sábado, dezembro 31, 2011

MUITA COMIDA EM 12, 13, se o mundo não acabar






Feliz 2012 - FERNANDO HENRIQUE CARDOSO


ZERO HORA 31/12/11

Natal e Ano-Novo são momentos que convidam à calma, às retrospectivas e aos devaneios sobre o futuro. Não será diferente nesta passagem de 2011 para 2012. Os pregadores de todas as religiões, os arautos das boas-novas, desde os políticos até os adivinhadores do futuro, vão insistir no "amai-vos uns aos outros", síntese do que de mais generoso já foi proposto para a humanidade.

Noutro dia, em um casamento, ouvi o celebrante pregar com emoção o amor entre os noivos e as juras de fidelidade eterna. Pensei em silêncio: diante da vida, ele crerá nisso? Acho que sim e eu também. Cumpra-se ou não à risca o que está ditado como a boa norma, ela não deixa de ser o ponto de referência sem o qual a sociabilidade não tem no que se apoiar e a relação entre as pessoas dá-se com tal estranhamento, que torna o homem inimigo do homem. Pode até ser assim, mas como anomalia, rejeitada pela "boa sociedade".

Esta construção mental – a boa sociedade – inspirada pela vontade e guiada por valores pode ser "utópica", mas é condição para uma convivência civilizada. É por isso que, sem cinismo, proclamamos os votos de bom Ano-Novo. Razões para pessimismo há, de sobra. Mas por que não acreditar que as coisas podem melhorar?

Assistimos em 2011 aos Estados Unidos naufragarem na crise financeira e no desemprego. Mas há alvíssaras. Com todo o impasse no Congresso, com os caricatos candidatos do Partido Republicano se digladiando na ignorância, pouco a pouco parece que encontraram um candidato menos ridículo, ainda que "direitoso", Gingrich. Obama, por seu lado, mais retórico do que eficaz, se equilibrou entre propostas generosas e dificuldades políticas para elas serem aceitas. Cedeu, mas não capitulou. Deixou que o Fed inundasse os mercados de dólares, não tocou nos banqueiros, viu seu prestígio ir ladeira abaixo pela dificuldade em barrar o desemprego crescente, mas parece que capeou o temporal. Torçamos para que as coisas se ajeitem e para que o ônus da tragédia dos "mercados irracionalmente exuberantes" não recaia apenas no povo mais pobre.

A Europa, meu Deus, quase se desmilinguiu. O maior avanço civilizatório posterior à hecatombe da II Grande Guerra, a Europa dos 17 ou dos 27 esteve à beira de se desfazer e ainda é possível que surja algum problema pela frente. O euro, símbolo da vontade de unidade europeia, foi duramente golpea- do. Os construtores da União Europeia e do Banco Central Europeu acreditaram que um tratado prévio, assinado na cidade de Maastrich em 2002, fosse capaz de ordenar os orçamentos de Estados soberanos. Lá estava estipulado que país algum poderia se endividar acima de 3% do Produto Nacional. Pobre engano: Alemanha e França, hoje heraldos da ortodoxia, foram os primeiros países a desobedecer. Como a União Europeia construiu-se a partir do princípio de solidariedade, os países ricos transferiram recursos aos mais pobres. Portugal, Espanha, Grécia, Irlanda abriram estradas, se "modernizaram". Entretanto, nem todos criaram novas fontes produtivas.

Agora, com os apertos financeiros, os banqueiros e governos europeus, que anteriormente encheram esses países de dinheiro, gritam: esses povos "do Sul", esses "mediterrâneos", são irresponsáveis, gastam o que não têm e não querem pagar o que lhes emprestamos. Dureza neles, nada de perdão de dívidas que levaria à "frouxidão moral". Com isso, talvez salvem o euro, mas dificilmente darão saída para o empobrecimento e o desemprego, que necessitam de mais investimentos para ceder. Torçamos para que em 2012 a Europa saia dessa enrascada.

A China, por seu turno, grande vitoriosa do último quartel, tornou-se possuidora das maiores reservas de dinheiro do mundo. Investe sem parar e, ao contrário dos europeus e americanos, tem o problema de frear lentamente o crescimento baseado em exportações e fazer com que os chineses consumam mais e poupem menos. Belo desafio! Ficam registrados minha torcida e meus votos para que a nova geração que se prepara para assumir o poder continue na linha pragmática da anterior e entenda que o "amai-vos uns aos outros" (que pode ser expresso em linguagem ideográfica e confuciana) implica ampliar o bem-estar dos chineses, mas também em colaborar para entendimentos que assegurem a paz entre os povos e o alento em suas economias.

Para o Oriente Médio e outros focos mais ardentes do planeta, fica a esperança de que a "revolução da primavera" não se perca em novos autoritarismos e fundamentalismos e que dela resulte o aumento da pressão para que prevaleçam dois Estados independentes e pacíficos na Palestina e em Israel. Ou, pelo menos, que o terror atômico não ensandeça a cabeça de algum exaltado líder iraniano ou israelense comprometendo em definitivo a paz no Oriente Médio. Por outro lado, espero que o delírio do "regime change", que leva a guerras derrotadas de antemão, não embale outra vez as ambições de líderes ocidentais na região.

E aqui, na pátria amada? Por enquanto, vamos escapando da derrocada da crise financeira. Mas, atenção: o que foi postergado, as reformas (as que vão da porta da fábrica para fora – a tributária, as de flexibilização do mercado trabalhista, as parcerias para acelerar as obras de infraestrutura etc., sem esquecer a sempre lembrada e pouco entendida "revolução educacional" ), está se tornando incontornável, se quisermos realmente competir com os polos mundiais de crescimento. Como poderemos enfrentar tamanho desafio com o arranjo político vigente, baseado em pluralidade de legendas e escassez de partidos e no butim do Estado para permitir o que se está chamando de "governabilidade" num sistema de coalizões entre grupos de interesse? Tenha coragem, senhora presidente, e trate de se livrar do entulho herdado, uma teia de corrupções, clientelismos e conivências. Ou melhor, tenha habilidade e competência política para jogar fora de sua "base" a ganga que parece indispensável, mas que pesa menos quando se defronta com uma vontade nacional alimentada com a energia de quem propõe uma agenda nova. É preciso grandeza para dar rumo ao país. São meus votos.

Assim como são meus os votos para as oposições oferecerem porto seguro, de paz e de prosperidade, aos que desejam novos caminhos para o país. Eles serão em número crescente à medida que a inércia governamental prevaleça. A alternância no poder não é apenas uma condição formal da democracia, mas uma necessidade para que as sociedades não se tornem apáticas com a repetição de práticas. Coragem, unidade e competência são meus desejos para as oposições. Feliz Ano-Novo.

2012, me surpreenda - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 31/12/11

As melhores coisas do ano sempre foram aquelas que eu não previ

Ano-Novo é uma convenção. Os dias correm em sequência. De 31 de dezembro para 1º de janeiro ocorrerá apenas mais uma sucessão de 24 horas em que nada mudará, tudo seguirá do mesmo jeito. Pois é, sei disso, mas é um ponto de vista sem nenhuma alegria. Sou das que compram o pacote de Ano-Novo com tudo que ele traz em seu imaginário: balanço de vida, reafirmação de votos, desejos manifestos e esperança de uma etapa promissora pela frente.

Faço lista de projetos e tudo mais. Só que, quando chega o fim do ano e avalio o que consegui cumprir, descubro que o inesperado superou de longe o esperado. As melhores coisas do ano sempre foram aquelas que eu não previ. Então tomei uma decisão: nessa virada, não vou planejar coisa alguma e aguardar as resoluções que 2012 tomará para mim, à minha revelia.

Mas poderia dar algumas sugestões?

2012, anote aí: que as coisas mudem, mas não alterem meu estado de espírito. Não deixe que eu me torne uma pessoa ranzinza, mal-humorada, desconfiada, sem tolerância para as diferenças. Aconteça o que acontecer, que eu me mantenha aberta, leve e consciente de que tudo é provisório.

Não quero mais. Quero menos. Menos preocupações, menos culpa, menos racionalismo. Pode cortar os extras. Mantenha apenas o estritamente necessário para me manter atenta.

Está anotando?

Espero que você esteja com ótimos planos para sua amiga aqui. Lançarei livro novo? Permita que eu seja abusada: dois. Sendo que nenhuma coletânea de crônicas, nem romance. Me ajude a variar.

Que lugares conhecerei que ainda não conheço? Que pessoas entrarão na minha vida que, quando cruzo com elas na rua, ainda não as identifico? Que boas notícias ouvirei das minhas filhas? Quantos shows terei o prazer de assistir? Estou curiosa para saber o que você está aprontando para incrementar os meses que virão.

Prometo que estarei preparada para receber o abraço afetuoso de quem antes me esnobava, para a frustração por tudo o que for cancelado, para voltar atrás nas minhas teimosias, para me dedicar a algo que nunca fiz antes.

Estarei disposta a tirar de letra os espíritos de porco e assumir a responsabilidade pelas asneiras que eu mesma cometer. E estarei pronta também para uma grande surpresa, ou até duas. Três, meu coração não aguenta.

