quinta-feira, setembro 20, 2012

Meia-boca - CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O Globo - 20/09


Já disseram que, se você fizer qualquer coisa com convicção, acaba dando certo. Vale para tenistas, por exemplo. O jogador que vacila no momento do golpe e, numa fração de segundo, imagina que aquela pode não ser a opção correta, ou erra ou passa uma bola fraca. Perde de qualquer jeito.

Mal comparando, Angela Merkel não vacila na política econômica que impõe à Europa. Governos endividados precisam fazer o ajuste e ponto final. Claro, ainda estamos longe de saber se isso vai dar certo, mas está andando. Até François Hollande, que se elegeu presidente atacando a receita Merkel, anunciou corte de gastos públicos e aumento de impostos.

Mas tentou amenizar a coisa. Disse que o peso do programa cairia sobre aqueles que ganham mais de um milhão de euros/ano e cuja alíquota do imposto de renda sobe de uns 50% para 75%. E, para amenizar a coisa pelo outro lado, explicou que isso afetaria no máximo três mil pessoas. E desculpou-se garantindo que os sacrifícios serão temporários.

Não tem a convicção, claro, está agindo por força das circunstâncias. Por isso, as dúvidas sobre a eficácia.

E a presidente Dilma Rousseff? Vai na bola com determinação ou hesita?

Depende. No caso das privatizações, claramente vacila. Fez a concessão de três aeroportos, a coisa não saiu direito - as grandes operadoras internacionais ficaram de fora - e agora Dilma não sabe bem como lidar com os demais que também precisam de pesados investimentos.

É pura falta de convicção. Está claro que o setor público não dá conta da tarefa, mas privatizar assim direto, à tucana, também pega mal para um governo petista, certo? Sai uma privatização meia-boca, que junta os defeitos do setor público e do privado que não quer correr riscos.

O governo também vacila na inflação. A presidente, o ministro Mantega e o presidente do BC, Alexandre Tombini, garantem que está em pleno vigor o regime de metas de inflação, sendo de 4,5% o alvo para este ano e para o próximo. Não vai rolar. Para este ano, a inflação deve ir a 5,5%, se não for mais, e mais um pouco em 2013. E daí? Até 6,5%, tudo bem, dizem as autoridades.

Não é bem assim. A meta é de 4,5%, tolerando-se um desvio, em circunstâncias extraordinárias, de até 2 pontos. Mas estamos nos encaminhando para o terceiro ano com inflação média perto dos 6%. Um extraordinário muito longo, não é mesmo?

Falta de convicção, de novo. Parece que meta de inflação é tão tucana quanto a privatização. A corrente desenvolvimentista, onde se assentam as convicções históricas da presidente, acha que uma inflação mais alta pode até ser um instrumento para se turbinar o crescimento.

Dirá o leitor: e não é assim mesmo? Qual a diferença entre uma inflação de 4,5% e outra de 6%?

Perguntem aos milhões de trabalhadores que têm batalhado por reajustes salariais. Quem ganha hoje 20% a mais do que recebia no início de 2010 está rigorosamente na mesma. Os funcionários públicos que aceitaram o reajuste de 15% em três anos estão perdendo dinheiro. A inflação acumulada no período será maior do que isso.

Tudo bem se houver crescimento, argumenta o pessoal do governo. Mas por que não anunciam logo que abandonaram o regime de metas e isso de BC independente? Porque não pega bem.

O mundo respeita o sistema de metas, simplesmente porque tem funcionado por toda parte.

Mesmo sem o governo admitir que deixou o regime, mas praticando meia-boca, os agentes econômicos (categoria que vai do investidor ao assalariado e consumidor de supermercado) já trabalham com inflação acima da meta por um longo período. Ou seja, buscam preços e salários nessa perspectiva, o que realimenta a subida de preços, ou impede sua queda em momentos de paralisia econômica.

Por outro lado, parece que o governo não vacila na sua disposição de intervir na economia e orientar/conduzir o setor privado.

Acredita que tudo, até a falta de medalhas olímpicas, pode ser resolvido com um programa e comando de Brasília.

O país cai num círculo vicioso: como o governo não tem dinheiro e nem capacidade para fazer tudo, precisa abrir espaço para o privado. Mas este não vai com convicção quando é amarrado pelo ambiente de negócios supercontrolado pelo próprio governo.

Crescimento baixo e inflação alta, não é por acaso.

JESUS E MADALENA


Toque pessoal - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 20/09

Amigos próximos se assustaram com o mau humor e a irritação de Lula nos últimos dias.

Butim de guerra

Agora é oficial. Ocorreram, sim, alguns saques naquela espetacular ocupação do Complexo do Alemão, em novembro de 2010, que derrubou o governo armado do tráfico na favela.
O comandante-geral da PM, coronel Erir Ribeiro, excluiu da corporação um sargento e um soldado, ambos do 16° BPM (Olaria), acusados de terem saqueado o apartamento onde morava, perto da favela, uma mulher supostamente ligada ao ex-chefe do tráfico Pezão.

Segue...
A decisão foi publicada em boletim reservado da PM no último dia 10. Mais detalhes no site (oglobo.com.br/ancelmo).

Copa Barros
Paulo Barros, o carnavalesco campeão da Unidos da Tijuca, será o responsável pela festa de abertura da Copa das Confederações, em Brasília, em 2013. Merece.

Fator Maomé

A crise no mundo islâmico, gerada por este vídeo ofensivo a Maomé, fez o presidente Mohamed Mursi, do Egito, cancelar a sua visita ao Brasil no dia 28 agora.

Carga explosiva
Dia destes, ocorreu o maior rebu no Aeroporto Galeão/Tom Jobim.
A Receita, por falta de registro no chamado Manifesto de Carga, apreendeu 374 quilos de explosivos dentro de um avião, vindo da Guiana. No fim, descobriu-se que o material era de uma grande multinacional que usaria as bombas na exploração do pré-sal.

Os cabos de aço que vão sustentar a nova cobertura do Maracanã começaram a ser instalados ontem. Repare só nas fotos como a Casa Grande do Futebol está e como vai ficar com a cobertura. Apoiados na arquibancada, os cabos serão erguidos, todos ao mesmo tempo, por 120 macacos hidráulicos. Confeccionada em fibra de vidro e teflon, a nova cobertura terá 68,4 metros de comprimento e vai proteger 76 mil dos 79 mil assentos do novo estádio. A antiga cobertura tinha 30 metros.

‘Siri jogando bola’


O alagoano Aldo Rebelo se encontra terça com a Associação Caatinga, ONG que luta contra a extinção do tatu-bola, a mascote da Copa de 14.

Aliás...
O ministro dos Esportes lembrou outro dia que o animal foi celebrado por Luiz Gonzaga e Zé Dantas na música "Siri jogando bola”
Um versinho: "Fui passear/no país do tatu-bola/onde o bicho tem cachola/e até sabe falar”

Enfim, separados

Este mês, Carlos Cachoeira, o bicheiro, e Andressa Mendonça completam 13 meses de... relacionamento sério.
É que eles não são oficialmente casados e não se pode dizer que "vivem juntos”: há sete meses, mais da metade, o bicheiro está preso.

Marcha do pleito
O PT marcou para 10 de outubro, três dias depois do primeiro turno, reunião do diretório nacional, em Brasília, com a presença de Lula.
Vão discutir os resultados das urnas e os efeitos do mensalão.

Urna não é penicoEm tempos de eleição, ainda mais agora que o desencanto com a política parece crescer, sempre surge um ato de irreverência,
como esta pichação (foto) num banheiro químico na Lapa.
Só que democracia é melhor.

Rei do Bacalhau
A 3? Câmara Criminal do Rio confirmou que Antônio Fernando da Silva, acusado de planejar a morte do pai adotivo, Plácido da Silva Nunes, dono do restaurante Rei do Bacalhau, vai a júri popular.
Plácido, então com 75 anos, foi estrangulado dentro de casa, em 2007.

Cofre maquiado

O ex-prefeito de Itatiaia, RJ, Almir Dumay Lima foi condenado por improbidade administrativa.
Ele, que governou de 1997 a 2004, é acusado de maquiar a situação financeira do município, prejudicando seu sucessor.

Nossa Varig
Hoje, às 14h, um grupo de aposentados da Varig planeja ocupar o prédio do Aerus, fundo de pensão da finada, para cobrar seus direitos.
O clima promete esquentar.

Cena carioca

Ao parar num ponto na Rua Haddock Lobo, na altura do Rio Comprido, no Rio, por volta das 12h de ontem, um ônibus da linha 433 foi cercado por quatro mulheres. Desesperadas, elas entraram dizendo que o ônibus parado à frente, da mesma linha, estava... cheio de baratas. E o trocador:
— Só hoje, cinco ônibus foram recolhidos pelo mesmo motivo.
Há testemunhas.

