segunda-feira, novembro 21, 2011

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE



"Não é marketing, é sobrevivência"

DÉBORA BERGAMASCO 

Marcelo Freixo, deputado, refuta que exílio de 15 dias seja jogada política

Depois de oito ameaças de morte em um único mês e de exílio relâmpago de 15 dias em Madri, Marcelo Freixo, deputado estadual do Rio, conversará hoje com José Mariano Beltrame. Olhos nos olhos, acusará o secretário de Segurança Pública do Rio, hoje no auge de sua popularidade, de ter errado. "Errou e foi desrespeitoso com minha família ao não me chamar para conversar sobre as ameaças que ele sabe serem sérias." Sua queixa é a de que as informações sobre planos da milícia para matá-lo, recebidas via disque-denúncia e Serviço de Inteligência da PM, não foram investigadas.

Para quem não se lembra, Freixo foi fonte de inspiração para a criação do personagem Diogo Fraga, do filme Tropa de Elite 2. De volta ao Brasil desde terça-feira passada, ele conversou com a coluna por telefone. E chamou de "cruel, perverso e covarde" quem classifica sua viagem de reestruturação emocional, por assim dizer, a convite da Anistia Internacional, de jogada de marketing rumo às eleições municipais. O pré-candidato do PSOL à prefeitura do Rio justificou: "Sair deu mais visibilidade? Claro que sim. Mas para as ameaças de morte que sofri". Na Espanha, se sentiu bem ao lado da família andando a pé sem uma escolta, podendo sentar-se em mesas nas calçadas de restaurantes tendo como única nuvem negra, o vento frio do outono europeu.

Como é viver ameaçado de morte?

Quebra completamente a naturalidade da vida. Acaba o improviso e a espontaneidade. Por mais que eu e minha família estejamos sob escolta desde 2008, não nos acostumamos. Nem devemos.

O assassinato da juíza Patrícia Acioli, em agosto, agravou seu medo?

Sim, porque rompeu barreira mudando o quadro. O crime nunca tinha matado pessoas do poder público no Rio por causa do trabalho desempenhado. Ainda mais assim, na porta de casa, com armas e munições do Estado. Ou seja, não foi descuido. E, sim, um recado típico da máfia. Confesso que existia no meu inconsciente, por mais que não tenha me descuidado, a suposição de que eles não seriam capazes de matar. Por causa das consequências. Depois da morte da magistrada, o número de ameaças contra mim aumentou. De outubro até agora foram oito.

O que os levou a romper a barreira?

Eles tomaram um golpe muito grande em 2008, com a abertura da CPI das Milícias e dezenas de prisões. Recuaram. Mas depois não houve o acompanhamento devido das autoridades como a tomada do poder econômico e territorial. Acredito que até esperavam por isso. Em 2008, somavam 170, as áreas de milícia. Agora, são 300. Mesmo presos, eles se sentem fortalecidos.

Como são feitas as ameaças contra o senhor?

Nunca diretas. São informações do disque-denúncia e do Serviço de Inteligência da PM. Tudo em detalhes, com nomes de policiais, onde trabalham, quando e onde os milicianos se reúnem. Ou seja, denúncias que deveriam ser investigadas.

E por que não são?

Nunca tive resposta da Secretaria de Segurança Pública. É como se o problema fosse particular e não fruto do meu trabalho público. A minha queixa é: como a Secretaria me entrega as denúncias mas não me dá satisfações sobre o encaminhamento de investigações? Chegaram a me dizer que eram sigilosas.

Algum palpite para a falta de apuração?

Não quero atribuir isso à questão política. Nem acho que seja. Talvez trate-se de incompetência mesmo. Ou, no fundo, acham que nada vai acontecer comigo, que há outras prioridades. Assim como não investigaram o caso da Patrícia. Ela havia recebido diversos disque-denúncia, que encaminhava ao TJ-RJ. E olha onde ela está.

Já pediu explicação ao secretário de Segurança Pública do Rio?

Tenho uma relação honesta e de respeito com o José Mariano Beltrame. Mas a Secretaria só responde o que eu não questionei. Não adianta eu dizer: "Tem ameaças que não foram investigadas" e eles me responderem "nós garantimos a segurança do deputado". Pô, isso me irrita muito porque é a minha vida.

O Beltrame o procurou?

Não por isso. Sexta (18) haveria uma audiência pública com o secretário na Assembleia Legislativa agendada há muito tempo. Voltei ao Brasil terça (15) e, sem nem saber que eu estava aqui, ele me ligou. Pediu encarecidamente para que a reunião fosse remarcada por causa da retomada da Rocinha - e entendo que isso realmente mude o cenário das agendas. Eu disse que consultaria os colegas e emendei: "Mariano, acho que precisamos conversar, né?". Ele respondeu: "Claro, Freixo, vamos nos falar. Quando você me ligar de volta com a decisão dos deputados, a gente discute sobre sua situação". Retornei, informei do adiamento da audiência e ele remarcou: "Estou te esperando segunda de manhã (hoje) no meu gabinete para conversarmos." Seremos só nós dois em uma conversa franca.

O que pretende falar a ele?

Tudo isso que estou falando para você. Acho que ele errou muito comigo, com minha vida. Foi desrespeitoso com minha família quando não me chamou para conversar sobre ameaças que ele sabe que são sérias. Quero dizer isso fraternalmente. Ele tem que me dar informações sobre as investigações. Quero coisas concretas: prazos para apurações e para prender quem está me ameaçando.

Como foi o período no exterior?

Ótimo. Fiquei com minha família em Madri, cuidamos um do outro. Foi bom lembrar como é ficar sem escolta. Só quem vive isso pode ter a dimensão do que significa andar na rua, pegar metrô. Ir a um restaurante, sentar do lado de fora e a única coisa a incomodar é o frio. A gente ria disso. Foi sensacional, nos fortaleceu.

O que pensa de quem classifica sua viagem como ação de marketing eleitoral?

Foi muito duro pois eu jamais utilizaria algo que mexe com a vida da minha família para fazer marketing. É absolutamente cruel, perverso, covarde.

O que causou estranhamento é que foi um exílio de 15 dias...

Eu nunca aceitei a ideia de "exílio". Nunca disse isso. Saí para ficar um tempo, reequilibrar o emocional e reforçar minha segurança. Sai para dar mais visibilidade? Claro que foi. Mas para a ameaça de morte, e não à minha pessoa. Não é marketing, é sobrevivência. E o debate sobre as milícias só voltou porque aceitei o convite da Anistia Internacional. E é essa exposição que me fará sentar (hoje) com o Mariano para discutir as investigações.

Voltou com projetos?

Sim. Fiz um dia de reunião com eles e faremos uma campanha internacional, começando pela Espanha. Em 2009 já fizemos uma pelo cumprimento do relatório da CPI das Milícias. Circulei por alguns países da Europa explicando como os milicianos agiam. E a Anistia ia distribuindo cartões postais, cartas do mundo inteiro para prefeito, governador, presidente. Dessa vez, eles estão ansiosos para a chegada do filme Tropa de Elite 2.

Como reforçou a segurança?

Trocaram o meu carro blindado por um mais resistente - e, aliás, só tenho um blindado, viu, porque espalharam que eu tinha seis. E aumentou o número de pessoas na escolta. Ah, também falaram que eu tinha 40 policiais me protegendo. Não posso dizer quantos, mas é uma escolta normal. Tenha certeza de que é três vezes menos do que tem o presidente do TRE (Luiz Zveiter).

O senhor é mesmo pré-candidato à prefeitura do Rio?

Sim, meu nome está lá por uma decisão partidária. É legítimo né? Fui o segundo deputado mais votado no Estado. O prefeito tem 18 partidos apoiando. Sobra pouca coisa do lado de cá. Nós não temos dinheiro, estrutura, nem o apoio da Fifa, mas contribuiremos para o debate. No Rio tudo é negociado, virou um grande balcão de negócios. Os serviços públicos são ruins, mas tudo tem ritmo de festa.

O que achou da retomada da Rocinha?

O projeto das UPPs tem méritos indiscutíveis. Mas a verdadeira motivação das Unidades tem que ser dita. O critério não é o da segurança pública e sim um projeto de cidade olímpica. Mas a Secretaria e o governo do Estado não admitem que criaram um "corredor de segurança" na zona hoteleira e de especulações imobiliárias. Veja porque uns lugares são escolhidos para serem mais seguros que outros. Como a Zona Sul. E outra, as UPPs deveriam vir acompanhadas de investimentos sociais, como saneamento, educação e saúde. Em unidades pacificadas há três anos, esses investimentos ainda não aconteceram. A paz não se faz só com polícia. E queremos a polícia nas comunidades. Mas qual? Eu quero uma que passe por reforma: de salário, treinamento e que seja controlada.

Finalizam a CPI das Armas ainda este ano?

Sim, em dezembro. O grande objetivo não é o indiciamento de muita gente, mas uma CPI com propostas concretas para a melhoria da qualidade da fiscalização sobre o comércio de armas.

Pode adiantar alguma conclusão?

Bem, vamos mostrar o quanto não existe articulação entre o Exército e as polícias Federal e Civil no controle do comércio ilegal de armas. Eles dialogam muito pouco e o tráfico desses equipamentos se alimenta dessa fragilidade do Estado. Porque, ao contrário do da droga, que já nasce ilegal, o da armas nasce na fábrica, na indústria e se perde no caminho.

Dois por dois - J. R. GUZZO


REVISTA VEJA

Acaba de ser lançado em São Paulo, com preço a ser tratado reservadamente junto aos corretores, um prédio de apartamentos descrito como de luxo superior, com tudo aquilo que normalmente devem ter os prédios de apartamentos descritos como de luxo superior. Está num dos pontos mais caros de um dos bairros mais caros da cidade. Seus futuros moradores poderão dispor de seis vagas na garagem. Há o closet da senhora e o closet do senhor. Descobrem-se uma sala para motorista, uma adega e espaço para home theater. Brindam-se os possíveis interessados, no anúncio de lançamento, com as assinaturas do arquiteto e da decoradora. Nada de churrasqueira, brinquedoteca e "espaço zen" por aqui; isso é coisa de gente que pode ter ganho algum dinheiro mas não ganhou classe, e deve procurar o que considera "nobre" em outra freguesia. Mais que tudo, porém, o edifício em questão fornece a todos um notável retrato das realidades da vida neste nosso Brasil Potência de 2011 - as realidades como elas são de fato, e não como diz a propaganda, oficial ou privada, segundo a qual estamos a ponto de nos transformar num país rico e, principalmente, num "país de todos". Basta olhar a planta com um pouco mais de cuidado para sair da ilusão e entrar na vida como ela é. Os apartamentos, ali, têm 501 metros quadrados de área privativa. O quarto da empregada tem 4 metros quadrados - e isso no tamanho master, de dois por dois. Há um outro menor, de 2 metros por 1,95 metros.

