nove.

CONSEQUÊNCIA

Na manchete do "Jornal Nacional", ontem, "Mais uma consequência das chuvas em São Paulo: represas chegam ao limite da capacidade e famílias são obrigadas a mudar de endereço".
Em suma, "as comportas são abertas" pela Sabesp "e alagam cidades".

ASSOREAMENTO

O UOL destacou (abaixo) que a Defensoria Pública de São Paulo entrou com um mandado de segurança contra a Sabesp e estuda um outro contra o DAEE por causa dos alagamentos na Zona Leste. Questionou, como a causa principal das enchentes, "o assoreamento do Tietê".

No alto da home, as primeiras ações judiciais

ENFIM

O iPad enfrentou críticas, sobretudo pela ausência de multitarefa. Mas o "NYT" já reagiu, dizendo serem ataques blogueiros de quem nem usou e lembrando que foi assim com o iPhone. Vê desenvolvimento - com o tempo

GOSTOSA

ARI CUNHA

Dinheiro para o Haiti


Correio Braziliense - 28/01/2010

Do maior valor a decisão do Brasil de enviar dinheiro para as vítimas dos terremotos no Haiti. É trabalho de colaboração e compreensão. Ao mesmo tempo, Angra dos Reis tem queixas a registrar. Logo no dia da tragédia que interrompeu a vida da cidade cobiçada pelos turistas, o vice-prefeito da cidade disse na TV que apoiava a ideia de dinheiro mandado para o Haiti. Fez ressalva quanto ao procedimento em relação a Angra dos Reis. E acrescentou que foi feito relatório para os governos estadual e federal. Os detalhes estão descritos com a necessária clareza e com as informações indispensáveis ao atendimento do pedido. Até agora — diz o vice-prefeito —, Angra dos Reis não recebeu sequer resposta dos governos do estado e da República.

A frase que não foi pronunciada

“Cabe aos correntistas não caírem nas armadilhas dos bancos.”
Olga Smith, norte-americana, explicando como escapar da quebradeira econômica.

Haiti
Desde 12 de janeiro começou a desdita dos habitantes do Haiti. País pobre e assaltado por sucessivos governos. Observador da situação usou o poder de repórter e a clarividência humana. A tremenda experiência de um jovem jornalista está resumida nesta estatística: 30%, o trabalho como profissional. Setenta por cento, o desânimo de ver sofrimentos com terremotos, e nada poder fazer. Sentir a dor de uma população sem rumo e sem futuro. O trabalho do Brasil continua exemplar e respeitado.

Portinari
A Galeria de Artes do Banco Central prepara organização de trabalhos célebres de Cândido Portinari. São peças de valor cultural, nas quais a marca do pintor paulista mostra a genialidade.

Sugestão
Nos próximos 10 anos, os ônibus e caminhões brasileiros devem ser substituídos por máquinas modernas e confortáveis. O Brasil fabrica ônibus em estilo moderno. São vendidos a particulares que exploram o ramo do turismo. Sofrem revisão das autoridades. Só assim poderemos ter transportes seguros. O mesmo ocorre com caminhões. Será bom porque vão ser reduzidos os prejuízos dos governos com hospitais e aposentadorias.

Aeroportos
Os principais aeroportos do Brasil, como São Paulo, Rio e Porto Alegre, estão em penúria de fazer pena, malgrado o alto preço das passagens. Os dessas cidades paralisam as atividades ante qualquer ação do tempo. Às vezes, fecham por horas, à falta de equipamento em terra que os aviões já possuem. Chuva e vento impedem o movimento de aeronaves de passageiros.

Trânsito
Cresce a cada dia em Brasília o número de motos. Motociclistas têm ordem de fazer entregas o mais rápido possível. Isso os leva a não cumprir regras de segurança. Cortam pela direita, utilizam o acostamento. Nas aulas de direção, o tema principal é obediência ao trânsito, o que não ocorre com instrutores. Importante é receber a incumbência e cumprir horário.

Congresso
Dois terços do Senado serão substituídos nas próximas eleições. Na Câmara, todas as cadeiras serão postas na disputa eleitoral. Pelo visto, muitos não serão reeleitos. Foram pessoas que acederem às tentações do mensalão. Vida farta e futuro indefinido, a menos que a ajuda prossiga em atraso da democracia.

Desemprego
Sete milhões e 600 mil brasileiros estão desempregados. O seguro desemprego é testemunha do fato. O Brasil precisa de pessoas aptas às classificações superiores. É a prova do desenvolvimento.

