quinta-feira, outubro 08, 2015

Essa conta é do PT - RAUL VELLOSO

O Estado de S. Paulo - 08/10

Não faz muito tempo, após o impeachment de Collor, o País vivia o day after em busca do que fazer com a hiperinflação que ainda campeava. Depois de várias tentativas fracassadas, as forças políticas batiam cabeça em busca de um novo arranjo de poder, sob o qual se alvejasse de verdade o problema da hiperinflação, trazendo novo alento à população.

Foi nesse contexto que a equipe econômica da época, temerosa de novo fracasso, teria cobrado do então ministro da Fazenda a definição de um programa fiscal de forte impacto, que faltara nas tentativas anteriores e que seria crucial para a sustentação de qualquer novo plano. Tendo saído há pouco tempo do governo, mas muito ligado ao dia a dia de Brasília, dediquei-me a imaginar qual deveria ser esse plano fiscal, nas difíceis condições daquele momento.

Formulei o diagnóstico básico do problema fiscal brasileiro que ainda hoje permanece válido. Só que, consciente das gigantescas dificuldades políticas da época, sugeri a criação de um mecanismo temporário que servisse de ponte para uma reforma fiscal definitiva, o Fundo Social de Emergência (FSE). Criado, como foi, por emenda constitucional, esse mecanismo simplesmente desamarrava, de qualquer "vinculação" específica, parcela de 20% de todas as receitas federais, permitindo o uso desses recursos para qualquer finalidade que se mostrasse imperiosa a cada momento, incluindo o pagamento de parte relevante do serviço da dívida, ou seja, o superávit primário. Dados a rigidez do gasto e o excesso de vinculações de receitas a várias finalidades, abria-se caminho para a reorientação do Orçamento na direção de um formato compatível com estabilidade econômica, enquanto se ganhava tempo para aprovar uma reforma ampla do gasto federal.

A discussão da longa história entre o sucesso inicial do Plano Real, viabilizado pelo FSE - cuja validade, a propósito, terá de ser prorrogada no fim deste ano -, e os difíceis momentos atuais, criados especialmente pelo governo atual, exigiria o espaço que esta coluna não tem. Só que nos colocaria, ao final, no dramático ponto a que chegamos, em que a hiperinflação estaria de novo à espreita.

E, para reforçar o risco de a hiperinflação voltar, há projeções de piora da situação fiscal, como as que fiz em estudo recente, com colegas, e que mostraram a perspectiva de os gastos com Previdência, assistência social e pessoal dobrarem em porcentagem do PIB até 2040.

Diante disso, começam a surgir novas ideias heterodoxas para a gestão macroeconômica, tipo nova "banda cambial". Ou, então, como ocorre com grupos que têm assessorado os últimos governos, aparecem as propostas de mais dos mesmos erros dos governos do PT, atribuindo a responsabilidade pela falta de solução à gestão da atual equipe da Fazenda, que surgiu na tentativa do segundo governo Dilma de finalmente começar a pôr ordem na casa fiscal.

Voltar a ter hiperinflação é sempre possível, mas é um absurdo que se considere essa possibilidade depois de tanto caminho percorrido na direção correta em matéria de gestão macroeconômica, como uma discussão mais detalhada da evolução recente mostraria. Em condições de partida muito melhores que as de 1993/1994, é preciso atacar de vez a rigidez do gasto, enviando ao Congresso as medidas de reforma que são hoje amplamente conhecidas. Como sua tramitação leva tempo e a economia não pode esperar, proponho ampliar o porcentual de desvinculação de receitas do FSE (hoje com o nome de DRU) de 20% para 50% e aprovar as medidas de ajuste recentemente enviadas pelo governo, a fim de restaurar a credibilidade e eliminar o risco de nova situação em que o problema fiscal "domina" tudo o mais.

Só que, em vez de fugir para a oposição, como parece ser o objetivo de muitos ligados ao principal partido no poder, é ele e seu governo que terão de pagar a conta de explicar os erros à sociedade e tentar reorganizar a base de sustentação política para aprovar as medidas requeridas para nos tirar do buraco atual.

Nem acordinho, nem acordão - CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O Globo - 08/10

No começo do primeiro governo Lula, quando começavam a decolar os acordos de comércio entre grupos de países, negociados por fora da Organização Mundial de Comércio, o então chanceler brasileiro, Celso Amorim, saiu-se com esta: o Brasil não está interessado nesses acordinhos.

Na diplomacia lulista, só o acordão interessava — um tratado global negociado há décadas no âmbito da OMC. Por isso, aliás, havia paralelamente o empenho brasileiro em conseguir o posto de diretor-geral da organização, uma vitória alcançada em 2013, com o diplomata Roberto Azevêdo.

Mas o posto já não tinha importância. A maior parte dos países — todos os mais importantes — havia simplesmente abandonado a OMC e concentrado todos os esforços nos tais acordinhos, que, bem vista a situação, davam não em um, mas em vários acordões.

Claro, ninguém diz que a OMC já era, nenhum governo retirou seu embaixador da sede da entidade em Genebra. Mas a organização não teve nada a ver com o Acordo de Parceria Transpacífica (TPP, em inglês), fechado nesta semana por 12 países que representam 40% do PIB mundial e movimentam quase US$ 10 trilhões/ano em exportações e importações.

Trata-se do maior e mais avançado acordo de liberalização comercial dos últimos 20 anos.
EUA e Japão lideram, a América Latina entra com México, Peru e Chile. O Brasil tem negócios com todos eles, negócios que podem ser desviados entre os parceiros TPP.