Eis aí, na aritmética, o Brasilzão como ele sempre foi. Hoje somos capazes de emprestar dinheiro ao FMI. O ex-presidente da República garante que eliminou a pobreza neste país; deixou "só um pouquinho" para a sua sucessora resolver. Segundo ele, estamos a um passo da "perfeição" no sistema público de saúde, entre outros prodígios. O duro, neste Brasil de maravilhas, é continuar sendo empregada - e mais uma infinidade de coisas parecidas. Num dos edifícios mais exclusivos da cidade mais rica do país, a empregada só tem direito àqueles dois por dois de área útil; teria mais espaço morando na garagem. A construtora São José e o arquiteto William Simonato, a incorporadora Yuni, a GTIS Partners e a corretora Lopes, responsáveis pelo projeto, encontraram lugar na planta para uma "prataria", e até mesmo uma chapelaria; mas não julgaram necessário dar mais que 0,8% da superfície habitável para o quarto da doméstica. É o que acontece, nesta e em tantas outras decisões, quando se faz a melancólica viagem do marketing para o mundo real.

É claro que qualquer cidadão tem o direito de comprar um apartamento de luxo, ou dois, ou o prédio inteiro. Só não deve acreditar que vive no Brasil da empregada. Moram sob o mesmo teto, mas continuam separados por um abismo.

Dos tumultos que um grupo de estudantes provocou recentemente na Universidade de São Paulo falou-se bastante; foram apontados, sempre com toda a razão, seu deslumbramento com a desordem, sua confusão mental e sua violência vazia. Nada os absolve, mas também nada há de novidade no que fizeram. Estudantes, de tempos em tempos e pelo mundo afora, têm mesmo esses acessos de excitação, com graus variados de radicalismo. (A turma da USP não chega nem perto, por exemplo, de propor algo parecido à bandeira de um bando ultraextremado do "Maio de 1968" - na França queriam que fosse eliminada a iluminação pública, que a seu ver não passava de um instrumento da burguesia para proteger a propriedade privada durante a noite.) O que mais chama atenção, no caso de São Paulo, é o comportamento de uma parte dos professores. Por medo dos estudantes, ou para aproveitar a oportunidade de fazer cartaz sem correr riscos, ficaram a favor da "ocupação da reitoria" e do movimento para banir a presença da polícia no câmpus.

Não é um papel bonito, mas o que se há de fazer? A vida tem dessas coisas. O problema, na atitude dos professores, é a sua tentativa de justificar-se com raciocínios. O principal deles é especialmente cômico: com a PM no câmpus, alegam, bloqueiam-se a livre produção e a circulação de ideias, fator essencial para a existência de qualquer universidade. Com certeza há hoje em dia uma severa escassez de vida inteligente na USP; o risco de aparecer por ali algo parecido a uma ideia original, ou, uma simples ideia, é remoto. Mas o que a polícia tem a ver com isso? Não é o estado-maior da PM que escolhe os professores, monta os currículos ou dá as aulas. A culpa pela baixa qualidade das ideias está na ignorância, preguiça e falta de talento de quem é pago para tê-las - e só aí.

O substrato da corrupção - REVISTA VEJA


REVISTA VEJA

O patético caso do ministro Carlos Lupi dá à presidente Dilma Rousseff a oportunidade de corrigir uma prática que está na raiz da maioria dos escândalos: o loteamento de cargos com o objetivo de obter apoio ao governo
Daniel Pereira e Paulo Celso Ferreira

Na última quinta-feira, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, foi ao Senado jogar uma cartada decisiva para as pretensões dele de continuar no cargo. Acusado de mentir ao Congresso e acossado por denúncias de cobrança de propina pela cúpula do ministério e de irregularidades na execução de convênios firmados com ONGs, Lupi prometera à presidente Dilma Rousseff, na véspera, rechaçar cabalmente as acusações e provar sua inocência. A audiência seria a redenção do ministro e presidente licenciado do PDT. Seria. Como na semana anterior, quando participou de uma reunião na Câmara, Lupi produziu uma farta quantidade de provas - todas contra si mesmo. Diante dos senadores, o ministro recuou e admitiu ter viajado no King Air providenciado por – como é mesmo o nome? - Adair Meira, dirigente de duas ONGs que têm contratos milionários com o Trabalho. Foi a confirmação da primeira de suas mentiras. O ministro também recuou e admitiu conhecer Adair, um parceiro que, sabe-se agora, chegou a oferecer um jantar em homenagem a Lupi em Goiânia. Jantar na casa do próprio Adair, aquele de quem o ministro não sabia nem o nome nem o endereço. Foi a confirmação da segunda de suas múltiplas mentiras.

Posando no papel de vitima de uma conspiração urdida por adversários. Lupi desferiu mais golpes contra si mesmo. Ao contrário do anunciado na véspera, não apresentou prova de que seu partido pagara os aviões usados na viagem, em dezembro de 2009, pelo Maranhão. Não o fez porque seus correligionários vieram a público para dizer que não pagaram. Sem querer, Lupi ainda abriu brecha para a revelação de que, durante as "atividades partidárias" realizadas no Maranhão, ele recebera cerca de 1 700 reais em diárias pagas pelos contribuintes. "Eu só quero saber do que sou acusado", clamou o ministro, para o espanto da audiência. Coube a um senador do próprio PDT, o novato Pedro Taques, ex-procurador da República, resumir a situação. Diante de sucessivas mentiras. Lupi e o partido não gozavam mais da confiança da sociedade para continuar à frente do ministério, disse Taques. Politicamente, estavam condenados numa sentença justa e inapelável.

Ministro há quatro anos e meio, Lupi tem uma memória privilegiada, segundo seus auxiliares, mas que lhe faltou desde que VEJA começou a revelar, há três semanas, os ilícitos cometidos por pedetistas lotados na cúpula do Trabalho. O ministro só reconheceu ter viajado no King Air depois da divulgação, na segunda-feira passada, de uma foto dele desembarcando do avião. E só reconheceu ter viajado ao lado de - como é mesmo o nome? - Adair Meira após o site de VEJA publicar um vídeo no qual os dois aparecem numa solenidade oficial no município de Grajaú. As fotos e os vídeos o desmascararam. Tomaram-no um espectro sem credibilidade na Esplanada, mas ainda assim ministro. Até o fechamento desta edição, Dilma não havia demitido Lupi - e nem pretendia fazê-la. Uma postura surpreendente, seja pelas sucessivas mentiras do pedetista, seja pelo desempenho dele como gestor. Quando era chefe da Casa Civil, Dilma já não gostava do trabalho de Lupi. Quando assumiu o Planalto, pensou em trocá-lo, mas foi dissuadida por Lula. À frente do governo, tirou poderes dele. como a prerrogativa de negociar com grevistas, e estava decidida a rifá-lo na reforma ministerial, prevista para janeiro.

Depois de demitir cinco ministros acusados de corrupção e tráfico de influência, o natural seria a presidente antecipar o cronograma e exonerar Lupi imediatamente. Mas ela, como o antecessor Lula, decidiu, neste caso, render-se à lógica nefasta da "governabilidade". Render-se ao temor de que a demissão afastaria o PDT da base aliada. A presidente que angariou apoio popular graças à faxina ética preferiu na semana passada, fazer vista grossa à sujeira. Isso. obviamente, tem implicações. Entre elas, suspender a saudável ofensiva, até então em curso, destinada a desmontar máquinas de arrecadação instaladas pelos partidos nos ministérios. Caso do PCdoB no Esporte, do PMDB na Agricultura e no Turismo e do PR nos Transportes (veja o quadro na pág. 76). São essas engrenagens partidárias que servem de dínamo para a corrupção e o desvio de verbas. Com o aval do governo, surrupiam dinheiro de programas sociais e de obras para os cofres dos partidos e os bolsos dos correligionários. Diz o historiador Marco Antonio Villa, professor da Universidade Federal de São Carlos: "O Brasil destoa das grandes democracias mundiais com este presidencialismo de transações que não são nada republicanas".

Desde a redemocratização, na década de 80, vigora no Brasil o chamado governo de coalizão. Funciona assim: o presidente da República de turno, para manter os partidos em sua órbita e receber deles votos favoráveis no Congresso, dá às legendas o controle de cargos importantes da máquina pública. De inicio eram ministérios. Com o decorrer dos anos, a fatura foi se tornando mais salgada. Agora, loteiam-se ministérios, autarquias, fundações e até os 23000 cargos comissionados à disposição do governo federal (veja o quadro na pág. 73). O rateio do butim garante a governabilidade mas, à custa, como mostram os recorrentes casos de corrupção, do suado dinheiro do contribuinte. "É possível governar sem o loteamento de cargos desde que sejam fechadas alianças programáticas", diz Villa. Ou seja: desde que o amálgama da base governista sejam ideias comuns para solucionar os problemas do país. "É preciso extinguir a maioria dos cargos de nomeação política. O Brasil é a única grande democracia a ter essa quantidade exagerada", acrescenta. A proposta é simples. Substituir os apadrinhados por servidores concursados. Trocar o QI - cínica abreviação do igualmente cínico "quem indica" - pela profissionalização e pela meritocracia. Dar uma visão empresarial a um estado tratado como bem privado por determinados setores.

Para o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília (UnB), a reforma ministerial dará à presidente Dilma a possibilidade de romper com o sistema atual, no qual o loteamento de ministérios e de mais de 20000 cargos serve para amarrar os partidos ao governo. Fleischer considera prioritário acabar com a adoção do modelo chamado de porteira fechada, aquele em que o partido comanda todos os postos de uma estrutura administrativa - do titular de um ministério ao degrau mais baixo da hierarquia. Dilma já impediu algumas porteiras fechadas. Previdência e Minas e Energia, por exemplo, têm ministros indicados pelo PMDB, mas secretários executivos escolhidos pela própria presidente. São exceções. Desde junho, Dilma demitiu cinco ministros por irregularidades. Em todos os casos, trocou-os por colegas "" do mesmo partido, que continua indicando desde a secretária que anota recados até o diretor que libera o dinheiro. Para o experiente deputado Miro Teixeira, no décimo mandato como deputado federal, a queda dos ministros não passa de um "jogo de distração", no qual se corta a cabeça dos titulares mas se mantém a estrutura corrompida dos partidos nas pastas. "O ministério fica" com o mesmo partido e acaba por isso mesmo. Há um sistema organizado para roubar o dinheiro público. A presidente tinha de demitir antes de submeter os ministros à fritura e ir a fundo", diz o parlamentar do PDT. Cientes disso, partidos governistas operam para retomar espaços perdidos quando foram alvo da tal faxina ética.

