O Estado de S.Paulo - 29/06
Prestes dando a mão a Getúlio que matou Olga Benário.
Lula estendendo a mão a Maluf.
A indignidade humana não tem limites.
Nas minhas viagens ao Norte e Nordeste, sempre me intrigou a ausência de frutas típicas da região. Nunca me esqueço de um hotel de São Luís. Num fim da tarde quente, desci ao bar da piscina e pedi uma caipirosca.
- De quê? Limão ou abacaxi?
- Não, quero uma fruta regional. Tem alguma?
- Tem sim.
- Qual?
- Kiwi.
Assim, por um processo misterioso, mágico, uma fruta do Sul da China, tornou-se nortista. Optei pelo limão, era mais seguro. No Recife, recentemente, me ofereceram a polpa de bacuri. "Quero a fruta mesmo." Não tem, respondeu o barman. A não ser em Belém do Pará, onde há casas de sucos maravilhosas, fica difícil topar com produtos da terra. Indo a Belém, peçam o suco de pinha. De nos levar ao céu. Também na recente viagem ao Amazonas, de vez em quando, no barco, havia algo típico. Inesquecível é a casa de sucos cremosos do Abraão, em Teresina, que existe desde 1957. Filas e mais filas. Um copão de meio litro custa apenas R$ 1,50. E vem com um poeminha que Abraão faz na hora para você, por ser repentista.
O que significa? Vergonha das coisas da terra? Cajá, bacuri, sapoti, graviola, pitomba, mangaba, tucumã, ingá, buriti, bacuri, melão de cheiro, pitanga, seriguela. Sabores inusitados. Aliás, o que anda acontecendo com nossas frutas? Perceberam que morango não tem mais gosto de nada nesta terra? Isopor puro. Antes, havia épocas de morangos, mas com as experiências genéticas (ou seja lá o que for) temos a fruta o ano inteiro. Ou não temos fruta nenhuma.
Antigamente, dava prazer descer para tomar um café da manhã nordestino. Era insensato quem pedisse no quarto, chegava o celebre Continental, tipo americano: ovos mexidos, queijo, pão, manteiga, suco de laranja. O prazer era ir ao restaurante e dar com aquela longa mesa. Enchia os olhos, enchia a boca d'água. Por essa razão, tive um reencontro feliz no Recife, no Hotel Marante, modesto, perfeito.
Fui para o café, esperava encontrar Adriana Falcão que falaria nessa noite na 3.ª Mostra Sesc de Literatura Contemporânea, que reuniu um mundo de estrelas do ofício (foi um sucesso), mas ela acabou não descendo. Há anos, Adriana e eu temos nos desencontrado. Estamos juntos num projeto, ela vai para uma cidade, eu para outra. Falo num dia, ela fala no outro. Pessoa querida. Somente a visão do bufê me consolou da ausência da Adriana (ah, como eu queria ter sido roteirista como ela). A mesa, criação de mestre Erivaldo, começava com sucos de caju e pitanga (este cada vez mais raro). Seguido por munguzá (canjica), cuscuz de massa de mandioca, macaxeira, inhame, cuscuz paulista, pão assado, cartola (fatias de banana comprida com queijo por cima), pão de macaxeira, rabanada, angu, bolo de rolo, bolo de mandioca, de fubá e formigueiro. E uma tapioqueira de primeira linha. Como a manhã estava livre, fui provando daqui e dali. Por sorte, me fortaleci e segui para o aeroporto, ia viajar naquela empresa que só dá barrinha ou cobra lanche.
Já que o assunto é comida, conto uma descoberta minha na recente viagem à Grécia. Naquelas tardes no terraço da Rua Iperiou, de onde contemplávamos a Acrópole, Renato Faria, que sabe de tudo um pouco e de pouco um tudo, contou do croissant que a maioria pensa ser francês, mas não é. É vienense. O croissant? Ah, as abobrinhas eternas são deliciosas, como diz Renato. A versão mais plausível é aquela que conta sobre o último grande cerco de Viena pelos turco-otomanos (muçulmanos) em 1683. Uma ameaça não só aos austríacos, mas a toda a Europa Oriental. Lá pelas tantas, o rei da Polônia, Jean Sobieski, foi com uma tropa de 30 mil soldados para dar uma força ao imperador da Áustria (imperador do Sacro Império Romano-Germânico) e seus aliados. Cheio de fúria, Sobieski pôs os turcos a correr e acabou com o cerco da cidade. Os inimigos fugiram apressadamente e deixaram seus acampamentos intactos.
Foi ali que os vencedores encontraram a massa folheada (típica das iguarias orientais). Os padeiros de Viena estudaram a massa e a reproduziram em um pãozinho em forma de lua crescente (símbolo dos otomanos). Nascia o croissant. Cem anos mais tarde, Maria Antonia casou-se com o delfim de França e tornou-se a rainha Marie Antoinette. Frugal, ao contrário do marido, um glutão, Maria Antonieta (entre nós) não passava sem seus quitutes. Foi ela quem levou o croissant para a França, ao lado de outros docinhos hoje chamados viennoiseries.
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