quinta-feira, dezembro 23, 2010

DEMÉTRIO MAGNOLI

Herói sem nenhum caráter
DEMÉTRIO MAGNOLI 
O Estado de S.Paulo - 23/12/10

Lula jamais protestou contra o monopólio da imprensa pelo governo cubano e nunca deu um passo à frente para pedir pelo direito à expressão dos dissidentes no Irã. Ele sempre ofereceu respaldo aos arautos da ideia de cerceamento da liberdade de imprensa no Brasil. Mas é incondicional quando se trata de Julian Assange: "Vamos protestar contra aqueles que censuraram o WikiLeaks. Vamos fazer manifestação, porque liberdade de imprensa não tem meia cara, liberdade de imprensa é total e absoluta."

Assange é um estranho herói. No Brasil, o chefe do WikiLeaks converteu-se em ícone da turba de militantes fanáticos do "controle social da mídia" e de blogueiros chapa-branca, que operam como porta-vozes informais de Franklin Martins, o ministro da Verdade Oficial. Até mesmo os governos de Cuba e da Venezuela ensaiaram incensá-lo, antes de emergirem mensagens que os constrangem. Por que os inimigos da imprensa independente adotaram Assange como um dos seus?

A resposta tem duas partes. A primeira: o WikiLeaks não é imprensa - e, num sentido crucial, representa o avesso do jornalismo.

O WikiLeaks publica - ou ameaça publicar, o que dá no mesmo - tudo que cai nas suas mãos. Assange pretende atingir aquilo que julga serem "poderes malignos". No caso de tais alvos, selecionados segundo critérios ideológicos pessoais, não reconhece nenhum direito à confidencialidade. Cinco grandes jornais (The Guardian, El País, The New York Times, Le Monde e Der Spiegel) emprestaram suas etiquetas e sua credibilidade à mais recente série de vazamentos. Nesse episódio, que é diferente dos documentos sobre a guerra no Afeganistão, os cinco veículos rompem um princípio venerável do jornalismo.

A imprensa não publica tudo o que obtém. O jornalismo reconhece o direito à confidencialidade no intercâmbio normal de análises que circulam nas agências de Estado, nas instituições públicas e nas empresas.

A ruptura do princípio constitui exceção, regulada pelo critério do interesse público. Os "Papéis do Pentágono" só foram expostos, em 1971, porque evidenciavam que o governo americano ludibriava sistematicamente a opinião pública, ao fornecer informações falsas sobre o envolvimento militar na Indochina. A mentira, a violação da legalidade, a corrupção não estão cobertas pelo direito à confidencialidade.

Interesse público é um conceito irredutível à noção vulgar de curiosidade pública. Na imensa massa dos vazamentos mais recentes, não há novidades verdadeiras. De fato, não existem notícias - exceto, claro, o escândalo que é o próprio vazamento. A leitura de uma mensagem na qual um diplomata descreve traços do caráter de um estadista pode satisfazer a nossa curiosidade, mas não atende ao critério do interesse público. O jornalismo reconhece na confidencialidade um direito democrático - isto é, um interesse público. O WikiLeaks confunde o interesse público com a vontade de Assange porque não se enxerga como participante do jogo democrático. É apenas natural que tenha conquistado tantos admiradores entre os detratores da democracia.

Há, porém, algo mais que uma afinidade ideológica, de resto precária. A segunda parte da resposta: os inimigos da liberdade de imprensa torcem pelo esmagamento do WikiLeaks por uma ofensiva ilegal de Washington.

No Irã, na China ou em Cuba, um Assange sortudo passaria o resto de seus dias num cárcere. Nos EUA, não há leis que permitam condená-lo. As leis americanas sobre espionagem aplicam-se, talvez, ao soldado Bradley Manning, um técnico de informática, suposto agente original dos vazamentos. Não se aplicam ao veículo que decidiu publicá-los. A democracia é assim: na sua fragilidade aparente encontra-se a fonte de sua força.

O governo Obama estará traindo a democracia se sucumbir à tentação de perseguir Assange por meios ilegais. O WikiLeaks foi abandonado pelos parceiros que asseguravam suas operações na internet. Amazon, Visa, PayPal, Mastercard e American Express tomaram decisões empresariais legítimas ou cederam a pressões de Washington? A promotoria sueca solicita a extradição de Assange para responder a acusações de crimes sexuais. O sistema judiciário da Suécia age segundo as leis do país ou se rebaixa à condição de sucursal da vontade de Washington? Certo número de antiamericanos incorrigíveis asseguram que, nos dois casos, a segunda hipótese é verdadeira. Como de costume, eles não têm indícios materiais para sustentar a acusação. Se estiverem certos, um escândalo devastador, de largas implicações, deixará na sombra toda a coleção de insignificantes revelações do WikiLeaks.

A bandeira da liberdade nunca é desmoralizada pelos que a desprezam, mas apenas pelos que juraram respeitá-la. Assange não representa a liberdade de imprensa ou de expressão, mas unicamente uma heresia anárquica da pós-modernidade. Contudo, nenhuma democracia tem o direito de violar a lei para destruir tal heresia. A mesma ferramenta que hoje calaria uma figura sem princípios servirá, amanhã, para suprimir a liberdade de expor novos Guantánamos e Abu Ghraibs.

"Vamos fazer manifestação, porque liberdade de imprensa não tem meia cara, liberdade de imprensa é total e absoluta." Lula não teve essa ideia quando Hugo Chávez fechou a RCTV, nem quando os Castro negaram visto de viagem à blogueira Yoani Sánchez que lançaria seu livro no Brasil. Não a teve quando José Sarney usou suas conexões privilegiadas no Judiciário para intimidar Alcinéa Cavalcante, uma blogueira do Amapá, ou para obter uma ordem de censura contra O Estado de S. Paulo. Ele quase não disfarça o desejo de presenciar uma ofensiva ilegal dos EUA contra o WikiLeaks. Sob o seu ponto de vista, isso provaria que todos são iguais - e que os inimigos da liberdade de imprensa estão certos.

Alguém notou um sorriso furtivo, o tom de escárnio com que o presidente pronunciou as palavras "total e absoluta"?

SOCIÓLOGO E DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP. E-MAIL: DEMETRIO.

MÔNICA BERGAMO

Fora fumacê 
Mônica Bergamo 

Folha de S.Paulo - 23/12/2010

Apenas 0,5% dos estabelecimentos fiscalizados desde o início da Lei Antifumo, em 2009, foram multados em SP. O Procon vistoriou 65 mil pontos e aplicou 312 autuações. O governo atribui o resultado ao "alto grau de aceitação da lei". A maior parte das multas (193) foi aplicada nos primeiros meses da lei.

CERCO
Já pela Lei da Entrega, que obriga as empresas a informarem data e hora em que levarão o produto que venderam ao endereço do consumidor, o Procon multou 201 empresas, ou 54% do total fiscalizado. A Lei do Perdimento, que autoriza o governo a confiscar combustível adulterado dos postos, resultou em 160 mil litros apreendidos em um ano. Parte desse volume é reprocessado e doado à Polícia Militar, ao Corpo de Bombeiros e a outros órgãos públicos. Vinte e dois postos foram multados e 16, lacrados.

GRASSI DE VOLTA
Antonio Grassi, que deve ser a figura chave do Ministério da Cultura na gestão de Ana de Hollanda, ainda não tem cargo definido na pasta. Ele vai ocupar "alguma posição essencial", disse a ministra à coluna. Mas não obrigatoriamente a secretaria executiva, como se imaginava. "Estamos conversando."

COMO TODOS
E Ana diz que é falsa a sensação de que Dilma Rousseff não poderá demiti-la com facilidade. "A minha relação com o Lula é muito próxima", diz a nova ministra. Para o atual presidente, seria difícil cobrá-la. Já a relação com a futura presidente, na visão de Ana, será profissional: as duas só tinham se encontrado uma vez, no aniversário de cem anos de sua mãe, dona Memélia.

DESDE SEMPRE
E Chico Buarque, irmão de Ana, ficará distante do Ministério, como faz desde sempre, diz ela. "Ele não se mete nessas coisas." Até a manhã de ontem, eles não tinham conseguido nem se falar.

LOTAÇÃO MÁXIMA
A cantora Paula Toller, do Kid Abelha, passa o Natal na pousada Maravilha, em Fernando de Noronha. O hotel, que no ano passado foi fechado por um xeque árabe para o Réveillon, tem diárias de R$ 4.500.

ENVIADA ESPECIAL
Arianna Huffington, do site The Huffington Post, ganhou jantar em sua homenagem na casa de Donata Meirelles e do publicitário Nizan Guanaes, anteontem, no Jardim Europa. Entre os presentes, Olavo Setubal Jr. e Ricardo Marino, do Itaú, o publicitário Sérgio Valente, João Joaquim de Almeida Braga, do Icatu, Rogério Fasano e a argentina Carolina Larriera, namorada do diplomata Sérgio Vieira de Mello quando ele morreu, em 2003.

PÓS-OPERATÓRIO
Silvio Santos consultou seu cirurgião plástico, Pedro Albuquerque, em novembro. Queria retocar a operação que fez há cerca de um ano na região das olheiras. Albuquerque o desaconselhou e o apresentador tocou em frente sua viagem para Miami. Silvio costuma brincar que não tem santa melhor que "Nossa Senhora da Plástica".

TÔ FORA
O presidente do Corinthians, Andres Sanchez, não endossa o Palmeiras e o SPFC na disposição de contestar contrato assinado pela Federação Paulista de Futebol com a agência que comercializará para os clubes a publicidade em placas nos estádios. Dirigentes dos clubes afirmam que os termos da negociação foram incluídos no acordo que assinaram, dando anuência, sem que fossem avisados. "Quando você assina, você já sabe. O São Paulo tinha que ter falado antes de assinar", diz Sanchez.