O PMDB emplacou o novo ministro da Agricultura, indicou o sucessor de Pedro Novais no Ministério do Turismo e praticamente todos os demais diretores. O PCdoB ainda trabalha para reorganizar seus camaradas no bombardeado Ministério do Esporte. O PR, que amargou um prolongado período de desgraça nos Transportes, tentou no último mês reconquistar fatias de poder. No fim de outubro, nove deputados da sigla jantaram com o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. Pediram rápida liberação de recursos para obras, mais trânsito no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e ascendência sobre a recém-nomeada diretoria da Valec, a estatal que cuida das ferrovias do país. ""Queríamos saber se o ministro estava ou não estava com a gente", conta o deputado Luciano Castro (PR-RR), anfitrião do jantar. Passos substituiu no ministério o senador Alfredo Nascimento, presidente nacional do PR. Desde a troca de comando, só tirou do partido o controle de uma das superintendências estaduais do Dnit. Os republicanos continuam, portanto, no comando das mesmas repartições denunciadas antes por cobrar propina de empresários. Foram-se os anéis, ficaram os dedos. "Os ministros são cada vez mais desqualificados. Esses postos, que deveriam ser ocupados por estadistas, terminam sendo loteados por aqueles que têm interesses meramente partidários. Isso vem se agravando governo a governo, e não há perspectiva de que possa melhorar", critica o cientista político Octaciano Nogueira, professor da UnB. "Falta dar um sentido ético à política", conclui. É justamente o que esperam os brasileiros - mas, infelizmente, o contrário do que sinaliza o governo com a permanência do patético Carlos Lupi à frente do Ministério do Trabalho.

A corrupção depois da chuva - EUGÊNIO BUCCI


REVISTA ÉPOCA

O combate à corrupção no Brasil é uma questão de ira santa, de saúde civil, de urgência política. Com um detalhe: também é uma questão de meteorologia.

Foi isso que ficou demonstrado no feriado de 15 de novembro. Marcadas para tomar ruas e praças de várias cidades do país no dia da Proclamação da República, as gloriosas passeatas anticorrupção registraram um declínio diluviano em relação às manifestações do feriado do mês anterior, no dia 12 de outubro. É que choveu demais, você sabe. Em Brasília, os manifestantes minguaram de 20 mil para apenas 30 indivíduos. Em São Paulo, de 2 mil para 200. Os organizadores lamentaram as tempestades e prometeram outra jornada de protestos para 9 de dezembro. Tomara que faça sol.

Para comparar: no mesmo feriado, sob as águas impiedosas de São Pedro, dezenas de milhares de fiéis da Assembleia de Deus lotaram dois estádios de futebol para festejar os 100 anos de sua igreja. Uma das celebrações, no estádio do Pacaembu, em São Paulo, contou com 30 mil espectadores nas arquibancadas e com vários políticos sorridentes no gramado, entre eles o ex-governador paulista José Serra, o ministro Gilberto Carvalho e o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Usavam capas de plástico. A fé é impermeável. Quanto à ira santa dos caçadores de corrupto, bem, esta é mais hidrófoba.

Volátil, o recente movimento contra a corrupção repele políticos e partidos. Declaradamente apartidário, tem uma dinâmica um tanto líquida, apesar da hidrofobia. Sua bandeira, não obstante, é sólida: uma vassoura verde e amarela, bem fotogênica, bem televisiva, que faz boa figura nos telejornais. Feita de fibras sintéticas, a vassoura verde e amarela é, evidentemente, à prova d"água – o que não adiantou muito: vassouras prestam bons serviços à dona de casa, mas ainda não substituem guarda-chuvas.

Fora as precipitações pluviométricas, a vassoura na estética política não constitui propriamente uma novidade: ela nos lembra Jânio Quadros, cuja relação com os líquidos era diversa e controversa e cuja relação com a ética pública era estrepitosa, inócua e inconsequente. Tão inócua que, de Brasília, Jânio varreu pouca matéria além de si mesmo. Ele não logrou acabar com a roubalheira, apenas nos legou um folclore divertido e esta metáfora persistente: que a improbidade administrativa é uma sujeira, é algo de imundo, um lixo que precisa de uma boa limpeza em regra, de uma faxina.

Palmas para as vassouras. Palmas para as faxinas. Mas só elas não bastam para combater os corruptos

A metáfora janista é essencialmente moralista. Faz acreditar que o desvio de dinheiro público se deve apenas à falta de caráter dos maus políticos e ponto. Assim mesmo, bem moralista, ela ficou. A vassoura resiste como símbolo dos honestos contra os salteadores dos cofres públicos. Não por acaso, o termo faxina vem servindo para designar as demissões de ministros acusados de falcatruas, demissões que vão se tornando praticamente mensais. Essas duas palavras, vassoura e faxina, encerram a promessa de que a administração pública pode ser higienizada, depurada, numa assepsia que a tornará melhor e mais virtuosa.

Corruptos normalmente são comparados a ratazanas e baratas, que proliferam onde há detritos, podridão e esgotos. São beneficiários e agentes do lixo. Daí que, se a faxina for bem feita, os corruptos, como os ratos, tendem a desaparecer. É essa a fantasia moralista: se varrermos os viciosos das repartições, nada mais de errado será perpetrado contra o povo, pois a eliminação dos criminosos limpará todo o sistema. Nesse ponto, o moralismo pode conduzir às utopias autoritárias. E, aqui, é um perigo.

Não que não seja indispensável punir os ladrões. O problema é que o discurso moralista, sozinho, é simplesmente incapaz de puni-los com eficácia. A indignação moral, que todos sentimos, é um sentimento justo, mas não é um instrumento justo. Nenhum país que combateu a corrupção com algum sucesso ficou apenas no discurso da assepsia moral. Para prender os ladrões e seus corruptores – e para inibir a prática da corrupção –, é preciso aprimorar a lei, acelerar o Judiciário e assegurar a transparência total da máquina pública.

No mais, assim como o vício dos corruptos não explica todo mal, a virtude dos caçadores de corruptos não conduz a todo bem. Moralistas também têm medo de chuva. Portanto, palmas para as vassouras verdes e amarelas, que elas são boas. Palmas para as faxinas. Mas vamos radicalizar – e institucionalizar – o combate à corrupção. Quanto antes.

A Revolução Beltrame na administração pública - FERNANDO ABRUCIO


REVISTA ÉPOCA

A gestão de José Mariano Beltrame na Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro já tem lugar reservado na história da administração pública brasileira. Ela está mudando a realidade de insegurança e abandono estatal que vigorava nas favelas cariocas, um problema local com dimensão nacional que permaneceu sem solução durante décadas, passando por governos de diferentes partidos. Na verdade, a maioria da população não acreditava na recuperação daquelas áreas da cidade, que estariam condenadas ao domínio do tráfico e das milícias. Como foi possível iniciar um processo profundo de mudança numa situação em que o Estado parecia incapaz de ser bem-sucedido? A resposta está nos métodos e meios utilizados, que podem ser disseminados com sucesso por outras políticas públicas.

O primeiro passo da Revolução Beltrame foi acreditar que seria possível implantar uma nova sociabilidade nas favelas do Rio, instalando aquilo que mais falta nas regiões mais pobres do país: o Estado. Não se tratava apenas de prender alguns traficantes ou fazer reformas urbanas que não mudavam a forma de comando do local. O mote era o Poder Público ocupar permanentemente as áreas conflagradas da cidade. Para isso, seria preciso conciliar atividades de repressão com políticas de longo prazo, que melhorassem a vida dos cidadãos de modo a eles terem outro horizonte de vida. Buscava-se, assim, acabar com a dicotomia entre ações de Segurança Pública e políticas sociais, que dominaram perversamente o debate desde a redemocratização.

O que sustentava verdadeiramente tal dicotomia era a fragilidade da ação policial. As polícias civil e militar tinham problemas de capacitação e condições de trabalho, além de uma cultura autoritária no tratamento da sociedade. E pior: parte dos integrantes dessas corporações estava vinculada à corrupção, quando não à própria bandidagem. Para enfrentar essa situação, tem sido utilizada uma estratégia de recuperação incremental da força policial do Rio, usando primeiramente grupos de elite e contratando novos profissionais, para evitar os vícios do sistema. Mas é importante observar que já há medidas tentando reconstruir a motivação geral da tropa, pois não seria possível reconstruir, dos pontos de vista jurídico, financeiro e mesmo político, todo o aparato de segurança de uma só vez. O desafio é mudar os incentivos organizacionais para os que ficarem, supondo, corretamente, que é necessário e viável recuperar boa parte dos policiais.

Os métodos usados na pacificação das favelas podem ser disseminados por outras áreas

Em toda essa ação, fica uma lição importante para a gestão de pessoas no setor público: é preciso ter uma estratégia de começar por nichos de excelência – que quase sempre existem –, depois disseminar o novo paradigma entre os demais e, sobretudo, renovar a burocracia, com concurso e treinamento adequados. Numa polícia com tantos problemas como a do Rio, é possível que esse método leve um tempo para dar certo. Por isso, foi fundamental outra medida: a cooperação com o governo federal, usando suas forças de Segurança. Contribuíram para essa parceria tanto a trajetória de Beltrame – ele é originário da Polícia Federal, e talvez um de seus melhores quadros – como o entrosamento entre o governador Sérgio Cabral e o presidente Lula, agora renovado pela presidente Dilma. É essencial reforçar este argumento: a articulação federativa tem sido a chave para o sucesso de políticas em vários setores.

O uso desses servidores públicos federais se deveu a três de suas qualidades: o poderio de repressão, em termos bélicos ou de efetivo (como no caso do Exército e da Marinha); sua desvinculação dos vícios do sistema de segurança local; e a utilização decisiva de instrumentos de inteligência policial, em particular com a colaboração da Polícia Federal. A junção desses aspectos garantiu uma ação planejada de entrada nas comunidades, usando a força apenas depois de mapear bem a situação – fato incomum no policiamento brasileiro das grandes cidades. Depois, permitiu uma permanência inicial do Estado bastante dissuasiva, algo essencial na tomada de favelas dominadas há décadas. Cabe frisar que houve um aprendizado ao longo do caminho. No início, as Forças Armadas cometeram equívocos em suas ações, pois a segurança de cidadãos é mais complexa que a conquista de territórios. Mas hoje elas estão entendendo melhor o que deve ser uma doutrina de segurança urbana. Além disso, o planejamento estratégico e toda a prática de inteligência policial vêm sendo compartilhados com a burocracia estadual.

