domingo, janeiro 27, 2013

Em campanha - EDITORIAL REVISTA ÉPOCA

REVISTA ÉPOCA

O governo acerta ao baixar as tarifas de energia, mas erra ao fazer uso político do tema

A campanha presidencial de 2014 já começou. Há dez dias, a presidente Dilma Rousseff apareceu com um gibão de couro num palanque no Piauí. Na semana passada, ela ocupou uma cadeia nacional de rádio e TV para anunciar uma redução na tarifa de luz de 18% para os consumidores residenciais e de até 32% para a indústria. O tom propagandístico da fala foi dado pelos ataques aos que duvidaram de sua promessa de reduzir a conta de luz e aos que "são sempre do contra" - uma referência aos especialistas independentes que, na imprensa, alertaram para os riscos de racionamento de energia, além dos opositores do PSDB. Tom um pouco acima do apropriado, pois espera-se de uma presidente que fale a todos os brasileiros, em vez de dividi-los entre "nós" e "eles".

A redução na tarifa de energia, que é uma das mais caras do mundo, pode ajudar a atenuar sérios problemas de competitividade da economia brasileira - e, por isso, ela é muito bem-vinda. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que aplaudiu a medida, estimou uma economia de R$ 31,5 bilhões ao ano com energia elétrica, sendo R$ 9,98 bilhões da indústria.

Há sérios questionamentos, no entanto, ao modo como o governo está implementando a medida. Primeiramente, há dúvidas sobre as conseqüências da redução da tarifa num momento em que o risco de uma crise de abastecimento de energia, segundo a opinião dos especialistas independentes, ainda não está afastado. Uma das lições da crise energética de 2001 é que os incentivos financeiros afetam o consumo de energia. Naquela ocasião, a crise foi contornada com descontos para quem reduzia o consumo e punições para quem consumia além da cota. É provável que a redução na tarifa, implementada na semana passada, leve a um maior consumo. Será que o atual momento, de escassez de água nos reservatórios das hidrelétricas, é o mais adequado e prudente j para implementá-la?

Há questionamentos ainda mais sérios ao financiamento dos custos da medida. O caminho mais saudável seria a redução pura e simples da carga de impostos. Mas o governo optou por outro caminho, cheio de desvios. Parte do desconto será bancada por gastos a mais do Tesouro Nacional (ou seja, todos os contribuintes) - estimados pelo governo em R$ 8,46 bilhões. Esses gastos cobrirão indenizações às empresas concessionárias geradoras de energia pelo desconto na tarifa.

Por último, revelou-se na quinta-feira que parte dos gastos adicionais do Tesouro será coberta com a antecipação da receita da dívida a receber do Paraguai pela construção da usina de Itai- pu - mais um truque contábil dos alquimistas do Ministério da Fazenda. Tal fato mostra que há certo artificialismo na redução da tarifa de luz, o que faz suspeitar que seus efeitos benéficos poderão ser menores do que se espera.

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