domingo, julho 07, 2019

De Bolsonaro a Erdogan - JULIO WIZIACK

Folha de S. Paulo - 07/07

Sob o escudo da 'despetização', governo Bolsonaro ataca princípios democráticos



Em um evento com parlamentares ligados ao agronegócio, Jair Bolsonaro voltou a repetir que seu governo precisa “desfazer o que foi feito para depois fazer”. Mas sob o pretexto de “despetizar” a administração federal, seu governo já faz: ataca as instituições públicas.

Somente na semana passada, o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, afirmou que os índices de desmatamento na Amazônia são manipulados, jogando lama no Inpe, centro de excelência em pesquisas espaciais.

Na Justiça, o próprio presidente disse que o ministro Sergio Moro vazou para ele informações de uma investigação sigilosa da Polícia Federal. Colocou em xeque a independência do órgão, que deve investigar até o ministro se for preciso.

No início de sua gestão, Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, acusou o Ibama de forjar contratos de aluguel de veículos. Foi apoiado por Bolsonaro, que prometeu nas redes sociais expor o esquema de corrupção. Nada havia de errado com os contratos, como se provou depois.

Nas palavras de parlamentares, Bolsonaro e seus principais assessores pintam o Congresso como um reduto de corruptos. Mas usam deputados de seu partido, o PSL, para tentar emplacar uma proposta de emenda constitucional que restrinja a atuação do Supremo Tribunal Federal, especialmente em temas ligados aos costumes.

Servidores são perseguidos e demitidos por serem “petistas” ou “ideologizados”, o que fere o princípio democrático da impessoalidade na administração pública.

Um processo assim não é de “desfazer”, como diz Bolsonaro, mas um golpe no próprio Estado.

Se os fins continuarem a justificar os meios, o risco é o de virarmos uma Turquia. Recep Erdogan foi eleito presidente com uma agenda liberal na economia e a promessa de reverter os estragos causados pela crise econômica e a corrupção.

No final, ele aparelhou as instituições do país que, considerado autocrático, fica cada vez mais distante de ser aceito como membro da União Europeia.

Estado policial: Moro já fez o que o PT não ousou nem para tentar se salvar - REINALDO AZEVEDO

UOL - 07/07

Estado policial: Moro já fez o que o PT não ousou nem para tentar se salvar



José Eduardo Cardozo: ministro da Justiça de Dilma, nunca houve nem sinal de que ele tenha tentado controlar a Lava Jato. Com seis meses no poder, Sergio Moro já passou a Bolsonaro informação sobre inquérito sigiloso e, segundo o próprio presidente, recebeu ordem para que a PF abra investigações. É tudo ilegal (Foto: Adriano Machado/Época)

José Eduardo Cardozo era o ministro da Justiça quando teve início a tal Lava Jato. Não se tem notícia de que tenha sido avisado previamente das ações desfechadas pela Polícia Federal. E isso implicava que sua chefe, a então presidente Dilma Rousseff, era literalmente a última a saber.

Desde os primeiros passos, a Lava Jato se organizou de forma meticulosa para capturar a imprensa com vazamentos organizados, hierarquizados e seletivos. Uma das consequências foi a queda do governo Dilma — que não se deu só em razão disso, mas também por isso.

Quem conhece os bastidores dessa história pode atestar: Cardozo era malvisto pelos setores mais inconformados do PT. Considerava-se um absurdo que, sendo a PF administrativamente subordinada ao Ministério da Justiça, atuasse com independência — como, de resto, prevê a lei.

Pois bem! O jornalista Rubens Valente, da Folha, apontou o que ao resto da imprensa passou despercebido, incluindo a este escriba. Reproduzo trecho de texto publicado em sua página:

Que o presidente da República tenha revelado isso e nenhuma reação provocado é um sinal preocupante de debilidade das instituições. Em entrevista coletiva no Japão, no dia 28, Jair Bolsonaro disse que o ministro Sergio Moro lhe deu acesso privilegiado a dados do inquérito sobre os laranjas do PSL: "Ele [Moro] mandou a cópia do que foi investigado pela Polícia Federal pra mim. Mandei um assessor meu ler porque eu não tive tempo de ler".
Segue Valente:

Ocorre que a investigação tramita sob segredo na 26ª Zona Eleitoral de Minas Gerais. Surgem aqui dúvidas éticas e legais. Bolsonaro foi além. Revelou que "determinou" a Moro, que por sua vez iria "determinar" à PF, que "investigue todos os partidos" com problemas semelhantes. "Tem que valer para todo mundo, não ficar fazendo pressão em cima do PSL para tentar me atingir."

As declarações devem assustar policiais das diversas carreiras da PF —alguns dos quais hoje em cargos de direção, reconheça-se— que nos últimos 30 anos trabalharam para que o órgão evoluísse para uma instituição "de Estado, não de governo", como cansaram de repetir. Uma PF que não esteja à mercê dos rancores do presidente e do ministro de plantão. Um órgão que investigue fatos e não pessoas.