Se a dor me alcançar, que me encontre com energia e sabedoria para enfrentá-la. Que eu não me torne dura diante dos horrores, nem sentimentaloide diante das emoções. 2012, os acontecimentos são da sua alçada. Da minha, cabe recepcioná-los com categoria.

Quais são seus planos para mim, afinal? Talvez nem todos sejam do meu agrado, portanto, que eu não tenha constrangimento em dizer “não, obrigada”, caso seja preciso. Mas que eu me sinta mais predisposta para o sim.

Se estamos de acordo, pode vir.

“Triângulo amoroso” poderia ser um filme melhor - PAULO MOREIRA LEITE - REVISTA ÉPOCA

REVISTA ÉPOCA

Acabo de assistir a “Triângulo amoroso,” do diretor alemão Tom Tykwer. É um bom bom, mas poderia ser melhor.

Explico. O filme tem uma história ousada, com vários pontos de referência em relação a sociedade atual. Retrata a vida contemporânea como um universo de grandes possibilidades, opções e dúvidas, seja no campo da ciência, da morte e da doença — e também do amor e do sexo. Os atores são bons, a música também. Tykwer incorpora vários elementos do mundo de hoje para narrar sua história. Em muitos momentos, consegue surpreender. A primeira metade do filme chega a ser empolgante.

Triangulo amoroso tem alguma coisa a ver com “Teorema,” o clássico de Pier Paolo Pasolini, onde um personagem angelical seduzia uma família inteira: pai, mãe, filho, filha e a empregada.

Um dos marcos do cinema de 1968, ano em que foi realizado, Teorema é um filme onde a estrutura de uma tipica família da burguesia italiana se altera na medida em que cada um de seus membros vai para cama com o personagem encarnado por Terence Stamp.
A historia de Teorema tem uma relação clara com a ideia que se fazia sobre a evolução dos costumes que ocorria na época: a liberação dos comportamentos sexuais tem um potencial imenso de mudança na sociedade. Pensadores que eram alvo de muita leitura e discussão nos anos 60, como Marcuse e Reich, parecem ter funcionado como co-autores intelectuais do roteiro de Pasolini.
Assim, o pai de família, que é um grande empresário, distribui sua fábrica para os trabalhadores depois de seu encontro com o personagem de Terence Stamp. O filho muda de horizonte na vida e vai se dedicar à a arte. A empregada deixa o trabalho doméstico e volta para sua cidade natal. Assim por diante. A mensagem (vamos falar assim) é clara e associa a liberação sexual com a liberação de outras amarras do conjunto da sociedade.

E aqui eu vejo um problema em “Triangulo Amoroso.” O filme começa com um horizonte de quem vai contar uma história de tom épico, ampla e ambiciosa. Há um certo distanciamento. Os diálogos envolvem temas presentes no debate contemporâneo, como ética, doença, morte. Os personagens fazem suas opções sexuais e o espectador sabe que não se trata de uma comédia romântica onde a questão é saber com quem vai dormir com quem de qual orientação sexual esta noite. Há um contexto maior. Não há simples descrição de eventos. Há uma narrativa.

Na medida em que o filme avança, contudo, a história se banaliza e o debate retrocede. Aquilo que seria uma discussão sobre liberdade e relações afetivas no mundo contemporâneo — com um horizonte muito diversos daquele retratado por Pasolini –, transforma-se num enredo de encontros e desencontros, com sustos e surpresas que pouco a pouco não assustam nem surpreendem. A impressão é que Tom Tykwer fez um filme e uma linguagem, no início, e terminou outro filme, com outra linguagem, no final.

Os porquinhos vão à praia - RUTH DE AQUINO - REVISTA ÉPOCA


REVISTA ÉPOCA


As cestas de lixo nunca serão suficientes para os porquinhos. Porque o que conta é educação e cultura

RUTH DE AQUINO  é colunista de ÉPOCA raquino@edglobo.com.br (Foto: ÉPOCA)
Era lixo só. No domingo de Natal, ninguém se atrevia a ir à praia em Ipanema e Leblon, os bairros da zelite carioca. É o metro quadrado mais caro do Rio de Janeiro, mas o que sobra em dinheiro falta em educação. Todo mundo culpou a Comlurb, a companhia municipal de limpeza. Que direito tem a prefeitura de expor nossa falta de respeito com o espaço público?

É verdade que houve uma falha operacional. Os garis do sábado à noite teriam de dar mais duro para compensar a redução da equipe da Comlurb no domingo. A praia mais sofisticada da cidade, que vai do canto do Arpoador até o fim do Leblon, amanheceu com 25 toneladas de lixo espalhadas, um espetáculo nojento. Cocos são o maior detrito: 20 mil por dia. Mas tem muita embalagem de biscoito e sorvete. As criancinhas imitam os pais que deixam na areia latas de cerveja, copos de mate, garrafinhas de água, espetos de queijo coalho, canudos de plástico. É o porco pai, a porca mãe e a prole de porquinhos.
Adorei o atraso da Comlurb por seu papel didático. Quem andou no calçadão dominical e olhou aquela imundície pode ter pensado, caso tenha consciência: e se cada um cuidasse de seu próprio lixo como pessoas civilizadas? O Rio está cheio de farofeiro. De fora e de dentro. De todas as classes sociais. Gente que ainda não aprendeu que pode carregar seu próprio saquinho de lixo na praia. A areia que sujamos hoje será ocupada amanhã por nós mesmos, nossas crianças ou os bebês dos outros. Falo do Rio, mas o alerta serve para o Brasil inteiro neste verão. Temos um litoral paradisíaco. Por que maltratar as praias?
Na Cidade Maravilhosa, o terceiro maior orçamento da prefeitura é o da Comlurb. Só perde para Educação e Saúde. Por ano, a prefeitura gasta R$ 1 bilhão coletando lixo dos prédios e das ruas. “Para recolher a lambança que as pessoas fazem nas ruas, parques, praias, são gastos R$ 550 milhões”, me disse o prefeito Eduardo Paes. “Daria para construir 100 escolas num ano, ou 150 creches, ou 200 clínicas da família.”

No ano passado, Paes criou o “lixômetro”, uma medição do lixo público nos bairros. Quem reduzisse mais ao longo do ano ganharia benfeitorias. O campeão foi a Cidade de Deus, comunidade carente pacificada. Menos lixo no espaço público significa economia para o contribuinte e trabalho menos penoso para os garis. A multa no Rio, hoje, para quem joga lixo na rua é de R$ 146, mas jamais alguém foi multado. Os guardas municipais raramente abordam os sujismundos e preferem tentar educar, explicar que não é legal. 
Os porquinhos adoram um argumento: não haveria cestas de lixo suficientes. Na orla, as 1.400 caçambas não dariam para o lixo do verão. A partir de fevereiro, as caçambas dobrarão de volume, de 120 litros para 240 litros. E nunca serão suficientes. Porque o que conta é educação e cultura. Ou você se sente incapaz de jogar qualquer coisa no chão e anda com o papel melado de bala até encontrar uma lixeira, ou você joga mesmo, sem culpa nem perdão. O outro argumento é igual ao dos políticos corruptos: todo mundo rouba, por que não eu? Pois é, todo mundo suja, a areia já está coalhada de palitinhos, plásticos e cocos, que diferença eu vou fazer? Toda a diferença do mundo. O valor de cada um ninguém tira.
Em alta temporada, 200 garis recolhem, de 56 quilômetros de praias no Rio, 70 toneladas de lixo aos sábados e 120 toneladas de lixo aos domingos. A praia com mais lixo é a da Barra da Tijuca. Em seguida, Copacabana. Tenham santa paciência. Quando vejo aquela família que leva da praia suas barracas, cadeirinhas e bolsas, mas deixa na areia um rastro de lixo, dá vontade de perguntar: na sua casa também é assim?
A tímida campanha do “Rio que eu amo eu cuido” mostra que muito mais conscientização será necessária. A China produziu um gigantesco rolo compressor antes das Olimpíadas: em outdoors nas ruas, programas de rádio e televisão, o governo pedia à população que não cuspisse e escarrasse na rua. Era uma forma de tentar mostrar ao mundo que o povo não era tão mal-educado.
Experimente responder a estas perguntas. Jogo lixo na rua? Já deixei lixo na praia? De carro, furo o sinal vermelho? Acelero no sinal amarelo para assustar o pedestre? Buzino sem parar e xingo no trânsito? Dirijo depois de beber? Deixo meu cachorro fazer cocô na rua sem recolher? Já fiz xixi publicamente? Corro de bicicleta na calçada, pondo em risco velhinhos e crianças? Abro a mala do carro estacionado para fazer ecoar meu som predileto?
Que tal ser um cidadão melhor e menos porquinho em 2012?

