O ESTADÃO - 18/09
Um dos maiores poetas do século 20, o grego Konstantinos Kaváfis, tem um poema, intitulado Embaixadores de Alexandria, que lembra o que vem acontecendo com o Banco Central e suas políticas.
O poema conta que os dois Ptolomeus que lutavam pelo trono do Egito mandaram embaixadores ao santuário de Delfos para consultar Apolo sobre qual dos dois arrebataria o poder. Era grande a ansiedade por um sinal e a resposta demorava exasperantemente. Mas eis que, de repente, desapareceu o interesse pelo oráculo. Por quê? Ora, Roma decidira quem ficaria com o trono e já não era necessário o veredicto de Delfos.
O recado mais notável que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, passou na entrevista à repórter Raquel Landim, publicada no domingo pelo Estadão, foi que já não esconde quem manda no Banco Central.
Não precisamos mais de Comitê de Política Monetária (Copom). Adeus "Copom watchers" - aqueles que antes se punham a interpretar os oráculos do Banco Central ou a falta deles. Também não necessitamos mais dos enormes catataus do Relatório de Inflação nem tampouco das sempre herméticas atas do Copom.
Sabemos com pelo menos quatro meses de antecedência que "os juros (básicos ou a Selic) não precisam ser elevados (em 2013)" e que o corte nas reservas dos bancos (depósito compulsório) se destina não propriamente a estimular o consumo, mas é parte da mesma política, na medida em que procura criar condições para a redução da margem de retorno dos bancos no crédito.
Enfim, as grandes decisões de política monetária já estão definidas - e não foram tomadas pelo Banco Central, cuja nova função é manter as aparências; é fazer o teatro de que roda incessantemente seus computadores em sofisticadas simulações e de que decide sempre na hora apropriada.
Ficamos sabendo ainda que a política de câmbio, outra ex-prerrogativa do Banco Central, é território da Fazenda: "Não vamos deixar o real se valorizar. Há quatro meses, o câmbio está acima de R$ 2. (.) É do interesse da produção brasileira não valorizar a moeda", disse o ministro.
No entanto, a última palavra sobre câmbio proferida pelo Banco Central é que as intervenções se limitam a reduzir a volatilidade das cotações - e não a dar competitividade à produção, conforme sugeriu Mantega.
Não há nada de especialmente errado em que a política de juros seja comandada direta ou indiretamente pela Presidência da República ou pelo Ministério da Fazenda. A crise global está revirando as funções institucionais dos grandes bancos centrais e seria estranho se o Banco Central do Brasil prosseguisse operando como dantes, como se nada de atípico acontecesse.
A diferença é que os presidentes dos outros bancos centrais reconhecem que estão navegando em águas não mapeadas e que se arriscam em operações "fora de padrão" - como têm feito Ben Bernanke, do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), e Mario Draghi, do Banco Central Europeu. Não é o que está se passando por aqui. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, finge que conduz as expectativas e já não se importa com que o ministro da Fazenda - com a desenvoltura já vista - determine as regras do jogo que se cumprirão depois.
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