A OMC também não tem nada a ver com o outro baita acordinho em gestação, o Transatlântico, que reúne simplesmente os EUA e a União Europeia. Está meio atrasado, porque os EUA estavam mais concentrados no TPP — cuja realização, aliás, está levando pressa aos europeus. Temem perder espaço em dois dos quatro maiores mercados do mundo, Estados Unidos e Japão.

União Europeia e China completam os quatro grandes. A UE tem vários acordos bilaterais, inclusive com países agora integrantes do TPP. A China, que vinha preferindo os voos solo, possíveis pelo seu tamanho, também está negociando um acordinho — com Japão e Coreia do Sul.

Eis onde nos trouxe a diplomacia inaugurada por Lula: todos os nossos principais parceiros comerciais fecharam ou estão fechando acordos que mudam a cara e o conteúdo do comércio mundial, enquanto o Brasil declara colocar fé no acordão da OMC e no...

Mercosul! É verdade que, de uns meses para cá, membros do governo Dilma voltaram a se ocupar de um acordinho que seria importante, o acerto Mercosul/União Europeia. Mas esta negociação já tem um recorde: é a mais antiga do mundo, a que tem mais anos de conversa sem nenhuma conclusão.

Em Brasília, costuma-se colocar a culpa do atraso eterno nos europeus, que não teriam a necessária flexibilização para uma abertura comercial. Bobagem, claro. Afinal, nesse tempo, a UE fechou diversos acordos, inclusive com latino-americanos.

A verdade é que o Mercosul fez a opção bolivariana, definida por Lula como a diplomacia Sul-Sul. Tratava-se de unir os países mais pobres contra os ricos do Norte, de modo que a Turma do Sul, fortalecida política e economicamente, pudesse encarar os de cima no mano a mano. Olhar na cara, como Lula gostava de dizer.

Do ponto de vista econômico, havia, digamos, um equívoco de base: achar que juntando um país pobre, dois pobres, três pobres etc... daria um rico. Não funcionou. Se funcionasse, teria dado apenas um pobre maior. Além disso, tirante os bolivarianos, os países em desenvolvimento estavam mais interessados em entrar no mercado dos ricos, os maiores consumidores mundiais.

Os governos petistas também acreditaram que o Brics era mais que uma sigla — ou seja, que Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul formariam um sólido e unido bloco no xadrez global. Até constituíram um banco de desenvolvimento, mas do qual os outros quatro esperam apenas obter acesso aos enormes fundos chineses.

Mas a China já não é o maior parceiro comercial do Brasil? Ora, a China, com sua voracidade por comprar commodities e alimentos e vender industrializados, é a maior parceira de um monte de países.

Na verdade, assim como ficou ao largo dos grandes movimentos comerciais, o Brasil também se isolou politicamente. Até na América do Sul perdeu influência.

Fala-se pouco disso por aqui, mas a diplomacia Sul-Sul foi um dos maiores desastres da era Lula-PT. Um sintoma é o estado lastimável em que se encontra o Itamaraty, formado por quadros tão competentes como Roberto Azevêdo, e que estão por aí quase sem serviço e, de uns tempos para cá, até sem dinheiro para pagar as contas das embaixadas.

Aliás, uma marca da estratégia Sul-Sul foi abrir embaixadas pelos países da África,
especialmente, e da Ásia mais pobre. Embaixadas que, do ponto vista nacional, não servem para nada. Mas podem servir para ajudar algum lobby a favor de uma ou outra empreiteira. E assim se cai de novo na corrupção, a outra marca.


Espalhada demais - CELSO MING

O ESTADÃO - 08/10

Embora o impacto dos preços administrados tenha sido relevante e o câmbio também venha contribuindo pesadamente, a inflação continua muito espalhada

Não é a inflação bem mais alta de setembro em relação a agosto (0,54% ante 0,22%) o aspecto mais relevante a apontar nos números divulgados nesta quarta-feira pelo IBGE. É o quanto ela permanece espalhada.

Os itens campeões de alta em setembro foram as passagens aéreas (23,13%) e o botijão de gás (12,98%). Mas não foram esses disparos que mais vêm puxando a inflação. As passagens aéreas, por exemplo, apenas se ajustaram à baixa de 24,9o% em agosto. A inflação brota por toda a economia, na contramão do que acontece nos países mais avançados do mundo, onde o risco maior é de deflação.







Muita gente ainda repete, quase automaticamente, que a inflação chegou aos 9,5% no período de 12 meses terminado em setembro apenas porque enfrenta a puxada dos preços administrados (aqueles que dependem de decisão do governo) e a forte alta das cotações do dólar no câmbio interno, de 46% só em 2015.

Embora o impacto dos preços administrados tenha sido relevante (alta de 16,34%, no acumulado em 12 meses) e o câmbio também venha contribuindo pesadamente, a inflação continua muito espalhada. O índice de difusão, que mede o número de itens da cesta de consumo atingidos pelo avanço de preços, continua muito elevado, de 65,0%. E a inflação dos serviços, bem menos atingidos pela variação do câmbio, mantém-se forte: foi de 0,66% em setembro e de 8,13% em 12 meses.

Essa avaliação não é destituída de consequências práticas. Quem se apega ao impacto dos preços administrados e do câmbio argumenta que a inflação deriva preponderantemente do aumento de custos e, por isso, está menos sujeita à ação da política monetária. Daí porque o Banco Central teria de derrubar os juros.