O jornalista atenta para a gravidade do caso:

Bolsonaro se elegeu agitando a bandeira "da lei e da ordem", o que pressupõe pelo menos respeito aos órgãos investigativos. Agora faz o contrário: acessa e fala sobre um caso sob segredo e humilha investigadores em praça pública ao ditar como devem se comportar, como se eles não soubessem seu papel. Ele também tem seguidamente atacado a PF por discordar, sem provas, das conclusões do caso Adélio.

Os órgãos de controle da União ou não ouviram o que Bolsonaro disse no Japão ou ouviram e silenciaram. Nos dois modos temos instituições cegas para o Alex Jones que ora ocupa a Presidência. Ele exerce abertamente a ousadia dos impunes a fim de obter dados sigilosos e determinar o que deve ser investigado no país. Isso é que é Estado policial.


DE VOLTA AO COMEÇO
Volto, então, ao meu primeiro parágrafo e pergunto:

1: o que teriam dito os críticos do PT — e isso me incluiria, claro! — diante da evidência de que a PF teria fornecido, contra a lei, informações sigilosas ao ministro da Justiça, e este, dando sequência à ilegalidade, à presidente da República? Falo por mim: eu teria acusado uma tentativa de instalação de Estado policial a serviço de um grupo que quereria golpear a República;

2: o que teriam dito os críticos do PT — e isso me incluiria, claro! — se ficasse evidente, então, que o ministro da Justiça comandava as ações da PF e que, pois, esta teria se transformado numa polícia a serviço do governo, não a serviço do Estado, segundo as balizas legais? Falo por mim: eu teria acusado uma tentativa de instalação de Estado policial a serviço de um grupo que quereria golpear a República;

3: o que teriam dito os críticos do PT — e isso me incluiria, claro! — se a então presidente da República tivesse admitido que mandou, sim, seu ministro da Justiça determinar à PF que investigasse seus adversários políticos? E tal ministro, entende-se — depois de ter recebido e fornecido ilegalmente informação sigilosa sobre investigação —, teria cumprido diligentemente a ordem. Falo por mim: eu teria acusado uma tentativa de instalação de Estado policial a serviço de um grupo que quereria golpear a República;

4: O que teriam dito os críticos do PT — e isso me incluiria, claro! — diante da evidência de que, se a presidente podia mandar investigar seus adversários sobre um assunto em particular, então poderia fazê-lo sobre qualquer outro? Falo por mim: eu teria acusado uma tentativa de instalação de Estado policial a serviço de um grupo que quereria golpear a República;

5: O que teriam dito os críticos do PT — e isso me incluiria, claro! — diante de outra evidência, esta que segue? Presidente que manda investigar A ou B, dos quais não gosta, tem poder, então, para mandar parar de investigar C ou D, dos quais gosta. Falo por mim: eu teria acusado uma tentativa de instalação de Estado policial a serviço de um grupo que quereria golpear a República.

CADA UM FALE POR SI

Como se nota, falo por mim. Cada um fale por si. Não mudei de princípios:: ACUSO A TENTATIVA DE INSTALAÇÃO DE UM ESTADO POLICIAL A SERVIÇO DE UM GRUPO QUE QUER GOLPEAR A REPÚBLICA.

E seu principal agente, como resta evidente, é Sergio Moro. E olhem que não trato aqui das revelações feitas pelo site The Intercept Brasil.



Dada outra grave ilegalidade, Moro enrola. E o morista Randolfe. Ou já ex?



Randolfe Rodrigues: senador era, até outro dia, a voz da Lava Jato e de Sergio Moro no Senado. Caiu a ficha?

Confrontado com a evidência inquestionável de que recebeu, ilegalmente, informações sobre investigação sigilosa e de que, também ilegalmente, a transmitiu ao presidente da República, Sergio Moro resolveu se dedicar a um de seus esportes retóricos favoritos: a enrolação. Na noite desta sexta, o Ministério da Justiça emitiu uma nota, segundo informa a Folha:

"O Ministério da Justiça e Segurança Pública esclarece que foi o próprio presidente da República quem solicitou a apuração rápida da suposta utilização de pessoas interpostas na eleição do PSL em Minas Gerais. Na quarta-feira, após a efetivação das prisões do assessor especial do Ministério do Turismo pela Polícia Federal, o fato foi informado ao ministro da Justiça e da Segurança Publica e ao Presidente". E acrescentou: "Nenhuma peça ou informação processual que pudesse comprometer o sigilo das investigações ou que já não estivesse amplamente disponível à imprensa foi repassada".

Lê-se ainda no jornal:

O líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), protocolou nesta sexta-feira na comissão diretora da Casa um requerimento para que Moro "esclareça, por escrito", a notícia de que forneceu os dados da investigação sobre o PSL para Bolsonaro.

