sexta-feira, março 23, 2012

Cenário externo se desanuviou - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 23/03/12


A cena externa melhorou muito, os juros dos títulos americanos estão mais atrativos e o risco de que o "tsunami monetário" inunde o Brasil com moeda estrangeira, forçando a valorização da moeda, é, hoje, menor do que se supunha há algumas semanas. Uma boa parte dos € 529,5 bilhões que o Banco Central Europeu despejou nos bancos, na segunda operação de financiamento de longo prazo, voltou para o BCE e deve ficar no próprio continente.

Há um processo de desinflação no Brasil desde maio do ano passado. O IPCA, hoje na casa dos 5,5%, vai perder alguns pontos em abril e maio. A queda, no entanto, pode ser interrompida em junho e julho - meses em que o IPCA foi de apenas 0,15% e 0,16% no ano passado - mas será compensada por taxas menores que as de 2011 no último trimestre do ano. Se não houver aumento de preço da gasolina, a inflação do quarto trimestre deve ficar um pouco abaixo de 0,50% ao mês.

Há, sim, chances de a inflação convergir para o cento da meta de 4,5% este ano, asseguram autoridades oficiais. "Vamos fazer o que for preciso para a inflação ficar em 4,5%, disse uma autoridade ao valor. Já 2013 é outro problema. As expectativas do mercado são de 5,5% para a variação do IPCA no próximo ano e as do Banco Central também estão acima do centro da meta. "Temos uma meta multianual. Uma projeção ligeiramente acima da meta num horizonte de 19 a 20 meses não é tão relevante", comentou um economista do governo.

Do lado do nível de atividade, a possibilidade de o PIB crescer neste ano acima de 3,5% é remota. As melhores projeções da área econômica do governo indicam que nos dois primeiros trimestres do ano a economia ainda estará meio morna, aquecendo no segundo semestre e encerrando o ano na casa dos 3%. Uma distribuição razoável da performance do produto seria de expansão em torno de 0,5% a 0,6% no primeiro trimestre, de 1,2% no segundo trimestre e de 1,6% nos dois últimos trimestres do ano. Crescimento de 3,2% para este ano, portanto, seria uma boa aposta.

Foi com base num cenário internacional mais amistoso e no fraco desempenho da atividade doméstica que o Comitê de Política Monetária (Copom) comunicou, na ata da sua última reunião, que deve interromper a trajetória de queda da taxa básica, deixando-a num patamar "ligeiramente acima dos mínimos históricos". Ou seja, a Selic deve cair para 9%, com mais um corte de 0,75 ponto percentual, como entendeu o mercado, e ficar nesse patamar por um tempo indefinido.

Para os economistas do governo, o corte nos juros não está sendo feito à despeito da inflação. O governo Dilma Rousseff recebeu a inflação medida pelo IGP-DI em 11,3%. Em fevereiro, ressaltam, o índice acumulado em 12 meses havia caído para 3,39%. O IPC da Fipe está praticamente no centro da meta na segunda quadrissemana deste mês. O IPCA, que mede a inflação de famílias com renda mensal de até 40 salários mínimos, cai mais lentamente.

Embora os analistas privados vejam o Banco Central de hoje como mais permissivo com a inflação do que o BC do governo anterior, autoridades da área econômica salientam que a taxa, hoje, não está fora dos padrões dos últimos anos.

A média de variação do IPCA nos 13 anos de vigência do regime de metas é de 6,76%. Subtraindo o índice de 12,53% de 2002 - que foi um momento atípico de risco eleitoral - essa média cai para 6,28%, ainda salgada. Nos últimos cinco anos ela caiu para 5,42%. O fato é que a inflação só ficou no centro da meta ou abaixo dele em quatro dos 13 anos (2000, 2006, 2007 e 2009).

A resistência da inflação no Brasil é alimentada pela indexação. Há, também, uma pesada inflação de serviços - movida pelo crescimento da oferta de emprego e por ganhos salariais. Recentemente, o BC fez uma sondagem junto a economistas do setor privado para colher sugestões sobre como descomprimir os preços dos serviços. O retorno foi fraco. A expectativa é de que a queda da inflação dos bens não comercializáveis seja gradual.

Para viabilizar a convergência do IPCA para o centro da meta, será decisiva a política de preços da Petrobras. Se depender unicamente da área econômica, não haverá reajuste da gasolina neste ano, até porque o combustível no Brasil já é caro. Comparado aos Estados Unidos, o galão de gasolina no país custa 50% a mais. Há, entre a Petrobras e a bomba de gasolina uma gama de custos tributários, margem dos distribuidores, entre outros, que precisa ser olhada, dizem as fontes.

As notícias mais recentes da economia mundial, reforçam, já não são tão sombrias. A economia nos Estados Unidos reage e a rentabilidade dos títulos do governo americano tem melhorado. O papel de dez anos, que no dia 7 de março rendia 1,97% ao ano, na sexta-feira passada já havia subido para 2,30% e ontem fechou em 2,27%. Na Europa a situação ainda é complicada, mas as ações recentes do BCE irrigaram o sistema bancário em € 1 trilhão. O temido "tsunami monetário" cunhado pela presidente Dilma Rousseff, porém, pode não chegar ao Brasil.

"Agora temos que parar de falar de crise. É hora de reacender o espírito animal", comentou um ministro ontem. Quanto à taxa de câmbio, ela continua flutuante, mas sob um fluxo de recursos regulado. Não desagradará a ninguém, no governo, se ela ficar na casa de R$ 1,80.

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