‘O Estado que temos quer tutelar o cidadão’ - ENTREVISTA JOSÉ DIAS TOFFOLI


O GLOBO - 31/12/11

TOFFOLI: “SE começar a ter maior participação popular no financiamento (eleitoral), vai ter cobrança maior”

Estudando se vota ou não no caso do mensalão, pela ligação com Dirceu, Toffoli leva Ficha Limpa ao plenário do STF em 2012

ENTREVISTA
José Dias Toffoli


Pouco mais de dois anos da posse no Supremo Tribunal Federal, o ministro José Antonio Dias Toffoli, que era advogado-geral da União, diz que se tornou um liberal e que o Estado deveria interferir menos na vida das pessoas. Para ele, a Justiça Eleitoral não deveria publicar na internet processos aos quais os candidatos respondem, pois o cidadão brasileiro é politizado o suficiente e não precisa de tutela. Toffoli pediu vista da ação sobre a Lei da Ficha Limpa e levará o caso ao plenário ano que vem. Está decidindo se participará do julgamento do mensalão, previsto para 2012. Pode se declarar impedido, pois, na época do escândalo, era subordinado ao então ministrochefe da Casa Civil, José Dirceu, réu no processo.

Carolina Brígido



O GLOBO: Dependendo da decisão do STF, a Lei da Ficha Limpa pode ser aplicada nas eleições de 2010. Quando o tribunal vai julgar a ação?


JOSÉ ANTONIO DIAS TOFFOLI: Estou com a vista do processo e devo levar (ao plenário) no ano que vem. Já desenvolvi bastante do voto, mas sempre tem alguma coisa pra refletir. A questão do trânsito em julgado ou não é algo a ser muito refletido. Até que ponto afronta ou não a presunção de inocência? Os argumentos tanto contra quanto a favor são bastante respeitáveis.

E o artigo que torna inelegível quem renunciou a mandato antes da lei? Ainda é ponto polêmico entre ministros?

TOFFOLI: 
Sobre esse ponto específico, quando votei no ano passado, entendi que era constitucional. Depois teve o voto do ministro (Cezar) Peluso, do ministro Gilmar (Mendes), no sentido de que só as renúncias ocorridas após a eficácia da lei é que poderiam ser (consideradas para a inelegibilidade). Estou refletindo sobre esses argumentos.

A Ficha Limpa mudou a forma de votar?

TOFFOLI: 
Ah, sempre repercute, chama a atenção. Era o que tinha que ser feito: ter o eleitor bem informado para decidir. O brasileiro é mais politizado do que a gente imagina. Às vezes, as pessoas acham que o cidadão tem de ser tutelado. Nesse aspecto, sou um liberal. Independentemente de classe econômica e nível educacional, o cidadão brasileiro é muito cônscio de seus direitos.

O senhor acha que, independentemente da Lei da Ficha Limpa, o TSE deveria publicar na internet a vida pregressa dos candidatos?

TOFFOLI:
 Acho isso preocupante, porque não cabe ao Estado interferir ativamente nesse processo. O Estado é gerido por pessoas que também fazem política. Aos adversários é que incumbe ir atrás disso.

O senhor esperou pela posse da ministra Rosa Weber para retomar o julgamento?

TOFFOLI:
 Acho melhor (ela participar do julgamento). Não pedi vista por isso, mas acho melhor. Porque o tribunal, completo, julgaria isso de uma maneira definitiva.

O STF deve julgar o processo do mensalão em 2012. O senhor vai votar?

TOFFOLI:
 Não sei ainda, não decidi sobre isso.

Pode se declarar impedido?

TOFFOLI: 
Ainda não sei. É como o caso do (ex-ativista) Cesare Battisti, só decidi na hora.

Já está estudando o caso?

TOFFOLI:
 Ainda não. Tem tanto caso aqui, meu Deus do céu. Aqui, cada dia sua agonia, como dizia Luiz Eduardo Magalhães.

O senhor preside uma comissão no Senado para reformar a lei eleitoral. O que a comissão vai propor?

TOFFOLI: 
Com certeza, vai mudar o sistema de processos eleitorais. Hoje, o mesmo fato pode gerar até quatro ações que podem levar à perda do mandato: ação de investigação judicial eleitoral, representação, recurso contra expedição de diploma e ação de impugnação de mandato eletivo. Não tem sentido. Tem que ser um processo só.

E o financiamento?

TOFFOLI:
 Entendo que o financiamento privado é possível, desde que seja feito por pessoa física. As pessoas jurídicas não seriam legítimos partícipes da democracia. Quem participa da democracia é o cidadão, pelo voto. A democracia deve ser financiada por quem faz a democracia. Quem elege é o povo.

O financiamento por empresas corrompe os políticos?

TOFFOLI: 
A minha preocupação não é nem essa, de partir do pressuposto de que há uma troca de favores entre aquele que financia e o eleito. A preocupação maior é que a pessoa jurídica não vota, só o cidadão vota. A pessoa jurídica é legitimada a participar desse processo? Eu penso que não. É uma interferência que ocorre com muita força. Na medida em que alguém tem mais recursos, tem maior probabilidade de atingir mais eleitores com a propaganda. É interferência não legítima. Não sou a favor do financiamento exclusivo por parte do Estado. É fundamental manter o direito do cidadão de participar da política. E fazer política é também atuar com os seus recursos.

Considera razoável estabelecer limite para gastos?

TOFFOLI:
 O partido, ao inscrever o candidato, diz qual teto vai gastar. Quem faz o limite é o candidato. Não há teto igual para todos. A ideia é pegar o parâmetro das últimas eleições.

A campanha da presidente Dilma custou R$ 165 milhões. Não é muito dinheiro? Impedindo as doações de empresas, esse valor não tende a diminuir?

TOFFOLI: 
Provavelmente. Mas o presidente Barack Obama, nos Estados Unidos, arrecadou mais de US$ 500 milhões pela internet em pequenas doações.

Nas eleições passadas, era possível doar pela internet no Brasil, mas a quantia arrecadada foi ínfima. Por que a modalidade não pegou por aqui?

TOFFOLI:
 Envolver o cidadão no financiamento da campanha politiza, porque ele vai cobrar mais. No Brasil, é cômodo para uma candidatura pegar três mil empresas e passar o chapéu. Arrecada-se num universo de pouquíssimas pessoas jurídicas. As campanhas vão atrás das grandes empresas, que, geralmente, dão o mesmo valor para a, b, c ou d. O compromisso não é político, ideológico. Elas pensam: “Não sei quem vai ganhar, não quero ninguém com raiva de mim. Meu concorrente doou, vou doar”. Se não tiver financiamento por pessoas jurídicas, o partido vai ter que ir atrás do povo não só para pedir voto, mas também recursos. Vai envolver mais o cidadão. Se começar a ter maior participação popular no financiamento, vai ter cobrança maior. O cidadão vai falar: “Além de ter votado nesse candidato, dei R$ 500 para ele. Olha aí, ele está indo mal, vou reclamar”.

Por que existe relação mercadológica, e não ideológica, entre empresas e candidatos?

TOFFOLI: 
O Estado no Brasil é muito forte. Se alguém que está concorrendo e pode chegar a um cargo pede (dinheiro) para alguém, a pessoa fica intimidada. O cidadão, não, vai doar para quem quiser, assim como dá o voto. Os gastos se multiplicaram por quatro em 12 anos. Se não puser limite, a campanha de 2014 vai custar R$ 250 milhões. O limite com base na última eleição pode ser razoável.

Sem financiamento das empresas, diminui o caixa dois?

TOFFOLI:
 O ilícito sempre pode ter, com financiamento público ou privado. Como se combate isso? Os partidos têm que se fiscalizar, como já ocorre. O TSE foi aperfeiçoando a estrutura para acompanhar gastos. Isso fez diminuir o caixa dois. Dificilmente você acha um doador que quer “doar por fora”. As empresas que doaram para campanhas presidenciais querem zelar pelo seu nome, não querem confusão. Avançou-se muito. Hoje, o caixa dois talvez exista em prefeituras, onde órgãos de fiscalização são menos fortes.

Nesses dois anos de STF, o que mudou na sua visão?

TOFFOLI: 
O que mais mudou para mim, e talvez isso surpreenda, é que cada dia que passo aqui penso que o Estado tem que interferir menos na vida do cidadão. O Estado no Brasil é muito grande e pesado. E olha que fui advogado do Estado. É óbvio que um país com desigualdades ainda depende muito do Estado. Mas este Estado grande que temos muitas vezes quer tutelar o cidadão de maneira talvez indevida. Com o tempo, cada vez me convenço mais disso e vou me tornando um liberal. O Estado tinha que educar mais do que tutelar.

Lições da Grécia - CRISTOVAM BUARQUE


O GLOBO - 31/12/11

Este ano foi da Grécia. Mais do que Irlanda, Islândia, Espanha, Portugal ou Itália, a Grécia simbolizou a crise mundial. Mais também do que os EUA em 2008.

Na Grécia, a crise mostrou uma dimensão mais ampla: foi econômica, com forte contração do PIB; política, porque nenhum outro país teve mais greves e mobilizações nas ruas; e social, por causa da consequência do desemprego, inclusive com fome em diversos setores da sociedade.

Na Grécia é possível perceber os escombros deixados por uma economia que apresentou uma exuberância artificial, graças a uma moeda supervalorizada e ao financiamento bancário fácil, permitindo consumo privado e aumento dos gastos públicos; tudo que significa ilusão de uma riqueza provisória.