Segundo Randolfe, a notícia sobre o repasse dos dados "é extremamente grave" pois "coloca em dúvida a lisura e a imparcialidade das investigações por parte da Polícia Federal".

O senador pediu que Moro seja indagado se está ciente da lei que estabelece que "é dever do Estado controlar o acesso e a divulgação de informações sigilosas produzidas por seus órgãos e entidades, assegurando a sua proteção".

Randolfe fez uma comparação entre o episódio e o que envolveu um delegado da PF "acusado pelo TRF [Tribunal Regional Federal] da 4ª Região de violar o sigilo funcional do cargo por ter revelado ao ex-deputado André Luiz Vargas a existência de investigação sigilosa deflagrada".

O presidente da ADPF (Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal), Edvandir Felix de Paiva, disse à Folha que não sabe a que o presidente se referiu quando declarou que teve acesso à apuração, mas que Bolsonaro é um terceiro e, em tese, não poderia ter acesso a uma investigação sigilosa.

"Só posso falar em tese. Em tese nós sempre queremos acreditar que jamais um terceiro vai ter acesso a uma investigação. O presidente, apesar de ser autoridade máxima de um país, é sempre um terceiro, ele não deve ter acesso a investigações em andamento", disse o representante dos delegados.

(…)

RETOMO

Será que Randolfe, hora dessas, vai fazer ao menos um mea-culpa por ter sido, durante tanto tempo, uma espécie de porta-voz da Lava Jato no Senado, fechando os olhos para todas as agressões à ordem legal que já estavam em curso sob o pretexto de apoiar o combate à corrupção? Mais do que ignorá-las, ele as exaltou muitas vezes.

É claro que não vou criticá-lo agora por ter feito a coisa certa. E não o criticarei por acertos futuros ainda que não venha a fazer a autocrítica. Mas sempre indagarei aos agentes políticos se descobriram o caminho da institucionalidade e do respeito às leis, de modo que arbitrariedades outras não venham a nos assolar no futuro.

Sim, é muito grave que Moro tenha tido acesso a informações sigilosas e que as tenha fornecido ao presidente. Ainda mais grave é que este tenha declarado, com a desfaçatez habitual, que ordenou que a PF investigasse também outros partidos. Não que não possam ser investigados se houver motivos. Mas ordená-lo é tarefa de um presidente?



Moro nunca foi tão perigoso: mais fraco e ainda forte, será servil ao rei




Prestem atenção a uma questão: Sergio Moro nunca foi tão perigoso como agora. E justamente porque está mais fraco — e se enfraquecendo. Entrou no jogo para ser uma espécie de âncora de seriedade do governo de Jair Bolsonaro e agora depende do presidente da República para manter a cabeça fora d'água. Não podendo ser aplaudido pelo estado de direito, vai buscar o aplauso do estádio.

Ainda que um bolsão de juízes federais tenha saído em sua defesa, é certo de que tal apoio moral vai diminuir à medida que se vá retirando o véu da fantasia que cobre a realidade. Parcelas crescentes da população começam a cair na real e a perceber que o demiurgo de uma nova ordem era, na verdade, o ogro.

E por isso Moro se torna especialmente perigoso: porque ainda dispõe de muito poder e vai lutar desesperadamente para se manter naquele lugar de gozo permanente em que ficou nos últimos cinco anos: bastava uma mensagem a seus comandados na Lava Jato, e tudo se movia, inclusive na imprensa. Ocorre que aquele lugar já não existe mais.

A lógica indica que haverá contra-ataque, mas agora, necessariamente, como um instrumento do governo. Não resta outra coisa à fera acantonada. O projeto pessoal do ex-juiz-vedete chegou ao fim — e será triturado ao fim da jornada. Enquanto permanecer no Ministério da Justiça, empregará seus infiltrados para atender às vontades do rei.

Autoengano - MARCOS LISBOA

FOLHA DE SP - 07/07

A reforma tributária pode simplificar o sistema de coleta de impostos, mas não diminuir a carga


Segundo a imprensa, um conjunto de empresários anunciou na semana passada que irá apoiar a criação de um imposto único sobre movimentação financeira, o que permitiria a redução da carga tributária.

Sinto ser portador de más notícias, mas isso não é possível. O governo tem uma série de contas a pagar, como aposentadorias, salários de servidores e muitas outras que não podem ser reduzidas, mesmo com mudanças na legislação.

A carga tributária hoje não é suficiente para pagar essas despesas obrigatórias, e o máximo que o governo pode fazer é propor reformas para reduzir o seu crescimento, como no caso da Previdência. Por isso, a reforma tributária pode simplificar o sistema de coleta de impostos, mas o resultado final não pode implicar queda da arrecadação.