Um juiz que não se dobrou - PEDRO DUTRA

O GLOBO - 20/09


O poder é o poder” bradava o gaúcho Silveira Martins no Senado, ao início da República. Crua, mas exata, a expressão sintetiza a cultura política nativa: o poder político qualifica-se a si próprio, e o seu alcance é ditado pelo seu exercício. Ou seja, só o poder é poderoso, pois entre nós ele não deriva, plenamente como deveria, das instituições criadas para enformá-lo juridicamente, as quais assim acabam por servi-lo e ao seu titular, que o maneja desabridamente.

O poder não é o poder, essa a síntese, inversa, proposta por Rui Barbosa àquela altura: o poder, protestava, é a obediência à Lei. O poder deriva da Lei, porque a Lei emana da vontade popular, e ela é expressa e formulada em assembleias livres. Esse processo, dizia, era a grande conquista da cultura política moderna, que ele queria para a nascente república brasileira.

À investidura de Floriano Peixoto na Presidência sucedendo a Deodoro, em 1891, seguiu-se o protesto de 13 oficiais generais por uma nova eleição, como determinava a constituição. Floriano respondeu com a reforma de todos eles, a prisão de senadores, deputados e a demissão de professores universitários que aderiram ao protesto. Rui requereu habeas corpus para 46 dos presos e foi à tribuna do Supremo Tribunal Federal defender a sua concessão.

O julgamento desses habeas corpus é um dos momentos mais nobres da advocacia e um dos mais baixos do Judiciário no Brasil.

Floriano fez chegar aos magistrados a pergunta, rude e sinistra, se eles imaginavam quem a eles daria habeas corpus no dia seguinte à decisão procedente ao pedido patrocinado por Rui.

O Supremo acovardou-se. E os habeas corpus foram negados. Mas houve um juiz que não se dobrou, e concedeu a ordem de habeas corpus. Rui não regateou, pela imprensa, a homenagem devida a Piza e Almeida, vendo "naquele homem modesto... a inquebrantabilidade da coragem moral’! E fulminou os demais juízes do Supremo, ajoelhados ao poder presidencial: "Medo, venalidade, paixão partidária, respeito pessoal, subserviência, espírito conservador, interpretação restritiva, razão de Estado, interesse supremo, como quer que te chames, prevaricação judiciária, não escaparás ao ferrete de Pilatos! O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz covarde."

O sóbrio juiz Celso de Mello reverenciou a linhagem de Piza e Almeida ao citar Rui. E o exemplo, vivo e atual, desse grande advogado permite ao Brasil hoje distinguir, e reafirmar a sua escolha, entre duas repúblicas: ou a de Floriano Peixoto, ou a de Rui Barbosa.

O Tiririca republicano - TUTTY VASQUES


O Estado de S.Paulo - 20/09


Se fosse candidato a prefeito no Brasil, Mitt Romney não estaria decerto sendo crucificado pelas bobagens que andou dizendo! Fala-se coisa muito pior em campanha por aqui, e ninguém dá a menor bola para isso!

No caso específico da tal gafe que deu origem ao calvário republicano nos EUA, nenhum brasileiro se ofenderia ao ser identificado como um tipo de sujeito "que acredita que o governo tem a responsabilidade de tomar conta dele".

Até porque "viver dependente do Estado" no Brasil, longe de ser uma aspiração desprezível, é um sonho legítimo do cidadão. Só o Sarney tem pra mais de sei lá quantos parentes nessa situação.

Mesmo entre os pobres, atire a primeira pedra quem não tem - ou não anseia por - uma bolsa do governo para ajudar nas despesas. Lá fora, pelo visto, isso é uma vergonha!

Diferenças culturais à parte, Romney teria cometido nos EUA um erro político igualmente estranho à liturgia eleitoral brasileira: falar besteira à caça de voto - artifício que por aqui elege muita gente e no estrangeiro dá o maior bode.

Não à toa, nosso Tiririca está entre os 25 melhores parlamentares do País e o deles praticamente perdeu a eleição para o Obama.


Paradigma

Quem é o contribuinte que, sozinho, deve R$ 43 milhões ao Imposto de Renda? É o tipo de pessoa física que todo rico brasileiro inveja!

Melhor assim

Graças a Deus, o papiro do século 4.º revelado dia desses por uma historiadora de Harvard sugere o casamento de Jesus Cristo. Já pensou se descobre alguma novidade sobre a vida íntima de Maomé?

Vai e volta

Certas notícias enguiçadas são assim mesmo: quando a gente pensa que a coisa andou, olha o Código Florestal aí de novo, gente! Quer apostar como daqui a pouco a Camila Pitanga vai pedir outra vez o veto da Dilma?

Má notícia em pessoa

A atriz Lindsay Lohan foi presa de novo, desta vez por atropelar um pedestre e fugir do flagrante para dentro de uma boate em Nova York. O fato de não estar bêbada ao volante, no caso dela, é agravante. Antigamente, ela só fazia bobagem quando enchia a cara!

O inferno é aqui?

"Só quero que você me aqueça nesse inverno", verso da música de Roberto Carlos, virou a última coisa que o brasileiro deseja no verdadeiro inferno em que se transformou a estação.

Novelas cruzadas

Vídeos de Marcos Valério contando tudo sobre mensalão podem estar com Max e Carminha. Só se fala de Avenida Brasil no Congresso!

Dá para acreditar?

A notícia de que Pamela Anderson vai ganhar R$ 100 mil para ser jurada do concurso Miss Bumbum 2012 em São Paulo deixou o Ministério Público de olho na ex-sex symbol canadense. Suspeita-se de lavagem de dinheiro! Cá pra nós, faz sentido, né não?

GOSTOSA


Russomanno e Erundina - ROGÉRIO GENTILE

Folha de S. Paulo - 20/09


SÃO PAULO - O que explica a larga vantagem de Russomanno? O apresentador de TV -que, na disputa estadual de 2010, era tratado como um candidato nanico- dispõe de pouco tempo no horário eleitoral, não tem os mesmos recursos dos seus principais adversários e tampouco possui um grande partido ou um padrinho forte que o sustente.

Russomanno se beneficia do fato de estar no lugar certo, na hora certa. Assim como ocorreu com Luiza Erundina na campanha de 1988. A petista, uma enorme zebra, venceu aquela eleição basicamente pela conjunção de dois fatores.

Por um lado, havia uma forte rejeição ao candidato reconhecido como do governo federal. João Leiva era do mesmo PMDB de Sarney, presidente impopular. Situação semelhante com a que ocorre agora com Serra, que paga pela baixíssima avaliação de Kassab na cidade. Tanto que a história de o tucano ter largado a prefeitura só se tornou um problema de verdade nesta eleição.

O segundo fator que explica a vitória de Erundina em 1988 foi o efeito CSN. Seis dias antes da eleição, o Exército ocupou a siderúrgica em Volta Redonda (RJ), em uma greve. Três operários morreram. Uma onda de indignação tomou conta do país. Maluf, que liderava com folga as pesquisas e era muito identificado com os militares (concorrera menos de quatro anos antes contra Tancredo), foi atropelado pela petista.

O efeito CSN parece se repetir agora com o mensalão. O julgamento no STF tem afetado Haddad, que está com um desempenho inferior ao tradicional do PT. Uma eventual condenação de José Dirceu pode agravar sua situação, por mais que ele tente se desvincular do colega de partido.

Apesar de tudo isso, Russomanno corre algum risco de não repetir Erundina. Para a sua infelicidade, a eleição não é mais em um único turno. Ainda que não haja hipótese de acordo entre PT e PSDB, quem passar para o segundo turno com ele deverá contar com o chamado voto útil.

Os pobres estão convosco - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 20/09


Falatório indigente de Romney ataca até suas bases eleitorais, americanos pobres reacionários 


MITT ROMNEY insultou quase metade dos americanos no vídeo em que foi flagrado dizendo bobagens estatísticas, políticas e eleitorais a seus pares. Pelo menos é o que dizem os espíritos mais humanitários a respeito das vulgaridades intelectuais do adversário de Obama.

Romney pode até ter insultado muita gente, mas talvez não todos aqueles de que desdenhou com seus comentários desmiolados, parecidos com os de peruas ricas do Brasil, por exemplo.

Em suma, Romney disse que 47% dos americanos querem viver encostados no governo, não pagam impostos, não se viram, não têm ambição, não "trabalham duro", frases arquetípicas dos EUA. Romney acha, pois, tolamente, que essa gente está com Obama e não vale a pena nem uma conversa eleitoreira.

A ideia de que o governo não tem nem o direito nem o dever de interferir na vida de alguém, mesmo para "fazer o bem", é maciçamente majoritária pelo menos no vasto meião que fica entre faixas estreitas da Costa Leste (mais para a Nova Inglaterra) e da Costa Oeste (em alguns trechos da Califórnia e olhe lá).

