terça-feira, março 15, 2016

Lula: ministro ou presidiário? - GIL CASTELLO BRANCO

O Globo - 15/03

Políticos de vários partidos foram hostilizados. Ninguém aguenta mais ver o sujo se defender acusando o mal lavado


Jararaca é o nome popular dado a várias espécies de serpentes. Alimentam-se de ratos e sapos. São vivíparas, ou seja, dão à luz filhotes. O seu veneno pode ser mortal. Assim sendo, ato falho ou não, foi curioso ver o próprio Luiz Inácio Lula da Silva comparar-se a uma cobra, destas que existem em várias regiões das Américas do Sul e Central.

Para atiçar a sua militância, o ex-presidente disse: “Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça. Bateram no rabo, e a jararaca está viva como sempre esteve”. Para os procuradores do Ministério Público Federal, entretanto, já havia suspeitas do rabo preso, antes mesmo da batida. O fato é que a bravata de Lula foi um tiro no pé e adicionou milhares de pessoas à maior manifestação da história do país.

Neste domingo, mais de 3,5 milhões de brasileiros reforçaram a repulsa à jararaca. Há 45 dias, pesquisa divulgada pela Ipsos constatou que para 67% dos entrevistados Lula é tão corrupto quanto os outros políticos. No início do ano, porém, ainda não eram tão comentados assuntos como o tríplex do Guarujá, o sítio de Atibaia, o apartamento vizinho ao seu em São Bernardo, o pagamento da Odebrecht pelo armazenamento de sua mudança de Brasília, os recursos pagos à empresa de um dos seus filhos e os presentes recebidos, entre outros.

Poucos sabiam que 47% dos recursos recebidos pela LILS (empresa de palestras de Lula) e 60% dos valores destinados ao seu instituto vieram de empreiteiras envolvidas na Lava-Jato: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, UTC, OAS e Queiroz Galvão. Essas empresas, aliás, se não bastasse tudo o que aprontaram, continuam contratadas pelo governo federal, sem qualquer impedimento para assinarem novos contratos, termos aditivos ou participarem de concessões. No ano passado, juntas, receberam R$ 1,3 bilhão.

Após o MP de São Paulo pedir a prisão preventiva de Lula, aumentou a possibilidade de o ex-presidente assumir um ministério no atual governo. Desta forma, pasmem, ele teria e seus familiares até poderiam invocar foro privilegiado para saírem do raio de ação do juiz Sérgio Moro, tal como está sendo pretendido pelos familiares de Cunha. Se assim for, Lula confiará na lentidão e no julgamento político do STF e Dilma, sem apoio político, entregará definitivamente o governo ao tutor. Se a jogada der errado, morrerão abraçados. No entanto, para quem está se afogando, qualquer rolha é boia. Ironicamente, na internet, circula frase pronunciada por Lula em 1988. “Quando um pobre rouba vai para a cadeia; quando um rico rouba, vira ministro”.

Como a megamanifestação fortaleceu muito a Lava-Jato e o juiz Sérgio Moro, a nomeação poderá não se consumar. Mas o que irá acontecer se o ex-presidente for condenado e preso? Para Lula e os devotos do PT, o ex-presidente se tornará um herói. Para a maioria dos brasileiros, se Lula for preso se tornará um presidiário, simples assim.

Certamente, o PT irá espernear, bem como alguns partidos historicamente aliados. Outros, como o PSB já fez e o PMDB cogita fazer, se tornarão independentes e irão se posicionar para o eventual afastamento de Dilma e para as eleições de 2018. Nas ruas, ou na porta do presídio, estarão o MST, a UNE e a CUT, entidades custeadas, em grande parte, com recursos públicos. A UNE, por exemplo, de 2003 a 2016, recebeu R$ 57,5 milhões do governo federal. A CUT, às custas da contribuição sindical que somos obrigados a pagar, amealhou R$ 59 milhões no ano passado.

Para os brasileiros que foram às ruas no último domingo, não há corruptos de estimação. Pouco importa se investigações envolvem doleiros, publicitários, deputados, senadores, governadores, o ex-presidente, ou mesmo, as campanhas eleitorais da presidente. Nas manifestações, políticos de vários partidos foram hostilizados. Ninguém aguenta mais ver o sujo se defender acusando o mal lavado. Na democracia, pau que bate em Chico, pode bater em Cunha, Cerveró, Renan, Odebrecht, Lula, Aécio, Alckmin e em qualquer cidadão desde que, comprovadamente, tenha desrespeitado as leis. Golpe é um “acordão” interromper a Lava-Jato. Neste momento em que a corrupção é deslavada e institucionalizada, precisamos conhecer toda a verdade.

Voltando às cobras, para evitar o mal que elas podem causar, é importante preservar os seus predadores, entre os quais as águias. Uma delas, Rui Barbosa, disse: “Deus deixou ao homem três âncoras: o amor à pátria, o amor à liberdade e o amor à verdade. Damos a vida pela pátria. Deixamos a pátria pela liberdade. Mas à pátria e à liberdade renunciamos pela verdade”. Assim seja.


Acabou, PT! - RODRIGO CONSTANTINO

O GLOBO - 15/03

Nunca antes na história deste país... E, de fato, nunca antes o uso desse bordão fez tanto sentido. O Brasil jamais viu tanta gente tomar as ruas em protesto contra um governo. Milhões de patriotas cumpriram seu dever cívico e lotaram dezenas, centenas de cidades país afora. Manifestações apartidárias, pacíficas, organizadas por indivíduos cansados de tanto abuso de poder, tanta corrupção, tanto cinismo.

Vim diretamente da Flórida "só" para estar presente neste momento histórico, e fiquei orgulhoso do meu Rio de Janeiro, que costuma votar tão mal, pois, afinal, é a capital nacional da esquerda caviar. A Praia de Copacabana estava simplesmente abarrotada de gente, pedindo em uníssono o impeachment de Dilma, a prisão de Lula, e dando apoio ao juiz Sérgio Moro. Foi assim pelo Brasil todo.

Os petistas ainda estão na fase da negação. Agem como autistas, descolados da realidade, sem se dar conta de que os dias de mamatas acabaram. Muitos da quadrilha disfarçada de partido vão parar atrás das grades, sem dúvida. É do que precisamos para passar a limpo essa fase sombria de lulopetismo e fortalecermos nossas instituições republicanas.

Não dá para ficar indiferente diante de tudo de podre que já emergiu do pântano petista. O muro pertence ao diabo. Estamos lidando com uma corja de bandidos da pior espécie, com safados que roubam tudo pela frente, até presentes para o chefe de Estado, pois se acham acima das leis, donos do Brasil. Não são! Mostraram-se apenas oportunistas sedentos por poder e dinheiro, nada mais.