A Grécia foi, em 2011, a prova de que a riqueza fácil é também efêmera.

Mais que isso, a Grécia foi a prova do fracasso de um modelo de desenvolvimento caracterizado pelo aumento do Produto Interno Bruto, sobretudo o progresso medido pelo aumento da produção material, mesmo às custas da concentração de renda, depredação ambiental, voracidade do consumo, endividamento, irresponsabilidade bancária e governamental, moeda artificialmente forte.

Em 2011 a Grécia foi o símbolo deste modelo, mas pode ser vista também como a origem do pensamento que serviu para adotarmos e executarmos hoje esse conceito de progresso. Foi da percepção e criação da lógica, entre os gregos clássicos, que nasceu a base da ciência e da tecnologia desenvolvidas quase dois mil anos depois no Renascimento Europeu, levando à Revolução Industrial na Inglaterra e à utopia da volúpia e da voracidade das últimas décadas em todo o Globo.

Em consequência é o símbolo do fracasso do progresso que nós, dos séculos XX e XXI, transformamos em sinônimo do consumo supérfluo, do consumismo irresponsável, exigindo gastos públicos além do equilíbrio fiscal, financiamento além da responsabilidade bancária, depredação ecológica além dos limites físicos, endividamento além das possibilidades dos estados, das empresas e das famílias.

A crise da Europa não é apenas financeira, econômica, social, ecológica. Mais do que uma crise é o esgotamento de uma concepção de progresso ao mesmo tempo arrogante em relação à natureza, injusta do ponto de vista social e estúpida do ponto de vista lógico.

A saída não vai estar nas finanças públicas ou bancárias, mas em uma reorientação dos propósitos do desenvolvimento e da própria civilização.

Mas, se a Grécia é a lição do fracasso de um modelo civilizatório ali nascido, sob uma forma diferente, tanto tempo atrás, ela pode ser também uma lição para o futuro.

Ouvi de um professor universitário grego que seu salário foi reduzido em 40%. Ao perguntar-lhe como sobrevivia, respondeu: “Primeiro tirei o filho da escola privada, coloquei-o na pública e agora tento ajudar sua escola a melhorar; já não tenho como ir ao trabalho de carro, em compensação, como muitos estão na mesma situação, o trânsito flui melhor; reduziram meu salário em 40%, mas também minha carga de trabalho na mesma proporção, e estou aproveitando o tempo livre para atividades que me dão prazer e, às vezes, uma renda adicional; quase não saio para comer fora de casa, mas aprendi a gostar de cozinhar; não tenho comprado roupas novas, mas não tenho sentido falta delas; meus eletrodomésticos não serão trocados nos próximos anos, mas não estou vendo necessidade disso; sinto muita falta de viagens ao exterior, mas estou descobrindo as riquezas turísticas da Grécia, inclusive uma ao lado da minha casa que atrai turistas de todo o mundo. Neste Natal gastaremos muito menos, mas a alegria não será reduzida na mesma proporção”.

Nem todos profissionais gregos podem ter esta lucidez e estas alternativas: as camadas mais pobres não têm como reduzir o consumo, os filhos já estão na escola pública, não têm alternativas de lazer, e nem de trabalho extra que assegure renda adicional; mas, de qualquer forma, esse exemplo é um indicador de que pode vir da Grécia, ao mesmo tempo, a prova do fracasso de um modelo civilizatório e a ideia de inflexão em direção a uma nova civilização, na qual o crescimento da produção econômica deixe de ser o padrão para definir o Bem Estar e a Felicidade; na qual seja possível até mesmo um decrescimento feliz, em harmonia social e com a natureza, sem endividamento, com mais tempo livre, mais bens públicos, com austeridade criativa e gratificante.

O que não aconteceu - CELSO MING


O Estado de S.Paulo - 31/12/11



Todo final de ano é tempo de avaliar o que aconteceu - no mundo e no Brasil. Desta vez, em vez de examinar o que aconteceu, convém focar o que deveria ter acontecido e que, no entanto, não ocorreu.

No mundo, os dirigentes dos países ricos se omitiram mais do que agiram. Na área do euro, liderados pela chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e pelo presidente da França, Nicolas Sarkozy, deveriam ter encaminhado uma solução para a crise da dívida, mas não conseguiram mais do que promover uma reunião de cúpula depois da outra. Em todas, a principal decisão foi marcar nova data para a seguinte. E os problemas seguem sem remédio. Dívidas enormes dos Estados nacionais continuam insustentáveis, sem financiamento nem para a rolagem do principal nem para os novos rombos orçamentários.

Na segunda semana de dezembro, foi obtido entendimento geral de que é necessário uma unidade fiscal mínima entre os 17 integrantes do bloco, para que a dívida não cresça a cada ano mais do que 0,5% do PIB. Apesar do acordo de que uma comissão especial de Bruxelas fiscalize a execução orçamentária de cada país, não há segurança de que ele seja cumprido, por falta de capacidade de imposição de sanções para os que não fizerem o que ficou determinado (falta de enforcement).

Também não há segurança de que o fundo de resgate (Mecanismo Europeu de Estabilização) tenha condições de socorrer economias relativamente grandes (como Itália e Espanha) em caso de incapacidade de honrar pagamentos. Até agora, Alemanha e França vetaram propostas de que o Banco Central Europeu (BCE) desempenhe função de emprestador de última instância a economias da área. Isso contribuiu para que a contaminação se espraiasse. A colapso pode se aprofundar se a dívida de países importantes, como a França, for rebaixada pelas agências de classificação de risco.

Enfim, as autoridades estão paralisadas. Não têm coragem de enfrentar o altíssimo custo do desembarque do euro; nem de tomar as duras decisões que lhe dariam solidez.

Enquanto isso, nos Estados Unidos, a dívida ultrapassou os US$ 15 trilhões. Por questões menores, puramente eleitorais, não houve acordo entre os partidos políticos - republicanos, na oposição, e democratas, no governo - para que o orçamento pudesse ser reequilibrado. A crise só não é maior porque o foco das atenções está voltado para a desintegração do euro.

No Brasil, a omissão maior foi nos projetos de reforma. O setor produtivo está perdendo poder de competição para o resto do mundo porque o custo Brasil está cada vez mais proibitivo. O governo vai adiando interminavelmente as reformas política, tributária, da Previdência e das leis trabalhistas. A infraestrutura segue cara e precária. Não há plano destinado a elevar os baixos níveis de poupança (de somente 17% do PIB) que inibem o investimento. E a Justiça, lenta demais, não consegue dirimir conflitos em velocidade suficiente para garantir a eficiência do sistema produtivo.

GOSTOSA


Causalidade sem causa - HÉLIO SCWARTSMAN


FOLHA DE SP - 31/12/11
SÃO PAULO - Aproveito o último dia do ano e as indefectíveis retrospectivas de 2011 para discutir a história. Se os economistas já têm problemas para ver seus vaticínios corroborados pela realidade, a situação do historiador é ainda pior.

Além da imprevisibilidade inerente às ciências sociais, o profissional da história é vítima do viés retrospectivo -a inclinação que temos para qualificar eventos que já aconteceram como mais evidentes do que eram antes de ter ocorrido.

Em qualquer cadeia complexa de acontecimentos, na qual cada evento se desdobra com alguma incerteza, há uma assimetria fundamental entre passado e futuro. Um bom exemplo é a previsão climática. Depois do temporal, meteorologistas explicam que ele ocorreu porque a frente fria se moveu da maneira X e a massa de ar quente fez o trajeto Y.

Eles têm bem menos sucesso quando precisam dizer como as frentes vão se comportar daqui em diante.
A diferença está no fato de que, no presente, as massas de ar estão sujeitas a um número quase ilimitado de interações com outros elementos, o que torna proibitivo o número de equações necessárias para determinar seu movimento. Quando olhamos para o passado, as interações que não ocorreram perdem o sentido, o que limpa o terreno e torna a sucessão de eventos óbvia.

A diferença entre o meteorologista e o historiador é que o primeiro testa suas suposições todos os dias e, com isso, produz modelos que são constantemente melhorados. Já o pobre historiador lida com eventos mais abertos e raramente testáveis.

Nossos cérebros, porém, não se acanham e recorrem a fabulações do senso comum para gerar uma ilusão de causalidade onde não há nenhuma. Quando damos uma explicação histórica, estamos ignorando uma enormidade de possibilidades para caprichosamente destacar um fator. É um prato cheio para nossos pendores ideológicos atacarem.

Qual será o tamanho da crise? - ROMEU CHAP CHAP


O Estado de S.Paulo - 31/12/11


Vivemos mais um momento de turbulência internacional. Muito além dos bancos, o que agora está em jogo é a União Europeia. O bom senso obviamente deverá prevalecer. Países são pessoas, e pessoas precisam ter condições de viver. Egos e fronteiras não estão acima disso. É claro que o Brasil não está imune. Mas não podemos sofrer por antecipação, ignorando nossas reais condições de desempenho econômico. Assim, há que colocar freio a alguns exageros, a um pânico fora de hora que em nada contribui para fortalecer o País e lhe garantir condições de superar mais essa crise.