Mesmo a maior parte do centro à esquerda defende cheia de dedos a ideia de "programas sociais" (benefícios para os mais pobres). Usam frases como "safety net" (rede de proteção, para quem caiu na vida na corda bamba), como se a pobreza fosse um acidente.

Muito americano pobre, branco, do sul e centro sul, que gosta de dar tiro e é religioso cristão abilolado, fundamentalista, recebe assistência social. Mas detesta o governo, acredita no individualismo americano, odeia "a elite branca" liberal da Costa Leste e ainda mais um democrata negro, embora centrista banana, como Obama.

Terão sido insultados por Romney? Sabe-se lá, mas o falatório do republicano revela o quanto ele pensa mal até sobre tática de eleição.

Incluiu no seu desdém conservadores de raiz (brancos do meião americano). Insultou velhos aposentados, ex-contribuintes, mais de metade dos que não pagam impostos.

Insultou americanos centristas ou até direitistas, mas caridosos e "ativistas sociais privados" (embora muita gente ache mesmo que os pobres assim são porque cometeram algum tipo de pecado).

Ainda assim, benefícios sociais para pobres, velhos e deficientes são uma despesa grande do governo.

Assistência para a saúde de idosos e pobres (não é universal nem totalmente grátis) leva 21% das despesas. Mais que o monstruoso gasto com defesa (19,4%) e quase tanto quanto a Seguridade Social (basicamente aposentadorias, 20%).

Cada uma dessas despesas leva uns 5% do PIB americano e toda a receita federal dos EUA. O resto do gasto, quase 9%, é deficit. Sim, senhor, receita de uns 15%, gasto de uns 24% do PIB.

O deficit veio do tombo das receitas devido à crise de 2008, cortesia dos amigos de Romney. Devido aos gastos extras com guerras, iniciadas pelo republicano Bush. Muito pouco se deveu à ajuda aos desvalidos desdenhados por Romney.

A pobreza, a necessidade de auxílio, cresce desde o início dos anos 1980, quando começou um bárbaro processo de concentração de renda nos Estados Unidos, com estagnação dos salários medianos e piora do mercado de trabalho. Os americanos querem "trabalho duro". Mas não encontram.

Sentença do BC - SONIA RACY

O ESTADÃO - 20/09

Com o STF condenando integrantes do Banco Rural por fraude, há quem diga que o Banco Central dormiu no ponto. Não é bem assim. O Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional tem julgado proposições do BC contra o banco e funcionários. E uma delas, de 2004, surtiu efeito.

Kátia Rabello está inabilitada, desde 1º de agosto deste ano, a exercer qualquer função no mercado financeiro brasileiro. E já deixou o banco formalmente, fruto de decisão do “Conselhinho”.

Sentença 2
Como Kátia, José Roberto Salgado também tem de sair. Aguarda substituto. Bem como Ayanna Tenório – condenada pelo Conselhinho e absolvida pelo Supremo. Há um quarto nome no recurso 12454-070137310, do BC: o de Plauto Gouvêa, que já deixou o Rural.

Indagado, o banco informa: os condenados estão sendo afastados. Explica que os contratos celebrados no fim de 2004 – e questionados pelo BC no mesmo ano – são legítimos. E se deram em meio à crise do Banco Santos. Está recorrendo à Justiça.

A dúvida cruel: entre a ação do BC e o julgamento passaram-se oito anos. Por quê?

Sortudos
Durante o período em que administrou o Banco Cruzeiro do Sul (liquidado semana passada), o Fundo Garantidor de Crédito pagou R$ 1,9 bilhão a detentores de papéis que venciam.

Os outros credores estão morrendo de inveja.

Recado
FHC não gostou nem um pouco de o tema mensalão não ter sido usado por Serra no debate de segunda-feira.

A interlocutores, o ex-presidente comentou: “O momento é esse, não tem por que evitar.”

Recado 2
E Fernando Henrique já avisou. Não poderá ir ao comício de encerramento da campanha de primeiro turno de Serra, dia 27, no Vale do Anhangabaú. Estará recebendo o ex-primeiro ministro da Espanha, Felipe González, em sua visita a São Paulo.

Recado 3
Aliás, o evento pode subir no muro. Há no ninho tucano quem defenda que ele seja trocado por quatro comícios nas zonas leste e sul. Com o rigor da lei eleitoral, reclamam que o formato não tem apelo.

Gregos + troianos
Sarney Filho iniciou, ontem, a campanha Veta Dilma 2ao Código Florestal. À coluna, o líder do PV disse que “esta é a pior proposta já aprovada pela Câmara”.

E apesar de todos afirmarem que o texto privilegia os ruralistas, Ronaldo Caiado também reclama: “Os produtores rurais ficarão à margem da Justiça”. Será?

Triiiim
José Maria Marin resolveu dar um empurrão. Telefonou, ontem, a Luis Alvaro.

Para pedir ao presidente do Santos que venda logo Ganso ao São Paulo, seu time de coração.

Quem vem
Após oito anos de ausência, desembarca em SP, segunda, Narciso Rodriguez. O estilista vem lançar fragrâncias com seu nome.
Psiu!

Wellington Nogueira, dos Doutores da Alegria, teve sua buzina de palhaço apreendida em Congonhas. Segundo a PF, é proibido embarcar com objetos sonoros.

O ator argumentou que era seu instrumento de trabalho, mas não teve chororô.

Mamãe coruja
A rainha Rania da Jordânia simplesmente ignorou a tensão entre mundo árabe e EUA e desembarcou na terra do Tio Sam.

Foi pleitear uma vaga para seu filho mais velho, o príncipe Hussein bin Abdullah, na Universidade da Georgetown – a mesma frequentada pelo maridão, rei Abdullah II.

Duas faces…
O índice que mede a intenção de consumo dos paulistanos subiu 1,9% entre agosto de 2011 e agosto de 2012. É o que mostra pesquisa da Fecomercio.

Perspectiva para os próximos meses? Recuo de 1,5%.

Na frente
E o FGV Online acaba de ganhar o Oscar da educação. Seus cursos gratuitos via internet receberam o prêmio de Conteúdo Mais Envolvente do OpenCourseWare Consortium.

Michelle Garcia dá a palestra Cartier: um luxo em óculos. Hoje, no Renaissance.

Isabel Galery abre individual amanhã. No Espaço Minas Gerais, em Higienópolis.

Ingrid Guimarães e Marcelo Faria, entre outros, estreiam a peça Razões Para Ser Bonita. Hoje, no Teatro Vivo.

Com show, Tom Zé lança o CD Tropicália Lixo Lógico, no SESC Vila Mariana. Amanhã.

Peter Hook, ex-New Order e Joy Division, se apresenta no Na Mata Café. Dia 27.

Domingo é dia do… sorvete – sim, ele existe. Para comemorar, a Kibon distribui 10 mil picolés nos parques do Povo e Villa-Lobos, além da Praça Vinicius de Moraes. E se chover?

Falta foco - MAURICIO CANÊDO PINHEIRO


O Globo - 20/09


Com o advento do pré-sal, os investimentos na produção e exploração de petróleo podem chegar a 400 bilhões de dólares nos próximos dez anos. O governo tem encarado esses investimentos como uma oportunidade para desenvolver setores industriais associados, direta ou indiretamente, ao petróleo. A principal ferramenta usada pelo governo para alcançar este objetivo tem sido a política de conteúdo local.

Será essa uma boa estratégia? A resposta depende de qual objetivo se quer alcançar, além, claro, dos detalhes da execução da política.

Para o fomento de novos setores, não se deve maximizar o conteúdo local, mas a chance de desenvolver empresas competitivas, capazes de caminhar com as próprias pernas. Para isso, o requerimento de conteúdo local deve ter data para acabar, com redução gradativa do aparato protecionista. Caso contrário, há o risco de criar indústrias ineficientes, incapazes de competir internacionalmente, dependentes eternas da demanda cativa garantida pela política industrial. Temos inúmeras experiências desse tipo, a Lei de Informática talvez seja o exemplo mais emblemático. Países como a Noruega fugiram dessa armadilha e foram bem-sucedidos, o que mostra que há alternativas.

A política atual não só não tem regras de saída, como carece de foco. Hoje ela alcança uma gama muito ampla de setores. Faria mais sentido econômico concentrar o foco naqueles setores mais diretamente relacionados ao petróleo. Serão esses os mais fortemente impactados pela demanda advinda da exploração e produção de petróleo no pré-sal. Desses, também é preciso selecionar os que têm perspectiva de se tornarem competitivos. Para estes, a política de conteúdo local deve funcionar como impulso inicial, que deve ser removido ao longo do tempo, pela gradual exposição à competição internacional, algo que não foi sinalizado pela atual política.

Para os setores que já estão estabelecidos no Brasil, mas que podem se beneficiar da demanda do setor de petróleo - siderurgia, por exemplo -, o mais adequado é adotar políticas que aumentem a sua competitividade (redução de carga tributária, diminuição do preço da energia, entre outras), e não políticas de conteúdo local.

Por fim, é preciso atenção especial à inovação. Programas como o Inova Petro, recentemente lançado pelo governo, são importantes.

Mas não basta financiar e reduzir o custo da atividade inovadora. É preciso torná-la um imperativo para as empresas. Nesse sentido, a concorrência é uma ferramenta muito poderosa: empresas não inovam por acaso, mas para obter vantagens sobre seus concorrentes. Novamente, é preciso expor gradualmente o mercado doméstico à competição internacional, de modo a construir os incentivos corretos para o investimento em inovação.

É difícil mudar as regras nos contratos em vigor. Mas para as próximas rodadas de licitação temos a oportunidade de fazer as mudanças, tornando a política de conteúdo local mais efetiva e com maior chance de sucesso.

Luz e escuridão - CLAUDIO J. D. SALES


O Estado de S. Paulo - 20/09


As medidas recentemente anunciadas por Dilma Rousseff que afetam a conta de luz podem ser divididas em duas categorias. A primeira representa um bom começo, pois reverte décadas de aumentos de carga tributária sobre a eletricidade. A segunda lança incertezas sobre os investimentos no setor elétrico, a qualidade dos serviços e, paradoxalmente, a própria modicidade tarifária.

Ao abolir e/ou reduzir três encargos setoriais sobre a eletricidade (CCC, CDE e RGR), o governo federal começa a diminuir a grande distorção que pesa sobre o setor elétrico: de cada R$ 100 pagos na conta de luz, R$ 45 são de tributos e subsídios que fazem do setor um guichê arrecadatório a serviço dos cofres públicos. A presidente, entretanto, poderia ter aproveitado o momento para zerar o PIS/Cofins sobre a eletricidade (uma promessa de sua campanha eleitoral em 2010 e que representa mais de 8% da conta de luz) e ter colocado mais pressão sobre os Estados: o ICMS responde por 21% dos 45% da carga tributária sobre o setor.

A redução de tributos e encargos poderia ter sido muito maior, e não apenas de 5,3%, no caso de consumidores residenciais. Na prática, o governo resolveu cumprir seu objetivo de redução tarifária concentrando fichas nas novas regras de renovação dos contratos de concessão de geração, transmissão e distribuição de eletricidade.

O potencial de redução aí de fato existe, mas nada justifica que se devesse tratar essa questão sem transparência e sem audiências públicas, rituais consolidados no setor elétrico. O anúncio intempestivo leva o setor a um futuro incerto, a começar pelos números divulgados. Dos 16,2% de redução para consumidores residenciais, 10,9% viriam da diminuição da tarifa média de geração e da Receita Anual Permitida da transmissão. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) precisará calcular os valores de reversão aos quais as empresas teriam direito, uma vez que nem todos os seus investimentos terão sido remunerados ao fim dos contratos que se encerram a partir de 2015. Também precisam ser calculados os valores das novas tarifas a ser impostas aos atuais concessionários para cobrir os custos de operação e manutenção dos ativos. Nota: nada foi dito sobre os investimentos adicionais constantemente requeridos.

Os detalhes sobre o cálculo dos valores de reversão não são conhecidos e as novas tarifas serão divulgadas apenas em 1.º de novembro, mas o governo acaba de anunciar que os concessionários deverão manifestar seu desejo de prorrogar suas concessões até 15 de outubro. Como tomar uma decisão que sela o passado e o futuro dos investimentos das empresas, se os parâmetros para a decisão são desconhecidos?

Outro exemplo de arbitrariedade é a fixação de maio de 2000 como data-limite para o reconhecimento de ativos de transmissão como amortizados, quando o próprio contrato de concessão estabelece que a indenização deve incluir todos os investimentos não amortizados ou depreciados.

Mais uma arbitrariedade decorre do desprezo para com o direito de prorrogação contido nos contratos de concessão de produtores independentes de energia, sob a alegação de que tal direito teria sido mantido em condições totalmente diferentes. Como se isso fizesse algum sentido...

O mercado livre de energia, caracterizado pela competição e flexibilidade de soluções, foi fortemente abalado, o que tem sido interpretado como sinal de que o governo não acredita na concorrência como instrumento de sinalização de preços a partir do equilíbrio entre oferta e demanda.

O mercado financeiro capturou tal instabilidade regulatória e reduziu em dezenas de bilhões de reais o valor de empresas estatais e privadas.

O Congresso terá muito trabalho para corrigir os rumos da MP 579. E o governo precisa acolher os inúmeros ajustes necessários para que não sejam interrompidos os investimentos no setor, especialmente num momento em que a interrupção ou o encarecimento de aportes representaria um desastre para a nossa economia.

A saca de sal - CONTARDO CALLIGARIS


FOLHA DE SP - 20/09

Antes de viver juntos, seria bom consumir uma saca de sal. Para o quê? Para se conhecer melhor?

COMEÇOU COM um e-mail bizarro me avisando que o restauro da Fontana del Sale (a fonte do sal, em Novi Ligure, Itália) estava terminado (bizarro porque o restauro foi terminado um ano atrás). Imediatamente, a mensagem evocou em mim um momento esquecido.

Novi Ligure (leia-se "lígure") é uma cidade de menos de 30 mil habitantes; apesar de seu nome, ela não está na Liguria, mas no Piemonte. Num domingo de inverno do fim dos anos 70, eu atravessava a Piazza Mariano delle Piane, em Novi, com minha avó Elena.

Sei que era domingo porque ela tinha pedido que parássemos (íamos de Rapallo a Casale Monferrato, visitar amigos) para que ela escutasse a missa. E sei que era inverno porque ela estava com um sobretudo longo de cachemira um tanto surrada, mas especialmente mórbida, com um colarinho do mesmo astracã cinza de seu chapéu "clochê".

Também ela tinha enfiado a mão, numa luva escura, debaixo do meu braço, mais pelo calor e pela intimidade do gesto do que por necessidade de apoio ao caminhar.

Eu estava lhe contando que acabava de me juntar com uma mulher, na cidade onde eu morava, que era Paris. Ela parou diante da Fontana del Sale, que está no meio da Piazza.

"Fonte do sal" não é um apelido. No passado, o sal era crucial para preservar os alimentos (pense no bacalhau), era vendido em sacas, e era precioso. Em 1814, os noveses defenderam sua reserva de sal contra franceses e ingleses. Para celebrar o esforço, foi construída a fonte, no meio da qual surge uma figura, que aperta contra o peito uma saca, que se parece com uma daquelas almofadas que as crianças querem sempre consigo e sem as quais elas não conseguem dormir (uma foto da fonte: http://migre.me/aKii8).

Minha avó, olhando para a estátua, disse: "Prima di vivere insieme, bisogna consumare un sacco de sale" -antes de viver juntos, é preciso consumir uma saca de sal. Minha avó era religiosa, mas sábia demais para se opor ao fato de eu me juntar sem me casar. Sua preocupação era com a precipitação.

Eu, nascido em tempos de geladeira, não sabia quanto tempo duraria uma saca de sal. Mas o recado era claro: antes de se juntar, um longo namoro é oportuno.

Há uma constatação que eu faço com frequência: não sei quem começou, se fomos nós ou se foram a literatura e o cinema, mas, em geral, no início das relações, a gente idealiza tanto o parceiro quanto o novo envolvimento afetivo ou sexual (as dificuldades da etapa seguinte ficam para a comédia, se não para a farsa). Consequência: o exórdio das relações aparece como um momento glorioso, cujo espírito se perderá, inelutavelmente, ao longo do tempo, consumido pela trivialidade do dia a dia e da convivência.

Uma leitora, Ester Costa, comenta: "Eu acho que, na verdade, começa mal e vai piorando. É ruim e errado desde o começo, e a gente sabe, mas, por decreto decide que vai continuar. Ninguém esconde do outro o que é, a gente é que não quer enxergar". Ou seja, "o germe da destruição" das relações está no seu começo, "o ovo da serpente está aí".

Outra leitora, Mariana Seixas, vai na mesma direção; ela acha que, quando encontramos alguém "com quem no futuro dividiremos uma vida e quatro paredes, (...), não conhecemos bem a pessoa", e o futuro nos apresentará "uma pessoa diferente daquela dos primeiros meses de namoro".

Em outras palavras, a degradação das relações está num defeito de fábrica, numa pressa ou num descuido do encontro inicial, em que, paradoxalmente, falamos demais e não nos mostramos o suficiente.

Minhas leitoras têm razão. O momento do encontro é enganoso, por um viés de otimismo: valorizamos tanto o grande amor definitivo que acabamos enxergando sua miragem no horizonte, mesmo quando não há por quê. Você lê os três primeiros números sorteados da Mega-Sena, são os que você jogou, o coração já dispara -embora até lá você não tenha ganho absolutamente nada, nem a consolação de uma quadra.

Seria bom, em suma, segundo minhas leitoras, que os futuros consortes se conhecessem melhor.

Em tese, eu concordaria. Mas, naquele domingo dos anos 70, eu completei a frase de minha avó perguntando-lhe, justamente, se o tempo da saca de sal era para o casal se conhecer melhor. Ela fez o gesto de quem descarta uma estupidez e disse: "Ma vá un po", non per conoscersi; per abituarsi", deixa de bobagens, é preciso de tempo não para se conhecer, mas para se acostumar.

Comando em xeque - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 20/09

A três semanas das eleições, o PT, obviamente, não irá tratar do julgamento do mensalão ao vivo e a cores para todo o Brasil. Mas, dentro do partido, há alguns grupos trabalhando o futuro e tirando conclusões. A primeira delas é a falência do grupo dirigente, em especial, na montagem do partido para as eleições deste ano. É como se o PT estivesse investido tudo para tentar ganhar São Paulo, jogando por terra o resto do Brasil. E caberá à atual direção responder por isso, ainda que o partido consiga colocar Fernando Haddad num segundo turno e fazer dele prefeito — o que não se pode afirmar com toda a certeza hoje, uma vez que o eleitor parece mais afeito a Celso Russomanno e a disputa pelo segundo lugar permanece empatada com José Serra, que não deve nem de longe ser desprezado enquanto candidato.

Internamente, as críticas ao presidente da sigla, Rui Falcão, vêm de todas as correntes e se espalham por vários estados-chave. Falcão, que pertence à minoritária corrente Novos Rumos, conquistou a presidência do partido ao se aliar ao Construindo um Novo Brasil (CNB), o antigo Campo Majoritário, que tem no ex-ministro José Dirceu um dos líderes informais. Agora, quando está responsável por comandar a primeira eleição externa, Falcão virou alvo. Há quem reclame de a direção partidária ter escolhido Humberto Costa candidato a prefeito do Recife; Patrus Ananias em Belo Horizonte; e não ter apoiado nenhum aliado em Porto Alegre, onde o PT tem o governo estadual e precisava deixar algum partido em dívida para garantir mais aliados a uma possível campanha reeleitoral de Tarso Genro em 2014.

Hoje, o PT está com dificuldades nessas três praças e não construiu, até o momento, nada que lhe garanta bons palanques nesses estados no futuro. Nem mesmo um muito obrigado. Também há reclamações sobre o fato de o PT ter apostado que o Supremo Tribunal Federal não teria coragem de julgar a Ação Penal 470 no meio da disputa eleitoral, mas isso já dissemos aqui em outras oportunidades.

Apostas & dívidas

É com esse clima de “falhamos” ou “eles falharam” que o partido de Lula segue para essa reta final das eleições. O desfecho dessa história promete ser um grande divã para que todos reflitam sobre as próprias ações depois de 7 de outubro. Vale repetir: se o partido chegar ao segundo turno em São Paulo, esse divã dispensará alguns personagens, mas se perder a capital paulistana, aí, leitor, o PT vai virar um pandemônio. Dentro da Câmara dos Deputados, há quem considere que é chegada a hora de tentar tirar ainda mais espaço do antigo Campo Majoritário.

Não dá para esquecer que, desde o escândalo do mensalão, o grupo perdeu espaço. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), por exemplo, embora seja ligado ao CNB, ganhou terreno, com o aval dos apoiadores de Arlindo Chinaglia (SP), integrante da tendência Movimento PT. Ou seja, Maia considera que não deve nada à turma de Dirceu. Não por acaso, Maia vem sendo criticado internamente como alguém que não moveu uma palha em favor do ex-ministro no julgamento do STF. Dia desses, um integrante desse grupo do PT me dizia que Maia deveria ter chamado os ministros do STF e falado dos interesses do Judiciário que tramitam no Congresso (Maia não o fez e nem poderia, porque seria uma interferência indevida no julgamento).

Assim que terminar o julgamento, o Construindo um Novo Brasil deverá perder mais espaço ainda. Afinal, dentro do PT, há quem diga que, passado o mensalão, não será a hora da vingança, e sim de reconstrução com outras figuras. Obviamente, alguns do CNB irão se debater, pedir a ajuda de Lula. Mas, da mesma forma que Lula criou Haddad, ele tem consciência que está chegando a hora de o PT reconstruir seus comandos e buscar novos horizontes. Esse jogo começa em 7 de outubro e já tem gente no aquecimento para disputá-lo.

Enquanto isso, em Aracaju…

Um dos poucos lugares onde os aliados de Dilma Rousseff e Lula estão em paz é Aracaju. Lá, o candidato do PSB, Valadares Filho, respira e pode haver segundo turno. Em função disso, Dilma gravou uma mensagem para ele e Lula programa um visita à cidade dia 27, uma quinta-feira.

E em São Paulo…

O slogan “O que é bom a gente mostra e o que é ruim a gente esconde” caiu em desuso depois de a Justiça Eleitoral paulistana negar direito de resposta a Haddad no caso em que Serra vinculava a imagem do candidato a José Dirceu. Ora, se o candidato pode usar aqueles que lhes garantem votos, por exemplo, Lula e Dilma, por que não pode suportar aqueles que pesam em sentido contrário? Está aí a prova de que pertencer a um partido tem ônus e bônus.

Ajuda, acordo, propina - MARCELO COELHO

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/09


O dinheiro, chegando na hora exata de votações no Congresso, foi decisivo para influenciar a conduta do PL


DEPOIS DE Joaquim Barbosa ter esgotado o assunto do PP na sessão do Supremo na segunda-feira, teria sido melhor passar direto ao voto do revisor do mensalão, Ricardo Lewandowski.

O julgamento ficaria mais movimentado. Mas não teve jeito. Ontem, a palavra ainda ficou com o relator, Joaquim Barbosa. Coube-lhe analisar o segundo partido envolvido no mensalão, o PL de Valdemar Costa Neto, de Jacinto Lamas e do ex-bispo Rodrigues.

O caso do PL (hoje PR) seria um pouco diferente do que ocorreu no PTB, no PMDB ou no PP. A defesa diz que não houve propriamente uma "compra de votos", já que o partido fazia parte da própria chapa que levou Lula ao poder. José Alencar, seu vice, pertencia ao partido.

O dinheiro para o PL veio da fonte que já se conhece: Marcos Valério, por indicação do tesoureiro petista Delúbio Soares.

Correspondia apenas, dizem os advogados, ao que fora combinado no momento da formação da chapa Lula-Alencar. O PL receberia ajuda para seus gastos eleitorais. Essa ajuda chegou, com atraso, em meados de 2003. Qual o problema disso?

Para Joaquim Barbosa, a versão não convence. Valdemar Costa Neto não apresentou nenhum recibo para mostrar que o dinheiro servira para pagar fornecedores da campanha eleitoral. Só faltou Barbosa dizer que o presidente do PL enfiou mesmo o dinheiro no bolso.

Mesmo que tivesse usado o dinheiro para o pagamento de gráficas e material de propaganda, Valdemar não escaparia da acusação. O uso dos recursos não altera, repete-se a todo momento no STF, o fato da corrupção.

O recebimento, argumenta-se também, foi acertado antes mesmo das eleições parlamentares. Como dizer que seria para comprar os votos de deputados, se os réus nem deputados eram ainda? Eram dirigentes partidários, nada mais.

Isso também não importa para a lei penal. Como se sabe, o funcionário público não precisa já estar no cargo para ser corrupto.

E é preciso pensar na "realpolitik" do Congresso brasileiro, diz Barbosa. Sabe-se que qualquer deputado não se sente obrigado a votar com o governo, mesmo fazendo parte da base parlamentar. O dinheiro, chegando na hora exata de votações importantes no Congresso, foi decisivo para influenciar a conduta do PL.

Cabe lembrar que o PL sempre tivera resistências a Lula; por que não fazer corpo mole enquanto o dinheiro não chegasse?

A tese foi bem sustentada por Barbosa, mas fica a pergunta de como será tratado o caso dos deputados petistas, que não entram nesse raciocínio.

O apoio do PL ao PT e sua participação na chapa foram sem dúvida "comprados", por R$ 10 milhões (não é pouco?), a partir dos próprios relatos dos envolvidos, numa reunião de que participaram Lula e José Alencar.

O pagamento só viria, entretanto, quando começaram as decisões importantes no Congresso.

Não é difícil concluir que isso se chama compra de votos parlamentares. Mas aqui o julgamento se transforma, sobretudo, em questão de interpretação.

As datas - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 20/09


Há duas datas importantes para o julgamento da primeira acusação contra o núcleo político do mensalão, formado pelo ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares.

A primeira é o dia 26 de setembro, na qual o plenário do Senado, num esquema de esforço concentrado que não tem explicação, vai aprovar o novo ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki. A outra é em 4 de outubro, dia da última sessão antes do primeiro turno da eleição municipal, dia 7 de outubro.

Uma pode interferir na outra, intervenção que, se houver, produzirá um dos maiores escândalos políticos dos últimos tempos. Sendo aprovado pelo Senado, cuja sabatina é apenas formal, o novo ministro poderá estar apto a assumir seu cargo a ponto de pegar a primeira sessão do julgamento do mensalão de outubro, dia 1º, quando estará sendo julgado por corrupção passiva o ex-ministro José Dirceu, acusado de ser o chefe da quadrilha pelo procurador-geral da República e todos os demais réus dos núcleos político e operacional.

Se pedir vista do processo, para se inteirar dele, o julgamento estará suspenso em tese por 20 dias, mas na verdade por tempo indeterminado.

Todas as informações são de que o futuro ministro não faria um papel desses, e deverá se abster de participar do julgamento justamente por desconhecer o processo, mas o ritmo acelerado do Senado, incomum num período de recesso branco devido às eleições municipais, tem levantado suspeitas de que está em andamento uma manobra para permitir que Zavascki assuma o cargo no Supremo a tempo de participar da fase decisiva do julgamento do mensalão.

Dependerá dele, e somente dele, não apenas a rapidez da posse - pela tradição, é o novo ministro que define a data - como a participação no julgamento.

A decisão anunciada ontem pelo relator Joaquim Barbosa, em comum acordo com o revisor Ricardo Lewandowski, de deixar para o final a parte referente aos acusados de corrupção ativa significa que a votação dos demais ministros sobre os políticos do PP, PTB, PMDB e PR envolvidos no mensalão, acusados de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, será realizada, na melhor hipótese, na quarta-feira dia 26, podendo se prolongar até a quinta, 27.

Isso quer dizer que o núcleo político ligado ao PT será acusado de corrupção ativa na primeira semana de outubro, antes do primeiro turno, e a votação para eventuais condenações se dará nas semanas entre o primeiro e o segundo turnos.

Essa divisão de temas proposta pelo relator, que o revisor Lewandowski comparou a "uma guerra", tem o objetivo de deixar claras todas as etapas do processo que Joaquim Barbosa descreve, assumindo quase que integralmente as acusações do procurador-geral.

A leitura de seu voto, que começou na segunda-feira e só deve terminar amanhã, é uma descrição detalhada do sistema montado para a compra de apoio político e lavagem de dinheiro por parte do núcleo operacional com requintes de sofisticação, com entregas de remessas de dinheiro em casa - um sistema delivery, como definiu sarcasticamente o presidente do Supremo Ayres Britto - e utilização de financeiras para a circulação camuflada do dinheiro roubado.

Por isso, o deputado André Vargas, secretário de Comunicação do PT, criticou duramente mais uma vez o Supremo, dizendo que a transmissão ao vivo do julgamento do mensalão interfere na vida democrática brasileira, acusando o STF de não estar tendo um comportamento técnico e neutro no julgamento.

Essa sistemática, descrita pelo relator Joaquim Barbosa detalhadamente, torna quase ridícula a frase do senador petista Jorge Viana, que, na tentativa vã de defender seu partido, disse da tribuna do Senado que os petistas foram "alunos mal aplicados" que tentaram repetir "o modelo profissional do PSDB e do PFL".

Modéstia do orador. O esquema petista desenvolvido por Marcos Valério, ao contrário, é um sistema aperfeiçoado a partir do que havia sido feito na eleição de Minas em 1998 para o PSDB.

Em escala nacional, e em quantidades maiores tanto de dinheiro quanto de pessoas envolvidas, o mensalão do PT está se mostrando uma sofisticada máquina de corrupção do Estado brasileiro montada para garantir o controle de um dos Poderes da República pelo Executivo.

TEM RAZÃO - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 20/09

Ice Blue, Mano Brown, KL Jay e Edi Rock (da esq. para a dir.) são os Racionais MCs, que hoje fazem show no VMB, às 21h, na MTV

LULA LONGE

Lula vai ficar distante do palanque paulistano nos próximos dias. Depois de viagem a Manaus, vai ao México. Volta no sábado, para comícios em São Bernardo, Santo André e Diadema.

ZONA DE CONFORTO
As cidades do ABCD, especialmente São Bernardo, são usadas como exemplo pelo PT de que o mensalão não tem sido fatal para campanhas do partido. O atual prefeito da cidade, Luiz Marinho, mantém folgada dianteira dos adversários.

SOMA
Guarulhos e Carapicuíba também entram na conta "positiva".

PEDRA DURA
Já em São Paulo, como mostrou o Datafolha, 45% dos eleitores declaram que o julgamento do mensalão pode influenciar seu voto. Um dirigente do PT minimiza: "Sempre tivemos problemas na cidade", diz.

SOM ALTO
Dilma Rousseff considera que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) "cruzou a linha" ao dizer que ela faz "maldade com Minas" na questão dos royalties que mineradoras teriam que pagar ao Estado. A presidente ficou irritada porque, dessa vez, Aécio não
"bateu" no governo -mas nela pessoalmente, destoando de seu tom habitual.

CONTA TUDO
O rapper Criolo enviou seus pais, Maria Vilani e Cleon, para a apresentação da Rede Pense Livre, que debateu com Fernando Henrique Cardoso política para descriminalizar as drogas, anteontem, no Itaú Cultural. "Ele não pôde vir. Aí pediu para a gente escutar e depois contar tudo. Adorei. Vou agradecê-lo depois", disse Maria.

BANDEIRAS
Formada por mais de 60 jovens lideranças e apadrinhada por FHC, a rede tem entre suas bandeiras também o uso medicinal e o autocultivo da maconha. "Cada um vai atingir quem conseguir na sua área de interesse", afirmou Roberto Marinho Neto, filho de Roberto Irineu Marinho, presidente das Organizações Globo.

MINHA CASA DO SABER
A Livraria Cultura vai lançar espaço para cursos. Será no shopping Iguatemi.

Vai se chamar Cultura em Cursos, segundo o empresário e dono, Pedro Herz.

SÓ 'SEI'
Nando Reis levará o ensaio de seu novo show, "Sei", à internet. A partir de segunda, por cinco dias, das 16h às 18h, o YouTube vai exibir o artista treinando o repertório em tempo real, com a banda Os Infernais. Será a estreia do Estúdio Trama ao Vivo.

DILMA DA DINAMARCA
A princesa herdeira Mary, da Dinamarca, causou alvoroço anteontem no restaurante DOM, de Alex Atala. Foi confundida com Dilma Rousseff por causa dos seguranças que se apinharam na porta do lugar.

CILDO SONORO
Um vinil de 33 rotações gravado pelo artista Cildo Meireles em 1970 vai a leilão na próxima semana, em São Paulo. A capa do disco simula a via láctea com o que aparenta ser cocaína. Há dois anos, uma unidade foi vendida por R$ 30 mil.

MAIS MÃO DE OBRA
O Brasil precisa formar mais de sete milhões de trabalhadores de nível técnico e de média qualificação (como pedreiros e açougueiros) até 2015. A conclusão está no Mapa do Trabalho Industrial, que será divulgado hoje por Paulo Skaf, da Fiesp, e Robson Braga, da Confederação Nacional da Indústria.

CICATRIZ
O Ministério da Saúde vai mudar a recomendação de tratamento para hemofílicos graves. Em vez de tratar quem se machuca, adotará cuidados profiláticos. Distribuirá às secretarias de saúde dos Estados 150 milhões de unidades de Fator 8, remédio feito a partir de sangue que melhora a coagulação.

MULTIUSO

O Prêmio Multishow teve shows de Erasmo Carlos, Michel Teló e Maria Gadú e deu a Gaby Amarantos o troféu da categoria Novo Hit. As atrizes Elke Maravilha e Thais Fersoza e o músico Arnaldo Antunes foram à festa, anteontem, na HSBC Arena, no Rio de Janeiro.

QUEM TEM BOCA
Os atores Daniel de Oliveira e Camila Lecciolli estão no filme "Boca", sobre a região de prostituição e produção cinematográfica em SP conhecida como Boca do Lixo, que foi exibido anteontem. O ator Milhem Cortaz também foi à sessão, no Cine Livraria Cultura, na av. Paulista.

CURTO-CIRCUITO

Exposição de Isabel Galéry será aberta hoje, às 20h, no Espaço Minas Gerais, na Consolação.

Elizabeth Vazquez, presidente da WEConnect International, fala hoje sobre empreendedorismo feminino, em fórum no WTC.

Marcio Atalla, educador físico do "Medida Certa", lança o livro "Sua Vida em Movimento" na Saraiva do shopping Ibirapuera, hoje.

Silvio Oksman e Anna Helena Villela são autores, junto com a arquiteta Marta Bogéa, da expansão da galeria Nara Roesler.

O produtor Cacá Ribeiro recebe 400 convidados para celebrar seus 50 anos. Hoje, no Club Yacht.

Rodney Tolley, diretor da organização Walk 21, dá o seminário "Andar a Pé nas Grandes Cidades". Amanhã, na Fiesp.

A ridicularização do profeta - GILLES LAPOUGE


O Estado de S.Paulo - 20/09

Na sexta-feira, dia de oração dos muçulmanos, embaixadas e consulados franceses em países islâmicos serão protegidos. As escolas francesas serão fechadas. Isso em razão de um tabloide, o Charlie Hebdo, um semanário satírico, especialista na provocação e no mau gosto, que resolveu responder à violência que vem enlutando vários países muçulmanos desde a divulgação no YouTube de um filme cretino sobre o Islã, rodado nos EUA por um bando de idiotas, que leva o título de A Inocência dos Muçulmanos. Uma blasfêmia contra a religião do Alcorão, que se tornou um grande sucesso: um embaixador americano foi morto em Benghazi, na Líbia, e algumas outras pessoas também.
Assim, o tabloide reagiu furiosamente, lançando uma publicação com uma dezena de caricaturas sobre o profeta Maomé e integristas muçulmanos. São desenhos aterradores. Maomé com o traseiro para o ar dizendo: "E o meu traseiro, você gosta do meu traseiro?" Ou então, o profeta com seu traseiro ornado com uma estrela com a legenda: "Maomé: nasce uma estrela".
Os caricaturistas do jornal francês parecem ter muito orgulho de si mesmos e demonstram, em primeiro lugar, que têm coragem, uma vez que há dois anos a sede do jornal foi incendiada depois de uma edição em que denunciava a inqualificável lei muçulmana, a sharia. Aliás, desde a manhã de ontem, forças policiais foram mobilizadas para proteger a redação do jornal contra a cólera dos muçulmanos.
Essas caricaturas indicam também que a França é um país democrático e laico. A liberdade intelectual não tem limite. As ideias e sua manifestação não se defrontam com nenhuma norma superior, especialmente a religiosa. Os caricaturistas do Charlie Hebdo, mesmo não desenhando tão bem, são fiéis aos princípios da Revolução Francesa, de 1789, filhos de Voltaire, que, no século 18, conseguiu que a liberdade de expressão triunfasse frente às religiões judaica, católica e muçulmana.
Nesse sentido, o jornal é impecável. Em compensação, é caso de perguntar se antes de lançar o seu panfleto incendiário, os gênios do tabloide não fizeram estas perguntas: o estúpido filme americano, lançou multidões de muçulmanos contra símbolos do Ocidente nos países árabes. Os EUA e o Ocidente, que já não eram amados nesses países, agora são odiados e detestados. Seria inteligente jogar mais lenha na fogueira?
Democracia. O jornal não estaria reproduzindo, ingenuamente, um sistema de relações que prevaleceu outrora, quando um Ocidente dominador impunha suas normas, seus princípios e, às vezes, os seus deuses para o restante do mundo? Respondendo aos horrendos atos de violência de alguns muçulmanos fanáticos, colocando no ridículo o profeta Maomé, o Charile Hebdo, um semanário tão pouco religioso, no fundo não quis mostrar que o Deus dos cristãos é superior ao do Islã porque é tolerante?
Em um país católico, de fato, a democracia e a liberdade de expressão são a norma. Podemos blasfemar, cometer sacrilégios, insultar o papa e até Jesus Cristo, sem nos expor à censura ou às represálias mortais. É essa a mensagem subliminar que devemos apreender das caricaturas desse jornal de esquerda que outrora esteve na vanguarda do combate anticolonialista?
Em resumo, o Ocidente vale mais do que o restante do mundo. Há seis anos, o mesmo tabloide publicou 12 caricaturas de Maomé que haviam aparecido antes no periódico dinamarquês Jyllands-Posten. Na ocasião, foram vendidos 600 mil exemplares, ao passo que as edições regulares do tabloide não têm mais do que 45 mil leitores. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Um barril de confusões - MÍRIAM LEITÃO


O GLOBO - 20/09

A indústria de petróleo do mundo reunida no Rio, e o ministro das Minas e Energia preferiu anunciar em Brasília a nova rodada de concessões de áreas de exploração. A ausência de autoridades na Rio Oil & Gas é só um sinal dos erros nessa área. Perdeu-se tempo sem fazer novas concessões, o modelo de partilha é confuso, a produção estagnou e a Petrobras teve prejuízo.

O governo garantiu que o petróleo é o nosso passaporte para o futuro, mas o Brasil tem importado cada vez mais gasolina, a Petrobras perdeu, em cinco anos, 20% do seu valor de mercado, enquanto a Ecopetrol subiu mais de 100%. O site MSN Money disse que a Petrobras teve nos últimos dois anos a pior performance em bolsa entre as grandes petrolíferas. A área prospectada em regime de concessão está minguando e, se nada fosse feito, em 2016 poderia acabar. Isso porque a última licitação aconteceu em 2008. Esse intervalo já está perdido.

Estranho, porque como disse em sua coluna o jornalista George Vidor, só em bônus de assinatura o governo pode receber US$ 1 bilhão. O especialista Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), calcula que o governo perdeu entre US$ 4 bi a US$ 6 bi de 2008 a 2012. Uma parte desses constantes adiamentos no leilão foi provocada pela decisão de alterar o marco regulatório. Ainda há dúvidas sobre como funcionará esse novo modelo, nem tudo foi aprovado no Congresso. Uma nova estatal no setor preocupa até a Petrobras.

Os números indicam que alguma coisa está fora da ordem: a produção de petróleo de janeiro a julho aumentou apenas 0,7% em relação ao mesmo período de 2011. Ficou estagnada. A produção da Petrobras desde março é menor do que a do mesmo mês do ano passado. A produtividade da Bacia de Campos está caindo e a exportação de petróleo recuou. Na área de derivados, o país teve déficit na balança comercial de US$ 10 bilhões em 2011. A exportação de derivados cai a quatro anos seguidos, enquanto a importação subiu 90% de 2007 a 2011.

A indefinição e a incerteza sobre o setor afastaram o investidor que há alguns anos achava que o Brasil era uma nova fronteira. Hoje, ele está dividido entre várias áreas interessantes que surgiram no mundo nos últimos anos.

— De 2008 para cá, foram feitas grandes descobertas na Colômbia, Estados Unidos e na África. Enquanto o Brasil ficou parado, esses lugares andaram e atraíram parceiros — disse Pires.

Entre os vários erros cometidos na excessiva politização do setor está a construção da refinaria Abreu e Lima, formatada também para refinar o petróleo da Venezuela. O país vizinho não contribuiu com os custos da construção, a Petrobras até agora bancou sozinha, e o orçamento do projeto deu um salto ornamental. Prevista para custar US$ 2,3 bilhões, custará mais de US$ 20 bilhões.

Mas a lista de tropeços é maior: a capitalização derrubou as ações da Petrobras. A mudança do regime de concessão sobrecarregou a empresa de investimentos e aumentou a obrigatoriedade de compras de conteúdo nacional. O consumo de gasolina subiu, mas ela não pode elevar os preços, arcando com o prejuízo das importações.

A nova diretoria da Petrobras tem o grande mérito da sinceridade. Isso fez com que a ação subisse no dia em que a presidente, Graça Foster, estava anunciando o prejuízo. Mas o presidente do conselho de administração da empresa, o ministro Guido Mantega, deu entrevista neste fim de semana dizendo que os combustíveis não podem subir toda hora. Ou seja, o principal produto da companhia terá sempre o preço no valor e na hora que a Fazenda decidir. 

Artilharia pesada - VERA MAGALHÃES - PAINEL


FOLHA DE SP - 20/09


O PSDB pretende distribuir 652 mil exemplares de um jornal que compara Celso Russomanno a Fernando Collor e Celso Pitta. O material é dirigido ao chamado "centro expandido" de São Paulo, região na qual o candidato do PRB avança sobre o eleitorado tradicionalmente simpático a José Serra. O impresso, de quatro páginas, é intitulado "Dez fatos que você precisa saber" e traz fac-símiles de reportagens já publicadas na imprensa contra Russomanno, líder nas pesquisas.

Direto ao ponto Além dos recortes de reportagens, há pequenos resumos explicativos para cada caso. Na contracapa, o informativo arremata: "São Paulo não quer um novo Collor ou um novo Pitta. Quer experiência".

Mala-direta Não há referências diretas a Serra no jornal, cujo expediente será assinado pela direção estadual tucana. O partido negocia com os Correios a entrega domiciliar dos exemplares.

Vacina Russomanno vai levar à TV sua trajetória política, incluindo os mandatos de deputado e a assessoria da vice-presidência da República. A ideia é combater justamente a tese da "inexperiência" na vida pública.

Novena A nota de d. Odilo Scherer rebatendo artigo do coordenador da campanha do PRB não foi lida só nas missas. A Renovação Carismática Católica a divulgou nos seus 412 grupos de oração, que têm 33 mil fiéis.

