domingo, janeiro 12, 2014

Bruxarias do mercado em ano eleitoral - ELIO GASPARI

O GLOBO - 12/01

Tem gente que acredita em pajé ou em agências de risco, mas as bruxas existem e suas vassouras estão por aí


O fato de um sujeito ser paranoico não impede que ele esteja sendo seguido. A doutora Dilma reclamou que seu governo sofre uma "guerra psicológica". Nada mais natural para um comissariado que vive sob a mentalidade do sítio, julgando-se perseguido pela imprensa, pelos aliados e pelo mercado. Mesmo assim, o paranoico pode estar sendo seguido.

Outro dia a agência de risco Moody's anunciou que poderá baixar a cotação do Brasil. Isso foi o suficiente para provocar um leve piripaque no mercado financeiro. O fato de a Fitch ter dito o contrário não teve qualquer importância.

As três grandes empresas desse mercado (Standard & Poor's, Moody's e Fitch) são uma espécie de oráculo. Por mais que possam ser neutras, a verdade é que com esses anúncios pode-se ganhar um dinheirinho fácil. Compra-se hoje, vende-se amanhã e embolsa-se algum. Na crise de 2007 elas passaram por um vexame histórico. Lambuzaram bancos quebrados e iludiram a boa-fé do público. Essa foi a conclusão a que chegou uma comissão de inquérito do governo americano.

Faz melhor negócio quem acredita nas agências de risco e não presta atenção ao que diz o ministro Guido Mantega, mas coisas estranhas acontecem no mundo das previsões econômicas.

No final de abril de 2008 Lula decidiu tirar o doutor Henrique Meirelles da presidência do Banco Central, convidou o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, que aceitou. No dia 1º de maio a agência Standard & Poor's elevou a cotação do Brasil, concedendo-lhe o "investment grade". Meirelles ficou no BC.

Durante a campanha eleitoral de 2002 o banco JP Morgan rebaixou a cotação do Brasil diante da possibilidade de Lula vencer a eleição presidencial. Nessa época o Morgan fazia negócios com o gênio Bernard Madoff, que vendia vento, numa fraude de US$ 65 bilhões, a maior da história americana. Há pouco o banco concordou em pagar uma indenização de US$ 2,6 bilhões às suas vítimas. Seus diretores não fizeram isso por altruísmo, mas para encerrar um processo que poderia levar alguns deles à cadeia.

Já o banco Goldman Sachs criou em 2002 uma gracinha chamada "Lulômetro". Era uma bonita equação onde o interessado preencheria as variáveis ao seu gosto e obteria o valor do dólar caso Lula fosse eleito. (A moeda americana ameaçava chegar a R$ 4.)

Divide-se a galera da psicologia das previsões em três grupos. Um quer advertir a clientela para a situação econômica ou os riscos de um resultado eleitoral num determinado país. É esse o seu papel. Outro quer influenciar a plateia e faz de bobo a quem acredita na neutralidade de sua previsão. No terceiro grupo estão aqueles que pouco se interessam pelos resultados econômicos ou eleitorais. Querem apenas ganhar algum. Na crise do real sobrevalorizado de 1998, um banco americano publicou um artigo propondo que Fernando Henrique Cardoso confiscasse a poupança nacional, como fizera Fernando Collor. (Sugestão idêntica veio do presidente da Argentina, Carlos Menem.) Era maluquice, mas um conhecedor do mercado estudou as cotações dos papéis brasileiros nos dias anteriores e posteriores a essa sugestão e concluiu que um espertalhão poderia ter ganho algo como US$ 5 milhões em poucos dias.

SALVEM A FACULDADE

A Universidade Gama Filho, onde funciona a maior faculdade de medicina do país, está apodrecendo. A doutora Dilma, o governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes comportam-se como se esse problema fosse do Qatar, sede da Copa do Mundo de 2022.

A trinca quer fama pelas obras que faz para grandes eventos. Fariam melhor se preservassem uma faculdade que tem 2.400 alunos. Não lhes convêm ficar como governantes que construíram estádios e assistiram ao fechamento de uma faculdade de medicina.

(Desde que os controladores não recebam um só tostão da Viúva e sejam obrigados a pagar o que devem.)

DE OLHO

O presidente do conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Coêlho, é candidato a uma vaga no Supremo Tribunal Federal.

Espera que o senador José Sarney ajude a levar seu pleito à doutora Dilma.

E-BOOKS

No Brasil ainda não se chegou a um acordo entre as editoras e as bibliotecas públicas para regular a circulação de livros eletrônicos para os contribuintes.

A coisa pode funcionar assim: a biblioteca empresta os livros por um prazo determinado, ao fim do qual o link morre.

Todo mundo ganha. Os livros custam a metade, as despesas com armazenamento e manutenção tornam-se desprezíveis, e o freguês recebe a obra sem sair de casa.

Já nos Estados Unidos, onde criam-se poderosas bibliotecas eletrônicas, foi inaugurada no Texas a primeira biblioteca sem livros de papel. No condado de Bexar, a Bibliotech oferece não só as obras, mas empresta também as tabuletas.

EREMILDO, O IDIOTA, FOI AO MARANHÃO

Eremildo é um idiota e soube pela repórter Andréia Sadi que a governadora Roseana Sarney, donatária do Maranhão, queria abrir uma licitação para adquirir mais de uma tonelada de camarões, 750 quilos de patinhas de caranguejo e um estoque de lagosta fresca. A feira custaria cerca de R$ 1 milhão e abasteceria a despensa da doutora tanto no palácio como em sua casa de praia.

Depois o cretino soube que o governo de Roseana Sarney divulgou uma nota repudiando a divulgação de um vídeo "com apelo sensacionalista". Eremildo convenceu-se que alguém havia filmado as lagostas e patinhas de caranguejo da governadora. Achou que o repúdio era mais do que justo.

Só depois ele soube que o vídeo mostrava presos decapitados numa prisão maranhense. O governo da senhora disse que ocorreu uma "ação criminosa (...) que fere todos os preceitos dos direitos humanos". O idiota ficou com uma dúvida: se o vídeo não tivesse sido divulgado, os direitos humanos dos presos degolados teriam sido preservados?

Eremildo fez umas contas de economia doméstica com a despensa da doutora Roseana. Ela pretendia gastar R$ 1 milhão para abastecer seu palácio e a casa de verão durante um ano. Isso dá uma conta de US$ 418 mil. (Isso para não se falar no caviar para visitantes ilustres.) Como disse a doutora, o Maranhão tem problemas porque "está mais rico", e rico sem caviar é um miserável.

O bilionário Michael Bloomberg foi prefeito de Nova York durante 12 anos e a conta dos almoços e cafés da manhã de seu gabinete ficou em US$ 890 mil, ou US$ 74 mil por ano.

Uma diferença: Bloomberg, que já era bilionário quando entrou para a política, pagou a fatura com dinheiro do próprio bolso.

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