O governo federal se mostra confiante. Como declarou recentemente o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda tem bala na agulha. E deve ter mesmo, pois, em termos de fundamentos, estamos bem resguardados. Basta lembrar como enfrentamos a crise de 2008.

No que se refere ao setor imobiliário, a munição é consistente, permitindo que a construção se mantenha na posição de carro-chefe do crescimento do PIB. E isso se deve a um vetor fundamental: crédito.

Conforme projeções, e considerados todos os tipos de financiamento existentes, os potenciais compradores de imóveis terão à disposição, em 2012, cerca de R$ 130 bilhões, montante mais de 20% superior ao aplicado em 2011.

Segundo estimativas da Câmara Brasileira da Construção Civil (Cbic) e da Caixa Econômica Federal - que responde por 75% das operações de crédito imobiliário em âmbito nacional -, esses recursos são suficientes para financiar mais de 1,5 milhão de unidades. Aliás, esse é o volume anual de moradias que o País precisa produzir, e durante os próximos 15 anos, para eliminar o atual déficit de habitações e atender ao natural crescimento da demanda.

Quanto à elevação dos preços dos imóveis, a tendência é de estabilização. A alta recente foi uma espécie de recuperação, retornando aos níveis dos anos 90. Agora, o fator determinante é o valor dos terrenos, que, cada vez mais escassos em cidades como São Paulo - até pela legislação do uso e ocupação do solo mais restritiva -, continua sendo o viés imponderável. E a opção das empresas, de construir em cidades vizinhas, só faz prejudicar problemas como o da mobilidade, uma vez que as pessoas continuam trabalhando na capital paulista.

De maneira geral, o cenário brasileiro, marcado por um nível baixíssimo de desemprego, favorece o mercado imobiliário. Com renda, a população busca realizar o sonho da casa própria e faz qualquer sacrifício para preservá-la, fato comprovado pelos atuais índices de inadimplência no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo: apenas 1,4%.

E não é possível pensar que o ambiente seja promissor apenas para as atividades imobiliárias. Certamente, outros segmentos produtivos também são beneficiados pelo consistente mercado consumidor doméstico, bem como pelas medidas anticíclicas que o governo adota para combater os riscos de desaceleração econômica, como redução dos juros e desoneração de impostos. Assim, fica a sensação de que vivemos desnecessária paranoia endêmica. Baixa o espírito da boiada e todos saem dizendo que o mundo vai acabar. Dizem tanto que terminam por precipitar o que nem sequer se anunciou de forma concreta.

Não devemos ingenuamente achar que tudo não passa de uma marolinha. Mas não podemos ser irresponsáveis em admitir um tsunami, parar de produzir e consumir, como se estivéssemos no final dos tempos. A situação mundial é complexa. Não cabe fazer pouco dela. Mas qual será o tamanho da crise para o Brasil? Aquele que decidirmos dar a ela.

Racionalmente, o Brasil precisa cuidar mais de si, até para poder ajudar aqueles países que se encontram em maior dificuldade. Tudo é questão de equilíbrio. Já tivemos os olhos maiores que a barriga. Houve quem encheu muito o prato, não deu conta de comer tudo e sentiu baque além do necessário quando o céu deixou de ser de brigadeiro. Porém, olhos medrosos e apertados acabam por deixar sobrar prato na comida.

Do outro lado do convés - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 31/12/11
RIO DE JANEIRO - Foi na temporada dos saveiros -1979, 1980, 1981-, em que, todo fim de ano, um grupo de cariocas se encontrava em Angra e, de lá, tomava um barco para passar juntos o Réveillon no mar.

No dia seguinte, o primeiro do ano, eram um prazer as horas a bordo, com o sol, a vela arriada e o barco devagar, quase parando. Mas, embora a prosa na expedição estivesse a cargo de Lygia e Fernando, Guguta e Darwin, Elba e João Luiz, Vilma e Ziraldo, Elice e Sérgio, Paulinha e Jaques, Ana e Callado e outros, a canseira e o marasmo podiam chegar e se impor.

Cada qual, então, se virava para cochilar ou ler. Certa vez, aboletei-me num canto com um livro, "Jeeves and the Feudal Spirit", em que, na Londres de 1910, o mordomo Jeeves livra seu patrão, o estroina Bertie Wooster, de mais uma trapalhada, num dos 20 romances e livros de contos que P. G. Wodehouse (1881-1975) dedicou à dupla.

Apesar de hipnotizado por P. G., percebi que, do outro lado do convés, o escritor Antonio Callado me observava. Por acaso, Callado era dos poucos ali que eu não conhecia bem. Nunca trabalhara com ele e nossa relação limitava-se a olás de passagem. Claro que, como todo mundo, eu o admirava, por sua firmeza e coragem diante da ditadura, ainda vigente.

À distância, eu sentia o olhar de Callado, severo. Aquilo me martirizou. Ali estava eu, atracado à literatura mais deliciosa e alienada do mundo -as histórias de Bertie e Jeeves-, diante de um intelectual que os militares tanto temiam e perseguiam. Puxa, o que ele ia pensar de mim? Por que eu não trouxe livros de um autor mais sério para o navio?

Por fim, Callado não se conteve. Vi quando se aproximou. Preparei-me. Mas não esperava pela pergunta: "Ruy, quando terminar, você me empresta esse livro? É o único Jeeves que me falta ler!".

GOSTOSA


Obesos deixam de ser tratados como animais - JORGE BASTOS MORENO - Nhenhenhém

O GLOBO - 31/12/11


Informe enviado por e-mail do secretário de Saúde ao governador do Rio:
Antes, nossos pacientes obesos somente tinham como local para fazer seus exames radiológicos o Jockey Club, junto com os cavalos. Ou faziam de favor, dois a três exames por ano, no Quinta D’Or. E somente para paciente até 150 kg.
Agora já podemos realizar exames em pacientes com até 320 kg. Não conheço nenhum privado com esta capacidade. E o tomógrafo é de 64 canais, capaz de realizar exames cardiológicos de coronária, igual ao do Rio Imagem!
Isto sem falar que saímos de 15 cirurgias para obesidade por ano (Fundão e Hosp. Ipanema juntos) para 200 cirurgias (até outubro deste ano). Seu projeto para tratamento da obesidade está transformando a vida das pessoas. Pessoas que somente tinham a solidão de um quarto ou até mesmo de um calabouço (onde alguns vivem até hoje) retornam à sociedade. Esse projeto somente é possível pelo comprometimento de pessoas excepcionais, como o Cid Pitombo e o diretor do hospital, o João Paulo. Este último vem transformando o Carlos Chagas. Saiu do Pedro II e aceitou o desafio de assumir um hospital “falido” como o Carlos Chagas, que vem se transformando num hospital para atender a alta complexidade.

Universal no poder!
Alaôr de Divinópolis, o bruxo que previu, com 24 horas de antecedência, as derrotas de Serra nas eleições presidenciais de 2002 e 2010, volta a atacar.
Sua bola de cristal vê a Dilma entregando um ministério, provavelmente o das Cidades, para o senador Marcelo Crivella botar quem ele quiser.

Melhor aguardar
Alaôr também viu o Ciro Gomes recebendo um ministério, mas pede para eu não divulgar porque a Dilma é imprevisível.

Cazaquistão
Perguntei se o meu amigo Borat, ministro da Pesca, também conhecido por Luiz Sérgio, estava firme e forte no cargo, e o bruxo respondeu que não sabia: o ministro está fora da área de serviço.
— Não pega? — perguntei. — Não faz nada! — respondeu o bruxo mineiro.

Inesquecível
Negromonte é outro ministro que acha que a Dilma se esqueceu dele. E dá graças a Deus por isso.
Sua agenda de trabalho, inclusive, já está preenchida até dezembro de 2012.

Acaboooouuu!!!!!
As relações entre o ministro Fernando Pimentel e o senador Aécio Neves já estiveram muito ruins.
Chegaram, em determinado momento, a ficar péssimas.
Hoje, praticamente, não existem.

Atitude
O preconceito contra o obeso é muito maior do que contra os negros e homossexuais.
A obesidade é mais grave que a fome.
São dados oficiais.
Por isso, merece aplausos a inauguração do tomógrafo do hospital Carlos Chagas, no Rio. Devolve a condição humana aos obesos.

Mico do Ano
O governador Eduardo Campos percorreu o país em campanha cívica!
Para botar a mãe no TCU.

Preguiçoso do Ano
O que fez o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, em 2011?
“Não sei”, diria o Ancelmo.

Fofoqueiro do Ano
Gilberto Carvalho.

Ministra do Ano
Gleisi Hoffmann — trabalho em prol dos deficientes e a reorganização administrativa do governo. E é linda!

A Revelação do Ano
A ministra Helena Chagas reatou relações do Planalto com os jornalistas, rompidas há nove anos. E tirou o debate da regulamentação da mídia de dentro do Palácio, num “Afaste da Dilma esse cálice”. Dilma fala e recebe a gente.

A Mulher do Ano
Maria Ribeiro — uma das mais belas atrizes brasileiras, dos sucessos dos dois “Tropa de Elite” aos da série “Oscar Freire”, dirigiu o elogiadíssimo documentário sobre Domingos de Oliveira, além de ser uma grande cronista.