Novo vírus
A população dos estados do Sul enfrenta dificuldade de saúde. A sujeira das águas dos rios que transbordam propaga um vírus que provoca dor de barriga, cansaço, desânimo. Cientistas de São Paulo estão orientando populações sobre cuidados com a higiene, até que consigam detectar a doença. Tudo começou em Olímpia e se espalhou pelo litoral. A primeira recomendação é comer legumes bem cozidos e não expor pratos nos refrigeradores dos restaurantes self service.

Menores
Cabe ao Unicef responsabilidade na reconstrução do Haiti. Mais da metade da população tem menos de 18 anos. O órgão em Brasília está mobilizado para a arrecadação, a fim de prover água potável, alimentação terapêutica, medicamentos e abrigos temporários para as crianças. O contato para informações é 0800 601 8407.

História de Brasília

Já que falamos em Iapb, o que se chama “área verde” é um amontoado de entulho, que ainda permanece. É bom lembrar que não há mais construção no Setor Comercial Local daquela superquadra. (Publicado em 23/2/1961)

FÁBIO ULHOA COELHO

A busca de um rosto fundamentalista

O ESTADO DE SÃO PAULO - 28/01/10

Certamente Lula não leu o decreto, que aprovou, do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Dilma, tampouco. Mas isso não tem nenhuma importância. Os dois sabiam muito bem do que tratava o documento. Estavam em busca de um rosto fundamentalista para o governo.

Estudiosos do fundamentalismo costumam traçar um paralelo com a utopia. Tanto os fundamentalistas quanto os utópicos querem mudar a sociedade. Mas, enquanto os utópicos projetam uma sociedade que não existe ("não existe ainda", dirão), os fundamentalistas se batem pela restauração de uma ordem social que já existiu. Os utópicos miram o futuro, os fundamentalistas, o passado.

O termo "fundamentalismo" está hoje fortemente associado ao islamismo. Algumas lideranças muçulmanas centram sua pregação na restauração da ordem que, de acordo com a leitura que fazem do Alcorão, era a propagada e implantada pelo Profeta. Mas a palavra foi inicialmente empregada na identificação de um movimento de protestantes nas primeiras décadas do século 20, no meio rural dos EUA. Também em razão da leitura que faziam da Bíblia, esses protestantes defendiam o retorno ao modo de viver dos antigos colonos.

Com esse significado de ânsia pela restauração de uma ordem social passada é que se pode falar em fundamentalistas de esquerda. Foi para eles que Lula e Dilma aprovaram o PNDH-3.

Os fundamentalistas de esquerda querem implantar, no Brasil do século 21, o poder soviético, isto é, o poder dos "conselhos populares" (soviets, em russo). A estratégia de Lenin para tornar vitoriosa a Revolução Russa consistiu em organizar conselhos populares, fortalecendo-os a ponto de se caracterizar uma dualidade de poderes. Durante certo tempo rivalizaram-se duas estruturas no Estado russo, fragilizado pela queda do czarismo: de um lado, assembleias um tanto inspiradas na democracia ocidental, de outro, os conselhos populares. Acabou prevalecendo a estrutura organizada pelos bolcheviques, mais forte que a da incipiente democracia russa, seguindo-se, então, a tomada do poder, a guerra civil e, finalmente, a criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que existiu de 1922 até 1991.

Essa estratégia funcionou apenas na Rússia daquele tempo. Gramsci, nos anos 1930, advertia que na Europa, com sociedade civil e instituições estatais bem mais fortes, a estratégia leninista era inviável. Rosa de Luxemburgo, na Alemanha, alguns anos antes, havia ensaiado crítica semelhante.

Os fundamentalistas de esquerda não leem Gramsci. Imaginam espalhar conselhos populares Brasil afora, que, robustecidos, poderiam um dia se afirmar politicamente como instâncias mais representativas do que as legitimadas pela Constituição (Congresso Nacional, Poder Judiciário,Ministério Público, etc). Em seus delírios fundamentalistas, vislumbram uma dualidade de poderes capaz de abalar as instituições democráticas brasileiras e possibilitar a instauração da ditadura de partido único.