Os "neutros", os que bancam os "isentos" e "imparciais", não passam de petistas enrustidos. A "neutralidade" hoje é petista. As manifestações fantásticas não deram moleza para políticos de "oposição", e tucanos chegaram a ser vaiados. A revolta com a pusilanimidade deles é justa, e quem pensa que tudo não passa de torcida de futebol, de "Fla x Flu", não entendeu absolutamente nada e perdeu o bonde da história. Queremos punição para todos os corruptos! O Brasil trabalhador e honesto mostrou que é possível sonhar com um futuro melhor, com um país mais justo e sem impunidade. A "gangue da mortadela" não pode contra o povo brasileiro. Os cúmplices do PT estão apavorados com a possibilidade iminente de perda das boquinhas, e deveriam estar mesmo. Afinal, Dilma vai cair, e essa turma medíocre terá que procurar emprego no livre mercado, onde reina a meritocracia. Qual sua chance? Em qualquer país normal, a presidente teria renunciado no mesmo momento em que tantos milhões foram às ruas dar um recado tão estridente, demitindo o governo. Mas nossa democracia está disfuncional, e a patota resiste, tentando lutar com armas desleais para não largar o osso. Não reconhecem a derrota, não admitem que acabou, que a população deu um basta, saturada de tanta incompetência e roubalheira. São insensíveis a todo sofrimento que causam ao país, principalmente aos mais pobres.

Foi lindo ver tantos jovens empunhando cartazes com mensagens liberais. A vanguarda não quer mais saber de Che Guevara e porcarias do tipo. Quer capitalismo, livre mercado, o direito de empreender sem um ambiente tão hostil ao lucro e ao setor privado. Foi emocionante ver tantos idosos resgatando a energia para lutar por um país melhor, senão para seus filhos, ao menos para seus netos.

O PT conseguiu unir o Brasil. Ao contrário do que dizem alguns "jornalistas", o país não se encontra dividido. Há uma imensa maioria de um lado, o da lei, da Justiça, o lado direito, e há uma minoria barulhenta e organizada, bancada por nossos impostos, defendendo o indefensável, ameaçando, intimidando, pois sabe não ter argumentos. Foi essa cambada que perdeu neste domingo.

As lideranças políticas terão de agir. Não dá para fingir que nada aconteceu. E a ala da "oposição" que fala em união e quer incluir até petistas está brincando com fogo. Não há mais espaço para conchavos asquerosos em Brasília, para acordos espúrios. Quem se colocar contra o Brasil vai cair junto com o PT. A população mostrou sua força, sua determinação em apoiar uma Justiça independente, combater a escória que usa a coisa pública como privada.

Fazer previsões num país como o nosso é sempre uma tarefa complicada, pois tudo é possível. Afinal, somos reféns do PT por longos e infindáveis 13 anos, o que parece uma eternidade. Como tanta gente caiu na ladainha populista de Lula é um mistério, que nem a "ajudinha" chinesa explica. Mas arrisco dizer que acabou. O martírio está perto do fim. Aceita, PT, que dói menos. O Brasil não será vermelho!


O governo, paralisado - CELSO MING

ESTADÃO - 15/03

A presidente Dilma, que faz questão de dizer que seu governo é para todos os brasileiros e não apenas para o PT, foi duramente cobrada; E teve uma reação pífia


As ruas trovejaram mais neste domingo do que simplesmente palavras de ordem do tipo “fora Dilma” e “fora Lula”.

De maneira mais explícita pediram a continuação das apurações sobre corrupção e a punição dos culpados. Nunca na história um juiz federal de primeira instância, como Sérgio Moro, teve tratamento de herói nacional e foi tão encorajado como desta vez. De cambulhada, as manifestações refutaram a tese do governo Dilma e dos dirigentes do PT de que as investigações são seletivas e de que carregam só para um lado.

Não apareceram apelos explícitos por mais emprego, pelo retorno do crescimento econômico, controle da inflação e saneamento das contas públicas. Mas foi a insatisfação geral com a condução da economia que permeou tudo.

A presidente Dilma, que faz questão de dizer que seu governo é para todos os brasileiros e não apenas para o PT, foi duramente cobrada. E teve uma reação pífia. Em nota lacônica assinada pela Secretaria de Comunicação Social não conseguiu mais do que afirmar que as manifestações demonstraram o caráter pacífico e democrático da população. Essa nota revela a perplexidade do governo Dilma e a falta do que entregar em resposta à pressão das ruas.

Os principais artigos em falta na lojinha presidencial não são bons projetos para resgatar os fundamentos da economia e a retomada do crescimento econômico, mas sim liderança política e capacidade de inspirar confiança.

O desgaste do governo é tão grande que não há quem aposte em que a presidente Dilma seja capaz de comandar uma virada. A única proposta dentro do governo é nomear o ex-presidente Lula para um cargo de ponta no ministério, menos para blindá-lo contra o cerco da Justiça e mais como tentativa de tomar a iniciativa. No entanto, vulnerável como está o ex-presidente Lula, é difícil de ver nessa hipótese alguma possibilidade de sucesso.

Os dirigentes do PT ainda reivindicam um cavalo de pau na política econômica, mas é do jeito deles, com propostas descabidas, que já deram errado e que não têm nenhuma possibilidade de eficácia se o objetivo é garantir a volta da confiança.

Daí por que as possibilidades de solução para o impasse, pelo menos por enquanto, estão no afastamento da presidente Dilma, ou pela cassação pelo Tribunal Superior Eleitoral, ou pelo encaminhamento do processo de impeachment, ou pela renúncia. O presidente do Senado, Renan Calheiros, ainda sugere uma espécie de parlamentarismo branco, que deixaria a presidente ainda de posse da faixa presidencial, mas de cargo esvaziado. Trata-se de uma opção casuísta, de duvidosa viabilidade jurídica.

Embora tenham sido repelidos nas manifestações, são os políticos que agora são chamados a buscar uma saída. Falta saber se estão à altura do que deles se espera neste momento. Além disso, ainda estão condicionados a imprevisíveis movimentos da Operação Lava Jato.

De todo modo, prevalece a percepção de que o Brasil começa a amadurecer. As instituições de Estado se fortalecem.

CONFIRA:

IBC-Br

Aí está a evolução do Índice da Atividade Econômica do Banco Central, o IBC-Br, que é uma indicação prévia do comportamento do PIB.

Piorou

O recuo do IBC-Br em janeiro, de 0,61% em relação a dezembro e de 4,44% no período de 12 meses terminado em janeiro, foi mais profundo do que o esperado. Mostra que a atividade econômica continua em franca deterioração em 2016 e torna mais difícil uma recuperação ainda este ano. Parece inevitável que essa forte queda se reflita em aumento do desemprego.


O vazio e o réu - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 15/03

O dilema em que o país está é que os caminhos para fazer a vontade das ruas têm dois obstáculos: um vazio e um réu. Se a trilha para tirar a presidente Dilma Rousseff do governo for o impeachment pelo Congresso, o processo será comandado por um réu da Lava-Jato, operação que recebeu o mais amplo apoio popular a uma investigação. Se for pelo TSE, os processos só serão julgados em setembro, um tempo longo demais.