Para agravar, o governo anda sugerindo que irá aumentar as transferências para estados e municípios. Para isso, ao contrário do esperado, terá que aumentar a carga tributária, considerando suas atuais obrigações legais.

Um imposto sobre movimentações financeiras de 2,5%, como proposto, pode parecer pouco, mas é caso de autoengano. A produção de bens inclui diversas etapas, da produção de insumos básicos, como energia ou aço, passando pela compra de máquinas e de peças que, por sua vez, são também o resultado de muitos processos produtivos.

Em cada uma dessas etapas, o pagamento pelos insumos utilizados será onerado por esse novo tributo. Quanto maior o número de transações para a produção de um bem final, maior será o imposto a ser pago.
Esse regime tributário penalizará, sobretudo, a indústria, cuja cadeia produtiva é usualmente bastante longa. Além disso, vai na contramão das regras adotadas pelos demais países e pode induzir o aumento da informalidade.

A boa prática tributária recomenda tributar apenas o valor adicionado em cada etapa produtiva, descontando-se os impostos já pagos quando da aquisição dos insumos utilizados no processo de produção. Dessa forma, evita-se pagar imposto sobre imposto, o que mascara a carga tributária efetivamente paga e leva ao aumento dos preços relativos dos bens mais complexos.

A boa prática também recomenda que os tributos sejam pagos onde os bens e serviços são consumidos e, por essa razão, a maioria dos países não cobra impostos sobre as exportações, tributando, porém, as importações.

Caso o Brasil adote um imposto sobre movimentação financeira, não será possível desonerar as exportações, pois qualquer insumo utilizado direta ou indiretamente estará onerado por tributos pagos para sua produção.

Nem tudo que reluz é ouro. A simplicidade pode custar mais caro do que se imagina.

Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia

Vinte e cinco anos do Real - FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

O Estado de S.Paulo/O Globo - 07/07

De novo o País está em perigo. Mãos à obra, a começar pela reforma da Previdência



Neste mês de julho de 2019 o Plano Real comemora 25 anos. As novas gerações não se lembram, mas a inflação foi um flagelo. De dezembro de 1979 a julho de 1994, a inflação acumulada atingiu aproximadamente 12 trilhões por cento.

A renda do trabalhador era corroída pela alta crônica e crescente dos preços. Sofriam principalmente os trabalhadores mais pobres, sem organização sindical a maioria. Onde o sindicato era forte havia greve a toda hora: as empresas concediam aumentos salariais, mas os repassavam ao consumidor, alimentando a espiral inflacionária. Protegiam-se melhor dela os bancos, os grandes aplicadores, as empresas capazes de impor seus preços ao mercado e o governo, que tinha suas receitas indexadas e contava com a inflação para ajustar o valor real dos seus gastos. Daí o aumento da pobreza e da desigualdade provocado pela inflação.

O governo defendia o seu caixa, mas não conseguia planejar as suas ações. Nem as empresas, muito menos os pequenos empreendedores, as famílias e as pessoas. A inflação era um flagelo especialmente para os mais pobres, mas infernizava o País como um todo.

Foi nesse contexto que ouvi, perplexo, em Nova York o presidente Itamar Franco me perguntar pelo telefone se eu aceitaria trocar o Ministério das Relações Exteriores pelo Ministério da Fazenda. Estávamos em maio de 1993. Seria o quarto ministro da pasta em sete meses de governo. Disse-lhe que não deveria trocar o então ministro, Eliseu Rezende, mas que, ausente do Brasil, não sabia avaliar a situação. Ele respondeu que conversaria com o ministro e me informaria. Mais tarde mandou avisar que não precisava mais falar comigo. Fui para o hotel desanuviado, até ser despertado de manhã por minha mulher, Ruth, desgostada por eu haver sido designado para pasta tão difícil.

Voltei ao Brasil com meu chefe de gabinete, embaixador Sinésio Sampaio Góes. Disse-lhe que precisaria dele no novo ministério, pois não conhecia bem os funcionários de lá. Voei pensando no discurso de posse do dia seguinte. Repeti o mantra de José Serra: o Brasil tem três problemas; o primeiro é a inflação, o segundo também e terceiro, idem. Mas “com que roupa” poderia dirigir o Ministério da Fazenda? Sou sociólogo, embora haja trabalhado na Cepal e iniciado a carreira universitária na Faculdade de Economia da USP. Só havia um jeito: convocar uma boa equipe de economistas e cuidar da política. Tinha recebido carta branca de Itamar.

A isso me dediquei com afinco. O primeiro a topar foi Clóvis Carvalho, que designei secretário-geral. Edmar Bacha aceitou ser assessor. Consegui a nomeação de um jovem, Gustavo Franco, para a Secretaria de Política Econômica, que seria chefiada por Winston Fritsch.