Na democracia, a conquista do poder resulta de um processo transparente e universal, isto é, de vitória nas eleições periódicas destinadas à identificação e afirmação da vontade da maioria do povo. No modelo soviético, ao contrário, tem poder quem dispõe de paciência e astúcia suficientes para suportar e manipular as enfadonhas reuniões dos ditos conselhos populares. São úteis, também, alguma habilidade com discursos inflamados, não necessariamente consistentes, e capacidade de articulações sorrateiras nos bastidores da organização partidária (de preferência, que abram as portas para a celebração de um convênio com o governo, por meio de uma ONG fajuta qualquer).

Na democracia, a alternância no poder é da essência do sistema. Periodicamente, de modo transparente e universal, renovam-se as lideranças. No modelo soviético, a alternância representa um grande problema e os rearranjos periódicos são sempre traumáticos. Se Trotski tivesse vencido Stalin, a História registraria o terror trotskista por trás de abomináveis processos de Moscou. Após a morte de Mao Tsé-tung, foi necessário julgar e executar sua viúva. Che Guevara provavelmente voltou à guerrilha por perceber que Cuba era uma ilha um tanto pequena para ele e os Castros.

Lula não foi eleito, nem reeleito, pelos fundamentalistas. Aliás, enquanto contava apenas com o apoio deles, amargou sucessivas derrotas nas eleições majoritárias. Logrou chegar à Presidência da República depois de ampliar o leque de sustentação política. É certo que até o escândalo do mensalão o mais importante sustentáculo do lulismo foram os fundamentalistas. Lula sobreviveu a esse escândalo graças, em parte, às demais forças políticas de sustentação do seu governo.

Um governo de muitos rostos, com os quais os fundamentalistas de esquerda têm dificuldade de se identificar.

Contudo, para levar adiante o plano de tornar plebiscitária a próxima eleição presidencial, Lula precisa impedir que os fundamentalistas acabem se empolgando em demasia com a candidatura Marina Silva. Para isso seu governo precisa exibir um rosto em que eles se reconheçam. A desastrada aprovação do PNDH-3 tinha só esse objetivo, assim como a vindoura Conferência de Cultura, em que a tese do controle social dos meios de comunicação certamente renascerá, ou mesmo a controvertida concessão de asilo ao preso Cesare Battisti.

Os democratas devem ficar atentos, sem dúvida, para que medidas eleitoreiras desse naipe não impliquem ameaças concretas às instituições. Até agora, contudo, Lula tem tido dificuldade em sua busca de um rosto fundamentalista para o governo, em razão da resistência vinda das demais forças políticas que o sustentam.

Fábio Ulhoa Coelho, jurista, é professor da PUC-SP

ROBSON SÁVIO REIS DE SOUZA

Um drama brasileiro


O Globo - 28/01/2010

O ano de 2009 terminou com um balanço pouco animador para a segurança pública.


Não obstante algumas conquistas, a década (20002009) foi a continuidade de um flagelo nessa área. Apesar da diminuição de alguns indicadores de crimes violentos (observados na segunda metade desse período, a partir de 2005), o balanço final mostra que não temos motivos para comemorar. O número de mortes por homicídio no Brasil é vergonhosamente assustador: cerca de 37 mil brasileiros perdem a vida por ano. Em sua maioria jovens, na faixa etária entre 14 e 29 anos, pobres e negros. Este também é o perfil dos novos presidiários que entram em idade cada vez mais tenra em nossas prisões — verdadeiras masmorras que não recuperam nem integram os infratores à sociedade.

Como se não bastasse o número de homicídios — a maioria fruto do adensamento do tráfico de drogas no país, mas uma grande quantidade motivada por questões banais, devido ao número crescente de armas em poder dos cidadãos —, outros indicadores de causas externas de mortalidade nos envergonham: são cerca de 36 mil mortes por ano no trânsito, essa nova máquina de matar que continua gerando novos criminosos sem nenhuma punição.

Isto porque nossa legislação não considera os assassinatos praticados por motoristas drogados, bêbados, irresponsáveis, em veículos sem condições de uso, como crimes dolosos.

A taxa de apuração de crimes pelas polícias é absurda. Homicídio, o crime mais violento, que atenta contra a vida humana, tem taxa de resolutividade média inferior a 10%. Com esse nível de ineficiência, a impunidade campeia. E, como resultado desse descalabro, o cidadão, desconfiado do sistema de proteção e defesa social, deixa de notificar a maioria dos crimes, dificultando ainda mais o planejamento estratégico e a gestão policial.

Soma-se a isso uma polícia violenta e corrupta.