A ação repressiva seria inócua se não fosse acompanhada de uma ocupação baseada na provisão de serviços públicos. É isso que torna as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) algo maior que um entreposto policial. Muitas obras feitas nas favelas e equipamentos públicos, antes precários ou inexistentes, começam a ser incorporados à vida da comunidade local. A garantia dos direitos básicos à população mais carente de áreas conflagradas – de paz, educação, saúde etc. – norteia toda a Revolução Beltrame. Se o Estado brasileiro seguir nessa trilha, justificará o custo dos impostos tão criticados pela opinião pública.

É bem verdade que essa segunda perna do modelo ainda precisa ser aperfeiçoada. As intervenções urbanas caminham a passos lentos. Os equipamentos sociais também estão aquém das necessidades. O atraso a tirar, argumentaria o governo do Rio, é grande. Mas a ação policial só dará certo caso a população tenha rápido acesso a serviços públicos, pois é preciso que o Estado se imponha como autoridade num local dominado, por décadas, pelo medo e pela "caridade" dos traficantes (ou milicianos).

As UPPs enfrentam um dos grandes desafios da administração pública brasileira: a montagem de uma ação que envolve vários setores em ação no mesmo território. Obviamente conseguir isso nas favelas cariocas é muito complicado, mas essa mesma tarefa, com graus variados de dificuldade, também aparece nas periferias urbanas do país, seja em São Paulo, seja nas cidades satélites de Brasília ou na área metropolitana de Fortaleza, onde segurança pública, saúde, políticas urbanas e educação devem vir juntas. Em todos esses lugares, o ponto central é como instalar, ao mesmo tempo, o Leviatã e o Estado de Bem-Estar Social.

A Revolução Beltrame certamente está incompleta. O aparato policial do Rio ainda tem partes vinculadas à corrupção, o sistema carcerário do Estado é muito precário e as diferenças sociais entre morro e asfalto continuam abissais. Mas há algo fundamental nesse processo que serve de lição para a administração pública brasileira: a perseverança de fazer o correto. Já houve crises e problemas, só que eles não levaram à descontinuidade, maior característica da gestão pública do país. O secretário Beltrame é capaz de planejar e de corrigir, seguindo em frente, sem desistir. Claro que o apoio político do governador tem sido fundamental – e, a despeito das várias críticas que possam ser feitas às políticas e a determinadas condutas pessoais de Sérgio Cabral, ele está deixando uma bela marca na história do Rio. E aqui fica o ensinamento: como no Plano Real e no Bolsa Família, fortemente criticados no seu nascedouro, a Revolução Beltrame sabe aonde quer chegar e persevera. É isso que tem faltado ao Estado brasileiro.

Deu bode na festa - REVISTA ÉPOCA


REVISTA ÉPOCA

O ministro das Cidades usa o cargo e arranca patrocínio estatal para evento no interior da Bahia que promoveu os interesses políticos de sua família

ISABEL CLEMENTE

As festas do bode fazem parte da tradição do interior nordestino. Em muitas cidades, as comemorações misturam exposições dos caprinos com muita comida, música e concursos entre vaqueiros a pé laçando os animais soltos no mato. A realização de uma dessas festas na semana passada em Paulo Afonso, município no norte da Bahia, mereceu a atenção de um ilustre representante da região, o ministro das Cidades, Mário Negromonte. Os cartazes da 11a Festa do Bode espalhados pelas ruas destacaram o nome e o cargo de Negromonte e do filho, o deputado estadual Mário Filho, ao lado dos logotipos de sete órgãos públicos apresentados como patrocinadores.

A exibição do nome dos dois políticos no cartaz de divulgação de uma festa paga, pelo menos em parte, com verbas oficiais materializa uma situação delicada para um ministro ou um deputado. A legislação brasileira proíbe a promoção pessoal no exercício de cargos públicos (leia o quadro na página 66). Veda também qualquer ato que possa ser caracterizado como campanha eleitoral antecipada. Para entender o exato envolvimento do ministro das Cidades com o bode de Paulo Afonso, é importante reconstituir os antecedentes da festança. O assunto foi tratado publicamente por Negromonte na manhã do dia 22 de outubro, durante a inauguração de uma estação de piscicultura em Paulo Afonso, obra realizada com verbas do Ministério da Pesca e do governo da Bahia. Acompanhado por Mário Filho, pela mulher, Ena Vilma, prefeita de Glória, município a 10 quilômetros de Paulo Afonso, e por vários outros aliados, Negromonte soube na ocasião que seu correligionário Delmiro do Bode, ex-vereador do PP, tinha dificuldades para obter patrocínio para a festa.

Delmiro é cabo eleitoral de Negromonte e responsável pela Coomab, cooperativa que fez a festa. Nos dias anteriores à inauguração da estação de piscicultura, tentava sem sucesso arrancar verbas de órgãos como a BR Distribuidora, o Banco do Nordeste e a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), uma estatal do grupo Eletrobras. Na frente de várias pessoas, Negromonte deu um telefonema para a Chesf e falou com um interlocutor sobre os problemas da festa. À noite, o ministro e Delmiro do Bode estiveram juntos num encontro do PSL em Paulo Afonso. Ele estava acompanhado, mais uma vez, de Mário Filho. Poucos dias depois, a Chesf autorizou a liberação de R$ 70 mil para o evento de Delmiro do Bode.

A boa vontade com a festa de Paulo Afonso é uma novidade na Chesf. A estatal nunca colocara dinheiro na produção anual de Delmiro. A empresa tem critérios para patrocínios predefinidos e registrados no portal oficial. As regras internas impedem contribuições financeiras para "eventos que possam caracterizar promoção pessoal de autoridades". As marcas da BR Distribuidora e do Banco do Nordeste estão no cartaz indevidamente, segundo as assessorias das duas empresas. No caso da distribuidora da Petrobras, o projeto de Delmiro do Bode "não se enquadrava na política de patrocínios".

O Banco do Nordeste também informou que o pedido não cumpria as formalidades exigidas pela instituição. Os outros órgãos citados no cartaz são ligados à Secretaria de Agricultura da Bahia. Disseram a ÉPOCA que entraram com apoio técnico, palestrantes e inspeção dos animais. A homenagem a Negromonte nos cartazes, segundo Delmiro, é uma retribuição a favores prestados pelo ministro. "Ele sempre ajuda com alguma coisinha, mas neste ano nem vi o ministro", diz Delmiro. Não é a primeira vez que Delmiro do Bode põe o nome de Negromonte nos cartazes de suas festas. Ele fez a mesma coisa em 2009, quando Negromonte se preparava para disputar mais um mandato de deputado federal. Não foi repreendido.

ÉPOCA procurou especialistas para ouvir opiniões sobre a exibição do nome de ministros e deputados na propaganda da festa. "Por si só, o cartaz com o nome de uma autoridade associada a alguma realização fere o princípio constitucional da impessoalidade, segundo o qual nenhuma obra ou realização é fruto do esforço de uma pessoa, mas de um governo, uma prefeitura", diz a procuradora da República Janice Ascari, de São Paulo. Ultrapassar a fronteira da "impessoalidade", segundo a procuradora, é um ato de improbidade administrativa, um ilícito sujeito a várias sanções, inclusive perda do cargo. A lei que trata do assunto obriga as autoridades "a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos". O procurador da República Rogério Nascimento, que já atuou pelo Ministério Público Eleitoral, também tem preocupações relacionadas à exposição de nome de políticos em cartazes. "Se adversários se sentirem prejudicados e a situação configurar abuso de poder econômico e político, independentemente de haver improbidade, pode ser um caso de propaganda antecipada para o qual a lei prevê multas", diz Nascimento.

A promoção da imagem de Negromonte em eventos públicos faz parte da estratégia de controle político da região pela família do ministro. Eleito deputado federal pela quinta vez em 2010, Negromonte demonstra interesse em manter sua influência na área para as próximas disputas eleitorais. Além da mulher, Ena Vilma, prefeita de Glória, Negromonte trabalha com afinco para eleger o filho prefeito de Paulo Afonso, maior cidade da região. Isso explica a constante presença de Mário Filho nas aparições públicas dos pais, muitas vezes associadas a verbas federais.

Com mais de 100 mil habitantes, Paulo Afonso é o domicílio eleitoral de Negromonte e o objeto de seu desejo político. A cidade tem hoje como prefeito Hamilton Bastos Pereira (PDT), adversário do ministro. Para divulgar o nome do filho, Negromonte se desloca nos fins de semana para Paulo Afonso, onde faz reuniões políticas e negocia candidaturas para as eleições municipais do ano que vem. Mário Filho circula pela Bahia, a tiracolo do pai, em cerimônias de inauguração de obras e equipamentos comprados com recursos federais. Cercados de aliados, os dois chegam às cidades com estardalhaço até para atos de assinaturas de protocolos de intenção.

Para dar conta das longas distâncias na Bahia, Negromonte viaja em pequenos aviões que, segundo ele, são pagos com dinheiro do próprio bolso. Ele ganha R$ 26.700 brutos e, segundo declarou à Justiça Eleitoral em 2010, tem uma lista de bens avaliados em R$ 975 mil, sem referência a qualquer valor significativo em aplicações financeiras. Nas viagens em que busca apoio para seus planos políticos, Negromonte não impõe um filtro seletivo ao perfil de seus aliados. Foi num desses aviões fretados que ele aterrissou, no início do ano, em Chorrochó, município baiano de 10 mil habitantes, comandado por um amigo enrolado, o prefeito Humberto Gomes Ramos (PP). Ramos chegou a ser afastado da prefeitura por um período, acusado pelo Ministério Público de ter contratado um morto para fazer transporte escolar.

Os adversários de Negromonte acusam sua família de usar obras públicas com fins eleitoreiros, como em Glória, o município de 15 mil habitantes administrado por sua mulher, Ena Vilma. Todas as obras importantes de Glória – uma praça de esportes, a ciclovia e uma pista de Cooper – foram feitas graças a emendas parlamentares que Negromonte propôs como deputado e liberou como ministro. Essas obras estão concentradas no balneário, uma área de lazer à margem de um lago artificial.

