FOLHA DE SP - 12/01
Descemos à irrelevância de discutir se a inflação alta faz meia década 'caiu' ou 'subiu' centésimos
TORNOU-SE ASSUNTO o fato irrelevante de que a inflação anual de 2013 foi 0,07 maior do que os 5,84% de 2012. Para quase todos os efeitos, 0,07 É ZERO. Seria igualmente irrelevante que a inflação tivesse baixado a 5,72%, a "meta" do governo.
Uma inflação menor em 12 centésimos faria diferença apenas para uma linha irrelevante de discurso da presidente-candidata. Centésimos não fazem diferença para a política econômica ou para o mundo real do supermercado. São ou deveriam ser apenas fofoca do mundo paralelo de Brasília ("a presidente ficou fula com a alta de sete centésimos"). Francamente.
Antes que se elevem os protestos da mais baixa estima e desconsideração pelo colunista, ressalte-se que não se está a dizer que a "inflação saiu do controle", até porque isso é óbvio exagero tolo ou desconversa.
Temos inflação relativamente alta faz cinco anos, próxima de 6%, com exceção do 2009 de colapso mundial e recessão. Não se trata de acidente, de choque de preços, de praga de gafanhotos que comeu as plantações do mundo ou da evaporação do petróleo do Oriente Médio.
Temos consumo demasiado (dada a nossa renda), desemprego baixo, preços subindo a mais de 8% no setor que não é afetado pela competição externa, carestia de serviços se espraiando por outras partes da economia. Mesmo com preços reprimidos pelo governo. Isso é inflação com todos os "efes" e "eles".
Pode-se enveredar por caraminholas teóricas e estatísticas a respeito de 6% ser inflação alta demais. Mas pode-se contar muita história a fim de mostrar problemas bem concretos e contextualizados dessa inflação persistente. Um exemplo.
Tivemos inflação a 6% na meia década em que as maiores eco- nomias do mundo temeram deflação (inflação até abaixo de 1%), com consumo anêmico, investimentos se arrastando e repressão de salários. Parte grande do "ajuste" euro-americano foi esfolar o couro do trabalhador.
Baixa de custos salariais e provavelmente outros ganhos de eficiência tornaram boa parte do mundo mais "competitivo" em relação ao Brasil, que fica cada vez mais caro.
Carestia aqui e consumo mundial baixo são motivos importantes da estagnação de quase meia década da nossa indústria (e dos investimentos no setor), que parece até subutilizar trabalho, mas não tem preço para competir. Investimento e crescimento industrial baixo têm nos segurado.
A gente até pode dar "tchau, tchau" para a indústria, ficar no que somos hipercompetitivos, no agronegócio: tem gente que gosta da ideia. Só que não, nem é esse o caso de fato. O governo, nós, está pagando para manter a indústria, com desoneração tributária e subsídios pesados. Esse arranjo de equilíbrio malabarista ineficiente não vai prestar.
Sim, o câmbio, o dólar antes barato, avariou a indústria (teria sido problema menor se o governo tivesse consumido menos). Mas, para compensar a defasagem de eficiência e a inflação anual de 6%, precisamos de rodadas de desvalorizações fortes do real, o que só não vai dar em mais inflação com repressão ainda mais feia de salários (fazíamos isso no início dos 1980).
"O Brasil está caro" virou clichê. Mas não é coisa apenas de quem vai a Miami. É um rolo que enreda a economia inteira.
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