ASTRO
Tiririca já recebeu três propostas para autorizar que a sua vida vire um filme. A primeira, e que tem a preferência da equipe do deputado eleito, veio do cineasta André Klotzel e do produtor Luiz Carlos Barreto. Mas outras duas, de grupos empresariais dispostos a ligar suas marcas à força popular da imagem do palhaço, também estão na mesa. Elas preveem a contratação de um diretor para realizar o projeto.

COMBINADO
Não está descartada uma combinação entre a proposta de Klotzel/Barreto e a dos outros de patrocinarem a ideia.

CURTO-CIRCUITO

A cantora Blubell lançará o disco "Eu Sou do Tempo em que a Gente se Telefonava" com show no dia 21 de janeiro, no Sesc Pompeia. Livre.

A festa Danceteria, do clube Hot Hot, terá edição extra hoje, às 23h30. 18 anos.

A prisão de seis funkeiros por apologia ao crime, na semana passada, será debatida hoje durante exibição do filme "Favela on Blast", no cinema Estação Botafogo, no Rio. Participam o diretor Renato HBL, o DJ Sany Pitbull e Renato Barreiros, ex-subprefeito de Cidade Tiradentes (São Paulo).

Stefanie e Natasha Shprecher estão produzindo as tortas vienenses Sacher Torte. À venda na Casa Santa Luzia e Steff Confeitaria.

GOSTOSA

EDITORIAL - O GLOBO


Inepta e sem ética
EDITORIAL
O Globo - 23/12/2010


É quase inevitável que um político com 80% de popularidade inspire toda uma mitologia em torno dele. Se esse político tem o dom da palavra, grande capacidade de se comunicar com as massas, a sua visão de mundo, aquilo que prega do palanque tem boa chance de ser entendido como a mais pura verdade. No caso de Lula, há vários exemplos. O bordão que criou - "nunca antes neste país" - quase sempre é seguido por alguma intenção do presidente, não por um fato objetivo. Mas deve-se reconhecer a capacidade de Lula, e do PT, de criar "verdades" que parecem irretocáveis. Entre elas está a política externa desses últimos oito anos. Credita-se a ela um suposto avanço do Brasil no comércio internacional, não detectado pelas grandes instituições multilaterais responsáveis por monitorar estas estatísticas. 

Ao contrário do que se pensa - e o senso comum é presa fácil de um marketing eficiente -, as exportações cresceram, mas, na melhor das hipóteses, no mesmo ritmo da expansão do comércio mundial. E, assim, a fatia brasileira nas trocas comerciais globais continua em torno do irrisório 1% de oito anos atrás. Com o avanço da globalização, o comércio é que progrediu muito. E o desempenho brasileiro foi modesto: correu muito para ficar no mesmo lugar. A política externa companheira não poderia mesmo ampliar o peso do país nas trocas globais, pois privilegiou a arcaica visão da diplomacia Sul-Sul, como se ainda houvesse espaço, no multilateralismo vigente, para uma estratégia de congregação de países do Sul ("pobres"), para somar forças em embates contra o Norte ("ricos"). A visão é bolorenta, traindo a naftalina das décadas de 60 e 70. 

Movida a um antiamericanismo míope, a diplomacia da Era Lula buscou liderar o G-20 na Rodada de Doha, para pressionar o Primeiro Mundo. Não que ele não devesse, e deva, ser pressionado: o bloco subsidia pesadamente a produção agrícola, em prejuízo das exportações de economias emergentes e pobres. A ilusão foi imaginar que o "Sul" é unido. A desmontagem da tosca estratégia do Itamaraty ocorreu quando o Brasil, com razão, tentou negociar a saída para o impasse na Rodada, e não foi acompanhado por Argentina, Índia e China ( parte do "Sul", na geopolítica itamaratiniana). Doha desmoronou - pelo menos esta tentativa de acordo - e, com ela, o plano fantasioso de o Brasil de Lula ser o líder mundial dos desvalidos. 

Ora, a malha de interesses dos países é bem mais intrincada, e não se move à base de ideologia. Este foi o erro mais grave do Itamaraty de Lula. Ao eleger o confronto com os EUA como a bússola da sua política externa, o governo perdeu oportunidades de ampliar a presença no comércio internacional. Recusou-se a discutir a Alca (Aliança do Livre Comércio das Américas), por ser um projeto de Washington. Mas, em troca, quase nada conseguiu em termos de acordos bilaterais, enquanto dezenas deles foram assinados pelo mundo. Cada um desses acordos dificulta a venda de algum produto brasileiro. Como é parte do Mercosul, o país só pode fechar acordos de que participe todo o bloco. Para complicar, quer, junto com a Argentina, colocar a Venezuela de Chávez entre os titulares do mercado comum. Pior, o terceiro-mundismo anti-EUA levou o Itamaraty a fechar os olhos em votações na ONU sobre ditaduras sanguinárias. Mesmo a presidente eleita, Dilma Rousseff, criticou a abstenção brasileira no caso dos apedrejamentos de mulheres no Irã. Encerra-se o ciclo de uma diplomacia inepta, leniente na defesa dos interesses da nação - vide expropriação de bens da Petrobras - e sem ética nos direitos humanos

VINICIUS TORRES FREIRE

Ano novo, juros novos 
Vinicius Torres Freire
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/12/10

BC avisa que juros devem subir 1,5 ponto percentual em 2011 num "Relatório de Inflação" bem convencional

O ÚLTIMO "Relatório de Inflação" do Banco Central do governo Lula e, na prática, o primeiro do governo Dilma Rousseff deve servir de ansiolítico para alarmistas e alarmados que alardeavam a hipótese de a autoridade monetária ter se travestido de heterodoxa nesta transição de presidentes. Ao menos segundo o que vai escrito no "Relatório", o BC permanece fundamentalmente convencional, temperado talvez por pragmatismo e por ceticismo em relação a extremismos teóricos, atitude evidente nos últimos dois anos.
Muito claramente, está dito que é preciso elevar a taxa básica de juros, a Selic, em janeiro. A julgar pelos resultados das estimativas e pelas condições presentes da economia, a Selic deve passar dos atuais 10,75% para 12,25% ao longo do primeiro semestre do ano que vem, o que era o palpite mais comum entre os economistas mais certeiros.
Além de convencional e mais ou menos previsível, o "aviso aos navegantes" emitido pelo BC é fundamentado em termos nada exóticos. As expectativas de inflação do mercado estão disparando. O consumo parece excessivo -a demanda interna (gasto do governo, investimento e consumo privado) cresce ao ritmo mais forte da década. O nível de utilização da capacidade produtiva está nos seus níveis mais altos, semelhantes àqueles de meados de 2008, quando a inflação também se desgarrara da meta. O desemprego está baixo. Etc.
Além do mais, o preço das commodities avança em marcha muito rápida. No acumulado em 12 meses até novembro, segundo os dados do próprio BC, o preço das commodities agrícolas subiu 33,2%, o das metálicas, 19,9%, e o das "energéticas", 7%. "A inflação ao consumidor apresentou aceleração nos últimos meses, com forte contribuição das commodities agrícolas." "[A inflação dos] serviços continuam a pressionar a inflação plena" -preço de serviços depende basicamente de preço de mão de obra, e os salários estão em alta.
Quanto às medidas de contenção do crédito anunciadas no início do mês, o BC obviamente reconhece que elas terão efeitos no esfriamento do consumo, que devem preceder medidas de aperto monetário "de manual" (alta de taxas de juros) e ponto. Enfim, pelo menos no texto do "Relatório", o BC não dá a menor sugestão de que medidas de caráter basicamente "macroprudenciais" (de contenção do crédito por normas regulatórias) possam substituir a política convencional de juros.
O mais interessante agora será observar o comportamento do restante da equipe econômica de Dilma Rousseff. Desde o início da campanha eleitoral, ou pelo menos desde maio, o entorno de Dilma alardeia que o governo vai frear gastos, que tem como objetivo chegar ao deficit público zero em 2014 e que as políticas fiscal (gastos do governo) e monetária serão mais coordenadas, de modo a reduzir o calibre dos tiros de juros na atividade econômica. O compromisso está mantido?
Para dar uma resposta convincente, o governo tem de dizer: 1) O que quer fazer do aumento do salário mínimo (e, pois, dos gastos do INSS); 2) O que fará do reajuste do salário dos servidores de agora em diante; 3) Dado que a possibilidade de corte de gastos em 2011 é pequena (o dinheiro está quase todo comprometido), qual o plano fiscal de médio prazo do governo Dilma?