Acompanharam-me ainda meu assessor no Senado Eduardo Jorge (Caldas Pereira) e um antigo aluno e amigo, Eduardo Graeff. No começo imaginávamos um plano tradicional de controle dos gastos.

Foi a partir de uma sugestão de Edmar Bacha (a de se tomar como índice de correção monetária as Obrigações do Tesouro Nacional) que começamos a pensar numa transformação mais profunda. Ali começou a nascer a URV, inspirada em texto teórico de André Lara Resende e Pérsio Arida, escrito dez anos antes. Mais tarde o presidente Itamar, sempre inquieto, proporcionou-me incluir ambos na equipe.

André substituiu Pedro Malan na chefia da negociação da dívida externa, enquanto este assumiu o Banco Central, quando ao início de agosto de 1993 Itamar se desentendeu com o presidente anterior do banco e resolveu demiti-lo. Outro choque entre Itamar e um alto funcionário, desta vez o presidente do BNDES, me permitiu convencê-lo a escolher Pérsio Arida para o cargo. Daríamos a sensação de estar fazendo um novo Plano Cruzado. Embora não fosse certo, era tudo o que Itamar queria.

Estava assim formada a equipe básica dos que trabalharam no Plano Real, que se reunia sob a batuta de Clóvis Carvalho. Eu comparecia a algumas discussões. Quando a proposta era muito complicada, sobretudo com equações, dizia logo: esclareçam melhor porque eu terei de explicar tudo ao País. E foi o que fiz. Das decisões tomadas, duas devem ser destacadas. A primeira foi a sugestão de anunciar com antecipação tudo o que faríamos, nada de surpresas! A segunda foi a de tomar cuidado com as questões legais. A essa tarefa Eduardo Jorge e Gustavo Franco se dedicaram, com apoio de profissionais do Direito. Evitamos os erros jurídicos que ocorreram em outros planos.

Dediquei-me a explicar o plano (tarefa que foi continuada com sucesso por Rubens Ricupero). Falei com cada bancada partidária no Congresso, com os principais líderes sindicais, incluídos os da CUT, com os ministros e, especialmente, com a Nação. Mudar o rumo de uma economia não é só tarefa técnica. É política. É de convencimento, e não apenas “dos mercados”, mas da população. Sem que a mídia e os comunicadores houvessem entendido e, até certo ponto, aceitado o desafio da estabilização da moeda nada de profundo aconteceria. Mais ainda: a URV não era “um truque”, mas uma ponte sólida para uma moeda estável.

Um programa econômico da magnitude do Real é um processo, leva tempo. Requeria a renegociação da dívida externa, como fizemos antes de lançar a nova moeda, bem como a privatização de muitos bancos públicos, especialmente os estaduais, a negociação da dívida pública de Estados e municípios e muitas outras medidas tomadas ao longo dos meus dois mandatos na Presidência, culminando com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Foram necessários tempo, persistência e coragem. Só assim se ganha o que é fundamental: a credibilidade.

Por isso é importante relembrar os 25 anos do Plano Real. De novo, o País está em perigo. Mãos à obra, a começar pela reforma da Previdência.

Sociólogo, foi presidente da República

Brasil petroleiro, segunda tentativa - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 07/07

Reabertura do setor e melhora da Petrobras vão levar petróleo para o centro da economia


O principal produto de exportação do Brasil é o grupo da soja. O segundo? Petróleo e derivados. Sim, combustíveis já estiveram algumas vezes na vice-liderança desde 2008. Mas nunca antes tiveram
tanto peso nas exportações: 14,2% do total, ante 15,9% da soja, 11% de material de transporte (veículos, aviões e suas peças) e 10,2% de minérios metalúrgicos (quase tudo ferro e algum cobre).

Afora no caso de colapso do volátil preço do barril, é bem provável que petróleo venha a ser em breve o principal produto da exportação brasileira e algo ainda maior no ambiente doméstico. O pouco notado recorde de produção de maio pode ser um aviso da mudança. O Brasil já é o nono maior produtor mundial.

A reabertura do mercado, em 2016, as privatizações de partes enormes do conglomerado Petrobras e a abertura do mercado de gás devem mudar a paisagem da economia e a propriedade do capital, em especial no setor de energia, além de estimular investimentos pesados a partir de 2020.

Falta análise, porém, de quem vai se divertir mais nesse remelexo do setor.

A produção de petróleo e gás foi recorde em maio, embora em termos anuais tenha praticamente estagnado desde 2017. Atualmente, extraem-se 2,73 milhões de barris por dia, sem contar o equivalente a 700 mil barris por dia em gás.

No “Plano Decenal de Expansão de Energia 2027” do governo, publicado em dezembro passado, previa-se que o país estaria produzindo 3,3 milhões de barris por dia neste 2019.

A previsão vai dar chabu, é óbvio, mas os investimentos começaram a voltar e vão aumentar ainda mais depois dos enormes leilões de áreas de exploração, em novembro próximo.