Esse alto nível de difusão mostra que, apesar da recessão e da quebra de renda do consumidor, ainda há uma inflação provocada mais por aumento da demanda do que pelo aumento de custos. A explicação para isso está nas ainda excessivas despesas do governo, as mesmas que vêm tendo como causa a desorganização das contas públicas.

A inflação alta, que tende a se elevar ainda mais nos próximos meses, traz novo desafio ao Banco Central. Obriga-o a examinar a existência da síndrome de dominância fiscal, tal como vêm denunciando alguns analistas de grande calibre. É a situação em que a desordem fiscal assume proporções tais que tiram a eficácia da política de juros. Até agora, o Banco Central tem dito o contrário: que as condições das contas públicas tendem a ser indiferentes (neutras) para a trajetória da inflação. Mais ainda, insiste em que a política de juros trabalha para produzir a convergência para níveis próximos do centro da meta de inflação (4,5%) ao fim de 2016, afirmação cuja credibilidade está em franca deterioração.

Se o Banco Central aceitar o diagnóstico de que a economia envereda para a dominância fiscal, ou de que já está nela, então será também preciso dizer o que colocar no lugar da política monetária que terá, então, perdido eficácia.

CONFIRA:

Fracasso

O jogo do contente manifestado pela diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, não mudou a natureza do fracasso da 13ª Rodada de Licitações desta quarta-feira. Apenas 37 dos 266 blocos (14%) foram arrematados; apenas R$ 121,1 milhões em bônus de assinatura foram arrecadados, o que corresponde a cerca de 12% do bônus mínimo total em oferta. Das grandes, só a Petrobrás, a Total e a Shell compareceram, mas não arremataram áreas.

Irrealismo

O desinteresse não poderia ter sido mais contundente. Se a principal causa do malogro foram as condições adversas do mercado, então as regras do jogo, fixadas no pressuposto de que o apelo do Brasil continua irresistível, foram irrealistas.

Não é tão nosso

A hora é de rever as coisas. O petróleo é nosso, mas não é tão cobiçado pelos grandes capitais quanto proclamavam os ufanistas. E, se ainda for em alguma proporção, talvez não se restabeleçam tão cedo as condições para tirá-lo do chão.

O passado, futuramente - MONICA DE BOLLE

O ESTADO DE S. PAULO - 08/10

O Tempo não Para, música de 1988, ano da Constituição, época para lá de turbulenta no Brasil. Os poucos que conseguiam sobreviver sem um arranhão recorriam às inovações financeiras unicamente brasileiras para escapar da corrosão inflacionária. Planos de estabilização haviam fracassado, uns tantos mais estariam por fracassar até a travessia que terminou em 1994. Pensávamos que era para sempre. Mas como nos advertiu outro poeta brasileiro, tudo é eterno apenas enquanto dura.

Os anos 80 foram marcados por choques externos e convulsões domésticas. No cerne dos problemas econômicos que dominavam as manchetes estava a política fiscal, o descontrole das contas públicas que subjugava os demais instrumentos de política macroeconômica nos impondo a inexorável escalada inflacionária. Quem diria que passados 30 anos voltaríamos ao ponto de partida?

Dominância fiscal, jargão técnico, definição mais simples do que se poderia supor. Um país é acometido pela dominância fiscal quando o tamanho dos déficits e das dívidas é tal que a política monetária se torna completamente ineficaz para combater a inflação. A literatura acadêmica sobre o tema é extensa, a documentação corrente se restringe a alguns países europeus e, mais recentemente, ao Brasil. O Brasil hoje tem um déficit nominal – a diferença entre receitas e despesas, incluindo o pagamento dos juros sobre a dívida – de 9,2% do produto interno bruto (PIB). No início de 2014, o déficit nominal brasileiro era de pouco mais de 3% do PIB. Chegamos ao fim do ano passado com 6,7% de déficit nominal. Passados nove meses desde o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, a cifra alcançou impressionantes 9,2%, nível comparável ao enfrentado pelos EUA durante os anos negros que sobrevieram da crise de 2008.

Há mais: os juros médios que o governo paga sobre a dívida saltaram de 16,2% em meados de 2014 para inacreditáveis 29,3%. Isso significa que, para cada real de dívida que o Tesouro emite, ele paga 29 centavos de juros, quando há um ano pagava 16 centavos, quase a metade. O que nos trouxe a esta situação calamitosa foi a sequência de erros de política econômica que o governo cometeu desde o segundo mandato do ex-presidente Lula. O uso desenfreado do crédito público subsidiado, que pressiona as taxas de juros e eleva a dívida pública, a política fiscal cada vez mais frouxa para crescer a qualquer custo, as “pedaladas” e outras manobras para esconder a destruição enquanto o câmbio valorizado impedia que o sintoma da desordem se manifestasse. O sintoma da desordem é a inflação. Passamos anos vivendo com uma inflação que não refletia o descalabro macroeconômico porque o câmbio valorizado funcionou como âncora para um País que já estava à deriva. Quando a situação se inverteu, os esqueletos começaram a aparecer. E o governo recorreu ao museu de grandes novidades para segurar a inflação sem “prejudicar o crescimento”: reinstituiu controles arbitrários de preços, desonerou setores sem atentar para a fragilidade das contas públicas, acelerou o crédito público.