JOSÉ SIMÃO

Cumbica Urgente! Cancela o Natal! 
José Simão
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/12/10

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Socuerro! Cancela o Natal. O Papai Noel não vem. Tá preso na nevasca! Nevasca, greve, atrasos, multidão!
E ainda por cima peguei a gripe Cumbica: aquela que te deixa no chão! MEDO DE AEROPORTO! Eu não tenho pânico de viajar de avião. Eu tenho pânico de aeroporto.
Eu tomo um Lexotan em casa, dois na Marginal e três quando chego no aeroporto! E a comissária pergunta: "Qual o seu destino?". O MEU DESTINO É SOFRER! Rarará!
Cumbica vira CUMPLICA! E Congonhas vira Cagonhas. Ops, Vergonhas! Esse Natal vai ser barra. BARRA DE CEREAL!
E o peru do piloto. Em greve. Diz que os pilotos estão estressados. Tão estressado que um piloto gritou ontem numa viagem pro Nordeste: "Segura aí atrás que vai balançar". Rarará!
E os atrasos por problemas operacionais. Problemas operacionais é quando não tem quem opere o avião!
Piloto! Eu vou levar o kit aeroporto: Lexotan, saco de dormir e Sundown. Pra tomar um solzinho na pista. Rarará.
Avião tá demorando tanto tempo pra levantar que já tem até malabarista de farol na pista! Aeroporto vira aeroparto. Demora nove meses pra embarcar. Rarará.
Aeroporto devia ter a placa: TÁ COM PRESSA? VÁ DE ÔNIBUS!". Rarará! E as enchentes? Abriram o AQUASSAB! São Pedro e São Paulo não se bicam!
E avisa pro Kassab que IPVA quer dizer Imposto Para Vias Alagadas. E o Corinthians que quer contratar o Adriano Imperador? Aí junta com o Ronaldo.
E tem o Bicentenário do Corinthians. Duzentos quilos. O Timão vai ter que comprar um guindaste. Pra içar os dois elefantes. Rarará!
E a melhor frase de 2010: "Ainda bem que o ano acabou", da Patrícia Amorim, presidente do Flamengo. Rarará!
O Brasileiro é cordial! A antepenúltima do Gervásio. Mais um cartaz naquela empresa de São Bernardo: "Se eu ver quem é o estrupício que está deixando as ferramentas fora do lugar aqui no almoxarifado, vou fazer o desinfeliz virar namoradinha de um grosso cabo de martelo e sem vaselina. Conto com todos. Assinado: Gervásio".
Quem vai convidar o Gervásio pra ceia de natal? Rarará.
A situação está ficando psicodélica. Nóis sofre, mas nóis goza.
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

FORMAÇÃO DE QUADRILHA

MERVAL PEREIRA

Ministério amorfo 
Merval Pereira 

O Globo - 23/12/2010

O Ministério que a presidente eleita, Dilma Rousseff, montou mostra bem a dificuldade que uma política sem experiência terá para administrar esse imenso condomínio eleitoral de dez partidos políticos que têm entre si mais interesses do que visões programáticas. A coalizão mais fragmentada de que se tem notícia na História política recente só formaria um Ministério coerente se tivesse como base um dos partidos, e isso, Dilma fez, mesmo às custas de desagradar a outros aliados: deu um espaço privilegiado ao PT, que controla todos os chamados “ministérios da Casa”, ficando com os mais estratégicos também da Esplanada, como Fazenda, Planejamento, Saúde, Comunicações, Ciência e Tecnologia, Educação.

O Ministério ficou com mais cara de Lula, de uma continuidade sem grandes inovações, o que pode indicar justamente isso, um governo amorfo, ou também apenas uma estratégica submissão enquanto Lula não abre mão de ser o manda-chuva além do próprio mandato.

Dos 37 ministérios, o Partido dos Trabalhadores ficou com nada menos que 17, e o PMDB, o segundo maior partido da coligação, embora tenha permanecido com suas seis pastas, “perdeu substância”, como admitiu o vice-presidente eleito, Michel Temer.

Essa substância política foi parar justamente nas mãos de petistas: Paulo Bernardo nas Comunicações e Alexandre Padilha na Saúde.

A indicação do deputado do Rio Luiz Sérgio, um ilustre desconhecido fora das hostes petistas, para a articulação política do governo só demonstra a força de José Dirceu no Ministério novo.
Também o PSB, o partido da base aliada que mais cresceu nas últimas eleições, não teve recompensada sua atuação política nas urnas.

Ficou com duas pastas, como vinha acontecendo, mas apenas o número é igual. Perdeu para o petista Aloizio Mercadante o Ministério da Ciência e Tecnologia, que deveria ser um ministério estratégico para um país que se pretende ator de primeira categoria no cenário internacional.

O PMDB manteve sob seu domínio o Ministério das Minas e Energia, com o senador Edison Lobão, e o da Agricultura, com Wagner Rossi, mas terá que dar consistência política à Secretaria de Assuntos Estratégicos, turbinada pelo comando do Conselhão, o que pode significar coisa alguma se os seus aconselhamentos continuarem sendo desprezados pelo governo.

Mas, se o Conselhão ganhar importância estratégica, seu coordenador, o ministro Moreira Franco, ganhará relevância política dentro do governo.

Caberá a ele conseguir que os empresários que o compõem exijam que o fórum de debates ganhe repercussão dentro do governo e se transforme em uma das instâncias governamentais, se não de decisões, pelo menos de aconselhamento consequente. Tarefa difícil, pois o Conselhão foi criado no primeiro governo de Lula com a intenção de se sobrepor ao Congresso, encaminhando a ele reformas e decisões para serem homologadas.

O Congresso reagiu a essa intenção e transformou o Conselhão em quase nada, uma reunião de empresários cuja participação dá status, mas não poder decisório.

A presidente eleita mostrou sua determinação ao ampliar para nove o número de mulheres no seu Ministério, longe do idealizado terço, mas ampliação suficiente para marcar uma posição.

Também não foi criado nenhum novo ministério, o que é um bom sinal em tempos de necessidade de cortes de orçamento.

Mas no próximo ano deve ser criado o Ministério de Micro e Pequenas Empresas anunciado por Dilma durante a campanha eleitoral, e também o de Aeroportos, essencial para a realização da Copa do Mundo em 2014.

A dificuldade para montar o Ministério ficou patente não apenas nos atrasos do cronograma — ela pretendia apresentá-lo integralmente antes de sua diplomação na semana passada —, mas também pelo descontentamento que causou.

O PMDB não está contente com a desidratação de seu poder, e certamente vai buscar uma compensação no momento mais adequado politicamente.

O PSB queria um terceiro ministério para contentar sua bancada, mas teve que se satisfazer com o mesmo número de pastas, e de menor importância.

Além do fato de Dilma ter querido manter Ciro Gomes no Ministério, certamente seguindo o sábio conselho político vindo de Tancredo Neves, que criou o Ministério da Cultura para abrigar José Aparecido de Oliveira, aliado com voos próprios a quem preferia ter ao seu lado do que desgarrado.

Não conseguiu e ainda provocou um atrito com o presidente do PSB, o governador reeleito de Pernambuco Eduardo Campos.

Essas pequenas dissensões já se refletiram na disputa pela presidência da Câmara, fazendo com que o candidato oficial Cândido Vaccarezza tivesse que desistir do cargo para um candidato da base petista.

E alimentam movimentos dentro dos aliados para uma candidatura alternativa. Se ela se concretizar, poderemos ter uma repetição do impasse que levou à presidência da Câmara o indigitado Severino Cavalcanti.

A única vantagem do governo Dilma é que, hoje, as oposições se compuseram com o candidato do PT mais facilmente que os próprios aliados.

DORA KRAMER

Nada de novo no front 
 Dora Kramer 

 O Estado de S.Paulo - 23/12/2010

E para terminar o ano mais um escândalo no Congresso, mais caos nos aeroportos e mais um discurso de emotiva autoexaltação logo mais à noite na despedida do presidente Luiz Inácio da Silva em rede nacional.

A boa notícia é que Lula deve se aquietar em merecido descanso (de parte a parte) por alguns dias antes de voltar a falar de si dia sim outro também.

Por ora, nada de novo no front: os aeroviários fazem uma abjeta chantagem com a população que neste fim de ano enche os aeroportos por causa das férias e das festas, enquanto o presidente, indiferente aos malefícios gerais, desfila para cima e para baixo declarando-se o melhor governante de todos os tempos.

Aos passageiros, claro, resta enfrentar mais uma vez sua saga de Natal.

No departamento de escândalos, outra vez juntam-se Legislativo e Executivo na produção de um vexame envolvendo ministro indicado pela presidente que toma posse daqui a nove dias. Como ensaio geral não poderia ser mais significativo.

Pedro Novais apresentou pedido de ressarcimento de R$ 2.156,00 relativos a despesas no Motel Caribe em São Luís do Maranhão, seu domicílio meramente eleitoral, pois mora no Rio.

Indicação do PMDB sob o gentil patrocínio do presidente do Senado, José Sarney, e do líder do partido da Câmara, Henrique Eduardo Alves. Explicação da excelência?

"Não enche o saco", disse ao repórter Leandro Colon, do Estado, com a fidalguia inerente à estirpe.

Difícil saber o que é pior: o deputado cobrar, a Câmara pagar a conta da festa no motel, o PMDB indicá-lo para o ministério ou a presidente e a equipe de transição aceitarem a indicação sem procurar saber nada sobre a conduta da pessoa a quem entregarão uma pasta que liberou irregularmente dinheiro de emendas parlamentares, cujo orçamento em 2010 foi de mais de R$ 4 bilhões.

Talvez Pedro Novais não emplaque no ministério, mas o padrão está sinalizado. Na Câmara, as regras ditas moralizadoras, baixadas depois do escândalo da farra das passagens aéreas, dão a cada deputado entre R$ 15 mil e R$ 32 mil a título de verba indenizatória para fazer o que quiser. Inclusive festas em motéis.

Sobre os aeroviários, aprenderam o caminho das pedras em 2006, com os controladores de voo, e desde então o Natal é o mesmo inferno. Não só por causa deles.

A incúria e a imprevidência governamentais, a cobiça e o desacato das empresas aéreas em relação ao consumidor estão na origem de uma situação que faz milhões de brasileiros reféns indefesos de agonia sem remédio e dão ensejo a um movimento salarial de natureza criminosa.

Isso porque Nelson Jobim iria dar um jeito no setor. Três anos depois Lula ainda sai dizendo que "onde houver um brasileiro sofrendo quero estar espiritualmente ao seu lado".