Procurado por ÉPOCA, Negromonte disse que telefonou para a Chesf para "dar um testemunho" da importância da Festa do Bode, da qual participa há muitos anos. Afirmou também ter solicitado a análise da pretensão dos organizadores, em tramitação na empresa. Quanto ao nome nos cartazes, disse que foram colocados "sem autorização, sem solicitação e sem conhecimento prévio" do pai e do filho. Segundo Negromonte, a situação não configura promoção pessoal por ter sido uma iniciativa indevida dos responsáveis pela festa. Sobre o uso de avião para a viagem a Chorrochó, o ministro afirmou que a aeronave pertence a um empresário amigo do filho e só pagou pelo combustível.

Negromonte se tornou ministro das Cidades no início do governo da presidente Dilma Rousseff. Entrou no lugar de Márcio Fortes, também filiado ao PP, depois de uma briga interna no partido, que ainda hoje continua rachado. Márcio Fortes não queria sair e tinha a preferência de Dilma, mas Negromonte obteve o apoio da maioria da bancada do PP e atropelou o correligionário. Nos últimos meses, ele entrou na lista dos auxiliares indesejados pela presidente, aqueles que ela prefere ver longe da Esplanada. Por enquanto, a data prevista para a saída de Negromonte é a reforma ministerial, prevista para o início do próximo ano.

Guerra suja - ANCELMO GOIS



O GLOBO - 21/11/11 


Viúvas da ditadura espalham pela internet um texto atribuído a uma jornalista, Miriam Macedo, em que ela diz ter mentido ao afirmar que foi torturada na prisão e atribui a Mário Lago a frase: “Quando sair da cadeia, diga que foi torturado. Sempre.”

Graça Lago, filha do grande compositor, reage indignada com a torpeza: “Meu pai jamais disse algo sequer semelhante.”

Pede para sair
Um sábio do PDT sugere que Lupi saia do governo agora:
— Se sair já, Dilma nomeará alguém do partido. Fez isto com o PCdoB outro dia. Mas na reforma talvez o PDT perca a vaga.
É. Pode ser.

Ferro Ligas
A 3 a- Turma do STJ extinguiu a execução de R$ 250 milhões contra a antiga Companhia Paulista de Ferro Ligas, hoje da Vale. O caso diz respeito a 200 debêntures que teriam sido alugadas pelo empresário Arthur Falk, da Interunion, em liquidação.

Uma chance à paz
A chegada de Zico a Bagdá, onde treina a seleção do Iraque, foi tensa e emocionante. Seu intérprete iraquiano, que estava longe do país há dez anos, chorava ao ver as ruínas da cidade. Nas barreiras, a cada 200 metros, o iraquiano abria a janela do carro, dizia que estava com Zico, e os soldados sorriam.

Direita, volver
Veja a falta de esperança que se abateu sobre a Espanha:
Pesquisa diz que sete de cada dez eleitores do vitorioso Partido Popular não confiam muito no... PP.

No Carnegie Hall
Imagine a emoção. Crianças e adolescentes de baixa renda do Norte do Estado do Rio, da Orquestra Sinfônica Jovem Mariuccia Lacovino, de Campos, vão se apresentar quarta agora no badalado Carnegie Hall, em Nova York. Que honra.

Bebê de proveta
A professora Hildete Pereira de Melo, do Fórum Feminista do Rio, diz que o último censo mostra que “as mulheres não aceitam mais a maternidade como um destino!”. É que, desde os anos 1980, a taxa de fecundidade cai à medida que a escolaridade sobe.

Segue...
Para ela, com a taxa caindo, “a tendência é que a sociedade brasileira pague para as mulheres terem filho. Ou nasceremos de proveta?”

Também...
Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE, completa:
— A evolução da taxa de fecundidade prova que a medida mais importante para o desenvolvimento sustentável é dar a todas as mulheres do planeta acesso ao conhecimento, liberdade sobre suas vidas, corpos e oportunidades.
Eu apoio.
Calma, gente!
O diácono da Paróquia São Paulo Apóstolo, em Copacabana, fez o seguinte comentário em um batismo no sábado:
— Vocês acham que o Nem foi batizado? Ele tem salvação? Pessoas como Nem, Hugo Chávez e Lula será que foram batizadas? Será que podem se salvar?
Meu Deus!

Edifício Glauco
Moradores do Edifício Assuadi, em Copacabana, aprovaram em assembleia a mudança de nome do prédio.
A ideia é homenagear um ilustre morador, o artista plástico Glauco Rodrigues, falecido em 2004. A moção foi aplaudida de pé.

Músicos vetados
A eleição para o Sindicato dos Músicos do Rio, sexta, que reelegeu Déborah Cheyne presidente, não foi tranquila.
Alguns candidatos da oposição, entre eles Ivan Lins e Wagner Tiso, foram excluídos da chapa por decisão da Justiça do Trabalho.

Biblioteca Parque
Adriana Rattes, secretária de Cultura, se reúne quarta agora com moradores da Rocinha.
Até o final de janeiro será inaugurada a Biblioteca Parque da Rocinha.

No mais
Do historiador Marco Antonio Villa:
— Nos tempos bicudos que vivemos, ministro se mantém no cargo não pelas suas realizações, mas pela ausência de denúncias.

O possível - GEORGE VIDOR


O GLOBO - 21/11/11

O Ministério da Fazenda reduziu para 3,8% a previsão de crescimento da economia brasileira este ano, mas a maior parte das projeções no mercado financeiro aponta para um máximo de 3,2%. E no ano que vem para algo entre 3,5% e 4% (ainda há uma minoria otimista, com estimativas próximas a 4,5%). O que manterá a economia acesa serão os investimentos, como os citados abaixo.

Tal ritmo de crescimento, moderado, permite que o país consiga ganhar fôlego para treinar pessoal e reforçar sua infraestrutura, dois gargalos que impedem hoje o Brasil de caminhar mais rápido.

A moderação hoje é desejável porque evita que a inflação se mantenha acima da meta de 4,5% ao ano. Mas o ideal é que a economia brasileira reúna as condições para voltar a crescer na faixa de 4,5% a 5% ao ano, que é o ritmo capaz de nos conduzir ao patamar de um país avançado na próxima década.

Ao longo de 2012, possivelmente ainda no primeiro trimestre, começarão as obras de ampliação dos pátios e do cais de movimentação de contêineres do grupo Libra no Porto do Rio. A Multiterminais, vizinha e concorrente da Libra, também fará uma expansão. Quando as obras estiverem concluídas, o Porto do Rio terá o maior cais contínuo para atracação de grandes navios porta-contêineres.

As obras da Libra estão à espera da licença de instalação do órgão ambiental estadual (Inea), que vêm andando dentro do prazo. Mas é preciso correr contra o tempo, pois a ocupação dos pátios do terminal chega a beirar os 100% em alguns momentos.

Nessa corrida, a Libra está reforçando o piso dos pátios atuais para que, em vez de cinco, possam ser empilhados até sete contêineres. Quatro pórticos encomendados de uma empresa chinesa começarão a ser entregues agora em dezembro. São equipamentos gigantes que se movimentam sobre rodas, bem mais ágeis do que as atuais empilhadeiras (às vezes, é preciso retirar um contêiner que está na base na fileira, e hoje são feitos até 30 diferentes movimentos, consumindo tempo, espaço e combustível). Os pórticos são energeticamente mais eficientes, pois a força de descida é em parte reaproveitada nas subidas dos contêineres.

Para ampliação do pátio de contêineres será aterrada uma área que fica na parte interior do cais já existente. Para tal será usada areia da própria Baía de Guanabara, retirada da dragagem que a Petrobras vem patrocinando em torno da Ilha do Fundão. A ampliação do cais e o aterro, curiosamente, contribuirão para um pequeno aumento na velocidade das águas que passam por esse trecho da Baía.

O aumento da capacidade de movimentação do porto terá de ser acompanhado por novos acessos. As empresas sugerem a criação de um pátio de espera de caminhões, fora do porto, num terreno da prefeitura usado somente em parte pela Comlurb, empresa de limpeza urbana. Em março, o estaleiro Inhaúma, vizinho ao porto, no Caju, começará a funcionar, construindo plataformas para a Petrobras. Se os caminhões continuarem estacionando pelas ruas do bairro, causarão um tremendo tumulto.

A Abdan (Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares), entidade que reúne 40 empresas ligadas ao setor no Brasil, editou um pequeno livro com um balanço da situação das usinas nucleares no mundo após o acidente de Fukushima, no Japão. O relatório, que contou com apoio da Eletronuclear, conclui que não foram interrompidas as obras de 65 usinas em construção. No Brasil, a Eletronuclear espera pôr Angra 3 em operação até 2015.

A Alemanha foi o país que mais reagiu ao acidente, antecipando a data de desligamento das usinas que se aproximam do fim da vida útil. No entanto, essa decisão - que muitos especialistas ainda duvidam sobre se efetivamente ocorrerá - deu impulso a outros projetos que estavam em gestação no Leste da Europa.

A Alemanha era exportadora de energia elétrica e passará a importadora. O carvão contribui com mais de 50% da geração de eletricidade, seguido pelas usinas nucleares (25%). A participação do gás natural é de 12% e da energia eólica (ventos), 6%.

Polônia e os países bálticos consorciados avaliam a construção de usinas nucleares para vender energia à Alemanha, assim como a Eslováquia.

A propósito, as obras de Angra 3 vão de vento em popa: este mês foi atingida a marca de 50 mil metros cúbicos de concreto (a construção do estádio do Maracanã consumiu 80 mil metros cúbicos), o que equivaleria a um prédio de 160 andares com pavimentos de mil metros quadrados.

Além do concreto, que é a última barreira de contenção da usina, está sendo fixada a penúltima, totalmente de aço.

Luiz Affonso Romano e Paulo Jacobsen, ambos especialistas em consultoria desde 1971, fizeram um estudo para traçar o perfil dos consultores no Brasil. Resultado: cada vez mais do sexo feminino, têm mais de 30 e menos de 40 anos, trabalham em equipes autônomas, vêm predominantemente da área de administração e dedicam a maior parte de seu tempo a resolver problemas de gestão, planejamento estratégico, treinamento e desenvolvimento de pessoas.