Diante de tamanha confusão, o câmbio deixou de ser âncora, inverteu tendência, desvalorizou-se. O Banco Central, preocupado com os efeitos do deslizamento da moeda sobre a inflação, passou a intervir nos mercados por meio das operações deswap cambial. Tais operações não afetam diretamente as reservas do País, mas custam caro. São elas as responsáveis pelas perdas de cerca de 2% do PIB sofridas pelo Banco Central, são elas, também, que explicam o salto quântico do custo da dívida.

E agora? Com déficit nominal galopante e o elevadíssimo custo da dívida pública, o País travou reencontro inevitável com sua filha pródiga, a dominância fiscal. Esgotou-se a capacidade do Banco Central de elevar os juros para combater a inflação, uma vez que, se o fizesse, agravaria o problema das contas públicas, pressionando o custo da dívida. Não é à toa que a autoridade monetária assiste de braços cruzados enquanto Roma arde em chamas, a inflação em 9,5% ao ano. Se nada for feito, se não houver tentativa de restituir alguma âncora para os preços, ainda que temporária, o futuro haverá de colidir com o passado. A economia haverá de se reindexar, a inflação de se estranhar, a inércia que passamos anos a combater retornará. O câmbio continuará a se desvalorizar rapidamente, refletindo o risco crescente do País. É o quadro de 30 anos atrás, com ponto de partida diferente – qualitativamente similar, quantitativamente menos grave, de início.

O que fazer? Há três caminhos, supondo que o problema fiscal não seja resolvido agora.

O primeiro é deixar tudo como está, aceitar que sob dominância fiscal a política monetária não pode agir, deixar que a inflação faça o trabalho sujo. Haverá de doer, sobretudo no bolso dos mais pobres.

O segundo é adotar uma meta para algum agregado monetário, espécie de “afrouxamento quantitativo reverso”, algo demasiado técnico e que dificilmente funcionaria.

O terceiro é voltar à origem do Plano Real, tirar a poeira do objeto de museu, e restaurar as bandas cambiais móveis em lugar das metas de inflação. Reconheço as objeções ao regime, ele não é sustentável, é espécie de band-aid cambial para ganhar tempo até que se encontre solução definitiva para o problema da dominância.

Há muita rejeição à ideia de abandonar temporariamente o regime de metas, afinal, ele é o melhor em condições corretas de temperatura e pressão. Contudo não resiste a todo tipo de abuso. O Banco da Inglaterra abandonou-o por prazo limitado em 2009 ante o calor da crise. Diversos países emergentes fizeram o mesmo, tacitamente, em 2011, quando as políticas de estímulo monetário mundo afora dificultaram sua gestão. O Brasil não pode prescindir do regime de metas no médio prazo. Isso, entretanto, não justifica a paralisia. Paralisia é a garantia da volta do passado ingrato. Tristes tempos.

História sem tempo - DEMÉTRIO MAGNOLI E ELAINE SENISE BARBOSA

O GLOBO - 08/10

Renato Janine, o Breve, transitou pela porta giratória do MEC em menos de seis meses. No curto reinado, antes da devolução do ministério a um “profissional da política”, teve tempo para proclamar a Base Nacional Comum (BNC), que equivale a um decreto ideológico de refundação do Brasil. Sob os auspícios do filósofo, a História foi abolida das escolas. No seu lugar, emerge uma sociologia do multiculturalismo destinada a apagar a lousa na qual gerações de professores ensinaram o processo histórico que conduziu à formação das modernas sociedades ocidentais, fundadas no princípio da igualdade dos indivíduos perante a lei.


O ensino de História, oficializado pelo Estado-nação no século 19, fixou o paradigma da narrativa histórica baseado no esquema temporal clássico: Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna, Idade Contemporânea. A crítica historiográfica contesta esse paradigma, impregnado de positivismo, evolucionismo e eurocentrismo, desde os anos 60. Mas o MEC joga fora o nenê junto com a água do banho, eliminando o que caracteriza o ensino de História: uma narrativa que se organiza na perspectiva temporal. Segundo a BNC, no 6.º ano do ensino fundamental, alunos de 11 anos são convidados a “problematizar” o “modelo quadripartite francês”, que nunca mais reaparecerá. Muito depois, no ensino médio, aquilo que se chamava História Geral surgirá sob a forma fragmentária do estudo dos “mundos ameríndios, africanos e afrobrasileiros” (1.º ano), dos “mundos americanos” (2.º ano) e dos “mundos europeus e asiáticos” (3.º ano).


O esquema temporal clássico reconhecia que a mundialização da história humana derivou da expansão dos Estados europeus, num processo ritmado pelas Navegações, pelo Iluminismo, pela Revolução Industrial e pelo imperialismo. A tradição greco-romana, o cristianismo, o comércio, as tecnologias modernas e o advento da ideia de cidadania difundiram-se nesse amplo movimento que enlaçou, diferenciadamente, o mundo inteiro. A BNC rasga todas essas páginas para inaugurar o ensino de histórias paralelas de povos separados pela muralha da “cultura”. Os educadores do multiculturalismo que a elaboraram compartilham com os neoconservadores o paradigma do “choque de civilizações”, apenas invertendo os sinais de positividade e negatividade.


A ordem do dia é esculpir um Brasil descontaminado de heranças europeias. Na cartilha da BNC, o Brasil situa-se na intersecção dos “mundos ameríndios” com os “mundos afrobrasileiros”, sendo a Conquista, exclusivamente, uma irrupção genocida contra os povos autóctones e os povos africanos deslocados para a América Portuguesa. A mesma cartilha, com a finalidade de negar legitimidade às histórias nacionais, figura os “mundos americanos” como uma coleção das diásporas africana, indígena, asiática e europeia, “entre os séculos 16 e 21”. O conceito de nação deve ser derrubado para ceder espaço a uma história de grupos étnicos e culturais encaixados, pela força, na moldura das fronteiras políticas contemporâneas.