O Político do Ano
Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo e criador do PSD, o homem que está provocando uma grande agitação na correlação de forças dos partidos brasileiros.

Os Livros do Ano
Os jornalistas mais uma vez brilharam na literatura: Miriam Leitão, Wilson Figueiredo, Mario Sabino e Ricardo Amaral que o digam.
Foram os presentes mais chiques de fim de ano.
E, certamente, também, serão os mais charmosos presentes do início de 2012.

Aprender ou passar no vestibular? - JOCA LEVY

O ESTADÃO - 31/12/11


Discute-se muito a baixa qualidade do ensino público, com efeitos sobre as classes de menor poder aquisitivo. Deveriam também causar aflição sérios tropeços das escolas privadas, inclusive as que obtêm as melhores notas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Esses problemas, que passam despercebidos pela maioria dos pais e educadores, afetam jovens das classes mais altas, supostos candidatos mais prováveis à elite intelectual do País.

Os pais precisam desde cedo decidir se o plano para seu filho é aprender ou passar no vestibular. É possível aprender e passar no vestibular, mas é limitada e frustrante a trajetória intelectual da criança cujos pais estabelecem como meta o vestibular, não o aprendizado.

As escolas chamadas "convencionais" parecem ter por objetivo boas notas no Enem e no vestibular, não propriamente o aprendizado. Há crescente pressão dos pais nesse sentido. Não percebem que educação voltada para a competição e o vestibular é,acima de tudo, desinteressante para a criança. E sem interesse não há aprendizado.

A educação voltada para o vestibular busca prioritariamente habilitar o profissional a competir dentro de padrões estabelecidos por uma conveniência de massificação. Talentosos e ignorantes são, juntos, conduzidos com o gado para uma mesma faixa de referência na vizinhança da média.

Os mais inteligentes (não necessariamente os mais bem treinados para tirar notas) não têm oportunidade de seguir seus processos próprios de exploração, retenção e desenvolvimento intelectual. São forçados a seguir método desenhado com requisitos mínimos para a compreensão dos medíocres.

A ideia de permitir que desponte uma elite intelectual sofre resistência, silenciosamente. Por séculos de tradição aristocrática, a elite, ainda que tivesse maior oportunidade de desenvolvimento intelectual, dominou pelos sobrenomes, não por méritos pessoais. A democracia trouxe o desprezo pela elite e a noção irrefletida de que todos devem ser iguais. Grande erro! Todos não devem ser iguais, mas devem, sim, ter iguais oportunidades de desenvolvimento de suas habilidades. E os mais talentosos devem ser estimulados e prestigiados.

Cada pai deve empenhar-se em livrar os filhos da cultura da comparação, que os aprisiona na mediocridade, e habilitá-los a usufruir plenamente seus talentos, tendo por referência apenas a excelência, não a concorrência.

O jovem deve, sim, ter disciplina, mas não aprender por disciplina. Equívoco corriqueiro é estabelecer que aprender e tirar boas notas são obrigações da criança. Só se aprende por interesse. Para uma criança, as obrigações são chatas e desinteressantes. Toda criança sadia, minimamente bem educada e com ambiente emocional estimulante é capaz de aprender. Basta que o aprendizado seja interessante. Se lhe for apresentado como obrigação, contudo, o melhor que uma criança disciplinada fará é decorar, o que ajuda a tirar notas e passar no vestibular, mas não a integrar o conhecimento ao processo mental, ou seja, aprender.

Notas não avaliam a criança, mas a capacidade de ensinar e de disciplinar das escolas e dos pais, que, portanto, exigem boas notas em benefício de sua própria imagem na sociedade, não em benefício da criança. Boas notas não preparam a criança para uma vida de realizações.

O típico adulto moderno dá prioridade ao cultivo de seu próprio sucesso, numa rotina, no mais das vezes, intelectualmente improdutiva. Mais fácil é não se envolver na formação intelectual dos filhos, não ler para eles sobre a História do homem, não explicar porque a Terra é redonda, o que são as estrelas, a origem da vida, a evolução e as diferenças das espécies, não ensinar a brincar com números (no lugar de videogames, que mantêm a criança abobalhada), não despertar logo cedo o interesse pelo conhecimento, a curiosidade pelas coisas da natureza.

Mais conveniente é terceirizar por completo a educação, entregar as crianças à escola e esperar que voltem com um diploma, que não diz que o filho se tornou uma pessoa instruída, mas apenas que os pais cumpriram o seu dever segundo a convenção dos nossos tempos. Para o filho pouco serve aquele canudo, senão, talvez, para arrumar um emprego. Para o pai o diplomado filho é uma sentença absolutória da negligência intelectual a que abandonou a cria.

Formam-se legiões de burros, rasos, ignorantes, imaturos com diplomas (muitos com boas notas!). Pessoas destituídas da oportunidade de desenvolver seus talentos individuais. Enlatadas, padronizadas, como ditizadas. Dirão os pais que bem preparadas para competir no mundo moderno, mas, na verdade, aleijadas de suas competências subjetivas e jogadas para competir na mediocridade a que foram rebaixadas.

Não é à toa que no curso da educação moderna pessoas brilhantes - de Winston Churchill, Albert Einstein e Warren Buffett a Bill Gates e Steve Jobs - em algum momentos e desgarraram da educação convencional ou a deixaram ter influência secundária em sua formação intelectual. São pessoas que se recusaram a entrar na competição e se desenvolveram muito acima dela.


"Aprendizagem que privilegia apenas o intelecto dificilmente atinge o ser humano completo. O melhor exemplo disso são as informações formatadas exclusivamente para o vestibular. É um rio que passa na vida do vestibulando e que deságua no oceano do esquecimento. Quando a gente aprende algo e dele não se esquece nunca mais, é porque o coração e a alma também foram tocados. Quando o conhecimento é elaborado no intelecto, passa pelo sentimento e determina uma vontade, aí, sim, ele não desgruda mais da gente."
Helena Trevisan
 

JOCA LEVY: Advogado , é pai de Três adolecentes

Keynes estava certo - PAUL KRUGMAN


FOLHA DE SP - 31/12/11
O teste tem vindo de países europeus como Grécia e Irlanda, que tiveram que impor austeridade fiscal

"O momento de expansão, e não de retração, é a hora certa para o Tesouro Nacional ser austero."

Foi o que disse John Maynard Keynes em 1937, quando o BC americano estava a ponto de provar que Keynes estava certo ao tentar equilibrar o orçamento cedo demais, fazendo a economia americana entrar em profunda recessão.

Um governo que adota política de cortes numa economia em depressão faz a queda ser pior; a austeridade deve esperar até que a recuperação esteja bem encaminhada.

Infelizmente, no fim de 2010 e início de 2011, políticos e governantes em muitas partes do ocidente acreditavam que sabiam mais, e que nós deveríamos focar em deficits e não em empregos, ainda que nossas economias tivessem acabado de se recuperar da depressão pós-crise financeira. Agindo de forma anti-keynesiana, acabaram provando que Keynes estava certo mais uma vez.

Ao declarar que a economia keynesiana foi vingada, estou indo contra o saber convencional. Especialmente em Washington, a incapacidade do pacote de estímulos de Obama de gerar grande número de empregos é geralmente vista como prova de que gastos governamentais não conseguem produzir empregos.

Mas aqueles de nós que fizeram as contas corretamente perceberam desde o início que a Lei de Recuperação e Reinvestimento de 2009 era restrita demais, dada a profundidade da queda. E também previmos o consequente retrocesso político.

Portanto, o verdadeiro teste para a economia keynesiana não veio dos tépidos esforços do governo americano para impulsionar a economia, que foram largamente contrabalançados por cortes em níveis estaduais e municipais.

O teste tem vindo de países europeus como a Grécia e a Irlanda, que tiveram que impor severa austeridade fiscal como condição para receber empréstimos de emergência -e têm sofrido perdas econômicas do mesmo nível da Grande Depressão. Isso não deveria acontecer, segundo a ideologia que domina grande parte do nosso discurso político.

Em março passado, a parte republicana do Comitê Econômico Conjunto do Congresso divulgou relatório que ridicularizava as preocupações de que cortes em um momento de queda poderiam piorar a situação, argumentando que os cortes aumentariam a confiança de consumidores e de mercados, e isso sim poderia levar a um crescimento mais rápido, não mais lento.

A insistência em cortes imediatos continuou dominando o cenário político, com efeitos maléficos sobre a economia. É verdade que não houve novas grandes medidas de austeridade do governo federal, mas vimos muita austeridade "passiva" à medida que o pacote de estímulos de Obama saiu de cena e governos estaduais e municipais sem liquidez continuaram fazendo cortes.

Você poderia argumentar que Irlanda e Grécia não tinham escolha quanto à imposição de austeridade a não ser fazê-lo ou declararem-se inadimplentes e deixar o euro.

Mas outra lição de 2011 foi que os EUA tinham e têm uma escolha; Washington pode estar obcecado com a questão do deficit, mas os mercados financeiros estão, sim, sinalizando que nós deveríamos tomar mais empréstimos.