Entretanto, lamentavelmente, segundo Romano, também nessa pesquisa a inovação não surgiu como área importante. "Nem a novidade mercadológica nem a tecnológica apareceram como preocupação relevante no dia a dia desse consultor por nós observado. Na verdade, parece até que nós ficamos mesmo é a esperar as novidades que vêm de fora, do estrangeiro ou, pior ainda, achando que tal iniciativa caberia aos órgãos e instituições governamentais, de ensino ou não - tipo Fiocruz e Embrapa - que embora exitosas no que vêm fazendo não preenchem, minimamente, os requisitos e necessidades de uma economia cada vez mais global e competitiva.", diz Romano.

O Golfo do México é aqui? - ANTONIO PENTEADO MENDONÇA


O ESTADÃO - 21/11/11


Como de costume, empresa responsável por vazamento de óleo na Bacia de Campos tenta minimizar a gravidade da situação para se eximir de responsabilidades


Sem muito barulho, ao contrário do que aconteceu quando do acidente no Golfo do México, o Brasil é palco de um acidente ecológico de proporções ainda desconhecidas. Como costuma acontecer nestas situações, a empresa responsável tentou esconder os fatos, gerando profundas divergências entre suas informações, as informações da Marinha brasileira e as fotos da Nasa.

A única certeza é que a Marinha e a Nasa devem estar mais próximas da verdade e o vazamento de petróleo na Bacia de Campos é maior do que se pensou no primeiro momento. A empresa Chevron, responsável pelo poço onde aconteceu o vazamento, está tentando minimizar sua responsabilidade pelos danos.

Nada que a imensa maioria das empresas não tente fazer quando se defronta com a possibilidade de um prejuízo de vulto, como costumam ser os custos e multas decorrentes de acidentes desta natureza.

Pelas características e tipicidades da exploração de petróleo no litoral brasileiro e no Golfo do México, os dois eventos, ainda que tendo em comum serem vazamentos submarinos, têm consequências diferentes e causam danos diferentes.

Mas isso não quer dizer que os danos brasileiros não possam ser vultosos, mesmo que não matando nenhum ser humano ou a mancha de óleo não atingindo a costa.

As águas onde ocorre a exploração de petróleo no Atlântico brasileiro são ricas em vida marinha e importante rota migratória para uma série de espécies de animais de todos os tipos. Dimensionar o impacto deste vazamento é tarefa complexa e que não deve ser feita rapidamente.

Em primeiro lugar é necessário dimensionar o tamanho do vazamento; em segundo, quantificar os custos com o combate à propagação da mancha de óleo e sua limpeza; e, finalmente, o impacto econômico sobre a flora e a fauna atingidas pela poluição da água.

Os prejuízos decorrentes do acidente no Golfo do México ameaçaram a saúde da financeira da BP, uma das maiores petrolíferas do mundo - o prejuízo ficou próximo de US$ 30 bilhões. Qual será o prejuízo da Chevron? Ainda é cedo para uma estimativa mais exata, mas já é possível quantificar os gastos iniciais com as medidas para estancar o vazamento e conter a mancha que se espalhou pelo oceano.

A Chevron até agora não disse muito bem o que aconteceu nem assumiu uma postura firme no sentido de colaborar com as autoridades brasileiras. Pelo contrário: ao que parece, a empresa tenta até se furtar da responsabilidade mais comezinha, qual seja, ser a responsável pela perfuração do poço onde se deu o acidente.

Será que sua atitude, oposta à da BP no Golfo do México, é porque o acidente aconteceu no Brasil e para ela o Brasil deve ser tratado como a Nigéria, onde vazamentos imensos contaminam o litoral do país há décadas? Mas o acidente levanta outra questão.

Será que a Chevron tem apólice de seguro com garantias e capitais suficientes para fazer frente aos prejuízos gerados por uma cidente desta natureza?Indo além: será que a Petrobrás tem uma apólice nestas condições? Ou, ficando no básico, será que o governo brasileiro coloca nos editais de concessão das áreas a exigência da apresentação de seguros compatíveis com os riscos da prospecção e exploração de petróleo no oceano? Se sim, será que a ANP confere estas apólices? São perguntas para as quais eu não tenho as respostas. Mas são perguntas que ganham relevância quando nos lembramos que estamos no limiar de um novo patamar na exploração de petróleo no País, ou seja, a exploração, inédita no mundo, do petróleo no pré-sal.

Como este acidente mostra, vazamentos podem acontecer em todos os mares, tanto faz sob a responsabilidade de que nação, inclusive a brasileira.

É indispensável que o Brasil tenha isso em mente e tome as medidas para minimizar as possibilidades de sua ocorrência, bem como para garantir os recursos indispensáveis para fazer frente a todos os custos direta ou indiretamente envolvidos, caso um vazamento de grandes proporções aconteça em nossas águas.

A democracia e a economia - RENATO JANINE RIBEIRO


Valor Econômico - 21/11/2011

Em nosso tempo, nada rivaliza com a economia, em termos de poder. Menos de dois séculos atrás, Karl Marx chocava o mundo ao dizer que a política (estou simplificando) seguia a economia. Faz cinquenta anos, a direita usava argumentos religiosos, espirituais, morais para enfrentar o "materialismo ateu", que reduzia a riqueza do ser humano, criado à imagem de Deus, à vulgaridade econômica. Mas como bem disse, embora grosseiramente, James Carville, o marqueteiro de Bill Clinton que foi decisivo para elegê-lo presidente dos Estados Unidos: "O que conta é a economia, seu estúpido".

Esse fato tem vários desdobramentos. O primeiro fortalece a democracia. Acabou, quase por completo, pelo menos nos países em que há comunicação de massas, a ideia de que os pobres acatariam sua condição porque Deus assim o quis. Uma notável peça de Pedro Calderón de la Barca, "O grande teatro do mundo", sustentava, na década de 1630, que cada um deveria contentar-se com sua condição social, do miserável até o monarca, e cumprir o seu papel (daí, a referência ao teatro) adequadamente. Hoje, nem pensar. Em nossa sociedade, todos querem viver melhor. Mesmo quem está no topo da escala social e poderia nada almejar a mais, continua desejando subir. Quanto aos mais pobres, nenhum argumento religioso os convencerá de que devem suportar sua situação, digamos, cristãmente. Um arcebispo de Diamantina, líder da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, disse certa vez que precisa haver pobres, e mesmo muito pobres - porque, se não houver, como os ricos conseguirão ir para o céu, não podendo exercer a virtude da caridade? Admirável essa preocupação de salvar os ricos no Além, ainda que às custas dos pobres aqui e agora. Mas acabou. Ninguém mais diria essa tolice, hoje.

Portanto, os pobres querem, dos governos, que os ajudem a melhorar de vida e a deixar a pobreza. A classe média quer subir na vida e os ricos, pouco numerosos mas com bala na agulha, também. Isso faz que, em países como o nosso, a grande maioria de pobres tenha bem claro o que deseja da democracia: que ela seja social, isto é, que não fique só na política, mas mexa também na estratificação da sociedade, tornando-a mais justa. Esse fator, fortemente democrático, está ligado ao primado da economia em nossos tempos.

Mas há outro lado, que é pouco democrático. Porque quem entende da economia? Bem poucos. O sufrágio universal se impôs. Os eleitores têm cada vez mais consciência do que desejam e querem. Mas o instrumento para realizar essa prosperidade crescente, ou pelo menos para acabar com a miséria, reduzir a pobreza e baixar a desigualdade, é arcano - isto é, de difícil compreensão. Em outras palavras: está numa ciência (ainda que não exata), cujo domínio exige especialização e conhecimento profundo. Daí que as eleições tenham alcance limitado. Isso porque, entre o dia da eleição, que é quando se manifesta a democracia, isto é, a soberania popular, e os quatro anos de gestão dos negócios públicos, onde a economia prevalece, há uma distância - e mesmo um abismo.

Tudo isso, tanto o aspecto democrático que consiste num povo que não aceita mais a pobreza como natural ou santa, quanto o lado pouco democrático de uma gestão das coisas cuja compreensão escapa à esmagadora maioria, traz consequências para as democracias. Primeira e óbvia: nunca se promete uma recessão, um empobrecimento. O que se oferece é o contrário. Vejam a Califórnia, tema de reportagem de novembro na "Vanity Fair", acessível na Internet: o Estado quebrou, vários municípios ricos quebraram, sobretudo porque uma emenda constitucional de perfil conservador exige dois terços do Legislativo para aumentar qualquer imposto. Kaputt. É um caso extremo, mas que mostra que políticos, quando concorrem a uma eleição, têm de omitir o que vão fazer, ou mesmo mentir. De onde José Serra tiraria os aumentos que prometeu, no mês final antes da eleição de 2010, para o salário mínimo e a bolsa-família? Não o acuso; apenas digo que nenhum político pode agir de outro modo. Vão prometer. Então, a emancipação do povo, que consiste em ele não acatar mais a pobreza, vem junto com sua infantilização: ao povo, não se conta a verdade.

Daí, outra consequência: o primeiro ano de governo é de cortes e talvez de recessão. Já o ano da eleição tem que ser próspero, custe o que custar. Os economistas ficam de cabelos em pé ao verem isso, claro. Mas, por outro lado, suas receitas só eles entendem. Pouca gente mais. Alguém acredita que FHC entenda profundamente de economia? Ele conhece finamente a sociedade, seus processos e sua política. Emprestou sua competência para viabilizar o Plano Real, e com ele ganhou dois mandatos presidenciais. Mas a economia tem segredos. Por isso, quem entende dela - ou quem convence os outros que entende dela - tem acesso direto aos governantes.

E aqui vem nosso último problema. Quase todo o receituário dos economistas, salvo os keynesianos e os (poucos) marxistas, é conservador. Propõe corte de gastos públicos, redução de direitos sociais, até mini-recessões. Não há como defender isso junto ao povo, seja este grego, italiano ou brasileiro. Há alternativas? Claro que sim. A Argentina renasceu sem esse receituário. O Brasil superou 2008 sem essas receitas. A Islândia se recusou a cumpri-las. Claro que, em outros casos, o caminho será outro. Mas geralmente só se diz a receita quase única, aquela que nunca passaria numa eleição. Daí que, se a democracia exige uma economia em crescente prosperidade, a atuação dos economistas nem sempre seja muito democrática.

GOSTOSA


O gás da Petrobrás e a política - JOSÉ GOLDENBERG


O Estado de S. Paulo - 21/11/2011


Combustíveis fósseis - carvão mineral, petróleo e gás natural - são responsáveis por mais de 80% da energia que é consumida no mundo. O seu uso permite que parcela importante da humanidade tenha um nível de vida sem precedentes na História: mais de 2 bilhões de pessoas, um terço de toda a população da Terra, que vive na Europa, na América do Norte, no Japão e nas grandes cidades dos chamados países em desenvolvimento.