Se a produção chegar ao previsto pelo Plano Decenal e caso funcione a abertura do mercado de gás, o setor de petróleo vai para o centro da economia brasileira.

Em 2016, a lei de reabertura do mercado desobrigou a Petrobras de investir em qualquer campo do pré-sal, o que emparedava investimentos da concorrência e não favorecia os novos negócios da petroleira nacional.

Desde 2015, a empresa se recupera do desastre, voltando a elevar suas despesas de capital.

O setor ficou sem leilões e, pois, sem a perspectiva de aceleração do investimento, entre 2008 e 2013, graças ao revertério regulatório dos governos petistas, afora as desgraças causadas por maluquices, incompetências e pela roubança na Petrobras.

Endividada, em desordem e sem crédito, a empresa se desfez e se desfaz de suas grandes controladas, movimento acelerado pelo Cade, que quer acabar com os quase monopólios da estatal, e por Paulo Guedes.

A Petrobras vende suas empresas de transporte de gás. Vai vender a Liquigás, a BR Distribuidora e 8 de suas 13 refinarias, responsáveis pela metade de capacidade de refino da companhia (mais de 1 milhão de barris por dia).

Tudo isso deve entrar em liquidação pelos próximos dois anos, no máximo. São negócios de dezenas de bilhões de reais, talvez centena, a maior privatização desde FHC 1.

A privatização e a abertura devem, claro, também mudar a política do capital. Basta lembrar o que aconteceu com a ascensão da soja e dos oligopólios das carnes.

A diferença agora é que a maioria da novidade será estrangeira, embora a finança e antigos canavieiros devam levar nacos do negócio. Como se não bastasse, preços livres em um mercado volátil como o de energia podem causar turumbambas, de consumidores empresariais ao povo miúdo, vide o caminhonaço.

Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Bolsonaro traidor - ASCÂNIO SELEME

O GLOBO - 07/07

Presidente do Brasil perdeu mais uma disputa no Congresso, dessa vez na comissão que aprovou a reforma da Previdência


O presidente do Brasil perdeu mais uma disputa no Congresso. Dessa vez na comissão que aprovou a reforma da Previdência. Depois de ser chamado de traidor por policiais civis, federais e rodoviários e por agentes penitenciários, Jair Bolsonaro correu para tentar mudar o teor do projeto de modo a garantir proteção a estes também. Era tarde demais. O relator da reforma ignorou o presidente e a comissão retirou da reforma apenas policiais militares e bombeiros, até porque esta fatura cairá na conta dos estados.

Posicionado de forma intransigente com o Congresso, reiterando que não negocia com parlamentares por entender que negociação política é loteamento de cargos, o presidente achou que bastavam dois telefonemas a líderes de partidos aliados e uma postagem em rede social para resolver o problema. Quebrou a cara. Sorte do Brasil. Imaginem do que ele seria capaz se soubesse negociar e tivesse habilidade política.

O apoio ao presidente veio de apenas alguns fiéis e dos partidos de esquerda. PT, PCdoB, PDT, PSOL e Rede votaram a favor de estender um regime complacente também aos policiais. Votaram assim, não por convicção, mas para torpedear o projeto da reforma. E o quadro pitoresco que se viu foi Jandira Feghali defendendo no plenário da comissão o mesmo que Jair Bolsonaro pregava em redes sociais e entrevistas: mais privilégios especiais.

Jair Bolsonaro é um presidente corporativo. Por vezes pensa e age como se governasse apenas para militares. Mesmo assim, alguns oficiais das Forças Armadas também já o veem como um desertor da causa militar. Dado o seu empenho em favor da classe, não seria um bom CEO da “Generais e Cia Ltda”. Em seis meses, comprou briga com metade dos quatro estrelas que colocou no governo, e agora ouve sem reagir o filho Carlos atacar o seu general mais antigo, o ministro Augusto Heleno. Difícil enxergar aonde ele quer chegar. Por vezes parece que trabalha sem tática, sem objetivo. O relator da comissão, Samuel Moreira, disse que a reforma sozinha não basta, cabe agora ao governo apresentar seus projetos.

Se, passada a reforma, o governo afinal apresentar projetos, vai precisar do Congresso para aprová-los. Hoje, Congresso e Palácio estão em campos distintos. Tanto que a reforma que anda não é a de Bolsonaro nem a de Paulo Guedes, é a reforma previdenciária que o Congresso recriou. Depois de mexer duas vezes no comando da articulação política no meio da discussão da reforma, Bolsonaro deu posse na quinta-feira ao general Ramos no comando da Secretaria Geral. Nas palavras das repórteres Bela Megale, Naira Trindade e Jussara Soares, “Ramos terá de construir um bom relacionamento com o Congresso, mas não tão próximo a ponto de gerar desconfiança de Bolsonaro e seu entorno”.