A historiografia liberal articula-se em torno do indivíduo e da política. A historiografia marxista organiza-se ao redor das classes sociais e da economia. Nas suas diferenças, ambas valorizam a historicidade, o movimento, a sucessão de “causas” e “consequências”. Já a Sociologia do Multiculturalismo é uma revolta reacionária contra a escritura da história. Seus sujeitos históricos são grupos etnoculturais sempre iguais a si mesmos, fechados na concha da tradição, que percorrem como cometas solitários o vazio do tempo. Na História da BNC, o que existe é apenas um recorrente cotejo moralista entre algoz e vítima, perfeito para o discurso de professores convertidos em doutrinadores.


Na BNC, não há menção à Grécia Clássica: sem a Ágora, os alunos nunca ouvirão falar das raízes do conceito de cidadania. Igualmente, inexistem referências sobre o medievo das catedrais, das cidades e do comércio: sem elas, nossas escolas cancelam o ensino do “império da Igreja” e das rupturas que originaram a modernidade. O MEC também decidiu excluir da narrativa histórica o Absolutismo e o Iluminismo, cancelando o estudo da formação do Estado-nação. A Revolução Francesa, por sua vez, surge apenas de passagem, no 8.º ano, como apêndice da análise das “incorporações do pensamento liberal no Brasil”.


Sob o sólido silêncio de nossas universidades, o MEC endossa propostas pedagógicas avessas à melhor produção universitária, que geram professores “obsoletos” em seus conhecimentos e métodos. Marc Bloch disse que “a História é a ciência dos homens no tempo”. Suas obras consagradas, bem como as de tantos outros, como Peter Burke, Jules Michelet, Perry Anderson, Maurice Dobb, Eric Hobsbawm, Joseph Ki-Zerbo, Marc Ferro, Albert Hourani, Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda e José Murilo de Carvalho, não servem mais como fontes de inspiração para o nosso ensino. A partir de agora, em linha com o decreto firmado pelo ministro antes da defenestração, os professores devem curvar-se a autores obscuros, que ganharão selos de autenticidade política emitidos pelo MEC.


Não é incompetência, mas projeto político. Num parecer do Conselho Nacional de Educação de 2004, está escrito que o ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana “deve orientar para o esclarecimento de equívocos quanto a uma identidade humana universal”. Equívocos! No altar de uma educação ideológica, voltada para promover a “cultura”, a etnia e a raça, o MEC imolava o universalismo, incinerando a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A trajetória iniciada por meio daquele parecer conclui-se com uma BNC que descarta a historicidade para ocultar os princípios originários da democracia.


Doutrinação escolar? A intenção é essa, mas o verdadeiro resultado da abolição da História será um novo e brutal retrocesso nos indicadores de aprendizagem.

O filho caçula - ROGÉRIO GENTILE

FOLHA DE SP - 08/10

SÃO PAULO - Luís Cláudio Lula da Silva, 30, recebeu R$ 2,4 milhões da empresa Marcondes & Mautoni Empreendimentos.

Ninguém teria nada com isso, não fosse Luís Cláudio filho do ex-presidente da República Lula da Silva e a empresa que lhe fez o pagamento estar sendo investigada pela Polícia Federal e por uma CPI no Senado por suspeita de participar de um esquema de corrupção para redução de multas fiscais.

É evidente que suspeita não significa que houve, de fato, crime, tampouco quer dizer que o filho caçula de Lula tenha necessariamente algo com o eventual escândalo.
Mas não há como não achar esquisito a maneira como Luís Cláudio está lidando com o fato.

O filho do ex-presidente simplesmente se recusa a responder perguntas absolutamente pertinentes sobre a relação da sua empresa, a LFT Marketing Esportivo, com a investigada.

Qual foi o serviço prestado por sua empresa? Quando exatamente o serviço foi prestado? Quais profissionais atuaram no contrato? Quais foram os resultados obtidos? Que documentos foram produzidos?

Luís Cláudio alega sigilo profissional e se limita a dizer que sua empresa prestou serviços de "marketing esportivo", o que evidentemente não explica nada e dá margem para uma série de especulações.

Sobretudo num momento em que políticos importantes do PT, bem como funcionários graduados de estatais no governo do seu pai, estão presos acusados justamente de receberem propinas disfarçadas em pagamentos por serviços de consultoria.

Casos, por exemplo, do notório ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que nega a acusação, e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, réu confesso.

Luís Cláudio, que se considera um profissional de sucesso e chegou a declarar recentemente em entrevista ao UOL que "conquistou tudo o que quis na vida, nunca fracassei", não deveria temer a luz do sol.


Um manifesto fiscalista - JOSÉ SERRA

O Estado de São Paulo - 08/10

Um espectro ronda o Brasil – o espectro do descontrole fiscal. É preciso que as forças políticas se mobilizem para exorcizá-lo. Quanto piores as expectativas sobre as contas públicas e o crescimento da dívida – sancionadas e até turbinadas pelas agências internacionais de risco – mais caros se tornam os empréstimos e refinanciamentos para as empresas brasileiras, já fragilizadas pela queda vertical da demanda e pelos juros domésticos siderais.