Infelizmente, o uso em larga escala, e muitas vezes predatória, desses combustíveis deu origem a problemas que teremos de resolver nas próximas décadas, alguns dos quais parecem insolúveis: em muitos países, as reservas estão se esgotando, tornando o acesso a eles cada vez mais difícil e dando origem a conflitos regionais, até guerras. Além disso, no seu conjunto, esses combustíveis são a principal causa dos problemas ambientais que afligem a população, que vão desde a má qualidade do ar nas grandes cidades até o aquecimento global do planeta.

Dentre todos os combustíveis fósseis, o gás natural é o mais atraente, porque não contém impurezas, como o petróleo e o carvão, pode ser transportado facilmente e usado com melhor eficiência do que os outros. Não é por outra razão que boa parte da eletricidade gerada na Europa provém do gás importado da Rússia.

Ainda assim, as reservas de gás no mundo não são inesgotáveis e devem ser usadas com sabedoria. Sobretudo quando existem alternativas para o seu uso.

Em muitos países, como o Brasil, só para dar um exemplo, a eletricidade pode ser produzida por usinas hidrelétricas. Nesses casos, o gás deve ser reservado para fins mais nobres na indústria e para uso residencial.

Há exemplos de sucesso dessa estratégia, sobretudo no Estado de São Paulo, onde a rede de distribuição de gás aumentou muito nos últimos 25 anos para atender aos consumidores e ao setor produtivo. Alguns setores industriais que substituíram óleo combustível por gás natural, como o de cerâmica, se beneficiaram com a utilização de tecnologias melhores, que valorizaram os seus produtos e, acima de tudo, são mais limpas do ponto de vista ambiental, dessa forma, por conseguinte, beneficiando toda a população nas localidades onde estão instaladas.

A Petrobrás, no passado, nunca teve muita simpatia pelo uso de gás, que era obtido juntamente com o petróleo dos poços que perfurava e durante anos era queimado nas plataformas de exploração flared. O governo paulista teve de lutar muito na década de 1980 para que fosse construído o gasoduto Rio-São Paulo, que permitiu à Companhia de Gás de São Paulo (Comgás) ampliar a sua rede de distribuição. A situação só melhorou com a construção do gasoduto Brasil-Bolívia.

Mas agora a Petrobrás parece ter acordado para a importância do gás na matriz energética nacional. E passou ela mesma a utilizar parte do gás que produz para a geração de eletricidade em usinas termoelétricas. Além disso, o setor privado tem demonstrado grande interesse por essa opção, uma vez que gerar eletricidade usando gás é eficiente e as usinas podem ser construídas rapidamente.

A forma como a Empresa de Planejamento Energético (EPE) promove os seus leilões para aumentar a geração de eletricidade levou, contudo, a uma confusão nesse setor.

Nos leilões previstos para dezembro, todas as opções de geração são misturadas (usinas hidrelétricas novas e ampliação das antigas, pequenas centrais hidrelétricas, energia eólica e de bagaço de cana-de-açúcar). O governo não pode ficar impassível diante de "modismos" nesse setor: usinas usando gás não podem ser construídas em qualquer lugar, mas dentro de um plano de distribuição de energia que otimize o sistema.

Não é o que está acontecendo. Foram propostos no leilão 34 projetos (22 dos quais no Norte e no Nordeste) usando gás que gerariam 13 milhões de quilowatts (correspondentes a uma usina de Itaipu), 2 milhões de quilowatts com hidrelétricas e apenas 700 mil quilowatts com bagaço de cana. Estas últimas são energias renováveis e não poluentes, que é a direção que devemos seguir. Caso contrário nos tornaremos prisioneiros de um combustível como o gás, que é melhor do que o carvão e o óleo combustível, mas, ainda assim, fóssil - ou seja, não vai durar para sempre. O que se poderia também perguntar é se a instalação de 22 usinas a gás no Norte/Nordeste, onde o consumo de eletricidade é baixo, é de fato a solução mais racional.

A "corrida" para instalar usinas a gás já está criando problemas para a própria Petrobrás, que não consegue garantir esse combustível para todas as propostas, localizadas em 11 Estados, que exigiriam 64 milhões de metros cúbicos por dia, se fossem todas instaladas. No mercado atual só estão disponíveis 43 milhões de metros cúbicos de gás por dia.

Existe, portanto, um evidente descompasso entre a quantidade de gás que a Petrobrás pode oferecer e a demanda que resulta do processo inadequado de leilões da Empresa de Planejamento Energético - o que evidencia a total falta de entrosamento entre dois setores críticos da área energética do governo federal.

O leilão previsto para dezembro está encontrando também outras dificuldades, pelo fato de que as hidrelétricas propostas ainda não receberam licença ambiental e, portanto, dele não poderão participar.

Diante desses problemas, seria oportuna a convocação do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), órgão de assessoramento da Presidência da República, no qual têm assento um representante dos Estados e especialistas independentes em energia. O CNPE teve no passado importante papel na definição dos rumos da política energética do País, sendo um foro privilegiado em que pressões corporativistas podem ser mais bem equacionadas.

Miopias - ANTÔNIO GÓIS


FOLHA DE SP - 21/11/11

RIO DE JANEIRO - "Dono de uma das piores distribuições de renda do mundo, o Brasil, mesmo sendo uma das dez maiores economias industriais, ocupa a sofrível 73ª posição no ranking mundial do IDH."Assim começa estudo de 2002 da Secretaria Municipal do Trabalho de São Paulo. A prefeita era Marta Suplicy e o secretário, Marcio Pochmann, hoje presidente do Ipea.
Neste mês, a ONU divulgou novo índice de Desenvolvimento Humano, com o Brasil em 84º lugar (a ampliação do número de países e as mudanças metodológicas não permitem comparação com 2002).
O ex-presidente Lula não gostou e, tal como faziam tucanos no passado, cobrou reação do governo. O Ipea divulgou nota criticando o índice.
O IDH, porém, não é um bom instrumento para avaliar governos, pois variáveis como expectativa de vida e escolaridade média variam pouco de um ano para outro. Elas refletem muito mais erros e acertos do passado do que políticas do presente.
Mas, todo ano, o índice da ONU é usado para julgamentos de curto prazo, forçando os dados na direção de convicções ideológicas.
Um estudo de Michael Traugott, da Universidade de Michigan, ajuda a entender o comportamento. Ele investigou como os americanos interpretavam resultados de pesquisas em temas polêmicos.
Traugott apresentou aos entrevistados duas pesquisas fictícias. Uma tinha o nome de um instituto respeitado, e a outra era de uma empresa desconhecida, financiada por alguma organização com interesses no tema investigado.
A conclusão foi que pouco importava a credibilidade do instituto. Se o resultado combinava com a opinião pessoal, as pessoas acreditavam. Se contrariava, desconfiavam.
Como escreveu Drummond, a verdade é sempre vítima de nossos caprichos, ilusões e miopias.

'Não tem nada de mais' - a série - CARLOS ALBERTO SARDENBERG


O ESTADÃO - 21/11/11

E segue a nossa série "não tem nada de mais",feita com a colaboração das autoridades quando explicam algumas situações, digamos, embaraçosas. E vamos falar francamente: há boas mentiras, histórias bem contadas, que ficam de pé por muito tempo. Há também mentiras inocentes, daquelas que todo mundo sabe, mas deixa passar. Não é o caso das versões contadas pelo ministro do Trabalho, Carlos Lupi.

Reparem: não é que ele se esqueceu do nome e do jeitão de um eleitor qualquer, desses com os quais as autoridades vivem topando por aí, apesar dos seguranças. Ele não se lembrou de ter viajado num jatinho com o diretor de uma organização não governamental (ONG) que tem contratos com o seu ministério, nem se lembrou de ter jantado na casa do empresário.

Como não se lembrava, negou. Confrontado com fotos e vídeos, além das declarações do diretor da ONG dizendo que serviu a janta para o ministro pessoalmente, Lupi caiu em si. "É mesmo!" - deve ter comentado - "agora me lembro."

Então o ministro havia mentido na primeira versão?

De jeito nenhum, ele simples-mente não tem "memória absoluta", contestou, não num bate-papo de bar, mas numa reunião oficial no Senado.

Qual é o problema? Político se encontra com tanta gente, frequenta tantos almoços e jantares que é impossível lembrar tudo assim, de memória, explicou Lupi.

E o jatinho? Ora, ministro de Estado está toda hora viajando de jatinhos e jatões, como é que pode se lembrar em qual voou tanto tempo atrás? Mais impossível ainda é lembrar quem era o dono do jatinho ou quem pagou a viagem. Isso lá é atribuição de ministro? - argumentou Lupi.

Vamos supor, portanto, que tenha ocorrido uma enorme coincidência. O ministro precisou de um avião confortável e um assessor desavisado providenciou o aparelho logo com um empresário conhecido e que tem negócios com o ministério.

Não haveria aí um problema ético?Não gera a suspeita de troca de favores?

Só na cabeça da mídia e da oposição. Como se pode pensar nisso - segue a argumentação do ministro -, se ele nem sabia de quem era o avião ou quem estava pagando o aluguel do jatinho?

Reparem: se essa tese, digamos, faz algum sentido, então qualquer autoridade pode apanhar caro na no avião de um traficante. Não teria nada demais,se a autoridade não soubesse quem estava patrocinando sua viagem.

Fico imaginando: o assessor diz ao ministro "arrumei um avião, excelência, o problema é que pertence ao...". E o ministro adverte: "Não me diga nada, quer me comprometer?".

Resumindo, pois: o ministro agora sabe que viajou num jatinho providenciado pelo diretor da ONG que tinha interesse concreto em decisões tomadas por ele, ministro. Mas, como ele não sabia na ocasião, não tem nada de mais. Também não tem nada de mais ele ter apresentado duas versões, porque a primeira fora uma traição da memória.

O problema é que o Código de Conduta da Alta Administração Federal diz, em seu artigo 7.º: "A autoridade pública não poderá receber (...) transporte, hospedagem ou quaisquer favores de particulares de forma a permitir situação que possa gerar dúvida sobre a sua probidade ou honorabilidade".

Ressalva e explica o parágrafo único desse artigo: "É permitida a participação em seminários, congressos e eventos semelhantes, desde que tornada pública eventual remuneração, bem como o pagamento das despesas de viagem pelo promotor do evento,o qual não poderá ter interesse em decisão a ser tomada pela autoridade".