E é exatamente isso, o novo ministro da articulação política vai ter que andar no fio da navalha para não cair. Vai ser obrigado a negociar sem ter protagonismo. Será refém do desmedido ciúmes que os filhos têm do pai, das instruções obtusas do guru de Richmond e da intransigente mania do pai de não fazer concessões a políticos. Será um ministro que pela natureza da sua função terá que prometer muito, mas que em razão das suas amarrações palacianas terá pouco ou quase nada para entregar.

ESPERAVA-SE MAIS

Aqueles que se animaram com a renovação de mais de 50% do Congresso, nas eleições de 2018, já estão começando a sentir saudades do legislativo anterior. Pelo menos havia com quem negociar , pessoas que respeitavam acordos, apesar de boa parte deles ter perdido o mandato como punição do eleitor por suas ações criminosas. Os novatos na Câmara e o no Senado estão perdidos. Com meia dúzia de exceções, a maioria ainda tenta entender melhor como a banda toca. Mas essa é uma questão de tempo. Com mais três ou quatro anos já estarão todos na ponta dos cascos. O problema é que aí vem nova renovação.

SHOW DE BESTEIRAS

Tire dois ou três ministros que funcionam, e com os que sobram fica mais fácil entender o general Santos Cruz. Não se trata apenas do festival permanente de besteira, quem vê o governo de perto ou precisa dele diz que pouca coisa anda. E o que anda, capenga.

TRABALHO INFANTIL

Na sua mais recente bobagem , o presidente Bolsonaro disse que o trabalho infantil não prejudica o desenvolvimento da criança. “Eu trabalhei desde os nove anos. E hoje sou o que sou”. Pois é. Melhor não.

AVE MARIA

A ministra Damares Alves deveria visitar a exposição de Tarsila do Amaral, no Masp. Aliás, duas das maiores artistas brasileiras estão expostas simultaneamente em São Paulo e no Rio. Tarsila, no Masp, e Djanira, na Casa Roberto Marinho. Mas dona Damares deveria ir ao Masp e observar com atenção o óleo Religião Brasileira 1, de 1927. No presépio multiétnico pintado por Tarsila, Maria foi desenhada em azul e Jesus Cristo em rosa.


MDB VIVE

O velho partido não morreu. Ainda caminha com alguma dificuldade, mas respira sem ajuda de aparelhos e já busca nomes para presidente da legenda , que será eleito em outubro. Os candidatos naturais seriam os três governadores da legenda. Mas os estatuto não permite e, mesmo que fosse mudado, o que é comum no partido, Renan Filho e Helder Barbalho não aceitariam a indicação, e Ibaneis Rocha começou mal sua gestão no DF e não emplacaria. O nome mais forte é o da senadora Simone Tebet, do Mato Grosso do Sul.

O LIVRO DE GAROTINHO

O ex-governador Anthony Garotinho disse em dezembro passado que lançaria em março desse ano um livro sobre o governo de Sergio Cabral. Ele tinha até nome, seria “A gangue dos guardanapos e a vingança”. Segundo Garotinho, seu trabalho naquele momento era o de reduzir o tamanho do livro, uma vez que ele já tinha escrito mais de mil páginas. Acho que fatos novos o obrigaram a refazer o texto. Primeiro, porque ele não entregou o livro em março, como prometido, e reduzir é bem mais fácil que escrever . Segundo, porque na semana passada ele pegou um táxi na porta da sua casa e pediu para ser levado à UFRJ. O taxista, que o reconheceu, perguntou o que ele iria fazer na Universidade. Garotinho disse que ia para a biblioteca fazer pesquisas para o seu livro. E, terceiro, porque a esta altura é difícil haver coisa nova sobre Cabral que o mundo inteiro ainda não conheça.

JOSEF STRUMP

A festa promovida pelo presidente Donald Trump para comemorar o 4 de julho lembrou, na forma, os piores momentos do regime soviético. Desfile de tanques e jatos mostra nada , a não ser arrogância. Faltaram os mísseis, claro. Mas o desfile pode ter sido também um novo ensinamento que ele trouxe da sua recente visita ao Kim Jong-un, na Coreia do Norte.

NOSSO RIO

Muito bem, foi regulamentado o uso de patinetes no Rio. As regras são boas e não atrapalham ninguém. Só uma questão não deu para entender. Já que as regras servem para garantir segurança, por que o uso do capacete é opcional? Opcional significa desnecessário. Em São Paulo, seu uso é obrigatório.

JUSTIÇA FEITA?