Com toda certeza, os prisioneiros do caos prefeririam a sua parte em respeito, um mínimo de organização, atenção ao bem-estar da coletividade e menos empenho estritamente eleitoral.

Público alvo. José Serra não diz palavra a respeito, mas o gestual é todo de quem não tem a mínima intenção de se declarar fora do jogo eleitoral. Para presidente em 2014.

Com foco especial no milhão de correspondentes por e-mail e 580 mil seguidores no Twitter.

Cadeira cativa. Pensando bem, por que tanto interessa aos irmãos Ferreira Gomes (Ciro e Cid) o controle da Secretaria dos Portos?

O atual, Pedro Britto, foi secretário de Fazenda do Ceará e tesoureiro da pré-campanha de Ciro. O futuro, Leônidas Cristino, é prefeito de Sobral (CE), berço dos irmãos.

Até onde a vista alcança, não dá para enxergar como entraram os portos na história.

Votos de vida. Bom Natal, excelente virada de ano e até 2 de janeiro de 2011, já sobre a posse de Dilma Rousseff.

ILIMAR FRANCO

Insatisfeitos 
Ilimar Franco 

O Globo - 23/12/2010

Futuro ministro da Casa Civil, Antonio Palocci comunicou aos senadores eleitos Wellington Dias (PT-PI), Humberto Costa (PT-PE) e José Pimentel (PT-CE), segunda-feira, que a direção do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) continuará com Elias Fernandes Neto. Ele é uma indicação do líder do PMDB, deputado Henrique Alves (RN). O PT do Nordeste está profundamente incomodado com a montagem do governo.

Posição isolada
O candidato do PT à presidência da Câmara, deputado Marco Maia (RS), corre o risco de ser prejudicado pela disputa interna de poder no DEM. O líder demista, deputado Paulo Bornhausen (SC), anunciou ontem o apoio da bancada a Marco Maia sem consultar o grupo do presidente do partido, deputado Rodrigo Maia (RJ), que foi pego de surpresa. Entre os aliados do presidente do DEM não há veto ao petista, mas eles também estão conversando com o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que deve lançar candidatura avulsa. A atitude de Bornhausen irritou o grupo de Rodrigo, que pode apoiar Aldo para desautorizá-lo.

Turbinada
Depois que a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) foi confirmada no Ministério da Pesca, a emenda da bancada de Santa Catarina para essa pasta, no Orçamento da União para 2011, aumentou de R$ 5 milhões para R$ 44 milhões.

A equação de Pinheiro
Dois fatores levaram o senador eleito Walter Pinheiro (PT-BA) a recusar o convite para assumir o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Um é que ele é o primeiro senador da História eleito pelo PT da Bahia. O outro é que seu suplente é do PP. “O Ministério do Desenvolvimento Agrário é muito focado. No Senado, posso trabalhar de forma mais ampla. Não é malcriação”, disse Pinheiro.

EUA e a base de Alcântara
Em telegrama confidencial de setembro de 2005, o conselheiro da embaixada americana Phillip Chicola diz que o governo brasileiro não tem dado resposta às propostas de acordo feitas pelos EUA para utilização da base de Alcântara, mesmo tendo firmado entendimento com a Ucrânia. No governo FHC, o Brasil assinou um acordo alugando parte da base para o lançamento de foguetes norteamericanos, o que foi barrado no Congresso durante o governo Lula.

● FUTURO ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo participa hoje, em Recife, de reunião de avaliação do programa local de segurança pública.

● A SENADORA Marina Silva (PV-AC) tinha agenda ontem em seu estado referente ao aniversário de morte de Chico Mendes e não iria ao jantar com o presidente Lula.

● O GOVERNADOR eleito Agnelo Queiroz (DF) criou a Secretaria da Criança, que será dirigida por Dioclécio Campos Júnior, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria. Uma das prioridades será a ampliação da rede de creches e pré-escolas.

GOSTOSA

ALON FEUERWERKER

Recorrer ao velho PT
Alon Feuerwerker
Correio Braziliense - 23/12/2010

A pauta desta vez não é um problema no âmbito dos fardados. É entre os civis mesmo. Alguém tem, afinal, uma boa explicação de por que, mesmo antes da ameaça de greve, os aeroportos já iam mal?

Vamos combinar. Estivéssemos num governo do PSDB, haveria agora em Brasília um plantão de parlamentares petistas. Cuja missão seria entupir a imprensa com aspas culpando a administração pelas desventuras dos infelizes que resolveram viajar de avião neste feriado.

Talvez haja algum exagero no “infelizes”, pois os viajantes vão turistar, enquanto muitos ficam na ativa. Mas vamos em frente.

E que o governo tucano não se atrevesse a colocar pressão sobre os sindicalistas em ponto de greve. Teria imediatamente contra ele um discurso arrumadinho, de como a incompetência das autoridades acabou empurrando os pobres coitados dos aeroviários e aeronautas ao último recurso, desesperado, da paralisação.

Tudo pela absoluta falta de sensibilidade social de quem deveria ter se preparado com antecedência e negociado um bom acordo antes de deixar as coisas chegarem ao ponto que chegaram.

Ah, e teria mais. As dificuldades da Infraero se explicariam por uma política deliberada de sucateamento, cujo objetivo oculto seria a malfadada privatização, sob o bonito nome de “abertura do capital”.

Mas o governo é do PT, e não do PSDB. Para começar, é preciso fazer justiça. Os principais aeroportos do país, com raras exceções, estão melhor do que há oito anos. Há alguns relegados, e talvez o mais emblemático seja o de Vitória, capital do Espírito Santo. Mas no geral a coisa andou.

Só que não no ritmo do crescimento da demanda. Ficou longe. O governo — bom de comunicação que só ele — explora o aspecto positivo, de que o poder de compra avançou e hoje muito mais gente voa em vez de pegar uma estrada. Mas, e o tal planejamento?

A explicação fácil seria um deficit de capacidade de gestão, mas eu peço vênia para desconfiar toda vez que alguém fala em “problemas de gestão”.

Prefiro acreditar no velho PT, crer que tem gente fazendo há muito tempo corpo mole neste assunto, de olho num filé.

Foi assim no primeiro “caos aéreo”, depois que a irresponsabilidade de dois pilotos americanos causou o acidente da Gol em 2006. Em meio à politicagem, uma parceria entre o sindicalismo e o governo procurou vender à opinião pública a necessidade da “desmilitarização” do controle do espaço aéreo nacional.

Com o tempo, comprovou-se não haver a propagandeada “falência” do sistema de controle, mas aí os americanos (e com a ajuda do nosso altivo Itamaraty, segundo o WikiLeaks), já estavam no país deles, fora do alcance da Justiça verde-amarela.

Como o gato já tinha posto o rabo de fora, o apêndice do bichano pôde ser medido em muitos e muitos dólares, a serem desembolsados para construir o tal sistema paralelo civil de controle do espaço aéreo nacional.

E a ideia acabou indo na época ao arquivo, pois as pessoas notaram que se a Força Aérea Brasileira deixasse a função haveria o risco de o controle ficar à mercê do sindicalismo. Como agora na ameaça de greve dos aeroviários e aeronautas. Conseguem imaginar o que seria?

Mas a pauta desta vez não é um problema no âmbito dos fardados. É entre os civis mesmo. Alguém tem, afinal, uma boa explicação de por que os aeroportos já iam mal mesmo antes do ensaio de greve?

Só não vale dizer que não tem dinheiro. Afinal, este governo, quando quis, deu um jeito de capitalizar a Petrobras como parte das operações político-empresariais do pré-sal. Achou que deveria fazer e fez. Passou por cima de todo tipo de dificuldade e reticência. Hoje as ações da empresa sofrem, talvez momentaneamente. Mas o governo chegou onde quis.

Por que nunca houve a mesma vontade política no tema dos aeroportos? Deveríamos recorrer ao velho PT e desconfiar de que há mais gente interessada na privatização da Infraero do que supõe a vã filosofia?

Alistamento de todos
Não há razão para as Forças Armadas brasileiras deixarem de observar com atenção a correta medida adotada pelos Estados Unidos, de banir o veto ao alistamento de homens e mulheres assumidamente homossexuais.Patriotismo, orgulho nacional e vontade de servir fardado à pátria nada têm a ver com orientação sexual. Mesmo no aspecto operacional, todas as pesquisas realizadas nas FFAA americanas revelaram uma maioria favorável à revogação do Don’t ask, don’t tell, o “Não pergunte, não diga.”Considerando que os americanos estão o tempo todo em guerra, é um resultado ainda mais significativo.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Barril de pólvora 
Renata Lo Prete 

Folha de S.Paulo - 23/12/2010

Encerrado o loteamento ministerial, são muitos os aliados insatisfeitos, porém nenhum mais do que o PMDB. Em privado, seus principais caciques notam que outras siglas viram frustrado o desejo de se expandir, mas só o PMDB perdeu espaço na Esplanada.

Entre os alvos de recriminação está o presidente do partido, Michel Temer. No entender de correligionários, o vice de Dilma Rousseff negociou mal ao priorizar o objetivo de "ficar bem com ela", além de ter sido atropelado pelo QG da transição, que empurrou-lhe um prato feito. Segundo um peemedebista graúdo, não há o que fazer no momento: "Ajoelhou, tem que rezar." E quando virá o troco? "Na primeira crise."

Então tá
Na lista de queixas do PMDB, o item Ministério da Saúde está circulado em vermelho. Dilma havia pedido que o partido cedesse a pasta de modo a instalar ali um técnico e/ou grande nome da área. E o escolhido acabou sendo Alexandre Padilha. Médico, por certo, mas fundamentalmente um quadro do aparelho petista.