Ou seja, não apenas a autoridade tem de saber quem patrocina sua viagem e sua boca-livre. Todo mundo precisa saber. E se a coisa toda puder gerar alguma suspeita de favorecimento, então não pode fazer.

Poderia uma autoridade alegar que não sabia dessa regra?

Claro que não, no entanto Lupi já deu um drible na Comissão de Ética da Presidência. Informado de que não poderia ser, ao mesmo tempo, ministro de Estado e presidente do Partido Democrático Trabalhista (PDT), depois de ter reclamado muito Lupi se licenciou do cargo no partido. De araque. Todo mundo sabe que ele continuou co-mandando o PDT. Aliás, na tal viagem, ele estava justamente num trabalho partidário. Tanto que já disse que vai devolver a diária de ministro.

Assim, viajou na condição de ministro de Estado no avião providenciado pelo diretor da ONG contratada pelo ministério, fez campanha partidária e ainda cobrou diária do bolso dos contribuintes. Não tem nada de mais. Devolve o dinheiro e o resto se esquece, certo?

O ministro ainda perguntou: estão me acusando de quê?

Presentinho? O Código de Conduta da Alta Administração ainda esclarece: "É vedada à autoridade pública a aceitação de presentes, salvo de autoridades estrangeiras nos casos protocolar e sem que houver reciprocidade". Agora, presentinhos pode, desde que "distribuídos por entidades de qualquer natureza a título de cortesia, propaganda, divulgação habitual ou por ocasião de eventos especiais ou datas comemorativas, não ultra-passem o valor de R$ 100 (cem reais)".

Quem sabe o aluguel do jatinho saiu por uns R$ 99,99?

Uma longa batalha pela estabilização - LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS


Valor Econômico - 21/11/2011

A crise de confiança na capacidade dos governos europeus de colocarem suas finanças em ordem chegou agora à Itália. Como na teoria do dominó usada para justificar a Guerra do Vietnã, o mercado financeiro avalia que se ela não conseguir apresentar rapidamente um programa crível de redução de seu endividamento, o próximo dominó a ser ameaçado pela especulação será a França. E se isso acontecer, a crise na região do euro tomará outra dimensão.

Nas últimas semanas o analista vive uma verdadeira lição on line de como economia e política se integram nas democracias de massa modernas. A solução da crise europeia hoje passa necessariamente pelo enfrentamento simultâneo de dois grandes desafios:

1 - na chamada zona do euro, estabilizar - via medidas de ajuda financeira - os mercados de títulos de dívida de vários países e introduzir reformas necessárias para corrigir as falhas institucionais já identificadas para a estabilidade da moeda comum;

Ajuste fiscal duríssimo é, hoje, um dos dois desafios que a Europa precisa enfrentar para superar a crise

2 - nos países mais endividados, a implantação de um duríssimo programa de ajuste fiscal para restabelecer a credibilidade dos mercados em sua capacidade de honrar seus compromissos financeiros. Mas para que esse ajuste fiscal seja possível, será necessário também um choque de eficiência nos sistemas produtivos para aproximá-los da competitividade da Alemanha.

Esses desafios são imensos e de difícil superação dada principalmente à diversidade dos ambientes, econômicos e políticos, nos países da zona do euro. Até agora - em dezembro comemoram-se os vinte anos do acordo de Maastricht - o crescimento econômico funcionou como um poderoso cimento que permitiu a estabilidade desse complexo arranjo político/econômico. Mas nos próximos anos serão as dificuldades, e muito sofrimento, o ponto comum nessa complexa comunidade de nações.

E sabemos, pela experiência do passado, que dificuldades e sofrimentos não servem para esse papel de aglutinadores entre sociedades tão diferentes.

Por isso será necessário buscar outros elementos de união para que a zona do euro consiga enfrentar os desafios de hoje.

Essa busca está sendo tentada pela desarvorada classe política na Europa sem muito sucesso. Na minha avaliação, algumas vitórias obtidas em alguns países começam a construir um roteiro possível para ao menos estabilizar a crise. Quais foram elas?

Em primeiro lugar a Europa caminha na direção de uma maior estabilidade política por meio de eleições que legitimem novos governos comprometidos com os ajustes necessários para sua permanência na zona do euro. Foi o caso da Irlanda, de Portugal e, no fim de semana passado, da Espanha. Em outros países, como a Grécia e a Itália, a busca dessa legitimidade passou primeiro por um governo de tecnocratas para lidar com questões emergenciais e preparar eleições gerais mais à frente. Na Alemanha, depois de um período claudicante, a chanceler Angela Merkel parece ter conseguido unir os partidos que sustentam seu governo no objetivo comum de manter e reformar a zona do euro. Ela aparece hoje como a grande liderança da Europa.

Apenas a França, sob o comando frágil e confuso de seu presidente, terá que esperar pelas eleições de 2012 para ter um governo forte e com mandato claro para enfrentar os desafios dos próximos anos. Mas a França é um dos países mais comprometidos com o projeto da Europa Unida e a oposição socialista - que as pesquisas mostram como o mais provável vencedor das eleições do ano próximo - é totalmente comprometida com esse projeto.

Mas os realistas sabem que a classe política tem a tendência de postergar as decisões mais impopulares e acomodar-se a melhoras circunstanciais. Para enfrentar essa armadilha é que estamos vivendo uma situação inusitada e perigosa, com os mercados sendo o instrumento principal de pressão sobre os Piigs para caminhar na direção do ajuste. Os especuladores, estimulados pelo desencontro dos governos na busca de uma solução definitiva, aumentam suas apostas no colapso do euro e forçam os preços dos títulos soberanos para baixo nos mercados europeus. Preços menores correspondem a taxas de juros mais elevadas, aumentando o custo da rolagem das dívidas nacionais e pressionando ainda mais o déficit fiscal das economias endividadas.

Com isso forçam os políticos, e mesmo a sociedade como um todo, a aceitar os ajustes necessários, pois a permanência na zona do euro ainda é o desejo da maioria dos cidadãos. Nesse perigoso jogo de gato e rato, o Banco Central Europeu é peça fundamental ao entrar no mercado comprando os papéis submetidos à especulação sempre que os preços caem abaixo de um nível considerado pelos mercados como de ruptura. Nos títulos de dez anos da Itália esse limite tem sido um juro equivalente a 7% ao ano.

O instrumento mais poderoso para lidar com a crise financeira é a monetização da dívida soberana pelo BCE. Mas isso faria com que o esforço de reformas fosse definitivamente abandonado pela classe política. Por essa razão ele só poderá ser usado quando as reformas e ajustes nos orçamentos nacionais nos países deficitários estiverem garantidos. Mas quando isso acontecer, a confiança dos investidores voltará e o BCE não precisará intervir mais no mercado.

Estou convencido que é esse o processo que estamos vivendo nas últimas semanas. Mas confesso que não sei hoje se ele vai dar certo ou não.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

GOSTOSA


MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO



FOLHA DE SP - 21/11/11


Setor de trabalho temporário revisa para baixo efetivações após o Natal

Os primeiros sinais de queda do otimismo no setor de shoppings e no varejo para o Natal começam a se refletir na expectativa de emprego.

A previsão de que uma parte dos trabalhadores temporários contratados para o final de ano será efetivada foi revisada para baixo, de 29% para 20%, segundo a Asserttem (associação de empresas de serviços terceirizáveis e trabalho temporário).

"A crise mundial acaba impactando um pouco o ânimo do consumidor. Ele fica mais seletivo, se preocupa mais com as despesas. O governo tomou recentemente novas medidas para o crédito, mas o resultado não é imediato", afirma Vander Morales, presidente da Asserttem.

A previsão para o preenchimento de cerca de 150 mil vagas temporárias, entretanto, ainda está mantida.

A região Sudeste vai liderar o número de contratações de temporários neste Natal, mas é no Nordeste que deve ficar o maior índice de preenchimento posterior das vagas.

"O Nordeste vai ter uma proporção maior de efetivação pelo momento econômico, com maior carência de mão de obra e menor exigência de qualificação", diz.

Quase 50 mil vagas ainda estão abertas para a sazonalidade do Natal. São cerca de 41 mil postos no comércio e 9.000 na indústria.

Para este ano, a Abrasce (Associação Brasileira de Shopping Centers) estima crescimento menos intenso nas vendas de dezembro do que no ano passado.

SOB NOVA E FEMININA DIREÇÃO
Três advogadas passam a comandar três unidades de um tradicional escritório de direito, o Gouvêa Vieira Advogados, fundado há quase 80 anos, no Rio de Janeiro.

Maria Fernanda Pecora Gédéon assume a gestão da sede de São Paulo, Maria Isabel dos Santos-Nivault fica com a direção da de Paris e Patrícia Oki, com a do Rio.

Forte na representação de clientes franceses e de empresas em geral, o escritório contratou uma consultoria externa e passou por uma reestruturação.

"O escritório era muito liderado por homens, mas ficaram três mulheres ao acaso", diz a sócia-gestora Maria Fernanda Pecora Gédéon, que já cuida de casos de aquisições na nova casa.

"Nos últimos dois anos, cresceu 30% o movimento em Paris: de empresas francesas que buscam oxigênio no Brasil e 'familly offices' daqui que compram imóveis na França", diz Maria Isabel dos Santos-Nivault, que está há 16 anos em Paris.

CAFÉ PEQUENO
Com dez lojas fixas no Brasil, a Nespresso começa a atuar no conceito de quiosque para as vendas de Natal deste ano.

O novo modelo de negócio, menor e de custo mais baixo, será provisório e instalado no shopping Anália Franco, em São Paulo.

"Nas butiques temporárias, vamos vender só cápsulas de café", diz Stefan Nilsson, diretor para a América Latina.

Para a venda de máquinas, serão indicados varejistas de eletrodomésticos parceiros dentro do próprio shopping.

"Não faremos bar para servir a bebida. Não é o nosso negócio principal." A empresa espera o resultado da primeira iniciativa para avaliar a possibilidade de expansão.

NEGÓCIOS EM CRISE
O volume de fusões e aquisições no Brasil caiu 8,5% no terceiro trimestre deste ano ante os três meses anteriores, segundo estudo da Intralinks, que faz armazenamento de informações sigilosas.

"O Brasil teve uma sequência de altas, mas foi influenciado pela crise global. Na comparação com outros países, o resultado não foi ruim", diz Matthew Porzio, vice-presidente da empresa.

O resultado do terceiro trimestre no Brasil representou aumento de 56% sobre o mesmo período de 2010.

Os setores de energia, manufatura e telecomunicação foram os que atraíram maior interesse para negócios.

com JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