No ocaso da era petista, as condições fiscais se deterioraram e, agora, de modo fulminante, passaram a corroer a própria capacidade de gerir a política monetária nos marcos do regime de metas. Está se formando um consenso de que a política monetária de metas de inflação se tornou relativamente impotente em um ambiente de desconfiança generalizada na capacidade do governo de elevar o superávit primário e estabilizar a relação dívida/PIB.
Essa desconfiança provocou depreciação rápida do câmbio, com impactos sobre a inflação futura. A opção de subir juros adicionalmente em uma economia em recessão é vedada, pois só aceleraria a trajetória explosiva das despesas com juros, impulsionada adicionalmente pela queda abrupta das receitas. É o cenário típico da chamada dominância fiscal.


Essa situação não pode se arrastar nem ser vista como um destino do Brasil. Sou convictamente pelo equilíbrio fiscal. Não acredito na possibilidade de desenvolvimento e bem-estar social sustentados num contexto de finanças públicas precárias. E creio nisso não apenas por razões puramente econômicas. A fragilidade fiscal reverbera em todo o governo. Um governo fiscalmente fraco tende à inoperância política por definição: é incapaz de arbitrar conflitos, de se impor contra o “rent-seeking”, de propor rumos coerentes para o desenvolvimento e, sobretudo, de fazê-los acontecer. Não importa exatamente o tamanho do Estado. Ele deve ser sempre ágil e musculoso. E ele deve ser capaz de se contrapor ao que costumo chamar de FUCE: a Frente Única Contra o Erário que se desenvolve no Congresso e nas grandes corporações de interesse que pressionam os parlamentares.

A crise atual pode induzir ao aprimoramento de nossas instituições, de modo a torná-las capazes de refrear a médio e longo prazos a sempre tentadora – e destrutiva – tendência à desorganização fiscal.

No bojo do Plano Real, durante os governos do presidente Fernando Henrique Cardoso, foram feitas algumas mudanças fundamentais na direção correta. Sem elas, a crise atual seria bem pior. No primeiro mandato foram renegociadas as dívidas de estados e municípios, condicionando-se a extensão dos prazos e a redução dos juros ao controle do endividamento futuro. Para tanto, além de proibir a emissão de títulos públicos pelos governos estaduais e municipais, o governo federal forçou a privatização dos bancos estaduais, que haviam se tornado financiadores dos déficits descontrolados dos estados. No segundo mandato aprovou-se a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Esses tipos de aperfeiçoamentos institucionais estiveram ausentes das gestões petistas, cuja marca em matéria fiscal acabou sendo a contabilidade criativa, que inclui as pedaladas.
Por essa razão e em função da crise, tenho me dedicado, na condição de relator, ao Projeto de Resolução do Senado (PRS) voltado para instituir limites globais para a dívida consolidada da União, que desencravei do arquivamento e refiz completamente.
O PRS, ao impor um limite para a dívida global auxiliará o País a adotar padrão fiscal sustentável. O superávit primário deixará de ser a única variável fiscal relevante. Esse foco no superávit primário é indispensável, mas não deve, como tem ocorrido, ofuscar os resultados nominais, que incorporam também os grandes efeitos fiscais das políticas monetária e cambial, como por exemplo as despesas com juros. Observar apenas a evolução dos resultados primários é ignorar que a cada aumento de um ponto percentual da taxa de juros – na chamada Selic – corresponde uma despesa nova de R$15 bilhões anuais e, ao mesmo tempo, uma queda de receitas, devido ao maior esfriamento da atividade econômica. Tampouco pode se desconhecer a incidência de outros fatores como despesas de R$120 bilhões produzidas pela política de swaps cambiais – operações feitas para dar seguros contra a variação do dólar.
Um problema a mais do foco exclusivo no resultado primário é o recurso a uma carga tributária crescente, que tem asfixiado o setor produtivo e tornado nossa economia menos competitiva. A sociedade dá sinais de que não aceita mais ajustes que sejam feitos pelo lado da receita sem vislumbrar a utilidade do sacrifício.
Ao limitar o volume total de dívida consolidada – e não apenas da dívida líquida – paulatinamente e sem sobressaltos, em uma trajetória de no mínimo quinze anos – o Projeto de Resolução vai impor maior disciplina e coordenação no relacionamento entre o Banco Central e o Tesouro. Limitar-se-á a liberdade excessiva de endividamento hoje existente, a qual permite ao Banco Central exercer políticas cujos custos fiscais são desproporcionais, como, por exemplo, a mencionada oferta prematura e astronômica de swaps cambiais ao setor privado, em um cenário que deveria ser de câmbio flutuante. O custo das operações compromissadas – dívida sobre tutela do Banco Central – é outro exemplo: perto de um trilhão de reais rendendo 14,25% ao ano!
Na presente conjuntura é indispensável sinalizar para a sociedade e para os mercados que o País será capaz de melhorar no longo prazo sua segurança fiscal. Sem instrumentos institucionais adequados, a manutenção do cenário de desconfiança só adiará investimentos, reforçará a inflação e aumentará a fragilidade da economia brasileira.
O PRS que dispõe sobre os limites da dívida da União representa um aperfeiçoamento importante no regime fiscal brasileiro. Mais ainda, melhorará as expectativas dos investidores, devido aos bons sinais sobre as contas públicas a médio e longo prazos. Por aprová-las, o País não tem nada a perder, exceto os grilhões da recessão, do desemprego e da inflação.