Apesar desses números, podemos ver algumas luzes no final do túnel: primeiramente, o debate sobre segurança pública amplia-se. A sociedade passa a vocalizar uma ação articulada do Estado para essa área; segurança pública como direito de cidadania. Novos atores sociais são chamados a darem sua contribuição. Há uma evidente reação do poder público, com mais investimentos na gestão, integração e na eficiência policial. Programas de prevenção ao crime — destinados a populações em condições de vulnerabilidade social — se institucionalizam.

Os municípios, antes alheios aos problemas da segurança, compreenderam seu papel nessa política e vêm cumprindo a tarefa de ampliar os programas sociais, investindo também na prevenção ao crime, na melhoria da infraestrutura urbana e na vigilância do patrimônio público, desonerando a atividade policial.

O Poder Judiciário, menos encastelado e reativo, começa a experimentar novas metodologias de ação: a justiça restaurativa vai-se ampliando; a aplicação de penas e medidas alternativas ganha força e novos arranjos possibilitam mais celeridade e eficiência. Por fim, os gestores públicos nos níveis municipal, estadual e federal começam a atuar de forma articulada e cooperativa, não somente no combate ao crime, mas nas ações de prevenção e, principalmente, no planejamento estratégico e integrado de ações de médio e longo prazos o que poderá resultar numa melhor eficácia na política pública de segurança.

A década passada foi praticamente perdida para a segurança pública.

Tomara que iniciemos um novo ciclo, no qual os governos e todos os segmentos da sociedade interajam na reversão desse macabro quadro da (in)segurança pública brasileira.

JAPA GOSTOSA

JOSÉ SIMÃO

Ueba! São Pedro lava até o Peru!

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10


E a onda é jogar batalha naval! Os paulistas em engarrafamentos na enchente podem jogar!


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta!
Direto do Espírito Santo: "Com 35 pontos na carteira, diretor do Detran deixa o cargo". O diretor do Detran perdeu a carteira. Rarará.
2012 Urgente! O Peru tremeu e encheu! São Pedro tá lavando até o Peru! E um amigo meu tava com viagem marcada para Angra. Aí o agente de viagem sugeriu como opção: Macchu Picchu. E lá tá ele: ILHADO. Ilhado em Águas Calientes!
E aqui em São Paulo: Águas Fedentes. Daria pra chover água mineral? Rarará! Paulista só pode fazer compra pela internet. SUBMARINO.COM! E a onda agora é jogar batalha naval! Os paulistas engarrafados na enchente podem jogar batalha naval. Cada jogador tem uma cartela com um Kassab, duas Martas, três Serras e quatro Malufs. Errou, gritou ÁGUA! Kassab. Água! Marta. Água. Serra. Água. Maluf. Água. ÁGUA ÁGUA ÁGUA!
E Rodoanel é todo mundo de rodo na mão! Nós precisamos é de um Fluvioanel, pra DESAFOGAR o trânsito, literalmente!
E Bilhete Único vira Bilhete Úmido. E motoboy vira botoboy, moto com motor de popa. E eu só saio de banana boat. Sair de carro pra quê? Pra capota aparecer boiando no "Jornal Nacional"? E cena tragicômica: uma mulher atravessando uma rua alagada com a bolsa na cabeça. Aí chega do outro lado e o ladrão leva a bolsa! Rarará. Momentos cachorros! Cenas do Aquassab! Humilhados: úmidos e ilhados!
Aliás, sabe por que a terra treme tanto? Porque o Zé Mayer quebrou a cama. De tanto engravidar globete! Em Morrer em Vida!
E sabe o que eu vi ontem no "BBB"? Uma cena bizarra: uma PM de TPM! E um amigo me disse que o Kassab tá mais perdido que capivara no Tietê. Jacques Costeau para prefeito. É mole? É mole, mas sobe! OU como disse aquele outro: é mole, mas rela pra ver o que acontece!
Antitucanês Reloaded, a Missão. Continuo com a minha heroica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês". É que em Salgueiro, Pernambuco, tem um inferninho chamado BOCA NERVOSA! Ueba! Mais direto, impossível! Viva o antitucanês. Viva o Brasil!
E atenção! Cartilha do Lula. O Orélio do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Enchurrada": companheira que foi levada por um churro na enchente! Rarará! O lulês é mais fácil que o ingrêis. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Inflação pode preocupar no 2º tri, diz consultoria