As ruas foram de uma eloquência inegável. Querem a saída constitucional da presidente da República e isso não é golpe. A retirada do chefe do governo é previsto no presidencialismo brasileiro e tem os dois caminhos que descrevi acima. Soluções que tentam contornar o impeachment via Congresso ou a condenação via Justiça não fazem sentido. Qualquer mudança da forma de governo, semipresidencialismo ou parlamentarismo, não pode valer para o mandato atual.

Sobre o parlamentarismo, seria um absurdo ainda maior por dois motivos, um político e outro lógico. Consultado duas vezes, na década de 1960 e na de 1980, o povo brasileiro rejeitou o parlamentarismo. Teria que ser ouvido novamente. E por lógico entende-se que dar mais poder a um Congresso com as duas Casas sendo presididas por pessoas às voltas com a Justiça é uma contradição. Não se viu nas ruas nenhum pedido de mudança de forma de governo, mas sim mudança do governo.

O foco da rejeição ficou absolutamente claro: é o PT, a presidente Dilma e o ex- presidente Lula. Contudo, o que houve em São Paulo deve acender a luz amarela no painel de todos os políticos porque o que as ruas estão dizendo é que, a exemplo de outros países do mundo, a população está cansada da forma tradicional de fazer política, que aqui inclui o troca-troca, o toma- lá- dá- cá, a distribuição de cargos como se fosse a instalação de sesmarias, benefícios a empresas que depois se tornam doadoras de campanha. Essa crise da representação precisa ser levada a sério pelos políticos porque os brasileiros não querem apenas a troca de um partido ou de uma pessoa, querem uma transformação estrutural.

Por isso o que foi aclamado nas manifestações de domingo foi a Lava-Jato e seus símbolos : a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o juiz Sérgio Moro. Quanto ao juiz, aumentando ainda mais seu percentual de acertos, soltou uma nota em que tirou o foco que estava posto sobre ele, em cartazes e refrões, para jogar luz sobre o trabalho coletivo de órgãos de controle. Apesar de ter sido alvo de ataques e críticas, como as do ex- presidente Lula, ele não aproveitou o momento para qualquer revanche pessoal. Preferiu pensar institucionalmente, o que é um conforto nestes tempos de hoje.

O movimento de domingo enfraquece a presidente ainda mais. Escrevi aqui, no dia 6, que o governo Dilma estava diante do seu fim antecipado. Nenhum governante permanece no poder se não tiver apoios nem popularidade. Depois de manifestações que foram as maiores do país fica ainda mais evidente que esta administração acabou. E isso é que nos coloca no dilema descrito acima: os caminhos da mudança têm no Congresso o obstáculo de o presidente da Câmara ser Eduardo Cunha, réu da Lava- Jato; o caminho do TSE tem o problema do tempo, porque só em setembro é que estão previstos os julgamentos.

Haveria a alternativa de o próprio governo se salvar da fogueira com mudanças na maneira de governar ou na política econômica. Não é crível que isso aconteça. Pelo contrário, na economia a possibilidade maior é de que qualquer alteração seja para piorar a política econômica. A inflação deve ter uma queda no índice de doze meses, mas isso não chega a ser um alívio porque os preços subirão menos, mas continuarão subindo de um patamar já muito elevado. A recessão e o desemprego não darão trégua tão cedo. A crise fiscal continua sendo uma ameaça para o crescimento da dívida pública. A confiança de empresários, investidores e consumidores não será restabelecida por este governo. A crise econômica é profunda, mas não foi ela que levou os brasileiros às ruas, e sim o forte e generalizado repúdio à corrupção. Não é a conjuntura que machuca mais, é a estrutura. Por isso o ato de domingo abre tantas possibilidades para o Brasil.


Salvando a pele - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 15/03

A provável decisão de Lula de aceitar fazer parte do Ministério da presidente Dilma, depois de ter recusado duas vezes, além de explicitar o papel subalterno que ela tem em relação a seu tutor político, inaugurando o parlamentarismo à moda petista, é exemplar do descaso com que Lula trata a Justiça brasileira.

Esse menoscabo já havia ficado claro por um descuido de um vídeo da deputada Jandira Feghali, que mostra ao fundo Lula conversando com a presidente Dilma ao telefone. A certa altura, ele diz que os promotores deveriam "enfiar no c* o processo". Mais tarde, os petistas tentaram fazer outra leitura, dizendo que ele mandara enfiar "o acervo", mas o sentido de aviltamento continuava intacto.

Antes, no depoimento que deu à Polícia Federal, ontem divulgado na íntegra, Lula já havia se expressado de maneira infame em relação aos promotores, a pretexto de defender sua mulher: "Manda a mulher do procurador vir prestar depoimento, a mãe dele. Por que vai minha mulher?".

A sua confissão de culpa vem no mesmo momento em que a denúncia dos promotores paulistas é transferida para a esfera do juiz Sérgio Moro, o que escancara o objetivo de blindá- lo com o foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal ( STF). A nomeação é definida pela procuradora Silvana Batini como uma fraude processual, porque seria um desvio de finalidade do ato administrativo da presidente da República.

A nomeação será contestada na Justiça pela oposição com esse argumento e ainda por "ofensa ao princípio da moralidade", já que Lula está sendo investigado em diversas instâncias da Justiça brasileira. Já a presidente Dilma pode vir a ser acusada de obstruir as investigações. Dificilmente, no entanto, alguma dessas medidas terá efeito prático, porque são causas e motivações muito mais subjetivas do que a do ministro da Justiça, por exemplo, que tinha uma razão formal para ser impedido de assumir o cargo.

Mas haverá embaraços políticos evidentes para o ex- presidente, que não se livrará da pecha de ter fugido do juiz Moro. A cereja do bolo é ainda o artigo 51 da Constituição, que determina que o presidente da República, o vice- presidente e ministros de Estado só podem ser processados com a autorização de dois terços da Câmara dos Deputados.

A decisão, além de enfraquecê- lo moral e politicamente, pode levar a um problema familiar: dona Marisa e seus filhos não terão necessariamente foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal. O STF vem tratando dessa questão de foro privilegiado da forma mais instável possível, comenta a procuradora Silvana Batini.

Antigamente, a prática era que todos os coautores seguiam para o Supremo junto com o réu que tinha foro privilegiado. Com o tempo, isso veio sendo flexibilizado porque, à medida que houve um incremento de ações penais envolvendo autoridades, os próprios tribunais superiores começaram a ficar incomodados, e passaram a julgar separando o processo, ou atraindo a competência de acordo com a conveniência do processo, o que gera certa imprevisibilidade.

O STF, no caso do mensalão, por exemplo, julgou todo mundo junto. Mas, se os ministros seguirem a linha que vêm adotando na Operação Lava-Jato, deixarão separado. Lula joga de maneira arriscada seu prestígio político na tentativa de fugir da Justiça e, ao mesmo tempo, reconstruir o governo Dilma para se viabilizar como candidato em 2018.