Processo em curso - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 08/10

Ao acionar três ministros de Estado num domingo, e até mesmo o Supremo Tribunal Federal ( STF), para tentar barrar o julgamento das suas contas no Tribunal de Contas da União ( TCU), o governo reverteu contra si o ambiente político, dando ao parecer de um órgão assessor do Congresso o valor de uma condenação técnica que pode levar ao processo de impeachment.

A aprovação por unanimidade do parecer do relator Augusto Nardes, com cores de desagravo aqui e ali em pronunciamentos de ministros e do próprio presidente do TCU, Aroldo Cedraz, ganhou ares de repúdio à tentativa governamental de impedir que suas contas fossem devidamente analisadas.

O advogado- geral da União, Luís Adams, além da desastrada decisão de levar para o Supremo uma questão que deveria ter sido tratada no Congresso, chegou a ser ridicularizado pelo ministro Raimundo Carreiro, que identificou entre a papelada enviada para o TCU, à guisa de defesa, recortes de jornais sobre outros temas.

E a plateia, repleta de parlamentares oposicionistas, desdenhou em bom som, quando disse que o parecer do TCU seria usado para abrir um processo de impeachment da presidente.

Foi um dia de derrotas do Palácio do Planalto diante da reafirmação do Judiciário como Poder independente, o que representa uma vitória do sistema democrático, funcionando adequadamente até o momento, apesar das pressões indevidas do Palácio do Planalto e de decisões isoladas que não chegam a indicar uma reversão das expectativas.

No front do Legislativo, a presidente Dilma está mais do que nunca nas mãos do presidente do Congresso, senador Renan Calheiros, que receberá o parecer do TCU fortalecido pelo clima político que o próprio governo reforçou nos últimos dias.

O campo de batalha se transfere agora para o Legislativo, onde o governo segue na tarefa de "contar soldadinhos", que estão em falta no momento.

Não está necessariamente relacionada à falta de quorum para manter os vetos da presidente Dilma pelo segundo dia consecutivo depois da reforma ministerial, e à possibilidade de ter número suficiente para aprovar um processo de impeachment presidencial, mas está evidenciado que, provavelmente, a presidente comprou gato por lebre ao dar ao líder Leonardo Picciani um protagonismo que ele parece não estar preparado para exercer na base aliada governista. Ou que não é reconhecido por seus pares.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, mesmo alvejado de morte pelas novas revelações sobre suas contas secretas na Suíça, parece ter ainda margem para manobrar a bancada do baixo clero da Câmara, que a presidente Dilma pensava ter cooptado ao colocar para dentro de seu novo Ministério tantos representantes seus, a começar pelo próprio Picciani.

Será uma precipitação da oposição considerar que o relatório do Tribunal de Contas da União dá base à abertura de um processo de impeachment. Mesmo com o agravante de que, num ano eleitoral, tais atitudes influem no resultado eleitoral ao não permitir que o eleitor se dê conta do que está acontecendo no país.

Embora o teor do relatório seja revelador de irregularidades e crimes cometidos pelo governo, a aprovação pelo Congresso é fundamental para que o relatório sirva de base ao processo de impeachment. A oposição trabalhará melhor se pressionar o Congresso a analisar com rapidez o parecer, em vez de se aproveitar da ânsia de vingança de Eduardo Cunha para apressar o processo de impeachment.

Pulando etapas, a oposição dará chance a que o Palácio do Planalto atue na judicialização do debate político, contestando no Supremo Tribunal Federal medidas que possam atropelar o rito natural de um processo de impeachment, que está em curso, agora baseado em documento técnico aprovado por unanimidade.

Prosperidade é maior nas economias de mercado - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 08/10

Balanço das Metas do Milênio mostra que avanços sociais, econômicos e políticos ocorreram com mais intensidade em sociedades democráticas


O balanço das Metas do Milênio, realizado durante a 70ª Assembleia Geral da ONU no fim de setembro, mostrou que o mundo melhorou nas últimas décadas, pelo menos no que se refere aos oito objetivos propostos para 2015: reduzir a pobreza extrema; alcançar a universalização do ensino básico; promover a igualdade de gênero; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde das gestantes; combater doenças como malária e Aids; promover a sustentabilidade ambiental; e estimular a parceria global para o desenvolvimento. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, admitiu que ainda persistem desigualdades e as metas foram atingidas de forma assimétrica.

O sucesso, mesmo relativo, da iniciativa mostra que comprometer os países em torno de metas de prosperidade é uma iniciativa benéfica e factível. Por outro lado, a disparidade revela que os maiores avanços ocorreram nas nações que têm como sistema um modelo que combina economia de mercado e instituições democráticas.


E este é um fato importante a ser observado, sobretudo após a ONU lançar, no mesmo fórum, a Agenda 2030 do Desenvolvimento Sustentável: uma continuação das Metas do Milênio, dessa vez com 17 alvos específicos, cuja premissa geral é criar as condições para um mundo sem pobreza, mais seguro e com economia, política e meio ambiente sustentáveis.

No caso brasileiro, por exemplo, a adoção do Plano Real pavimentou o caminho para um período de prosperidade e inclusão social, abrangendo desde o governo de FH à primeira parte da gestão Lula. Com a base criada pela abertura da economia, responsabilidade fiscal e políticas sociais responsáveis, o Brasil pôde colher os frutos de um período de bonança na economia global, marcado sobretudo pela valorização dos preços das commodities. Hoje, o país corre o risco de retrocesso em todas as áreas onde avançou justamente porque se afastou do modelo inicial.

