O Estado de S.Paulo - 29/09
O acesso à assistência médica privada é o terceiro maior sonho do brasileiro, atrás da casa própria e da educação. A cada quatro brasileiros, um possui plano de saúde. A principal motivação é a baixa qualidade dos serviços públicos. No entanto, a carteirinha do plano de saúde privado está longe de ser garantia de acesso a serviços de qualidade.
Apenas entre março e julho deste ano, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) recebeu 17 mil reclamações sobre a qualidade do atendimento de 41% das operadoras do setor. A maioria das queixas aponta descumprimento do prazo de agendamento nas consultas médicas e exames clínicos, recusa de cobertura a tratamentos de doenças e falta de autorização para procedimentos médicos.
Não falta quem argumente que esse volume de queixas é baixo. Mas, nessa matéria, os critérios são diferentes. A ocorrência de cem casos de dengue a cada 100 mil pessoas pode parecer insignificante num país de 200 milhões de habitantes, mas é suficiente para ser considerada epidemia. "No setor, uma queixa pode significar risco de vida", observa André Longo, diretor-presidente da ANS.
O Índice de Reclamações, calculado pela média das queixas contra uma operadora e do seu número de beneficiários, é a base para a ANS suspender a comercialização de planos de saúde mal avaliados desde dezembro de 2011.
Há um mês, no entanto, uma sentença judicial impede que a ANS suspenda a comercialização de 246 planos, por entender que a medida não dá direito de resposta às operadoras. "O que o beneficiário pensa ser uma falha quase sempre não passa de desconhecimento da lei ou das cláusulas contratuais", rebate Guilherme Valdetaro, advogado da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que reúne 17 empresas do setor.
Longo refuta: "Mediamos os conflitos e 80% dos casos são resolvidos com as operadoras sem punições". Ele observa que a suspensão é a primeira de uma série progressiva de punições, como multas e intervenções na direção fiscal e técnica das operadoras.
O mercado de saúde suplementar está pressionado. Em dez anos, o crescimento da classe média elevou em 53% o número de beneficiários. Hoje, são 49 milhões de pessoas (veja o gráfico). A FenaSaúde se queixa da escalada dos custos. Entre 2007 e 2012, as despesas assistenciais das operadoras cresceram 91% (veja também as receitas no Confira). Somados custos com administração e impostos, diz a FenaSaúde, o setor acumulou prejuízo de R$ 1,3 bilhão em 2012.
"Há planos que recebem mensalidades de apenas R$ 30. Essa conta não fecha", pontua Libânia Paes, especialista em Administração Hospitalar da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Enquanto isso, crescem as filas nos prontos-socorros, faltam leitos nos hospitais e a marcação de consulta leva meses. "As redes de atendimento não cresceram da mesma forma. O setor inteiro sofre com o déficit de todo tipo e escassez de especialistas", reconhece Longo.
A conta pode não fechar, mas a fatura sempre chega para o consumidor, no boleto bancário e na espera de atendimento.
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