Evidente que a simples decisão muda o jogo político, e freia momentaneamente o que parecia uma inabalável corrida de deputados em direção ao impeachment da presidente Dilma, mesmo porque os deputados só se inclinarão para uma decisão definitiva se se convencerem de que não há mais vida política neste governo.

Se Lula decidir mesmo afrontar a Justiça e a opinião pública assumindo o controle do governo e tomando medidas populistas para recuperar a popularidade, pode afundar o país definitivamente para salvar sua pele. Nesse caso, caminharemos para o pior dos mundos, a venezualização do país, com todas as consequências de radicalização política e depressão econômica.


Em desespero, Dilma tenta autogolpe com Lula - JOSIAS DE SOUZA

Blog do Josias de Souza

O brasileiro já ouviu muitas histórias de gente tirando gênio de garrafas. Mas nunca antes na história desse país se ouvira falar de alguém obrigando o gênio a retornar à garrafa. Na versão de um ministro petista é o que Lula está fazendo com Dilma. Vendida em 2010 como gestora genial, ela foi convencida a entregar ao antecessor o futuro dos escombros que restaram do seu governo.

Numa tentativa desesperada de se livrar do impeachment, Dilma fará de Lula um superministro, com sala no Planalto. Ele chefiará a articulação política do governo e projetará sua sombra sobre toda a Esplanada, especialmente sobre a pasta da Fazenda. Depois de acusar os rivais de tramar um golpe, Dilma recorre a um autogolpe. Lula entrará pela porta dos fundos numa espécie de terceiro mandato.

A manobra envolve alto risco. Ao patrociná-la, Dilma como que exerce um dos poucos privilégios que ainda lhe restam —o privilégio de escolher seu próprio caminho para o inferno. Com o governo esfarelando-se, madame atrelou seu destino ao de Lula, divorciando-se definitivamente das ruas.

No último domingo, o asfalto roncara sobretudo para exigir o impeachment de Dilma e prestigiar Sérgio Moro, cacifando-o para punir inclusive Lula ‘Jararaca’ da Silva. Em resposta a essas demandas, Dilma resolveu unir o inútil ao desagradável: para se manter no cargo, concede à serpente o foro privilegiado dos ministros, livrando a cobra criada do PT dos rigores do juiz da Lava Jato.

O movimento é inútil porque, ainda que consiga deter o impeachment, o máximo que Lula fará por Dilma é acomodá-la no verbete da enciclopédia como a primeira pessoa na história a se tornar ex-presidente ainda no exercício da Presidência. É desagradável porque a presença de Lula na Esplanada, além de não ser um bom exemplo, é um péssimo aviso: o governo entrou na fase do vale-tudo.

Tomado pelo que se diz dele no Planalto, Lula retornará a Brasília para operar milagres. Na política, promete reagrupar o bloco partidário que dava suporte aos governos petistas no Congresso. Na economia, acena com uma reviravolta capaz de abreviar a retomada do crescimento. Falta combinar com a lógica.

Quando ainda era um presidente da República popular, Lula só conseguiu apoio no Congresso comprando aliados com o dinheiro sujo do mensalão e do petrolão. Os parlamentares governistas continuam com o mesmo código de barras na testa. Mas o governo, com a força-tarefa da Lava Jato no seu encalço, já não pode remunerá-los como antes. O novo superministro manuseará um orçamento em ruínas.

Não é só: retratado nas ruas como um boneco-presidiário batizado de Pixuleco, investigado por corrupção, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica, Luís Inácio já não é o mesmo Lula da Silva. É nessa condição de ex-Lula que terá de convencer o PMDB, por exemplo, de que é mais negócio permanecer com Dilma do que colocar na cadeira dela o correligionário Michel Temer, seu substituto constitucional.

A contabilidade do impeachment favorece Dilma. Para aprovar o pedido na Câmara, os antagonistas do governo precisam reunir 342 votos. Para barrar o impedimento, o Planalto tem de reunir 171 votos. Líder do governo na Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE) afirma que, se o governo não tiver algo como duzentos votos no plenário da Câmara, é porque a propalada governabilidade já foi para o beleléu.

Na economia, a guinada defendida por Lula e seus devotos no PT passa pelo abandono de projetos como a reforma da Previdência e de estratégias como o rigor fiscal. Tudo em nome de uma hipotética retomada do crescimento ainda em 2016. Como se fosse possível colher bons indicadores sem plantá-los.


Sob o risco da leitura de que ex-presidente foge da Justiça - CARLOS MELO

O Estado de São Paulo - 15/03

A possibilidade de o ex-presidente Lula assumir um ministério no governo Dilma é uma jogada de alto risco, com diversas e complexas implicações. Em primeiro lugar, seria um sinal muito negativo para a própria imagem do ex-presidente. A trama não se resume apenas em protegê-lo, mas a primeira leitura seria essa, a de que Lula fugiu da Justiça para deixar sua sorte nas mãos do Supremo, o que coloca uma enorme responsabilidade para a própria Corte, forçada a decidir os destinos de Lula sob enorme pressão e clamor da sociedade. E qualquer decisão estará sob suspeição – ou de excesso para provar independência ou de conivência.

No campo do governo também haverá problemas claros: primeiro, com Lula sob o mesmo teto, Dilma abriria mão do poder; Lula seria a referência de autoridade interna e externamente ao governo. Seria antecipar o impeachment, com uma duvidosa solução petista. Mas, não apenas isso: há quem acredite que Lula reorganizaria o governo, rearticularia o Executivo com o Legislativo e com a economia. Também aí parece haver incongruências: o Lula de hoje não é o Lula de um ano atrás, tampouco o Lula de 2010. Já não mobiliza e nem agrega como antes: quais nomes realmente críveis traria para o governo?

E, acima de tudo, a estratégia é de risco também porque é de um enfrentamento que talvez o PT não tenha mais força para fazê-lo; o PT não é o mesmo; não é mais seguido por tantos setores como no passado; a nomeação seria compreendida como uma declaração de guerra de um exército que perdeu quase todos seus soldados. Os congressistas que decidirão (ou não) a respeito do impeachment de Dilma têm consciência disso tudo.


Vamos às bases - CRISTOVAM BUARQUE

CORREIO BRAZILIENSE - 15/03

O Brasil fez, ao longo dos últimos dez anos, grande esforço pela saúde, graças ao Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse período, foram gastos quase R$ 2 trilhões - 3,9% do PIB em 2014, R$1.060 por pessoa. O resultado, apesar dos avanços ao comparar com o passado, são hospitais superlotados, epidemias de dengue e a imensa tragédia, vergonha nacional, da microcefalia. O erro foi não cuidar da base.

Tratou-se a saúde como questão de atendimento hospitalar, não como questão anterior ao hospital, de saneamento e medicina familiar. Tratou-se de doenças e não de saúde. O governo do DF, entre 1995 e 1999, não construiu hospitais, mas conseguiu aumentar o número de leitos disponíveis, nas unidades existentes, atacando o problema pela base em três áreas: um programa de saúde local, chamado Saúde em Casa; a generalização de serviços de saneamento, usando as técnicas de baixo custo desenvolvidas há 40 anos pelo engenheiro José Carlos Melo; e uma campanha intensiva de educação do trânsito. Atacou-se a base, com resultados positivos: menos doenças, hospitais sem filas, leitos livres, doentes atendidos em casa. Mas isso não foi considerado boa gestão, porque não se construiu hospitais, nem UPAs, reduziu-se a necessidade deles.

Enfrentar o problema na base não é visto com mérito; porque não põe placa de inauguração, não consegue financiamento de campanha por construtoras, menos ainda propinas, nem as pessoas passam orgulhosas em frente ao prédio e não percebem que não estão doentes por investimentos discretos ou mesmo invisíveis. A população não se deslumbra com as soluções de base.

O governo Lula entendeu isso e escolheu atender o gosto do povo por novas universidades, no lugar de cuidar primeiro da educação de base. Com isso ele pôde dizer que um filho de trabalhador entra na universidade pelas cotas. Isso dá mais votos do que dizer que os filhos de todos os trabalhadores têm uma boa educação de base e, por isso, isso têm condições de disputar uma vaga, em condições de igualdade mesmo com os filhos dos ricos. Mas essa opção seria solução pela base e apareceria como produto oferecido pelo governo. Não daria voto. Em compensação, não deixaria as universidades brasileiras na decadência em que estão.

Aumentar vaga nas universidades dá mais voto do que assegurar que todas as crianças terminarão o ensino médio com a qualidade dos melhores países, porque os alunos que entram, graças a novas vagas, ficam agradecidos, mas os que entram por vestibular não se sentem gratos pela boa escola de ensino médio. Quem não fica doente não agradece o saneamento, quem não foi acidentado não agradece aos hospitais com leitos livres.

Os empresários brasileiros querem que os governos ofereçam empréstimos subsidiados e exonerações fiscais, no lugar do governo definir formas e apoiar a elevação da produtividade. Preferem a solução por cima, desprezam o esforço e a solução pela base.

Os desenhos urbanos de nossas cidades concentram os lugares de trabalho no centro, para enfrentar os engarrafamentos, faz-se estradas e viadutos. Perdeu-se a chance de atacar o problema do trânsito pela base, reduzindo a necessidade de locomoção, podendo-se viver perto do trabalho, e oferecendo sistema eficiente de transporte público.

Queremos acabar com a violência pela construção de mais cadeias e a contratação de mais policiais, no lugar de medidas que façam o Brasil pacífico, redução do número de bandidos e o tamanho da violência. O povo não acredita que é possível atacar os problemas pela base, sobretudo porque demora, e prefere-se o imediato ao topo. Graças à Justiça e a um juiz, demos grande avanço para punir corruptos eleitos, mas não cuidamos da educação na base do eleitor para que não haja corruptos.

O desprezo à base, o gosto pelo topo é característica de nossa maneira de pensar. Pena que dificilmente essa lição será aceita para a eleição de prefeitos e a de 2018, para presidente. O eleitor vai provavelmente continuar preferindo o prefeito que prometa hospitais e viadutos, e não menos necessidade de transporte, não o que se comprometa com o saneamento e o presidente de mais vagas em universidades e não o de mais vagas no ensino médio. E, assim, continuaremos com mais hospitais lotados, mais trânsito interrompido, mais alunos da universidade abandonando o curso por falta de base.


O último lance - NATUZA NERY - COLUNA PAINEL


Para assumir ministério, Lula exige conversa com Dilma e garantia de que política econômica mudará

FOLHA DE SP - 15/03

O último lance Ao saber que Lula voltaria para o Palácio do Planalto, Dilma mostrou-se “aliviada”. Já não se importa com a imagem de rainha da Inglaterra. Está disposta a “entregar tudo e mais um pouco” para que o petista socorra o governo, dizem assessores. Até porque, se tudo ruir, observa um ministro, ao menos o projeto não morre “só na mão dela”. Mas Lula impôs condições: só toma posse depois de uma conversa franca nesta terça e com garantias de que a política econômica mudará.
Leão da montanha Em um primeiro momento, o provável embarque de Lula provocará uma inflexão à esquerda. O petista só vê alguma saída para a crise se reconectar Dilma com a base social do PT, insatisfeita com a reforma da Previdência e com corte de gastos sociais.
Mexida Nelson Barbosa continuará à frente da Fazenda, ao menos por ora. Ricardo Berzoini, que deve perder a Secretaria de Governo para Lula, pode ficar como secretário-executivo da pasta.
Festa de Babette Fartos com o estilo Dilma de governar e ávidos por um “choque” capaz acordar a Esplanada, assessores e ministros celebravam o “novo governo”.
Vai com calma Apesar dos rojões, a tensão com a Lava Jato não se dissipou. Quem acompanha a investigação assegura que Dilma e alguns de seus auxiliares mais próximos terão dias de pesadelo pela frente. “Aí, nem Jesus…quer dizer, nem Lula salva”, pondera um ministro.
Mapa da guerra Semana passada, mesmo relutando a aceitar o convite de Dilma para integrar o governo, Lula trocou telefonemas com parlamentares para sondar a real situação do Congresso e verificar quais seriam seus focos mais emergenciais de atuação.
Sujou Peemedebistas empenhados no rompimento com a presidente ameaçam precipitar o divórcio. Temem que a chegada do ex-presidente ao Palácio do Planalto seja capaz de reaglutinar algum apoio dentro da sigla nos próximos 30 dias.
Tiro ao alvo Em sua delação, Delcídio do Amaral (PT-MS) não tem nada de franco-atirador. Suas acusações são certeiras. A imagem de metralhadora giratória fica melhor em Pedro Corrêa, que reservou uns cinco capítulos em sua colaboração só para Lula.
Só coisa difícil Em depoimento à PF, o ex-presidente Lula falou “não sei” 103 vezes. Usou a interjeição “hein?” outras 18 vezes. E ainda respondeu “não tenho noção” oito vezes.
Resistências Além de ter sido acusado pela PF de tentar obstruir investigações do mensalão, o subprocurador-geral da República Eugênio Aragão, que assumirá a Justiça, tem forte histórico de desavenças com o ministro do STF Gilmar Mendes.
Sabe de algo? Os investigadores da Lava jato andam fazendo perguntas específicas a alguns delatores e depoentes sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Olha ele Um ponto das manifestações de domingo chamou a atenção do Planalto: Jair Bolsonaro (PSC-RJ) conseguiu discursar sem ser hostilizado. Foi um dos poucos.
Crème de la crème De um tucano sobre a adesão de correligionários ao “esquenta” no Maksoud Plaza, hotel de luxo em SP, antes da manifestação de domingo: “Temos agora o tucano petit four, a evolução do coxinha!”.
Visitas à Folha Francisco Falcão, presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Douglas De Felice, secretário de Comunicação.
Rodrigo Garcia, secretário da Habitação do Estado de São Paulo, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Roger Ferreira, assessor de imprensa.

TIROTEIO
Enquanto a recessão castiga os brasileiros, o governo e o PT só se preocupam em salvar a pele do Lula e livrar Dilma do impeachment.
DO DEPUTADO ANTONIO IMBASSAHY (PSDB-BA), sobre a decisão do governo Dilma de colocar o ex-presidente Lula novamente no Palácio do Planalto.

CONTRAPONTO
Estamos juntos
Durante intervalo na gravação de um debate na TV Câmara, um auxiliar aconselhou o deputado Silvio Costa (PT do B-PE) a arrumar suas meias para que saísse mais aprumado no vídeo. Ao ouvir a dica, o parlamentar foi logo reclamando:
— Poxa, todo mundo aqui arrumadinho e só agora você me avisa que preciso me ajeitar?
Não houve tempo sequer para o clima pesar. Ao lado de Costa, o deputado Esperidião Amin (PP-SC) rapidamente interveio na conversa.
— Mas eu não estou penteado! — disse, bem-humorado, o veterano parlamentar, que é calvo.

Para escapar de Moro, Lula dá o golpe em Dilma - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 15/03

Se faltasse ainda uma prova, talvez a última, de que a presidente Dilma e o PT são impermeáveis à vontade das ruas, e à vontade a da esmagadora maioria dos brasileiros expressa em todas as pesquisas de opinião conhecidas até aqui, agora não falta mais.

Menos de 24 horas depois da maior manifestação popular da história do Brasil que disse “não” à corrupção, “não” a Lula e “sim” ao impeachment de Dilma, ministros do governo anteciparam que hoje ou amanhã haverá troca de presidente da República.

Sairá Dilma, que só formalmente continuará no cargo. Entrará Lula para escapar de uma eventual prisão, de um eventual julgamento comandado pelo juiz Sérgio Moro, e para barrar o impeachment no Congresso. Dará certo? Eufórico, o PT acha que dará.

Mais do que isso: os principais líderes do PT entendem que Lula presidente na prática, embora com título de ministro, é a única saída que resta para que o Congresso não casse o mandato de Dilma, e para que o PT possa sonhar em se manter no poder.

Do jeito que vai – ou que ia até ontem -, os dias de Dilma no poder pareciam contados. Nesta quinta-feira, com a decisão final do Supremo Tribunal Federal sobre as regras do impeachment, o processo será destravado para começar a correr na Câmara.

Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, imagina que em 90 dias a sorte de Dilma estará selada. O PMDB uniu-se ao PSDB para fazer do vice Michel Temer o sucessor de Dilma. Partidos que ainda dizem apoiar o governo estão decididos a largá-lo.

A perder o lugar para Temer, Dilma foi convencida pelo PT a ceder o lugar a Lula. Somente ele – e isso até seus adversários admitem – poderá reescrever a crônica de uma queda anunciada. Impeachment bancado pelo PT não é golpe. Para ele, é ato de legítima defesa.

É também de falta de vergonha, de escrúpulos, de respeito aos brasileiros e, especialmente, à Justiça, mas não se faz política na maioria dos lugares com vergonha, escrúpulos e respeito ao povo ou à Justiça. A não ser quando o povo reage ou a Justiça reage.

A se consumar o impedimento de Dilma e a nova posse de Lula, a Justiça será provocada por partidos da oposição a declarar se não estamos diante de uma “ofensa ao princípio de moralidade”. Ou se o ato de nomeação de Lula não significará uma “fraude processual”.

Porque seja uma coisa ou outra ou ainda uma terceira, é disto que se trata a levar-se em conta o senso comum. Por senso comum, leia-se “o modo de pensar da maioria das pessoas com base no conhecimento adquirido a partir de experiências e vivências”.

Afinal, Lula é suspeito de ter contribuído para o assalto à Petrobras, de ter enriquecido sendo pago por palestras que não fez, e de ocultar patrimônio. Delações que estão por vir ou por se revelar deverão deixá-lo em pior situação do que está.

A fuga que ele está a empreender na direção do Palácio do Planalto lhe assegurará o privilégio de só poder ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Ali, Lula espera contar com a boa vontade da maioria dos ministros escolhida por ele e Dilma.

Para dizer o mínimo, é uma desfaçatez. Para dizer o que é de fato, é uma tentativa de obstruir a Justiça.


E o Brasil disse: basta! - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 15/03

O 13 de Março apontou o caminho com uma clareza absolutamente inquestionável: basta! O governo Dilma acabou de fato e com ele o famigerado ciclo de poder lulopetista, que depois de se sustentar por anos apoiado no populismo rasteiro que teve seus momentos de brilho no embalo de uma conjuntura favorável afundou o País na atual crise política, econômica e moral. Esse processo foi acelerado, por um lado, pelo mar de lama que emergiu com a Operação Lava Jato e suas congêneres e, por outro, pela inacreditável incompetência política aliada à inépcia gerencial de Dilma Rousseff. Resta agora formalizar, com a observância estrita dos preceitos constitucionais, o que foi decretado nas ruas. E, numa segunda etapa, consertar as instituições que foram conspurcadas pela tigrada e repor o País no rumo do crescimento sustentável e com justiça social.

A tarefa de reconstrução nacional, por princípio difícil em qualquer circunstância e em qualquer lugar, é de modo especial desafiadora quando deve ser feita com o material humano de que a política brasileira dispõe. Basta olhar para o Congresso Nacional, onde os presidentes das duas Casas que o compõem são obrigados a dividir seu tempo entre comandar à sua maneira peculiar o Poder Legislativo e defender-se das múltiplas investigações e denúncias criminais que os acossam.

De qualquer modo, ficou claro que uma mobilização como a que reuniu multidões no 13 de Março só poderia ter sido feita por movimentos suprapartidários, enraizados num genuíno e multifacetado anseio popular por mudança. Os milhões de brasileiros que saíram mais uma vez às ruas sabem exatamente o que não querem, mas estão divididos quanto ao que, além disso, desejam. Mas nem por isso deixam de se unir em torno dos pontos com os quais concordam. E o fazem como bons cidadãos e vizinhos, em paz e concórdia. Na verdade, conseguem extrair alegria de um momento de grande gravidade.

Essa massa que acorreu às ruas na maior manifestação pública do gênero na história da República também demonstrou desconfiança e impaciência com lideranças político-partidárias em geral. Aécio Neves e Geraldo Alckmin, alvos de manifestações pontuais de desaprovação na Avenida Paulista, exatamente como ocorreu com muitos outros políticos Brasil afora, devem ter sentido com preocupação a cota extra de responsabilidade que lhes pesa nos ombros.

O fato é que, aos poucos – mas muito rapidamente –, as lideranças dos movimentos e os próprios manifestantes vão percebendo que a realização de seus anseios só poderá dar-se no Congresso Nacional. Ou seja, a crise política, econômica e moral montada pela corrupção lulopetista só será desmontada na arena política. E também dali é que surgirão as soluções para o destravamento da economia e a limpeza dos costumes políticos. Assim, não é de espantar que, no 13 de Março, políticos profissionais tenham comparecido às ruas – ainda que enfrentando a incompreensão e a intransigência de alguns manifestantes.

O governo, por sua vez, reagiu desnorteado ao 13 de Março. Sem ter o que dizer, teria sido preferível que o Palácio do Planalto se recolhesse ao silêncio obsequioso, em vez de enveredar por obviedades infantojuvenis a respeito de “maturidade de um País que sabe conviver com opiniões divergentes e garantir respeito às leis e instituições”. Afinal, diante das repetidas manifestações do povo brasileiro, são mais que patéticas as declarações de que Dilma e o PT devem permanecer no poder para “respeitar a vontade do povo”. Lá ficam para tentar, in extremis, perpetuar um projeto de poder que se sustentou com o maior esquema de corrupção na gestão pública de que o País tem notícia.

Diante das hipóteses de o PMDB desembarcar formalmente do governo – porque, de fato, desde sábado já apeou – e de Lula assumir o governo disfarçado de ministro, só restou ao Palácio do Planalto a inspiração acaciana de dizer que “a liberdade das manifestações é própria das democracias e por todos deve ser respeitada”. Se Dilma, de fato, respeitar a clamorosa vontade popular, logo teremos a notícia de sua renúncia.


Mobilizações acuam governo, que busca manter-se à tona - EDITORIAL VALOR ECONÔMICO

VALOR ECONÔMICO - 15/03

As peças do xadrez político se moveram novamente e aproxima-se o xeque mate no governo de Dilma Rousseff. A gigantesca manifestação em São Paulo, acompanhada de outras com maior número de participantes nas capitais e duas centenas de cidades, deu aval aos partidos para tirarem o PT e sua impopular presidente do poder. Em dois encontros, o PMDB, fiel da balança, aproximou-se do PSDB com vistas à sucessão de Dilma e, em convenção, avançou mais rumo ao desembarque do governo, em um movimento que deve arrastar parte da estilhaçada base governista.

Em breve, serão sacramentadas as delações premiadas do ex-líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral, e de executivos de várias empreiteiras. Elas seguramente não melhorarão a situação do PT e seu governo, e têm potencial para provocar terremotos nos demais partidos, em especial no PMDB. O caráter agudo da crise política se revela no fato de que a terra treme em volta dos protagonistas principais de um eventual desfecho, como Michel Temer e Renan Calheiros, que estão com a cabeça a prêmio na Justiça, da mesma forma que Eduardo Cunha, o presidente da Câmara que deverá reiniciar o processo de impeachment. Sozinha, a oposição (PSDB e DEM) não tem condições de definir o rumo desse processo.

Com marcada aversão a políticos e partidos, a mobilização das ruas, ao fechar o foco em "Fora Dilma" e "Fora PT", deu carta branca aos partidos no Congresso para que façam todo o possível para tirar a presidente Dilma do Planalto. PMDB e PSDB se aproximaram com essa finalidade na semana passada. Esse acordo não é fácil, porque a outra face da crise, a econômica, lega um pesado ônus político a quem quer que seja o sucessor de Dilma. As diferenças no ambiente político são gritantes caso ele seja Michel Temer ou alguém sagrado pelas urnas em novas eleições, caso a chapa Dilma-Temer seja cassada pelo TSE.

Ajustar as contas públicas e criar condições para a volta do crescimento exigirá medidas duras e um tempo para que tenham efeito que contraria o calendário eleitoral. Ou então, a saída seria um tratamento de choque, que exigiria um mandatário com credibilidade e prestígio políticos que só uma nova eleição poderá dar.

Se o vice-presidente Michel Temer parar em pé, terá o apoio da oposição para ir em frente com o ajuste fiscal, limpando o terreno para os tucanos que, em tese, são a bola da vez. O que o PMDB ganharia fora a promessa de uma nova vice-presidência em um eventual governo do PSDB não é certo - e pode não ser desejável.

Há outros cursos possíveis que não encaminham uma solução para a crise. Se o rito do impeachment, ou os julgamentos que envolvem a presidente, se arrastarem até 2017, e ela for afastada, caberá ao Congresso - quem sobrar nele - escolher o sucessor por via indireta. O escolhido faria um mandato tampão sem força para ousadias.

Há poucas chances de a presidente Dilma se manter no cargo. Pode fazê-lo como "rainha da Inglaterra" em um "semiparlamentarismo", a "semi-qualquer coisa" com o qual se reduziria, não se sabe como, o poder da Presidência. Dilma não aceitaria jogo. Ou pode ganhar força suficiente para pelo menos terminar seu governo, recompondo sua base política, o que parece hoje uma missão impossível. A crise é tão violenta que fez até o PMDB decidir em convenção pelo impensável no imaginário da legenda: recusar cargos no governo.

Está claro que por suas próprias forças o governo Dilma é incapaz de virar o jogo a seu favor. É o que torna plausível a surreal entrega de um ministério a Lula, ação politicamente desmoralizante e de altíssimo risco, mas talvez a única, para vários petistas, que poderia salvar um governo moribundo. Dilma sairia fortalecida também na hipótese de Lula e o PT mobilizarem multidões semelhantes às do último domingo. Após perder o domínio das ruas desde junho de 2013, parece difícil que esse seja um caminho onde a estrela do partido volte a brilhar.

Lula no governo será o verdadeiro presidente e só teria alguma chance de sucesso se abandonasse as ideias que vem dando guarida para estimular a economia, que só aprofundariam a recessão. Foi o que fez em 2002, ao adotar medidas ortodoxas que foram bem-sucedidas. Alvo de suspeitas e símbolo do PT, sua mudança para Brasília lhe daria foro privilegiado, sob risco de provocar mais e maiores mobilizações que poderiam acelerar o fim do governo e por encerrar sua carreira política com um triste epílogo.

Um ‘basta’ das ruas a Dilma, Lula e PT - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 15/03

Manifestações históricas forçam o andamento do calendário do impeachment, enquanto a economia se dissolve, sem perspectivas de mudanças



Em crises profundas e amplas como a atual, a evolução de suas vertentes política e econômica não costuma se dar na mesma velocidade. Neste domingo, impulsionados pelo maior conjunto de manifestações de rua da história do país, o calendário e o relógio da face política da crise apertaram o passo rumo a um desenlace.

Até aqui, o processo assustador de liquefação da economia permanece sem uma perspectiva de solução — mesmo que as melhores alternativas para reequilibrar as contas públicas, conter inflação, reativar investimentos e consumo sejam conhecidas. Porém, por desagradarem a PT e aliados, nada se faz. É neste ponto que as crises política e econômica se entrelaçam e interagem.

Mas os milhões de manifestantes de domingo contra Dilma, Lula, PT, e a favor de Sérgio Moro e Lava-Jato — não importa se 3,6, segundo as PMs, ou 6,9, de acordo com os organizadores — tiveram tal dimensão, maior que todos os eventos políticos de rua ocorridos até hoje no país, que forçam uma definição sobre o futuro de uma presidente acuada em Palácio.

Do roteiro para a votação do pedido de impeachment de Dilma já fez parte a convenção do PMDB, no sábado, em que o partido reconduziu o vice Michel Temer à presidência e se deu uma espécie de aviso prévio de 30 dias, durante os quais não aceitará cargo no governo e definirá a independência em relação ao Planalto. Não por acaso, neste prazo deverá ficar previsível o futuro de Dilma. O partido não foge ao estilo de manter os pés em duas canoas. Mas já conversa com tucanos sobre governo de transição.

Dilma e os ministros mais próximos, noticia-se, se curvaram ao fato estrondoso da ida às ruas em protesto contra ela, seu mentor e seu partido. Tratam de reparar as avarias, por meio de mais conversas com a base parlamentar. Deve vir por aí mais fisiologismo. A ver.

O inevitável é que o calendário do impeachment está em andamento, e amanhã prevê-se que o Supremo julgue os embargos de declaração (pedidos de esclarecimento) encaminhados pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para elucidar questões sobre o rito a seguir. Estabelecidas de vez as regras do impedimento, Cunha, de costas para o Planalto faz tempo, promete ser rápido. Continua incômoda a presença na Mesa da Casa de alguém com a ficha de Cunha, investigado pela Lava-Jato, já denunciado ao STF pela Procuradoria-Geral da República, também autora de pedido à Corte do afastamento do deputado da Mesa da Câmara. Mas, esteja ou não Cunha no cargo, o processo tramitará independentemente dele.

O PT, por sua vez, insiste no mantra do “golpe”, cada vez mais desafinado, diante das evidências de que tudo tramita sob o manto da Constituição. Inclusive na Lava-Jato. E assim precisa continuar a ser. Também é inócuo o partido maldizer a “classe média”, sempre presente em momentos políticos importantes, e não só no Brasil. Por sinal, foi ela que deu o empurrão decisivo para que um Lula convertido à paz e ao amor chegasse afinal ao Planalto em 2003 e lá ficasse por mais um mandato.

Mas precisam os militantes e a cúpula da legenda procurar entender por que perdem apoio em regiões em que vinham sendo bem votados nestes 13 anos de poder. Pelo menos, nos dias que antecederam o domingo, demonstrações de arrogância de Dilma, ao falar sobre renúncia, e ameaças de Lula com sua “jararaca” não devem ter contribuído para os interesses do partido.

O PT aposta no medo - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 15/03

Não deveria haver a menor dúvida sobre quais foram os principais alvos da gigantesca manifestação que tomou as ruas do Brasil no domingo. Lá estavam bonecos do ex-presidente Lula e da presidente Dilma Rousseff retratados como presidiários, e multiplicavam-se cartazes e palavras de ordem contra o PT. No entanto, bastou que alguns políticos da oposição fossem vaiados durante os protestos para que o Politburo petista decidisse que estamos todos enganados: para os iluminados do partido, não se tratou de um ato contra o PT ou contra Dilma, mas de uma expressão de descontentamento com o mundo político em geral.

Essa versão amalucada dos fatos nada tem de ingênua. Os apressados podem atribuí-la à criatividade de um partido que há tempos se transformou em uma seita – na qual os fanáticos seguidores acreditam que o real é aquilo que seus guias espirituais dizem ser, e não o que seus olhos veem. No entanto, a interpretação que os líderes petistas estão fazendo das manifestações é fruto não de confusão mental ou de transe religioso, mas sim de uma estratégia política rastaquera, cujo único objetivo é tentar sobreviver à ampla desmoralização do partido nas ruas e na história.

Não é difícil de acompanhar o raciocínio dos capas pretas do PT. O presidente do partido, Rui Falcão, disse que se “preocupou” com o fato de que “a oposição que fomentou esse ato tenha sido hostilizada em plena Avenida Paulista”. Isso o “preocupa”, ele disse, porque “em 1964 os golpistas que apoiaram os militares, esperando que, com a deposição do Jango (presidente João Goulart), pudessem assumir o poder, foram igualmente afastados e depois tivemos 21 anos de uma ditadura sanguinária”.

Traduzindo: para a voz oficial do PT, a oposição criou um clima propício para a mobilização popular na expectativa de usá-la para destruir o partido, derrubar a presidente Dilma, acabar com Lula e retomar o poder, mas acabou sendo vítima do próprio veneno. A comparação com 1964 é obviamente absurda, entre outras razões porque a destituição da presidente Dilma Rousseff – de resto uma exigência da maioria absoluta da população – só ocorrerá dentro do mais estrito respeito à lei. Foi exatamente o que aconteceu em 1992, quando milhares de brasileiros – petistas inclusive, com Lula à frente – foram às ruas para demandar o impeachment de Fernando Collor. Naquela época, nenhum petista se queixou de que se gestava um golpe como o de 1964.

Agora, no entanto, aos petistas só resta apostar no medo de um retrocesso democrático, ao sugerirem que os milhões de manifestantes do domingo não passam de representantes de uma elite golpista que não se conforma com os alardeados “avanços sociais” do lulopetismo. Mais do que isso: essa massa, adverte o PT, é uma criatura que se insurgirá contra seus criadores, desprezando a classe política e entregando o comando do País a algum aventureiro.

Foi esse cenário de pesadelo que outro líder petista, Tarso Genro, invocou para atacar as legítimas manifestações de domingo. No Twitter, Genro escreveu que “a velha ordem política terminou na Avenida Paulista, como na Marcha com Deus em 64” – referência à mobilização popular e de lideranças civis em São Paulo que antecedeu a instalação do regime de exceção.

A “velha ordem política”, de fato, está por um fio – especialmente porque muitos de seus próceres estão em sérios apuros legais depois de terem sido flagrados esbaldando-se no festim corrupto promovido pelo PT. Mas é claro que não foi a isso que Genro se referiu. Para ele, os protestos realizados Brasil afora são a negação da política, uma evidência de que “os partidos e a política foram feridos gravemente” – algo que, segundo Genro, pode ser comparado ao que aconteceu na Alemanha às vésperas da ascensão do nazismo.

Esse é o nível da impostura dos seguidores de Lula. Mas nada disso surpreende. Os petistas desde sempre menosprezam qualquer forma de expressão política que não tenha sido inspirada em sua doutrina, pois se consideram moralmente superiores e, portanto, os únicos capazes de interpretar e de atender aos interesses do povo. Eis a verdadeira negação da política.