Altar A Arquidiocese de São Paulo incluiu o padre Júlio Lancelotti, desafeto dos tucanos, entre os 12 religiosos que vão questionar candidatos na sabatina hoje. Ele é ligado a setores do PT e amigo de Gabriel Chalita (PMDB).

Presente Questionado em debate por não ter se licenciado do mandato de deputado na campanha e continuar recebendo salário, Chalita foi à Câmara nesta semana e fez questão de dizer no rádio que estava em Brasília.

Revide 1 A campanha de Fernando Haddad veicula a partir de hoje spot de 15 segundos associando Serra a Fernando Henrique Cardoso e Gilberto Kassab. O texto, paródia da peça tucana que liga Haddad a réus do mensalão, é: "Sabe o que acontece quando você vota no PSDB?''

Revide 2 E segue: "Você vota e ele volta", justapondo fotos de Serra, FHC e Kassab. Depois, o rosto do candidato toma o centro da tela, cortado por um "x", e o comercial se encerra fazendo menção ao fato de Serra ter deixado a prefeitura em 2006: "Você vota e ele vai. Foge e abandona mais uma vez o cargo".

Rodízio... Se condenados pelo STF, os deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP), além de João Paulo Cunha (PT-SP), que já teve o destino selado, deverão perder o mandato. Nos três casos, as cadeiras serão ocupadas pelo PT.

... mensaleiro Vanderlei Siraque, primeiro suplente da coligação em São Paulo, já assumiu mandato em substituição a Aldo Rebelo (PC do B), que assumiu o Ministério do Esporte. Pela ordem, quem assumiria a vaga de Cunha seria José Genoino, outro réu no mensalão. A também petista Iara Bernardi é a terceira suplente.

Day after Condenado ontem por Joaquim Barbosa, Roberto Jefferson afirma não se arrepender de ter denunciado o mensalão e diz que a eventual condenação de José Dirceu, "pelo mesmo pacote generalista, nos iguala a todos". "É injusto."

Holofote Sobre o destino do julgamento, ele afirma que a bola está com o relator: "Fui protagonista do mensalão no plenário político. No plenário dos togados, a estrela é o Joaquim Barbosa".

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI

tiroteio

"Haddad acha degradante ser ligado a Dirceu. É a crise de identidade da psicanálise, em que o adolescente nega o pai, mas é igual a ele."

DE ANDREA MATARAZZO, candidato a vereador pelo PSDB, sobre a petição do PT para tirar do ar propaganda de José Serra associando-o ao mensalão.

contraponto

Bullying presidencial

No almoço do último domingo, Eduardo Campos disse a Lula que uma declaração sua chamando de "gordinho" o prefeito de Ipojuca era hit na campanha da cidade.

-Todos os carros de som do Pedro Serafim denunciam o senhor como preconceituoso, presidente.

Lula riu e lembrou de outra saia-justa com Serafim. Diante da insistência do prefeito em discursar num evento longo, o então presidente alfinetou:

-O Ministério da Saúde recomenda sexo pelo menos três vezes por semana para a pessoa ficar mais pontual!

À mesa, todos gargalharam com a história de Lula.

A nossa guerra santa metropolitana - EUGÊNIO BUCCI


O ESTADÃO - 20/09


A competição entre os candidatos a prefeito na cidade de São Paulo virou gincana religiosa. Representantes católicos afirmam que a candidatura de Celso Russomanno (PRB) é uma estratégia maquiavélica da Igreja Universal do Reino de Deus e da Rede Record para ganhar a Prefeitura. Identificam aí uma cruzada fundamentalista, perigosíssima, apocalíptica. De seu lado, Russomanno nega tudo. Garante que seu partido tem mais católicos do que evangélicos e até pediu uma audiência reservada com o cardeal-arcebispo dom Odilo Scherer para pacificar os ânimos (infelizmente, conforme este jornal noticiou ontem, a Cúria Metropolitana alegou problemas de agenda e não atendeu ao pedido).

Há uma tensão religiosa no ar poluído da nossa capital. O ambiente vai pesando, vai confluindo para aquilo que místicos de outras inspirações espirituais chamariam de "energia ruim" ou de "clima carregado". A esta altura da campanha eleitoral, nada poderia ser pior.

As igrejas, quando convertidas em aparelhos partidários, não iluminam mais nada. Viram agentes das trevas. Todas as igrejas, sem exceção. A História está cheia de exemplos tenebrosos, todos conhecemos esses exemplos, mas, nesta hora obscura, não custa relembrar os princípios que servem de alicerce à crença democrática que nos unifica.

Uma disputa eleitoral - o rito mais alto da democracia, como gostam de dizer os cientistas políticos - existe para debater e, se possível, equacionar os impasses e as necessidades comuns de uma sociedade, qualquer que seja ela, uma cidade ou um país. Estamos falando aqui de impasses ou necessidades comuns (de uma comunidade): são impasses e necessidades, portanto, de ordem pública, que afetam todos, independentemente das particularidades individuais ou grupais de uns e outros. Em razão disso, os processos de discussão e de decisão que caracterizam as campanhas eleitorais democráticas pertencem à esfera da política, não da religião. Enquanto a primeira lida com argumentos racionais (ainda que, por vezes, nos pareçam um tanto estúpidos), a segunda se sustenta na fé. Quem pretende resolver a política com apelos vindos da fé pretende matar a política. Aliás, se a fé, sozinha, desse conta de equacionar os dilemas de uma cidade, a política não seria necessária - e poderia até ser dispensada, jogada fora, ou mesmo proibida. Em conclusão: trazer a coação eclesiástica para o núcleo do debate eleitoral constitui um ataque à democracia e à liberdade individual.

Sim, isso tudo já é sabido, é o bê-á-bá, mas parece que todo mundo se esqueceu do óbvio. Chega a ser inacreditável que líderes religiosos - evangélicos ou católicos, tanto faz - desconheçam princípios tão elementares, mas eles dão sinais de que os desconhecem e, às vezes, dão provas cabais de que os desprezam. Já vimos essa degradação em outras ocasiões. Na campanha presidencial de 2010, por exemplo, o pretexto do aborto abriu caminho para as cruzadas mais insanas, tornando irreconhecíveis faces que eram vistas como democráticas até então. Nessas horas de nuvens escuras, até mesmo políticos sabidamente agnósticos - ou ateus praticantes - assumem o papel de profetas moralistas empenhados em promover o fanatismo religioso para corroer o diálogo racional. As eleições se rebaixam, o potencial das urnas se apequena, a vida social se estreita - e a própria religião perde a graça.

Ninguém aqui tem o direito de se iludir. Quem promove o obscurantismo em períodos eleitorais não é o povo crédulo, como dizem os cínicos, mas as lideranças, os dirigentes religiosos e partidários, que exploram a credulidade dos humildes. Pelo que temos visto em São Paulo, hoje católicos e evangélicos enveredam pelo mesmo desvio, com pregações aparentemente antagônicas, mas que são igualmente antipolíticas. Se conseguirem transformar a eleição municipal numa contenda entre duas igrejas, essas lideranças religiosas (e partidárias) serão sócias na tarefa de desnaturar palanques em altares profanos.

Existe um problema no imbricamento entre religião, partido político e redes de televisão e de rádio, representado pela triangulação entre Igreja Universal, PRB e Rede Record? É claro que existe. Mas esse é um problema político, não religioso. E não é um problema dos evangélicos, por favor. Trata-se de um problema político passível de ser solucionado com ferramentas próprias da política, no âmbito do Estado de Direito (como, entre outras medidas, pela adoção de regras que proíbam a promiscuidade entre emissoras, partidos políticos e igrejas). Em tempo: existem inúmeras emissoras de orientação expressamente católica que caem na mesma distorção. Além disso, embora católicos petistas reclamem de Russomanno, é bom lembrar (outra vez, lembrar o óbvio) que o PRB se construiu com o apoio do lulismo, que também açulou seguidamente a TV Record por ter visto nela uma oportunidade de fustigar as "elites".

Não, o fenômeno Russomanno não caiu do céu, assim como não vai para o céu. Ele decorre do lulismo, da ausência de regras na radiodifusão e do oportunismo de sempre. Não vale, agora, sair por aí dizendo que os evangélicos, por serem evangélicos, querem levar o fundamentalismo à Prefeitura paulistana. Nada mais falso, nada mais baixo, nada mais ofensivo. A fé pessoal de cada um não tem nada que ver com isso. Se queremos culpar, se queremos satanizar alguém, deixemos em paz os comuns do povo. Vamos procurar as causas na sacrossanta esperteza dos caciques e vamos debater politicamente o que politicamente foi urdido.

No Brasil, é bem verdade, como alguém logo vai avisar, até as guerras santas terminam em pizza (acompanhada de vinho do padre). Mesmo assim, recomenda-se cautela aos chefes religiosos. Cautela e humildade. Que ninguém volte a chutar a santa - e que ninguém bata a porta na cara de ninguém. De vez em quando, ter um pouco de fé na política também ajuda.