O Estado de S.Paulo - 23/06
Governo da hora - e no poder há dez anos -, o PT é depositário do maior desgaste político com as manifestações dos últimos dias em todo o País. A gradativa corrosão de seu capital político, do que o mensalão é mais emblemático, tem na perda do monopólio das ruas o fim de um ciclo em que o patrimônio ideológico sucumbiu ao fisiologismo.
O modelo de cooptação de partidos, sindicatos e entidades estudantis, na busca de uma hegemonia que gerou a condenação do partido pelo Supremo Tribunal Federal, emudeceu os canais legítimos de crítica ,essenciais ao equilíbrio do governo, mergulhado numa zona de conforto agora sacudida pela marcha histórica da classe média.
O movimento é apartidário, porém não apolítico, o que torna precipitado traduzi-lo como uma ameaça à democracia representativa, até porque é a omissão do Poder Legislativo, em grande parte cooptado (basta ver a extensão da base de apoio ao governo), que dá causa ao impulso pela democracia direta, da qual o recuo no aumento das passagens é uma demonstração pontual.
O veto à participação dos demais partidos, por enquanto, parece sugerir mais um protesto pela indiferença com a deterioração dos serviços públicos que perdem investimentos para a corrupção - a maior causa da gestão ineficiente a gerar a cobrança por mais presença do Estado ( que não deve ser confundida com mais Estado).
Embora o recado alcance todos, em todas as instâncias de governo, também a presidente Dilma Rousseff é atingida de forma mais dura no primeiro momento. O movimento coincide com uma substancial queda de sua aprovação nas pesquisas, explicada principalmente pela inflação, com a qual flertou.
É um quadro de difícil reversão, não só pelo curto prazo até o final do mandato, mas porque seu governo está definitivamente conduzido pelo projeto de reeleição - incompatível com as medidas de ajuste necessárias para uma virada. Se após as pesquisas a maioria do mundo político passou a lidar com a irreversibilidade de um segundo turno, agora já se questiona até seu favoritismo em 2014.
A perplexidade ainda não deu lugar a ações práticas, como uma agenda positiva - e nem poderia, dado o pouco tempo para que sejam analisados todos os aspectos das manifestações. Mas do que já se sabe, fica claro que se esgotou o ciclo dos truques e dos governos de marketing, que "produzem" gestores, mas não serviços.
O que explica o discurso da presidente Dilma, anteontem, correto do ponto de vista institucional, mas sem qualquer conteúdo que responda à pauta das ruas, cuja síntese é a devolução à função pública do conceito de servir.
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