O salto de qualidade mais evidente, no mundo, foi, sem dúvida, o experimentado na região asiática nas últimas décadas, estimulado pela adesão da China à economia de mercado, em parte. É verdade que a segunda maior economia do mundo vive hoje uma crise que ofusca o esplendor dos últimos anos. Mas uma análise detalhada mostra que os percalços que o gigante asiático enfrenta atualmente provêm justamente do lado de seu sistema que se manteve preso aos vícios provenientes de um Estado centralizador e antidemocrático.

As nações que menos avançaram nas Metas do Milênio foram aquelas que coibiram as liberdades civis, de empresas e de instituições, asfixiando a economia e o sistema político. A presença do Estado traduziu-se em ineficiência, excessiva regulação, burocracia e corrupção. Em alguns casos, gerou regimes autoritários, como mostram exemplos bem próximos a nós, comprometendo avanços sociais.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

TCU APUROU VÁRIOS CRIMES NAS CONTAS DE DILMA

Além das “pedaladas fiscais”, que configuram crime financeiro, as contas da presidente Dilma Rousseff revelaram, entre vários absurdos, a abertura de créditos suplementares por meio de decreto. Esse tipo de providência somente pode ser adotada com prévia aprovação do Congresso Nacional. O decreto deixa Dilma vulnerável à acusação de crime de responsabilidade por usurpar prerrogativas do Legislativo.

METRALHADORA GIRATÓRIA
O decreto abrindo crédito suplementar também configura ofensa à Constituição, à legislação ordinária e à independência dos Poderes.

MOTIVOS NÃO FALTAM
Além das “pedaladas”, operações de crédito, dívidas não autorizadas, omissão de despesas, etc podem inspirar pedidos de impeachment.

PERPLEXIDADE
“Ela cai hoje”, afirmou ontem um conhecido jurista, antes do julgamento do TCU, perplexo com as barbaridades nas contas de Dilma.

GASTOS A DESCOBERTO
O trabalho dedicado de 14 auditores do TCU apurou que o governo Dilma gastou como quis, sem amparo legal, mais de R$ 106 bilhões.

DECISÃO NO TSE DEIXOU DILMA ARRASADA, NA TERÇA
Dilma chegou bem disposta à abertura do Congresso da Abert, terça (6) à noite em Brasília, mas o sorriso sumiu quando, já no palco, um assessor se aproximou e contou ao seu ouvido que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia sacramentado a decisão de investigar a denúncia de dinheiro roubado da Petrobras em sua campanha. Ela desabou: empalideceu, abaixou a cabeça, fechou a cara e ficou meio aérea.

CONFUSÃO MENTAL
Chamada a discursar no evento da Abert, ainda desnorteada, Dilma fez discurso em que não disse coisa com coisa. Depois, bateu em retirada.

INDEPENDÊNCIA
Como presidente, Dias Toffoli só precisava votar para desempatar, mas, na sessão de terça, fez questão de votar favorável à investigação.

TOFFOLI INCOMODA
Assessores dizem que Dilma “não aceita” o comportamento do ministro Dias Toffoli. É que o presidente do TSE anos atrás foi advogado do PT.

QUANDO MADAME VAZA?
Dilma entrou esta semana em uma espiral descendente, imparável, que chegou a provocar pânico no Planalto e fez retornar a discussão sobre quanto tempo a presidente conseguirá permanecer no cargo.

REDUZIU A PÓ
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, precisou de apenas 8 páginas para reduzir a pó mais de 1.000 páginas do pedido da AGU para suspender o julgamento das contas do governo Dilma, no TCU.

SEM RABO PRESO
Na derrota acachapante do governo, com a rejeição das contas de Dilma, destacaram-se as intervenções enfáticas e desassombradas dos ministros Bruno Dantas e Vital do Rêgo, recém-chegados ao TCU.

VENDA ESTRANHA
Chamou a atenção da Lava Jato a negociação de venda dos poços de petróleo, na África, do banco BTG, de André Esteves, para a petroleira nigeriana Oando. É que está lá um dos novos pontos de atenção do grupo de investigação, a partir dos depoimentos de colaboradores.

SOMOS TODOS MOTORISTAS
“Sou motorista”. Assim deputados ironizaram ontem o deputado Takayama (PSC-PR) que tomou um corretivo de Marcão, motorista gente boa do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), que reagiu à agressão do parlamentar. Delcídio agiu bem, defendendo o funcionário.

DECISÃO FOI DE DILMA
O líder do PMDB, Leonardo Picciani, diz que até tentou emplacar o deputado Manoel Júnior (PB) ministro da Saúde, incluindo seu nome em uma lista de sugestões, mas a escolha foi de Dilma. Dias antes, Manoel Júnior havia defendido a renúncia imediata da presidente.

PEDIDO DE DIVÓRCIO
O deputado Carlos Marun (PMDB-MS) perdeu a linha, ontem, com a passagem da cantora/dançarina Valesca Popozuda na Câmara. Afirmou-se disposto até a se divorciar só para ganhar um abraço dela.

MEMÓRIA
Fazem 38 anos, nesta quinta (8), que Ernesto “Che” Guevara foi preso na aldeia boliviana de La Higuera. Seria assassinado em 9 de outubro de 1967. Deixou a frase famosa, usada hoje até em comerciais de perfumaria: “Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás”.

PERGUNTA NA PRAÇA
Pergunta que não sai da cabeça de quem frequenta a Praça dos Três Poderes: quem cai primeiro, Dilma ou o Vasco?