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou uma adolescente da cidade de Campestre por criticar no Facebook uma mulher que desperdiçava água lavando a calçada com mangueira. A condenada terá que pagar R$ 3 mil à ofendida e se retratar na rede social. Na primeira instância, o juiz Felipe Ceolin Lirio julgou que os posts da adolescente teriam lesado a honra da requerente. O Tribunal concordou com o juiz e negou recurso da acusada. Segundo o desembargador Luciano Pinto, as postagens “extrapolaram o razoável”. A mulher que lava calçadas desperdiçando água ganhou. Duas perguntas ao leitor: 1) Você acha que a justiça foi feita? 2) Denunciar desperdícios publicamente deve ser considerado crime?


O que faz um estadista - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 07/07

Jair Bolsonaro julga que, por ter sido eleito, tem legitimidade para fazer o que seria a vontade do 'povo': acabar com tudo o que veio antes dele


Quem ambiciona ser estadista deve ter clara visão de mundo e deve se perguntar se essa visão é mesmo a melhor para o país que pretende governar. Há pessoas que, diante dessa questão, respondem, sem espírito crítico, que sua visão é não só a melhor, como é inquestionável. Na verdade, quem assim se apresenta não é um estadista, mas um político medíocre, que mede o mundo pela régua curta de seus preconceitos e não tem, como consequência, rigorosamente nada de grande a oferecer ao país em termos de política, de economia e do bom funcionamento das instituições.

Um verdadeiro estadista não é o que manda, mas o que governa – e governar é tomar decisões depois de ouvir as forças políticas e sociais legítimas e procurar saber quais são as autênticas prioridades das gerações atuais, mas, principalmente, das futuras. Desse modo, é capaz de inspirar os cidadãos, mesmo aqueles que não o escolheram como presidente, a trabalhar por um país melhor. Essa é a diferença entre um projeto de construção e um projeto de destruição. Um dos grandes males do Brasil após a redemocratização tem sido a política de terra arrasada: quem assume o poder anuncia que fará tábula rasa do que veio antes, sem se importar se aquilo que veio antes é essencial para o crescimento do País.

Há governantes que vão além e interpretam o voto que receberam como uma ordem para destruir o trabalho dos antecessores e tratar a oposição como pária. O voto, segundo essa visão, estabeleceria uma conexão direta do eleitor com o eleito, tornando esse governante o único capaz de interpretar o desejo popular. Na América Latina, esse tipo de populismo já foi experimentado com dramáticas consequências, por exemplo, no Peru de Velasco Alvarado e na Venezuela de Hugo Chávez, a cuja ruína assistimos ao vivo.

Em comum na experiência desses países é que governantes medíocres que se pretendem “estadistas” não conhecem outro caminho que não seja o da demagogia para exercer o poder, atropelando as instituições democráticas e contaminando o debate político com ideologias e imposturas. Interdita-se a política e criminaliza-se o passado, como se nele residisse todo o mal. Só o “novo” é bom e redentor.

A história mostra que o País só ganhou quando foram preservados, de um governo a outro, os valores fundamentais da sociedade e revogados os costumes que jogavam governo e sociedade num círculo vicioso e corruptor. Lula da Silva soube entender essa verdade básica, mantendo na primeira parte de seu governo inicial os fundamentos que levaram à estabilidade econômica na administração anterior, de Fernando Henrique Cardoso. Quando ele se deixou levar pelo perfume inebriante do populismo e tentou convencer os brasileiros de que o legado de responsabilidade fiscal era uma “herança maldita” e, como tal, precisava ser destruído, os governos petistas abriram caminho para o desastre. O País ainda não se recuperou dessa aventura.

Vivemos situação semelhante. O presidente Bolsonaro vive repetindo que é ele o único e bom representante do povo, como se não soubesse que, pela boa doutrina constitucionalista, é o Legislativo que representa a vontade popular. O novo governo elegeu-se prometendo mudar tudo. Quando Bolsonaro decidiu encaminhar um projeto inteiramente novo de reforma da Previdência, desprezando um projeto do governo anterior que já estava com tramitação avançada, seguiu a lógica da terra arrasada, sem levar em conta as necessidades do País. A mesma lógica presidiu o desinteresse do atual governo pelos projetos deixados pela gestão anterior com vista a incentivar a retomada do crescimento. Há muitos outros exemplos dessa devastação deliberada, da política externa à educação.

Mas Bolsonaro julga que, por ter sido eleito, tem legitimidade para fazer o que seria a vontade do “povo”: acabar com tudo o que veio antes dele. “Respeito todas as instituições, mas acima delas está o povo, meu patrão, a quem devo lealdade”, escreveu nas redes sociais, esquecendo-se de que ele não foi o único eleito em 2018 – todos os parlamentares, inclusive os da oposição, também receberam votos. Deve-se dizer, aliás, que a vontade do “patrão” de Bolsonaro representa-se melhor no Congresso do que no Palácio do Planalto, que não é a “casa do povo”. Por isso, se o presidente quiser saber o que o “povo” demanda, o melhor lugar não é numa manifestação de simpatizantes na Avenida Paulista, e sim no Congresso democraticamente eleito para representar cada um de nós.