Nada a perder - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 31/12/11

O lançamento do nome do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) para presidente da República é um balão de ensaio útil para o partido. Se crescer até 2014, ótimo, senão, torna o partido mais forte para negociar apoio a outro candidato. A estratégia, no entanto, não é consenso no DEM. Há quem veja constrangimento com os tucanos, principalmente em Minas. O partido faz o mesmo em São Paulo, com a pré-candidatura de Rodrigo Garcia.

Tudo ou nada

Esquálido depois do ataque especulativo do PSD, o DEM vai apostar tudo nas eleições do ano que vem. O partido tem nomes competitivos para disputar a eleição em Aracaju (SE), Campo Grande (MS), Macapá (AP), Salvador (BA), Recife (PE), Fortaleza (CE), Vila Velha (ES), Feira de Santana (BA) e Pelotas (RS). Se sobreviver às eleições municipais do próximo ano, a estratégia do partido será lançar grifes derrotadas para o Senado e para governos estaduais, como Marco Maciel (PE), Heráclito Fortes (PI) e Paulo Souto (BA), para a Câmara dos Deputados, com o intuito de puxar outros nomes e eleger uma bancada razoável.

O debate acerca da saída de Rodrigo Neves será travado no Diretório Estadual, e não no de Niterói” — Luiz Sérgio, presidente do PT-RJ, sobre a pressão para que Neves deixe a Secretaria estadual de Assistência Social antes das prévias para a prefeitura de Niterói.

ESVAZIADA. Apesar de considerarem que a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) fez uma boa gestão, a avaliação de ambientalistas é que ela não tem força política no governo. O exemplo mais forte foi a sanção, pela presidente Dilma, de lei que tira poderes do Ibama, apesar dos apelos da ministra para que fossem vetados artigos da proposta. A lei foi assinada por Dilma no momento em que Izabella estava em viagem à África.

Tête-à-tête 1
Ao avistar o presidente do PP, senador Francisco Dornelles (RJ), no coquetel no Alvorada, a presidente Dilma disparou: “Preciso falar com você”. Os dois se afastaram, para curiosidade dos demais, e conversaram por uns 15 minutos.

Tête-à-tête 2
Dornelles diz que foram “só dois minutos”. E que o assunto foi a redistribuição dos royalties do petróleo. “Ela quer encontrar uma solução e acha que, passado 2011, vai dar para negociar com mais tranquilidade”, afirmou o senador.

O fator Pimentel
A permanência do ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento) no governo divide os aliados. Um grupo apoia a presidente Dilma e afirma que ela tinha que dar um basta na queda de ministros, senão ficaria sempre a reboque da imprensa. Já outra parte se ressente e reclama de tratamento diferenciado por ele ser do PT. Pimentel é o primeiro ministro atingido por denúncias que é da cota pessoal de Dilma, não de Lula.

Militância verde
Empenhada em um movimento suprapartidário, a ex-senadora Marina Silva tem evitado falar na criação de um novo partido porque quer que a nova sigla, capitaneada por ela, surja de um movimento de base, e não de cima para baixo.

Palanques
Sem um nome forte que unifique a base aliada ao governo federal, a tendência em São Paulo é a pulverização de candidaturas no primeiro turno, para a prefeitura, apesar do esforço em contrário feito pelo expresidente Lula.

PASSANDO O CHAPÉU. O PSDB entra em 2012 com uma dívida de R$ 10 milhões referente à campanha eleitoral de 2010.

ALIMENTANDO
 sua fama de hipocondríaco, o exgovernador José Serra diz que ganhou, de Natal, uma lupa, “para ajudar a ler bulas de remédios”.

O DEPUTADO
 Tiririca (PR-SP) enviou ofício ao prefeito do Rio, Eduardo Paes, mostrando preocupação com o projeto de revitalização da Praça Onze, que reduziria o espaço para a instalação de circos.

Quando entra o terapeuta - MARCELO RUBENS PAIVA


O Estado de S.Paulo - 31/12/11


Onde você estava?, perguntou o marido.

"O que é isso, controle?"

"Curiosidade."

"Na terapia."

"Na onde?"

"Tá duvidando?"

"E desde quando você faz terapia?"

"Desde hoje", ela respondeu e começou a andar pela casa, como se não quisesse alongar a conversa.

"Que terapeuta?"

"Você não conhece."

"E como você conheceu?"

"Uma amiga indicou."

"Que amiga?"

"Você também não conhece."

Claro. O único terapeuta que ele conhecia era de cães, com quem jogava tênis no clube.

E amigas que indicam terapeutas são sempre aquelas que os maridos não conhecem. Essas intrusas que, numa conversa de banheiro, ao invés de enumerarem as novidades da indústria cosmética, sugerem terapias.

Por que têm que se meter em algo que, acreditam os maridos, pode e deve ser resolvido na intimidade do lar? Deveriam indicar um restaurante novo, um filme genial, um livro irresistível.

"Quando você começou a pensar em fazer terapia?"

"Depois das férias."

"Depois daquela viagem paradisíaca em que acampamos na praia mais limpa e deserta no raio de duzentos quilômetros, em que não choveu um dia, comemos peixes pescados na hora, não ficamos gripados, nem fomos atacados por borrachudos, bichos geográficos, águas-vivas, piranhas?!"

"Não existem piranhas no mar."

"Não mude de assunto."

Ela entrou no banheiro. Trancou. Ligou o chuveiro. Ele continuou, através da porta.

"Por quê?"

"Achei uma ideia interessante", ela disse e entrou no chuveiro.

Terapia não é para deprimidos, melancólicos, esquizofrênicos, paranoicos, insones, ansiosos, viciados, alcoólatras, dependentes químicos? Não. É também para quem acha...nteressante. E pode ser indicada por uma desconhecida num papinho em frente de um espelho de banheiro.

"Por que você não me disse antes?", perguntou assim que ela saiu enrolada numa toalha.

"Porque você sempre está ocupado, nunca repara nos meus problemas."

"Foi por isso que você foi fazer terapia?"

"É, pode ser, não tinha pensado. Será que preciso resolver isso?"

"Resolver o quê?"

"Levar isso."

"Para onde?"

"Para o meu terapeuta."

"Seu terapeuta? Conheceu o cara hoje e já considera seu?!"

Então, tudo mudou no casamento que, acreditava ele, seguia pelo caminho seguro da normalidade, dos conflitos usuais e do número de relações sexuais em acordo com as estatísticas de vida saudável das revistas femininas.

Relação nada conturbada, comparada com outras ao redor.

"Será que preciso resolver isso?" passou a ser o argumento que encerrava toda discussão ou questionamentos, até os mais simples, como por que ela preferia pizza de massa fina, filme dublado, sorvete de frutas, shoyu na salada, se vestir de preto, dormir de lado, caipirinha de saquê, carne malpassada, ler com uma lapiseira na mão, começar as revistas pelo fim e os jornais pelo caderno cultural.

Não teve jeito. Um terapeuta entrou na vida do casal. E quantas vezes ele se pegou imaginando o que conversavam, quais eram as queixas e, pior, o que ele sugeria.

Será que o desgraçado coloca minhocas na cabeça dela, sugere aventuras extraconjugais, realizações de sonhos secretos? Será que ela conta detalhes íntimos, faz comparações com outros homens? Será que arrumou um confidente, com quem ridiculariza as fraquezas inerentes em todos os maridos?

"Que linha ele segue?", perguntou um dia na fila de cinema.

"Quem, meu terapeuta?"

"Quem poderia ser?"

"Ah, sei lá..."

Sei lá? Não existem mais linhas? Seria psicanálise? Usa divã? Estão associando os sonhos à relação dela com os pais? Freudiana, junguiana, lacaniana?

"Acho que é uma linha que ele mesmo criou", foi a resposta que só piorou o tormento.

Afinal, ele confiava nas correntes mais tradiças da psicanálise, anos e anos postas em prática, pouco empíricas, mas muito pesquisadas, debatidas, cujos arquétipos praticamente viraram senso comum.

"Ah, é uma terapia alternativa?", perguntou quando se apagaram as luzes do cinema.

"Pode-se dizer que sim."

"Por quê?"

"Eu precisava resolver umas questões pessoais."

"Que questões?!"

"Coisas minhas."

"E como é? Só você fala, ele anota, ficam frente a frente, dura uma hora, analisam sonhos, você fala de mim?"

"Shhhh!", gritou o idiota da fileira de trás, já que começara o filme.

Ele passou o filme todo se perguntando que questões seriam essas e quanto ele era responsável pela novidade. Será que ela era infeliz no casamento? Será que ela tinha outro e precisava debater com um especialista? Será que ela tinha outra? Será que ela vai se apaixonar pelo terapeuta?

Decidiu, sufocado por tantas perguntas, que não deveria se meter.

Relaxa. Muita gente faz terapia. Vamos ver, de repente, ela fica mais feliz, realizada, mais bonita, mais tarada. Esperar. Ver no que vai dar. Afinal, é apenas uma terapia.

Pense no pior: ela poderia entrar para uma seita amazônica ou um grupo de teatro alternativo ou um movimento de extrema-direita ou um fã-clube de uma banda heavy metal.