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10

Se a desvalorização do real persistir no ritmo atual -ao redor de 8% do início do ano até agora-, a pressão inflacionária sobre a economia brasileira vai se acentuar no segundo trimestre deste ano, o que poderá levar o Banco Central a elevar a taxa básica de juros, a Selic, segundo Fábio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores.
A perspectiva de elevação da inflação nos próximos meses decorre do fato de os preços de alguns produtos no atacado estarem em ritmo de alta e sem chance, na análise de Silveira, de recuarem no curto prazo.
Café, algodão, carnes, açúcar, arroz, milho e laranja são alguns dos produtos que registram alta de preços no atacado e devem pressionar a inflação no varejo a partir de março, segundo análise de Silveira.
Comparando a terceira semana deste mês com a terceira semana de dezembro, o preço do café subiu 5,7%; o do algodão, 7,9%; o das carnes, 2,4%; o do açúcar, 23,4%; o do arroz, 2,6%; e o da laranja, 31,6%.
"Preço de produto agrícola em alta e taxa de câmbio se desvalorizando são dois fatores de pressão altista. Outro motivo que pode resultar em inflação mais elevada é o próprio crescimento da economia, que deve ser de 5% neste ano em relação ao ano passado", diz Silveira.
A pressão de alguns produtos sobre a inflação já vem sendo sentida, na avaliação dele, desde outubro do ano passado.
No último trimestre de 2009, os preços no varejo de açúcar refinado subiram 12,64%; de móveis e utensílios, 2,08%; de calçados e acessórios, 2,30%; de transporte público, 2,26%; e de serviços pessoais, 1,30%.
"Os preços voltam a preocupar", acrescenta.

Preço de produto agrícola em alta e taxa de câmbio se desvalorizando são dois fatores de pressão altista. Outro motivo que pode resultar em inflação mais elevada é o próprio crescimento da economia
FÁBIO SILVEIRA
sócio-diretor da RC Consultores

DIRETO DE DAVOS

EMPOÇADO


José Sergio Gabrielli, presidente da Petrobras, disse ontem, em Davos, que a empresa captou US$ 40 bilhões em 2009, um ano considerado muito bom. Almir Barbassa, diretor financeiro da companhia, que também participa do Fórum Econômico Mundial, na Suíça, lembrou que "há muita liquidez empoçada", muitos recursos para serem emprestados.

ALPES X HAITI

Não bastasse a pressão da opinião pública de países desenvolvidos contra os generosos bônus em bancos que receberam ajuda dos governos, o Fórum acontece em momento difícil para os CEOs subirem as sofisticadas montanhas nevadas de Davos, em razão da tragédia no Haiti. Rápida no gatilho, a organização do Fórum programou, para o primeiro dia, debate sobre o papel da iniciativa privada e de organizações humanitárias para ajudar as vítimas do terremoto.

OBAMA X SARKOZY

Em mais de uma roda de altos executivos pelos saguões do Fórum, a conversa girava sobre populismo. Em uma delas, dois americanos discutiam com franceses, cada grupo buscando convencer o outro de que seu presidente era quem merecia o título de "O Mais Populista". Nicolas Sarkozy fez um discurso considerado forte pela plateia.

RASTREADO

Executivos do Leather Working Group -conjunto de empresas ligado ao Greenpeace para rastrear a origem do couro- estão no Brasil em reunião com a indústria, representada pelo Grupo de Trabalho Pecuária Sustentável. A ideia é debater critérios para certificar que o couro importado do Brasil não esteja ligado a práticas como desmatamento e trabalho degradante. Executivos de Nike, Adidas, Ikea e New Balance visitaram instalações em Mato Grosso.

CARRO NOS TRILHOS

A Maxipark venceu licitação para administrar estacionamentos em três estações de metrô e trem de São Paulo. O projeto faz parte de uma tentativa do governo de reduzir o problema do trânsito na região central da cidade, integrando bolsões de vagas para carros às estações. As estações contempladas são a Marechal Deodoro e a Brás, do metrô, e a Dom Bosco, da CPTM. O sistema de cobrança inclui o uso da vaga e o bilhete de transporte.
A tarifa irá variar em cada unidade. Na Marechal Deodoro, o valor cobrado é de R$ 11,20, com estadia de 12 horas e duas viagens de metrô, CPTM ou ônibus da SPTrans. A hora adicional custará R$ 1,00. No projeto todo, estão previstas aproximadamente 600 vagas, segundo Paulo Frascino, presidente da empresa. A Maxipark tem cerca de 80 unidades em São Paulo e outros sete Estados, onde administra mais de 25 mil vagas.

Selic só deve subir em julho, aponta agência

Não há motivos para a alta da Selic no curto prazo, segundo a agência classificadora de risco Austin Rating. "Os juros devem subir, mas de forma gradual e só a partir de julho", diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin. Os motivos para a manutenção da taxa, diz ele, são: inflação sob controle, cenário internacional ainda em ajuste e espaço para a recuperação da produção.
Enquanto o boletim Focus, do BC, projeta a Selic em 11,25% para o fim do ano, a Austin prevê que os juros não devam ultrapassar os 10%. "Seria imprudente a taxa em 11,25% num momento em que a economia precisa atrair investimento. A alta afastaria o investidor de aplicar no setor produtivo."

com JOANA CUNHA, ALESSANDRA KIANEK, FÁTIMA FERNANDES e NATÁLIA PAIVA

SEPARANDO

MARCOS VINICIOS VILAÇA

Além dos tempos

O GLOBO - 28/01/10


No começo do século XX, quando aconteceu no Rio de Janeiro a III Conferência Pan-Americana, os delegados estrangeiros se abismaram com a popularidade de Joaquim Nabuco. Gilberto Freyre escreveu que, a partir dali, Nabuco passou a ser visto como o grande brasileiro do seu tempo e de todos os tempos.

Alceu Amoroso Lima completaria: Nabuco foi a imagem mais fulgurante do humanismo brasileiro, e a mais harmoniosa da nossa história cultural.

Nas comemorações do centenário de sua morte, que a Academia Brasileira de Letras está promovendo, essa visão dele como modelo certamente se imporá em definitivo na cultura dita canônica, decerto ainda um tanto desatenta ao que Eduardo Portella chama “lógica exterminadora do Modernismo”.

Joaquim Nabuco, como um operador da transformação social, trouxe o povo para o combate pela liberdade. Não o contentava apenas o abolicionismo como mudança: queria a verdadeira transformação.

E disse: “Acabar com a escravidão não nos basta; é preciso destruir a obra da escravidão” e implementar a “democratização do solo”.

Por tudo isto, “Minha formação” é o seu melhor retrato e o seu melhor momento, inclusive como restituição do cidadão do mundo, restituição do extraviado , ao seu chão. Ele sempre disse: “Sou cativo de Pernambuco.” A Academia é em grande parte o contraste entre dois homens inseparáveis: Machado de Assis, o humilde que se fez aristocrata das letras, e Nabuco, que, pertencendo à hierarquia do Império, se fez humilde para melhor escutar os gritos de liberdade.

Atentemos para o que disse, insuspeitamente, Graça Aranha: “Na sua vida precária, sem pouso certo, sem meios, perseguida pela ironia, atacada pelo despeito, a Academia encontra a sua resistência moral em Machado de Assis e Joaquim Nabuco, o par glorioso que ela pusera à sua frente, e cuja assistência justificaria diante do público a sua aparição no caos literário.” Explicase que a Academia registre o centenário de morte de Joaquim Nabuco com permanente curiosidade e completa empatia, tal como fez em relação a Machado de Assis.

Promoveremos ciclo de conferências, re edições de algumas de suas obras, iremos a Londres e a Washington para comemorações especiais com a intelectualidade dessas cidades nas quais serviu como embaixador, iremos nos curvarreverentes no Recife e em Massangana, onde ouviremos as badaladas do sino da capela de S. Mateus, o seu “muezzin íntimo”, como belamente recordou Evaldo Cabral de Mello.

Tudo isso se fará como ensinou Agostinho de Hipona a respeito do triplo presente: o presente do passado — a memória; o presente do presente — a percepção; o presente do futuro — a esperança.

Temos certeza de que os brasileiros estarão ainda mais convencidos da sabedoria dele recordando o que, em 1909, escreveu no seu diário pessoal: “O corpo pode ser demolido, não o seja nunca o espírito.” E juntos atentaremos para a lucidez de quem, há cem anos, enxergando da vida o claro/escuro e mesmo já com a voz a falhar, segredou ao médico que o atendia: “Doutor, pareço estar perdendo a consciência...

Tudo, menos isso!...” Nabuco não perdeu a consciência.

Sua consciência está conosco.

MARCOS VINICIOS VILAÇA é presidente da Academia Brasileira de Letras.

“O corpo pode ser demolido, não o seja nunca o espírito”

JANIO DE FREITAS

Diplomacia gasosa

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10

Criou-se tal tumulto que as tropas brasileiras contiveram com uso da violência de gás pimenta famintos e sedentos

O REMENDO da provocação, pretensamente diplomático, resultou ainda pior. Para atenuar a má repercussão da iniciativa de distribuir alimentos e água bem em frente a tropas dos EUA, instaladas na área do ex-palácio presidencial, alguns dos americanos foram chamados a juntar-se aos brasileiros em nova distribuição. O improviso provocou uma corrida de desesperados. E criou-se um tal tumulto que as tropas brasileiras, tão preocupadas em mostrar-se mais humanitárias que as demais, contiveram com uso da violência de granadas de gases pimenta e lacrimogêneo famintos e sedentos.
A ideia, atribuída ao ministro Celso Amorim de passagem pelo Haiti, retoma procedimentos impróprios, e até irregulares, das tropas brasileiras. A função designada ao Brasil no mandato da ONU é a de prover segurança, em trabalho conjunto com tropas de outras nacionalidades sob a denominação geral de Minustah. O próprio comandante dessa tropa, general Floriano Peixoto, em suas frequentes entrevistas refere-se ao papel dos brasileiros, assim pretendendo assinalar que tropas e serviços dos EUA não se sobrepõem nem se apropriam da relevância brasileira.
Essa tropa incumbida de segurança foi, no entanto, a destinada a instalar um posto de distribuição de gêneros em represália ostensiva aos americanos instalados, por sua conta, na área do palácio em ruínas. Foi além a má iniciativa: só soldados brasileiros da força de segurança foram designados para aquela distribuição de tantos gêneros quanto de relações públicas. Política de animosidade com uns e política de discriminação com outros.
A diplomacia do tumulto repetiu o uso da tropa brasileira que não é o reiterado, como próprio e regulamentar em comparação com os americanos, pelo comandante simultâneo dela mesma e da força de segurança da ONU.

A volta
O PSDB quer e o PV aceita satisfeito que Márcio Fortes seja o vice na chapa de Fernando Gabeira ao governo do Estado do Rio. Não é o Márcio Fortes ministro. É o vice-presidente do PSDB fluminense que se notabilizou como principal associado do então governador Moreira Franco, quando o Estado do Rio foi sacudido, durante anos, por uma sucessão de escândalos. Vários deles originários de notícias da
Folha sobre fraudes, com empreiteiras, em concorrências de obras de bilhões, todas forçosamente anuladas.
Como especialista em arrecadação de dinheiro, claro, Márcio Fortes foi chamado para a campanha de José Serra ao governo de São Paulo.

Jamegão
A investigação de múltiplos crimes financeiros denunciados contra a empreiteira Camargo Correa foi suspensa, por liminar do Superior Tribunal de Justiça, sob o argumento de que o denunciante é anônimo. Em vez do debate criado em torno da suspensão, já que vários indícios foram encontrados pelos investigadores, é só o caso de alguém assinar e protocolar uma suspeita, até com base nos indícios já reunidos.

O ABILOLADO

EUGÊNIO BUCCI

'Avatar' e o espírito do nosso tempo

O ESTADO DE SÃO PAULO - 28/01/10

Na estação de enchentes em São Paulo, as salas de cinema também se deixam inundar. De gente. A causa é Avatar, a superprodução dirigida por James Cameron (o mesmo de Titanic, aquele romance de aguaceiro e de naufrágio). Rios de espectadores deságuam com tal violência contra as bilheterias que estas, atônitas, precisam impor diques à correnteza: os ingressos estão esgotados. Então, obediente às leis da hidrodinâmica, a massa líquida faz redemoinhos e encontra veios alternativos para sua voragem: compra entradas por antecedência. Depois, retorna em torrentes para afogar todas as poltronas.

Avatar é um fenômeno cultural como não vemos há um bom tempo. Por trás dos óculos baratos que garantem o efeito tridimensional do espetáculo, a freguesia contempla a consolidação das fantasias do nosso tempo, que misturam tecnologia, amor adolescente, engenharia genética, jogos eletrônicos e congraçamento transcendental com a natureza. Avatar também é um passatempo banal, claro, mas não é só isso. É uma síntese do pensamento político da moda, legitimada pela caudalosa acolhida que vem recebendo, tanto em São Paulo como em cidades onde não chove tanto assim.

O pensamento político da moda herda algumas utopias ancestrais. Ele incorpora, como já foi observado, o mito do bom selvagem, que embevecia o olhar dos europeus diante dos nativos do Novo Mundo. Agora, porém, o bom selvagem habita não outro continente, mas outro planeta, onde as raízes das árvores tecem conexões com todo o ecossistema. Os seres desse mundo carregam, nas tranças do cabelo, uma espécie de cabo USB, como bem definiu um jovem jornalista que viu o filme comigo. Plugando o seu "cabo USB" a cavalos de seis patas e a répteis voadores, os neosselvagens comandam-nos por ondas cerebrais. O novo bom selvagem sabe-se uma célula de um organismo vivo maior que ele, uma "Gaia" cintilante, uma internet com neurônios e clorofila.

Nesse lugar fantástico, a natureza é sujeito político. Ela é capaz até mesmo de ter consciência e agir segundo sua vontade. Conclamada, ela transforma sua consciência difusa ("consciência em si") em consciência ativa ("consciência para si") e parte para a guerra contra aqueles que pretendem dominá-la e explorá-la. Ou seja, quem assume a causa universal do "bem" não é mais uma nação, um povo ou uma classe social, mas a própria natureza. O humanismo converte-se em ambientalismo cibernético e esse cyberambientalismo é a base do ideário que anima as plateias. Elas acreditam que natureza e tecnologia encontrarão um ponto de equilíbrio harmonioso. Elas choram no cinema.

As contradições da nossa era também aparecem na tela. A ciência, embora financiada pelo dinheiro, termina por se insurgir contra a face mais cruel do capital. No modelo dramático de Avatar, o extrativismo que desrespeita o meio ambiente é "do mal" - e a ciência que se opõe à razão econômica é "do bem". As contradições explicitam-se também na mocinha, a neosselvagem pura - um pouco Iracema, totalmente Pocahontas - que reza uma prece para cada animal que mata com fins pacíficos e, ao mesmo tempo, tem acessos de raiva, como qualquer adolescente neurótica, quando confrontada com uma mentira do seu príncipe encantado. A mocinha é "natural" e, não obstante, é também uma "urbanoide" histérica.

Vários chavões da ficção científica - que sempre é ficção política - marcam presença no filme. Seres construídos em laboratório desenvolvem sentimentos próprios, mais que vontade própria, e se voltam contra o criador, como o monstro do dr. Frankenstein ou o cyborg de Blade Runner. Desta vez, no entanto, com uma nota distinta: antes, os heróis eram os humanos; agora, não é bem assim. Aquilo que em Matrix era um pesadelo - a rede de computadores a serviço do poder numa sociedade administrada, sem saída - vira um sonho dourado, fluorescente e libertador, mas além dos nossos corpos de hoje. Cameron propõe um Éden de realidade virtual, onde a forma humana já não tem parte com a solução: ela é, antes, um estágio a ser superado, a ser deixado para trás, como aquele pedaço de cauda que o foguete descarta no espaço para seguir seu curso. No Eldorado de Cameron, o que há de mais humano em nós só poderá sobreviver na forma de novos seres, geneticamente modificados, mais aptos do que nós para a felicidade que sempre almejamos e que nunca alcançamos.

Parece discurso religioso - e é. Político e religioso. Avatar vislumbra um reino de amor além da extinção da própria humanidade. O novo sucesso de Hollywood anuncia um futuro pleno - e pós-humano.

Antes, os micróbios da Terra dizimavam os alienígenas (como em A Guerra dos Mundos). Agora, a natureza alienígena, "do bem", é que vai dar cabo dos homens de carne e osso para ver se deles resta algo de bom, mas em novos corpos, corpos mutantes. Certamente alguns dirão que, nessa fábula, a forma humana é apenas uma metáfora para o que temos chamado de ego: ou o sujeito se liberta da tirania do ego, ou ficará escravo, sem conhecer a si mesmo. Mas não é apenas isso. Em seu libelo contra o extrativismo e a ganância, o filme prega um paraíso edificado sobre a ideologia do politicamente correto, um mundo melosamente humano sem humanos, um jardim em que não há formigas, bicho-de-pé, arranha-gato nem gente de carne e osso.

Avatar é o céu das multidões em turbilhão, um altar para as crenças de uma humanidade descrente. É também uma historinha de amor como muitas outras - mas, como um relâmpago, vem fotografar o imaginário do nosso tempo. Quem quiser entender as fantasias políticas que restam a este nosso mundo açoitado por tempestades - fantasias um tanto mágicas, um tanto idílicas, bastante irracionais -, que vá ao cinema. Enquanto chove.

Eugênio Bucci, jornalista, é professor da ECA-USP