As voltas que...Observação de um veterano do primeiro mandato: com a ida de Luiz Sérgio (PT-RJ) para a Secretaria de Relações Institucionais, José Dirceu voltará a ter uma pessoa de sua confiança dedicada à estratégica atividade de distribuir emendas e atender prefeitos.

... o mundo dáDirceu controlou essa torneira até fevereiro de 2004, quando Waldomiro Diniz foi ejetado da Casa Civil no primeiro escândalo da era Lula.

BarbeariaIndicados Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia) e Luiz Sérgio para a equipe de Dilma, um ministro de Lula comentou: "Não sei quanto à cota de mulheres, mas a de bigodes foi bem contemplada".

É com elaLula avisou a Nicholas Sarkozy que o assunto compra dos caças será resolvido por Dilma. O presidente da França aguarda ansiosamente a batida de martelo em prol dos Rafale.

ClãEntre as pessoas que se movimentaram em favor da escolha de Bruno Covas (PSDB) para comandar a Secretaria de Meio Ambiente na futura administração de Geraldo Alckmin está dona Lila, avó do deputado estadual campeão de votos e viúva do governador Mário Covas.

CurrículoO deputado estadual David Zaia (PPS), anunciado ontem por Alckmin para comandar a Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho, foi presidente do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos). Antes de migrar para a central UGT, Zaia integrou a Executiva Nacional da CUT.

Veja bemEm vídeo de Boas Festas enviado ontem aos servidores paulistas, o governador Alberto Goldman (PSDB) saiu em defesa da política da gestão José Serra para o funcionalismo. Listou benefícios como plano de carreira, programas de qualificação e financiamento de computadores e imóveis. Reconheceu, porém, que a valorização da categoria "ainda está longe do ideal".

Mais umDepois de indicar o irmão para a pasta de Infraestrutura e a mulher para a da Família e Desenvolvimento, o governador eleito do Paraná, Beto Richa (PSDB), verá o filho Marcello se tornar secretário de Esportes de Luciano Ducci (PSB), que sucedeu o tucano como prefeito de Curitiba.

Visita à FolhaJuarez Lopes de Araújo, presidente da Deloitte Touche Tohmatsu, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Heloisa Helena Montes, diretora de Marketing.

Tiroteio
"Vejo choradeira desnecessária. A mudança é salutar, e é preciso coragem pra mudar. No resto, chorem na cama, que é quentinho!"

DE FABIO LEPIQUE, assessor de Geraldo Alckmin, respondendo, em seu Twitter, aos tucanos que mais ou menos abertamente se queixam de escolhas feitas pelo governador eleito para o futuro secretariado paulista.

Contraponto

Show de calouros
Presidente do TRE-SP, o desembargador Walter de Almeida Guilherme encerrava seu discurso na solenidade de diplomação dos eleitos por São Paulo cantarolando estrofe de Tobias Barreto das trovas acadêmicas do Largo São Francisco, sede da faculdade de direito na qual o desembargador e o senador eleito Aloysio Nunes (PSDB) foram colegas de turma.

Na fila para receber seu diploma, o deputado federal Paulinho da Força (PDT) comentou:

-Se isso aqui fosse o programa do Silvio Santos, ele teria sido reprovado. Troféu abacaxi...

O VAGABUNDO

CELSO MING

A inflação ataca 
Celso Ming 

O Estado de S.Paulo - 23/12/2010

O Relatório de Inflação de dezembro veio bem mais sombrio do que a ata do Copom, divulgada apenas seis dias antes. (Veja o Entenda.) A mudança de tom foi tão grande que ficou a dúvida: a realidade piorou tanto em menos de uma semana ou é o Banco Central que não está sabendo se comunicar?

Desta vez, o ambiente para os preços se deteriorou rapidamente, adverte o Banco Central, preparando assim os agentes econômicos para uma nova rodada de alta dos juros básicos (Selic), que desde julho estão a 10,75% ao ano. O diretor de Política Econômica do Banco Central, Carlos Hamilton Araújo, foi ainda mais contundente. Falou em "aceleração gigantesca nas expectativas de inflação a partir de setembro".

O setor produtivo vai a reboque do consumo - diz o Relatório. Cresce ao ritmo de 7,3% (é quanto vai se expandir o PIB), enquanto o consumo avança a 10%. Isso explica o quadro de inflação de demanda, aquele em que os preços sobem em consequência de um descompasso entre oferta e procura. Ou seja, nem o aumento das importações, de 44% nesses 11 meses do ano, pagas com um dólar barato, a R$ 1,70, estão dando conta da febre de compras dos consumidores.

Pela primeira vez, em muitos anos, ficou dito no documento que os salários jogam contra a estabilidade na economia. Os reajustes que as empresas estão sendo forçadas a conceder pela escassez de mão de obra "são incompatíveis com o aumento da competitividade do setor produtivo". Dito de outra forma, o excessivo aquecimento do mercado de trabalho vai exigir despejo de água fria. Para esse resfriamento, não será suficiente apenas a desaceleração a ser provocada pela contenção das despesas públicas. Será preciso atuar também por meio da elevação dos juros.

E há as advertências sobre a deterioração das condições externas. Após quase três anos de crise global, a inflação passou a ser o principal problema a ser enfrentado pelos bancos centrais dos países ricos, especialmente da Europa. E o maior foco de alta virá da escalada dos preços das commodities, especialmente dos alimentos, o que traz o lado bom para o Brasil, que é o aumento das exportações, mas contribui para puxar os preços por aqui.

Outro grande incubador de inflação interna está na área dos serviços, um segmento do mercado que tem pouca ou quase nenhuma exposição à concorrência externa. É outro sinal de que a demanda avança na frente da oferta.

E qual é o recado? O Banco Central avisa que falta medir o impacto das restrições do crédito sobre os preços. Não disse com todas as letras que os juros aumentarão dia 19 de janeiro, quando se reunirá o Copom. Mas deixou entrever que ficou mais provável que isso aconteça.

A alta dos juros é o primeiro elemento que contrariaria a intenção do futuro governo Dilma de baixar o custo do dinheiro a fim de atrair mais investimento do exterior para as obras do PAC sem risco de derrubar demais a cotação do dólar.

Enfim, a força da inflação provavelmente exigirá uma esticada ainda maior dos juros do que a programada. Falta saber qual será a disposição do governo federal de apertar ainda mais os cintos de maneira a não deixar a maior parte do serviço de saneamento para o Banco Central, como invariavelmente tem acontecido.

O que é o que é
O Relatório de Inflação é um documento trimestral, que ontem veio com 137 páginas, no qual o Banco Central avalia todos os fatores que direta ou indiretamente influenciam a inflação e os juros.

Barco a remo
O Relatório e a ata do Copom são os principais instrumentos de comunicação por meio dos quais a instituição realiza sua política de condução das expectativas junto ao mercado financeiro e aos marcadores de preços. Mostram o que o Banco Central está vendo e como pretende combater a inflação, mais ou menos como o patrão do barco a remo canta o ritmo das remadas.

Questão de credibilidade
O bom gerenciamento das expectativas é essencial para a obtenção de resultados. Quanto maior a credibilidade desfrutada pelo Banco Central, mais os agentes econômicos tenderão a remarcar os preços nos limites e no ritmo por ele manifestados. Por isso, pressupõe capacidade de discernimento e clareza de expressão.

MÍRIAM LEITÃO

Turbulências 
Miriam Leitão 
O Globo - 23/12/2010

A presidente da Anac, Solange Paiva Vieira, está gripada e não sabe se terá Natal com a família ou se passará em Guarulhos, de plantão, no combate ao risco de caos aéreo, desta vez detonado pela ameaça de greve dos aeronautas e aeroviários. Anac, Infraero, Ministério da Defesa e secretarias de segurança foram mobilizados para enfrentar as dificuldades dos próximos dias.

Solange avaliava ontem que a greve não teria o impacto temido, porque o índice de sindicalização é baixo e há outros sinais de baixa adesão. De qualquer maneira, numa infraestrutura que já tem deficiências e, com o aumento da demanda, qualquer problema pode gerar efeitos em cascata.

A paralisação foi convocada para hoje por ser o momento de maior vulnerabilidade das empresas.

O aumento de salário pedido pode ser justo, mas atingir as famílias no reencontro de Natal é uma estratégia para jogar a opinião pública contra qualquer movimento. As empresas, por seu lado, devem negociar com mais habilidade para não expor os usuários a mais desgaste além do normal nesta época do ano.

As secretarias de segurança foram mobilizadas para evitar que os piquetes possam impedir quem quer trabalhar. Solange Paiva garante que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Infraero têm planos de contingência para minimizar os efeitos de qualquer problema, que vão de uma hierarquia de prioridades de voos até a possibilidade de embarque sem bagagem, se houver problemas com o pessoal de terra: — Além disso, o pessoal da Anac sabe que em qualquer problema, as folgas estão canceladas para todos os funcionários. Eu mesma só saio de Guarulhos se tudo estiver bem.

Há problemas estruturais e conjunturais. Uma greve faz parte do segundo grupo, mas os aeroportos brasileiros estão ficando cada vez mais vulneráveis a qualquer turbulência ocasional. Um pequeno problema pode detonar um caos aéreo porque o aumento dos investimentos em logística aeroportuária não ocorreu na mesma rapidez que o incremento da demanda por transporte aéreo de passageiros.

O número de passageiros nos aeroportos tem aumentado ano a ano, por causa do crescimento econômico, da melhoria do mercado de trabalho e da renda das famílias. De acordo com a Infraero, os embarques e desembarques no país, contando voos internacionais, saltaram 80% de 2003 a 2009, indo de 71 milhões para 128 milhões. Este ano, somente até outubro já foram registrados 126 milhões, quase o mesmo número de 2009 inteiro.

Segundo o site Contas Abertas, com base em dados do Ministério do Planejamento, a Infraero só conseguiu realizar 22% do orçamento deste ano. Dos R$ 1,6 bilhão que estavam disponíveis, apenas R$ 358 milhões foram executados. Esse percentual tem caído nos últimos anos. Em 2003 e 2004 foram realizados 65,1% e 81,1% do orçamento, respectivamente. Em 2008, realizou-se apenas 17%, e em 2009, 42,9%.

— Nos últimos anos, o percentual gasto do orçamento foi diminuindo. A Infraero nos últimos quatro anos não conseguiu gastar sequer metade do dinheiro que estava disponível para melhorar a infraestrutura dos aeroportos. Essa é das áreas mais fracas do PAC — afirmou Gil Castelo Branco, do Contas Abertas.

Para o ex-presidente da Infraero, e hoje professor da UNB, especialista em aviação, Adyr da Silva, o problema é gerencial e não é de falta de recursos. Segundo ele, o país tem hoje cerca de 35 milhões de embarques e desembarques sendo acomodados na base do jeitinho brasileiro. Silva diz que em 2003, apenas 6% da população brasileira andou de aviação pelo menos uma vez no ano. Em 2010, o percentual chegará a 13%.

— Nunca houve tanto dinheiro para investir no setor como nos últimos três anos, mas não se consegue gastar. Temos uma crise gerencial. O quadro é crônico, e muito mais sério do que a imaginação possa alcançar — afirmou.

O país tem que enfrentar esse problema, não pelos eventos esportivos que ocorrerão aqui, mas pelo aumento da demanda. Num país continental como o Brasil é natural que uma grande parte do transporte de passageiros seja mesmo aéreo.

— A greve é pontual. A verdadeira crise é provocada pelas decisões erradas. Mandaram interromper a terceira pista de Guarulhos, que duplicaria a capacidade, e decidiram construir outro aeroporto não se sabe onde. A obra de Santos Dumont custou muito mais do que devia.

Congonhas está esgotado. Temos deficiências gravíssimas em vários aeroportos, poucos investimentos e investimentos errados — diz Adyr da Silva.

A torcida é para que a greve não vá adiante. Mas nunca é demais lembrar que o verdadeiro problema é mais permanente.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

Mina d"água 
Sonia Racy 

O Estado de S.Paulo - 23/12/2010

É grande a expectativa dos ambientalistas para que Dilma e governadores estaduais façam valer leis ambientais. Querem saber quando haverá fundo específico para depósito de milhões de reais arrecadados desde o ano 2000, resultantes da cobrança de compensações medidas na categoria "impacto difuso" - prevista na Lei de Proteção Ambiental.

Atualmente, esses pagamentos jorram direto na veia do Tesouro Nacional. Calcula-se que já foram depositados pouco mais de R$ 600 milhões.

Dinheiro que não foi necessariamente para ações compensatórias a danos na natureza.

Mina 2
No Rio, Carlos Minc, quando secretário do Meio Ambiente de Sérgio Cabral, correu e abriu um fundo ambiental específico para receber esses recursos. Hoje, o fundo tem R$ 30 milhões em caixa e outros R$ 90 milhões acertados.

Minc, curiosamente, não repetiu a dose na esfera federal quando ministro de Lula. E também é um mistério porque outros estados do Brasil não criam seus próprios fundos ambientais.

Amor eterno amor
Adivinhe onde Roger Agnelli, da Vale, passará o Natal com sua família?

Carajás.

Dó-ré-mi
O provável ingresso de Bruno Covas no secretariado montado por Alckmin diminui a bancada tucana na Assembleia Legislativa. No entanto, ela se torna mais musical.

Leandro, do grupo KLB, é democrata e entra na vaga.

Sunshine
Celso Kamura, maestro do look de Dilma, acredita que no dia da posse ela irá vestida de claro. "Sugeri azul, mas ela já usou na diplomação", conta. A maquiagem também seguirá estilo natural e leve.

Além de Dilma, o make-up artist também cuidará do visual de outra cliente de longa data, Marta Suplicy.

Low profile
Ana de Hollanda ainda não tem Twitter. Entretanto, após sua nomeação, o perfil de sua homônima recebeu dezenas de mensagens.

Pega ele
Um cachorro escapou na pista do Aeroporto de Guarulhos, semana passada, enquanto estava sendo "descarregado". Foi preciso acionar bombeiros para capturá-lo.

Enquanto isso... 
Clima de apreensão no Minc. Motivo? Teme-se que Ana de Hollanda leve parte da turma de Antonio Grassi para lá. Íntimo da nova ministra, o ator não deixou boas lembranças na sua saída da Funarte, quando brigou com Gilberto Gil.

Mulher Maravilha
Carla Bruni virou personagem de história em quadrinhos. Obra da editora canadense Bluewater Productions. A história vai desde seu nascimento, na Itália, até os atribulados romances com Mick Jagger, Eric Clapton e, claro, Sarkozy.

Tipo importação
Will.i.am, do Black Eyed Peas, gostou mesmo do suingue brasileiro. O músico voltará para o carnaval em Salvador. Agitará o bloco Skol Folia, no circuito Barra-Ondina.

Precoce
José Garcia, escritor mirim, lançou seu primeiro livro.

Na Fazenda da Vó de Juca explora as férias do personagem-título. Aos oito anos, o menino levou apenas um fim de semana para colocar sua história no papel[17 E 18/12].

Na frente
Marta Suplicy recebeu ontem Arianna Huffington para almoço tête-à-tête em sua casa. Novo site à vista?

No réveillon, Cesar Cielo não quer ver água a não ser a do seu chuveiro. Só volta a treinar dia 10.

João Bordon, Marcus Buaiz, Kako Perroy, Rubinho Zogbi e Daniel Nasser preparam-se para inaugurar, em março, o Club Set, conhecido point em Miami. Na esquina das avenidas Cidade Jardim com Faria Lima.

William, ex-capitão do Corinthians, foi convidado por Leon Cakoff e Renata de Almeida para comentar o filme Fora do Jogo, de Jafar Panahi. Amanhã, no programa da Mostra Internacional de Cinema, da TV Cultura.

Klaus Mitteldorf lança domingo o livro São Paulo Blues, pela Terra Virgem Editora, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional.

A SPR e a Francap se uniram e inauguram hoje a rede de franquias São Paulo Mania. Especializada em produtos com a grife do São Paulo Futebol Clube.

As "artes" estão tristes. Morreu ontem, aos 96 anos, Hércules Barsotti. Um dos maiores pintores, desenhistas e gravadores do País.

GOSTOSA

LUIZ FERNANDO JANOT

Um paradigma espetaculoso
LUIZ FERNANDO JANOT
O GLOBO - 23/12/10


No início do século passado, a cidade do Rio de Janeiro foi palco para inimagináveis transformações urbanas. Ao se consolidar no poder, o governo republicano atuou de forma implacável na velha cidade colonial e imperial com o objetivo de transformá-la numa "cidade civilizada" que correspondesse aos princípios positivistas de ordem e progresso. Demoliram morros, efetuaram aterros, destruíram casas, alargaram ruas, abriram avenidas - enfim, um conjunto extraordinário de obras que fez com que o Rio fosse aclamado "cidade maravilhosa". Foram tempos de luxo, cultura e beleza simbolizados pela construção da Avenida Central, do Teatro Municipal, do Museu de Belas Artes, da Biblioteca Nacional e dos palacetes, prédios, clubes e hotéis que prósperos empresários, como a família Guinle, deixaram como legado para a cidade.

Com os avanços tecnológicos na construção civil e a influência da cultura americana, a cidade se verticalizou, dando origem à Cinelândia, ao edifício "A Noite" e alguns belíssimos prédios de apartamentos na Glória e no Flamengo. Sucessivamente, o Rio incorporou ao seu contexto urbano o maior e o melhor acervo da arquitetura modernista brasileira. O edifício do MEC, a sede da ABI, o Aeroporto Santos Dumont, o Parque Guinle, o Conjunto Residencial do Pedregulho, o Museu de Arte Moderna e o Monumento aos Pracinhas são alguns exemplos que demonstram a qualidade da produção arquitetônica carioca daquela época e que até hoje permanece como referência para quem deseja conhecer a cidade.

Mas existia, também, o outro lado da moeda. A precariedade dos recursos destinados à habitação popular levou as populações mais pobres a se deslocar para os subúrbios da Central e da Leopoldina e para as favelas que se espalhavam por toda a cidade. Por sua vez, as famílias mais ricas e uma significativa parcela da classe média decidiram morar à beira-mar, nos bairros da Zona Sul. Vislumbrando esse mercado emergente, as grandes empresas imobiliárias concentraram seus investimentos, preferencialmente, nas localidades litorâneas, deixando os subúrbios para os pequenos construtores e empreiteiros informais.

A imensa procura por apartamentos menores e mais econômicos, sem que fosse exigida qualquer contrapartida dos construtores, contribuiu para a produção maciça de imóveis desprovidos de qualquer preocupação estética e funcional. Aceitou-se passivamente uma lógica de mercado que oferecia alta lucratividade na comercialização de imóveis dotados apenas dos requisitos mínimos exigidos pela legislação. A perda da qualidade arquitetônica nas construções acentuou-se a partir dessa época e alcançou o seu auge nos anos 50 durante o boom imobiliário, especialmente em Copacabana. Esse período é marcado pela produção de uma quantidade incalculável de unidades residenciais amesquinhadas, formando concentrações comprometedoras da eficiência dos serviços de infraestrutura e insustentáveis do ponto de vista ambiental. Por mais contraditório que possa parecer, esse modelo se repete para atender à demanda por imóveis semelhantes na Barra da Tijuca e no Recreio dos Bandeirantes. E, se não for controlado, irá se estender para a região das Vargens e de Guaratiba, comprometendo definitivamente o meio ambiente nessas localidades.

Todavia, vislumbramos uma possibilidade de reversão gradativa desse modelo de ocupação extensiva da cidade, na medida em que as comunidades que estão sendo retomadas do poder paralelo comecem a receber novos investimentos. A requalificação urbana dessas localidades e das áreas desvalorizadas no seu entorno deverá despertar o interesse das empresas imobiliárias em atuar efetivamente na ocupação dos inúmeros vazios urbanos nelas existentes. Espera-se, contudo, que as futuras intervenções não fiquem atreladas unicamente às variáveis de ordem econômica e financeira, e contribuam para elevar o padrão de qualidade das construções.

É importante que se tenha a compreensão de que o Rio possui uma cultura própria e que a sua valiosa imagem não pode ficar comprometida por obras sem consistência e de gostos duvidosos. O deslumbramento na apreciação de projetos que chamam a atenção esconde, muitas vezes, a sua fragilidade diante do tempo que os transformará precocemente em objetos ultrapassados e indesejáveis. As reluzentes pontes em arco construídas pelo Metrô sobre o Canal do Mangue e a estonteante torre de elevadores para acesso ao Morro do Cantagalo, apenas para citar alguns exemplos, justificam a nossa preocupação diante da possibilidade de esse paradigma arquitetônico espetaculoso ser adotado aleatoriamente nos projetos que serão construídos no Rio, pelo poder público e pela iniciativa privada, para receber os Jogos Olímpicos de 2016.

LUIZ FERNANDO JANOT é arquiteto urbanista e professor da FAU-UFRJ.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Produção de carros vai desacelerar e deve crescer 8% em 2011, diz consultoria 
 Maria Cristina Frias

Folha de S.Paulo - 23/12/2010

A produção brasileira de automóveis deve apresentar crescimento de 8% no ano que vem, um sinal de desaceleração em relação ao ritmo de expansão registrado neste ano, de 14%, segundo projeções da RC Consultores.

A indústria automotiva brasileira deve atingir a produção de 3,94 milhões de veículos em 2011.

"O esfriamento do mercado já era esperado. A economia brasileira não aguentaria uma taxa de crescimento no mesmo patamar da registrada neste ano", afirma Fábio Silveira, sócio da consultoria RC Consultores.

O aumento da massa real de rendimentos e a expansão do crédito devem sustentar esse crescimento, na análise feita por Silveira.

O estoque de crédito concedido pelo sistema financeiro exclusivamente para a aquisição de veículos deve atingir R$ 129 bilhões na média de 2011.

Esse volume será 14% maior que o deste ano, segundo a consultoria.

As importações brasileiras devem ultrapassar a marca de 1 milhão de veículos, com aumento de 30% sobre as compras deste ano, de acordo com as projeções.

"Se o mercado se mantiver aquecido e as importações excederem muito a marca de 1 milhão de veículos, o governo deverá adotar novas medidas para tornar o crédito mais restritivo e conter o consumo", diz Silveira.

A taxa de câmbio valorizada é apontada como um limitador para o aumento das exportações brasileiras.

Entretanto, as vendas externas devem registrar aumento de 25% no ano que vem, para 984 mil veículos, segundo projeções da RC.

Um Brasileiro depois de 114 anos 
Após quatro anos como diretor-geral da Bayer HealthCare na Espanha, Theo van der Loo voltou ao país em novembro para assumir a direção da unidade brasileira e se tornar presidente do grupo em janeiro.

Filho de holandeses que deixou o país aos 12 anos, Loo avisou aos pais que voltaria ao se formar. Cumpriu a promessa e começou aqui a carreira. O executivo, que é o primeiro brasileiro a presidir o grupo no país em 114 anos, começa a sua gestão com ao menos cinco lançamentos.

Em 2011, a Bayer coloca no mercado um contraceptivo considerado "inovador" pela companhia por conter estrogênio natural.

Outro produto novo será um monitor portátil que mede hemoglobina glicada em cinco minutos. Medicamentos para hipertensão pulmonar e disfunção erétil também estão na lista de novidades, além de produtos para animais, vitaminas e da linha Bepantol.

"O mercado farmacêutico está mais competitivo no país", diz Loo. "Mas vamos continuar a crescer em torno de 10% a 13% ao ano."

Natal com mais Presentes
O crescimento das vendas para o Natal de 2010 será maior que o estimado pela Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shopping).

Segundo o presidente da entidade, Nabil Sahyoun, o aumento em comparação com o ano passado será próximo de 14%. A expectativa da Alshop antes do período de compras era de 12%.

Os produtos que apresentaram maior elevação na demanda foram eletroeletrônicos, cosméticos e roupas.

Outra informação antecipada por Sahyoun é que as vendas no Estado de São Paulo cresceram mais que no restante do país.

O levantamento nacional do setor será divulgado amanhã em São Paulo.

Consórcio para Servidor
O Bradesco vai lançar planos de consórcio exclusivos para os servidores públicos.

A taxa de administração será até um ponto percentual mais baixa que a média cobrada no mercado.
São planos de automóveis, caminhões e imóveis.

Até novembro deste ano, a Bradesco Consórcios comercializou 221 mil cotas de consórcios, 25% a mais do que no ano passado.

Com a conquista da folha do funcionalismo de Pernambuco, o banco atingiu a marca de 1,5 milhão de clientes servidores públicos.

Contratações
A demanda por serviços de logística cresceu 60% no último trimestre deste ano em relação ao período de julho a setembro. Com o aumento, foram contratados 100 mil trabalhadores temporários, de acordo com o Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços Terceirizáveis e de Trabalho Temporário de São Paulo.

Fila no... 
As vendas do setor de supermercado do Estado de São Paulo acumulam alta nominal de cerca de 8% até novembro, quando são consideradas as lojas em funcionamento desde novembro de 2009 e lojas abertas em 2010, segundo a Apas (Associação Paulista de Supermercados).

...supermercadoQuando são levadas em conta apenas as mesmas lojas, o índice é menor -cerca de 5% de crescimento. Como em dezembro as vendas são acentuadas, a estimativa é que o setor encerre o ano com crescimento real acima de 6%.

Negócios na Mesa 
Após quatro edições realizadas na Espanha, o evento de gastronomia Millesime vai ocorrer em São Paulo, em março, no Terraço Daslu. Com direção do chef Alex Atala, o evento oferece degustações e apresentações sobre gastronomia.

Durante as três noites, empresas podem pagar R$ 50 mil por uma mesa para oito pessoas, onde é possível fazer reuniões em jantar preparado por uma equipe de chefs internacionais e brasileiros, com seis pratos.

A vinda a São Paulo faz parte da expansão do evento, que "em breve chegará também a Nova York e Chicago", segundo Manuel Quintanero, criador do Millesime.

O ABILOLADO

GILMAR MENDES

Federalismo cooperativo e segurança pública
GILMAR MENDES 
O Estado de S.Paulo - 23/12/10



Além de espelhar o alívio, a aprovação e a esperança dos cariocas em tempos de menos tensão e mais prosperidade, o sonoro aplauso dos brasileiros à operação de retomada de territórios há décadas dominados por traficantes no Rio de Janeiro sinaliza um novo patamar de exigência da população no tocante ao problema da segurança. Muito ao reverso de tudo isso, a perplexidade maior ficou por conta da facilidade com que tudo se deu, deixando no ar indagação meio óbvia: se foi tão fácil, por que não se fez antes?

Bem, talvez faltasse a confluência de fatores que se viu agora: a vontade política dos governantes; a indignação dos cidadãos, reféns indefesos da audácia crescente da bandidagem; a urgência em garantir ambiente seguro aos altos investimentos necessários à Copa de 2014 e à Olimpíada de 2016; enfim, o consenso de que somente pela atuação conjunta e ordenada do aparato estatal, utilizando com eficiência todos os instrumentos disponíveis, seria possível fazer frente ao requinte organizacional que o crime alcançou.
Sim, passa da hora de reconhecer que as questões de segurança são de alcance nacional, não só por permearem diversos Estados da Federação, mas por serem de responsabilidade de todas as esferas políticas. A concentração dos índices de criminalidade em certos nichos não desonera a União de trabalhar diretamente, em ação integrada e com gestão compartilhada, na superação de um dos mais graves obstáculos ao desenvolvimento socioeconômico do País.
Não é tarefa fácil porque, além de ações muito bem planejadas e executadas por órgão com competência federal, requer a disponibilidade de recursos específicos para a contínua redução dos índices e efeitos da criminalidade, em montante que ultrapassa em muito a capacidade de endividamento da maioria dos Estados.
Aliás, esse amadurecimento político, distante das disputas partidárias, já vem sendo notado há anos em áreas cruciais como saúde e educação. A segurança, evidentemente, não pode ficar de fora desse pacto por ações definitivas em prol do bem comum. Já é chegada a hora de interpretar o dispositivo da Constituição federal que atribui competência à União para assegurar a defesa nacional - Art. 21 III - como uma intimação constitucional à sua maior atuação no combate à criminalidade organizada, que ameaça o Estado brasileiro e toda a sociedade. É preciso que a União assuma, de uma vez por todas, seu natural papel de liderança federativa, expurgando as improvisações que, nos casos ligados à violência, além de inadmissíveis, se mostram tão paliativas quanto improducentes.
Neste diapasão a Constituição de 1988 também impõe um dever às Forças Armadas, no momento em que, no seu artigo 142, estabelece que a elas poderão, por iniciativa dos poderes constitucionais, destinar-se à garantia da lei e da ordem. É preciso interpretar essa norma de forma construtiva e com efeitos concretos.
A complexidade da criminalidade organizada, seu aspecto transnacional e sua potencialidade lesiva - valendo-se da droga, das armas e da violência como produto - permite que esta questão de segurança pública se transforme num problema de segurança nacional.
Também a Polícia Federal deve liderar a organização de esforços, estruturas e informações essenciais à repressão e à prevenção da criminalidade, principalmente quanto aos delitos essenciais ao crime organizado, como o tráfico de armas e entorpecentes, além da lavagem de dinheiro.
Desta forma, a atuação da União, por meio das Forças Armadas e da Polícia Federal e em coordenação com a atividade dos Estados, representa uma necessidade e uma realidade. No âmbito da Justiça, a atuação integrada não é novidade. Cito o exemplo da parceria firmada, em fevereiro deste ano, entre o Ministério da Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para implementação da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), objetivando, entre outras medidas, a integração de bancos de dados, levantamento de informações sobre mandados de prisões, providências em relação aos presos em delegacias e acompanhamento de inquéritos e processos criminais.
No Judiciário, ações como os Mutirões Carcerários, o Começar de Novo e o Projeto Integrar são exemplos de iniciativas a envolver a atuação conjunta de órgãos de diversas esferas administrativas que têm produzido progressivos resultados na efetividade da prestação jurisdicional.
De modo algum uma acanhada interpretação do federalismo pode obscurecer ou restringir a responsabilidade da União de organizar o empenho das mais variadas estruturas administrativas na área da segurança pública. É fundamental que o Estado se aproprie de ferramentas tecnológicas no combate ao crime e que suas estruturas políticas possam compartilhar informações e soluções para avançarmos coordenadamente no combate ao crime.
Medidas simples que dependem dessa coordenação interinstitucional - como o banco de mandados de prisão, maior inteligência sobre o modus operandi das organizações criminosas e registros confiáveis sobre a população carcerária - são instrumentos indispensáveis à definição de política pública para a área de segurança.
Diante do êxito, cabe prosseguir com passos seguros e estratégias proativas, de maneira a garantir a vitória nas batalhas que se avizinham. Então é pensar em medidas normativas que promovam o devido suporte legal ao protagonismo da União, para que se viabilize o mais depressa possível a orquestração harmônica desse imprescindível concerto a várias mãos.
MESTRE PELA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA, MESTRE E DOUTOR EM DIREITO DO ESTADO PELA UNIVERSIDADE DE MÜNSTER (ALEMANHA), MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), FOI PRESIDENTE DO STF E DO CNJ 

ANCELMO GÓIS

Porradão de Lula 
Ancelmo Góis 

O Globo - 23/12/2010

Lula, em entrevista ao site Porradão de 20, de Celso Athayde, que vai ao ar hoje, solta os cachorros no DEM, partido que, disse ele na campanha, “deveria ser extirpado da política”:
— Começou como Arena (...). Com o fim da ditadura, espertamente, mudou o nome para PDS. Não deu certo, mudaram para PFL. O povo abriu os olhos mais uma vez (...), e trocaram para DEM. E já devem estar pensando em um novo nome, porque o DEM já não engana ninguém. Tem a ditadura no DNA.

Mesmo assim... 
Lula faz um mea culpa: — Quando falei que o DEM devia ser extirpado me referia às urnas. Mas me penitencio. Foi um arroubo, uma exaltação. Ah, bom!

Escola Base...
Lula voltou a defender a turma do mensalão petista:
— Comparo ao caso da Escola Base, em que os donos foram acusados de molestar crianças. Eram absolutamente inocentes.

No mais... 
É pena que Lula, que tanto bem fez aos pobres, use seu prestígio para acobertar crimes. Só um exemplo do que foi o mensalão: Duda Mendonça, marqueteiro de Lula em 2002, que quase trabalhou na campanha de Dilma, admitiu ter sido pago no exterior com grana ilegal de caixa 2 e paraísos fiscais.

Contagem regressiva 
Faltam oito dias para o PMDB continuar a ser governo e abocanhar um carguinho aqui, outro ali, mais um aqui, um outro ali...

A demanda do peru 
Algumas empresas que encomendaram perus de Natal para dar aos funcionários tiveram problemas na entrega. A Sadia, gigante do penoso de carne gostosa, diz que não faltou peru, e que os atrasos foram pontuais. Glu, glu, glu.

Se gosta, cuida 
O voo da TAM que saiu ontem de Brasília para o Rio às 15h18m trouxe a bordo o presidente da Infraero, Murilo Barboza. No pouso, Barboza, que viajou como gente comum na poltrona 11C, comentou com a pessoa ao lado: “Os paulistas que me perdoem, mas não há nada igual ao Santos Dumont. Este aeroporto é lindo! Meu predileto.”

Aliás... 
O ar-condicionado do aeroporto está quebrado.

Voo 447 
A Air France, aos poucos, vai sendo condenada a indenizar famílias de vítimas do voo 447 que caiu no Atlântico em 2009. O juiz Alberto Republicano, de Niterói, condenou a voadora a pagar R$ 1,2 milhão a uma família que perdeu quatro pessoas. O mesmo juiz mandou a francesa indenizar em R$ 3,5 milhões outra família que alegou ter sofrido danos com a falta de informações sobre o desastre.

Calma, gente 
Vai parar na Justiça o caso de três alunos, na faixa de 15 anos, expulsos de uma escola de bacanas na Zona Sul do Rio, acusados de fumar maconha. Os advogados Sérgio Bermudes e Nélio Machado foram contratados por um dos pais.

Menos processos 
O carioca buscou um pouco menos a Justiça em 2010. O TJ do Rio chega ao fim do ano com 8.085.093 ações em primeira instância (em 2009, foram 8.199.457). Mas o número de condenações aumentou — de 552.253 para 580.579.

Cena carioca 
Dias atrás, uma parceira da coluna entregou o carro a um manobrista do Porcão de Ipanema e foi jantar. Uma picanha e algumas linguiças depois, voltou para pegar o possante e... o vidro de trás estava com um rombo.

Segue... 
O manobrista alegou que um PM, ao prender um ladrão, bateu com a cabeça do gatuno no vidro do carro. O Porcão pagou o preju sem questionar. Ah, bom!

Morte no palco 
Sábado passado, no meio da peça “Doidas e santas”, uma barata graúda surgiu no fundo do palco e roubou a cena. Cissa Guimarães, nossa querida atriz, protagonista, ficou paralisada. Seu companheiro de palco (dela e da cascuda), o ator Giuseppe Oristanio, pegou a barata com a mão, jogou no chão e, sem dó, esmagou a “coadjuvante”. No fim, Cissa agradeceu: “Meu herói!”

GOSTOSA

VERISSIMO

De Natal
VERISSIMO
O ESTADO DE SÃO PAULO - 23/12/10


Não há cronista que não tenha cometido uma crônica de Natal. Alguns são reincidentes, fazem uma crônica de Natal a cada Natal – muitas vezes a mesma crônica. Ou faziam. Hoje poucos se sentem obrigados a não deixar passar a data, talvez porque tenham escasseado, com o tempo, as formas de tratar do assunto com um mínimo de criatividade. Antigamente você podia fazer da natividade uma metáfora moderna: a manjedoura como símbolo da origem humilde de um justiceiro social, José e Maria como despossuídos (os primeiros sem-teto) perseguidos pelos poderosos do dia, como hoje, etc. etc. Ou podia apelar para a crítica política indireta: os três reis magos chegam à manjedoura trazendo só mirra e incenso porque tiveram que passar por Brasília e o ouro desapareceu. Uma vez descrevi a cena na manjedoura do ponto de vista dos animais, perplexos com o que veem e incapazes de compreender o momento histórico que vivem. Minha intenção, eu acho, era fazer uma divagação profunda sobre a neutralidade do mundo natural diante – ou atrás, já que só serve de cenário – dos dramas humanos, e a insignificância destes em contraste com a vasta indiferença das coisas. Ou coisa parecida. Isto tudo sem falar, claro, nas mil e uma variações sobre a figura do Papai Noel e seu saco. Tudo já foi feito. Mas, só para não deixar passar a data, aqui vai a minha crônica de Natal deste ano, na categoria reminiscências com ilações, também já muito usada.
Sempre houve árvore de Natal na nossa casa, desde os pinheirinhos da época dos móveis escandinavos, que era como minha mãe chamava os caixotes de bacalhau norueguês trazidos do mercado e transformados em mesas e estantes. Quando a situação melhorou o pinheirinho cresceu. Eventualmente, acometidos de consciência ecológica, trocamos o pinheiro de verdade por um sintético, que é o que está na sala agora, todo decorado, com uma humilde estrela na ponta onde, no Natal de 2006, tremulava uma fotografia do Gabiru, autor do gol que deu o campeonato do mundo ao Internacional naquele ano, suspiro e reticências. Minha mãe era religiosa mas o nosso Natal nunca foi religioso. Às vezes há mais amigos judeus do que cristãos no jantar da véspera, em nossa casa. E aqui entra a ilação, já que se está discutindo tanto crença e descrença em Deus. O Natal nos fornece símbolos de muito mais coisas, e coisas mais importantes, do que questões de fé. Estamos juntos, nos gostamos muito, isso é o que celebramos todos os anos. E nada mais distante de especulações teológicas do que a Lucinda rondando a árvore, tentando adivinhar quais dos presentes são seus.