Será que ela está pensando em se separar?! Claro! Mulheres fazem terapia antes do divórcio, para se certificarem!

"Gostou do filme?", ela perguntou no estacionamento.

"Não sei. E você?"

"Preciso discutir com o meu terapeuta."

"Boa. Será ético você me contar se ele gostou?"

"Não sei. Por que você não faz terapia também? Aí, terá com quem conversar."

Entraram no carro. Ela olhou pelo espelhinho, retocou a maquiagem, ajeitou os cabelos. Um novo brilho nos olhos. Uma voz macia, diferente. Está tão mais... sexy. Que merda.

Ele concluiu: ela já está apaixonada pelo cara. OK, vou fazer terapia também, pensou. Quem sabe o desgraçado não me indica uma terapeuta. Bem gostosa.

GOSTOSA


O ano intenso - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 31/12/11
Quase nada do que aconteceu em 2011 estava escrito. Foi um ano intenso e surpreendente. A crise da Europa estava dada, mas não se imaginava que fosse se agravar tanto; terremotos no Japão acontecem, mas a tragédia nuclear foi surpresa. A explosão do Norte da África e as quedas de ditadores foram a maior surpresa do ano e revelaram muito da ignorância do Ocidente.
Uma foto postada no Twitter da jornalista da CNN Kristie Lu Stout é um exemplo do inesperado acontecido em 2011. É uma foto protocolar de uma reunião recente da Liga Árabe, pouco antes das rebeliões do Norte da África. Na frente, os governantes Zine El Abidine Ben Ali, da Tunísia; Ali Abdullah Saleh, do Iêmen; Muammar Kadaffi, da Líbia; e Hosni Mubarak, do Egito. Confiram a reprodução da foto no meu blog. Abraçados, eles parecem inamovíveis, partes da paisagem daqueles países. Seguros e sólidos. Em 2011 eles foram depostos e Kaddaffi morto no redemoinho que levantou todas as areias da região.
O que a tempestade de areia revelou é que esses ditadores não eram pirâmides, plantadas lá para sempre, como os governos dos Estados Unidos e dos países do Ocidente os consideravam. Em 2003, o presidente Lula foi à Líbia e disse que Kadaffi estava conduzindo um processo de democratização. O governo americano sempre sustentou a ditadura de Mubarak. Não foram poucos os pensadores que disseram que os árabes não tinham a mesma necessidade de democracia.
O mundo aprendeu muito sobre sua própria ignorância, sobre a realidade dos países árabes, sobre a capacidade de contágio das redes sociais e do mundo conectado. É um capítulo em aberto da história e a evolução de alguns eventos é imprevisível.
Até o Japão surpreendeu em 2011. Todos esperam um terremoto no Japão, principalmente ele próprio. Todos sabem os riscos de um vazamento nuclear, principalmente o Japão. Antes do desastre na Usina de Fukushima o que todos tinham como certo é que os japoneses estavam preparados para terremotos e tinham cercado suas usinas nucleares de todas as garantias possíveis. Não tinham.
Problemas de suprimento na cadeia produtiva por causa do desastre japonês e a alta forte do preço do petróleo pelos eventos da África abateram a incipiente recuperação da economia dos Estados Unidos. Na polarização política que divide os americanos, o Congresso encenou o impensável. Por semanas o mundo viveu na dúvida sobre se o emissor da dívida considerada mais segura do mundo deixaria de honrar os títulos vencendo.
Ver a Europa sangrando em suas contas abertas confirmou que não há país inatingível por crises e que elas são parecidas. Dívidas altas, gastos excessivos abalam a confiança dos credores e minam a estabilidade dos países.
Foi assim com a América Latina nos anos 1980; foi assim na Ásia nos anos 1990; está sendo assim na Europa. Não há países intocáveis.
Aprendeu-se também em 2011 que não há fórmulas simples para crises complexas como a da Europa. Gastar mais para incentivar as economias, como aconselham alguns, só vai erodir mais a confiança dos financiadores. Cortar gastos públicos como único recurso pode aprofundar a recessão e encolher a receita. Gastar mais com resgate financeiro enfurece o contribuinte; se os bancos quebrarem, a crise se agrava; resgatar bancos e não desempregados é inaceitável; os manifestantes do "ocupe" são um movimento à procura de uma bandeira.
A Europa encontrou em 2011 os limites do seu sonho. Tudo parecia perfeito até que a crise chegou. O projeto era unir os países comercial e economicamente, criar uma zona de moeda comum com as decisões passando pelos parlamentos, reduzir o custo de endividamento dos países impulsionando o crescimento. Foi assim por bons anos. As economias menores cresceram puxadas pelas transferências que recebiam da União e o benefício dos juros baixos da moeda forte. As economias maiores tinham mais mercado.
A conta chegou em 2011. Os juros baixos não eram eternos e haviam incentivado o endividamento excessivo. Quando subiram produziram uma bola de neve: quanto maior a dívida mais rapidamente ela cresceu. Não deu certo a ideia de isolar o país mais fraco - a Grécia - e ajustar os países médios. Ao chegar à Itália a crise desembarcou no coração da Zona do Euro. A necessidade de aprovação pelos parlamentos nacionais era vista como virtude. Na crise, virou lentidão das soluções e dificuldade de governança. Quando o Reino Unido reforçou o canal que o separa do resto da Europa enfraqueceu a si mesmo e a região da moeda comum. O ano termina legando incerteza para 2012. A crise da Europa atravessará o ano conosco.
Não sei como foi na sua vida, mas na minha também foi um ano forte. De alegrias, tristezas e surpresas intensas; um ano para lembrar que não se controla o destino, que as previsões têm o defeito de serem a projeção linear do presente e poucas vezes comportam o inesperado da vida. O meu desejo para cada pessoa que me dedica seu tempo precioso lendo esta coluna é que em 2012 as tristezas sejam econômicas e nos poupem, e que as alegrias sejam superavitárias.

QUAL É, QUAL FOI - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 31/12/11
Tiririca (autor do verso acima), Bethânia, Neymar e Fátima Bernardes são alguns dos personagens que desfilaram pela coluna em 2011

Tiririca contou em primeira mão, em 11 de agosto, que já havia aprendido o que faz um deputado: "Trabalha muito e produz muito pouco".
Disse mais:

"A Câmara é uma fábrica de loucos"

POESIA VIRTUAL
Em 16 de março, a coluna revelou que Maria Bethânia tinha sido autorizada a captar R$ 1,3 milhão, por meio da Lei Rouanet, para produzir um blog de poesia. O volume de recursos para um projeto de internet acabou virando o centro de uma das maiores polêmicas do ano na área cultural. Bethânia desistiu da ideia.

DOIS E UMA
Dilma Rousseff, Lula e Fernando Henrique Cardoso deram declarações exclusivas à coluna. O petista explicou sua ausência no almoço da presidente com Barack Obama. FHC falou sobre drogas, e Dilma, sobre a meia entrada para idosos na Copa de 2014.

"Minha querida, isso é uma lei brasileira. E não pode mudar. Não é uma questão de querer ou não querer"
DILMA ROUSSEFF
3 de outubro

"Era um momento muito importante para ela [Dilma], eu não deveria, eu poderia atrapalhar"
LULA
23 de março

"Eu sou a favor da descriminalização de todas as drogas. Todas, todas (...) e deixa alguma experimentação. Eventualmente, plantação caseira [de maconha], por aí"
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
29 de maio

NÃO TE VI NA TV
A coluna anunciou com exclusividade, na Folha.com, em 30 de novembro, a bomba do ano na televisão: depois de 14 anos, Fátima Bernardes deixava a bancada do "Jornal Nacional".
Mantovani Fernandes/Jornal O Popular

E também na Folha.com, em 2 de outubro, foi antecipada a saída de Rafinha Bastos da bancada do "CQC", da TV Bandeirantes. Piada sobre Wanessa Camargo foi o estopim para o afastamento do humorista.

ABENÇOADA POR DEUS...
"Algumas pessoas teimam em dizer que tenho problema com essa época do 'BBB'. É a minha história e tenho o maior orgulho dela"
GRAZI MASSAFERA
10 de abril

... E BONITO POR NATUREZA
Enquanto alguns alardeavam que Neymar já tinha fechado contrato com o Real Madrid, o time da coluna trazia a informação correta: nada estava definido. A garantia era dada pelo presidente do Santos, Luis Alvaro Ribeiro: "Se eu não assinei, não existe contrato fechado com ninguém". E Neymar ficou no Peixe. Como Ganso. Já Anderson Silva foi o destaque das lutas de MMA.

"Eu depilo, tem que depilar. Tenho poucos pelos, mas sou um cara muito vaidoso"
PAULO HENRIQUE GANSO
5 de junho
Eduardo Knapp/Folhapress

"Tem creme para o rosto, para as mãos, isso que as mulheres usam para ficar bonitas e que os homens deveriam ter também. Meus amigos falam: 'Cara, isso não é coisa de lutador, é coisa de boiola'"
ANDERSON SILVA
27 de fevereiro

"Me arranjam tanto time quanto arranjam namoradas"
NEYMAR
22 de outubro

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY