Sai dívida e entra recessão
ALBERTO TAMER
O ESTADÃO - 04/08/11
A crise não veio, mas foi apenas adiada. O alívio foi substituído ontem no mercado financeiro internacional pelo risco de recessão. Ninguém acreditou na solução temporária do Congresso americano, onde os republicanos ultraconservadores e os radicais reacionários do Tea Party venceram. Todos os outros perderam. O Brasil também.
Perdemos a chance de encontrar mercado nos Estados Unidos e enfrentamos o risco de ter uma nova inundação de dólares jogados no mercado pelo banco central americano. Só em julho, US$ 15,8 bilhões, agora aumentados pelo superávit comercial decorrente dos preços das exportações de commodities. O BC informa que eles recuam, mas permanecem altos.
A entrada de dólares por esse mercado, ao lado da atração dos juros, está relacionada com a valorização do real que o governo tenta conter. São dólares que aumentam as reservas que acabam sendo aplicadas em títulos americanos - os Estados Unidos venderam para o Brasil, China, Japão, Grã-Bretanha e outros aplicadores externos nada menos que US$ 73 bilhões na semana do auge da crise da dívida.
O acordo com o Congresso permite rolar a dívida, mas provoca o dano profundo que impede o governo dos EUA de utilizar a única arma de que dispunha para tirar a economia da recessão.
Recessão. Será? Até agora apenas alguns economistas menos expressivos alertavam para esse risco. Ontem, foi Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro do EUA, que fez um belo trabalho no governo Clinton, e presidente emérito da Universidade de Harvard. Para ele, o risco é de 30%. O professor Martin Feldman admite 50%, refletindo o pensamento de muitos. Outros não chegam a ser tão negativos, mas todos concordam que a economia americana não se recupera este ano.
Ontem, foram divulgados mais indicadores negativos. Agora, recuo também na área de serviços. Amanhã saem os números da criação de emprego. As previsões do mercado são sombrias, não se espera mais de 85 mil contratações. Foram 18 mil em junho.
As bolsas despencaram na terça-feira, com maiores perdas sucessivas em uma semana desde outubro de 2008, reagiram um pouco ontem. Novas tensões na Itália e na Espanha agravaram um cenário que se arrasta há meses, jogando para diante soluções difíceis. Tudo foi adiado na Europa, que não deve crescer mais de 1%, e nos Estados Unidos onde previsões até do banco central americano recuam a cada semana.
Crescer 2,7%? A última estimativa do Fed era que o PIB deve crescer entre 2,7% e 2,9% este ano. Vai dar? Não. Para isso, o crescimento teria de ser 3.3% nos próximos dois trimestres. No último foi 1,3%. Impossível nas circunstâncias atuais com um governo amordaçado, uma política monetária restritiva ao extremo e um mercado interno e externo retraído. Retraído, não, afundando.
Ondas, não tsunamis. No Brasil, o que se espera é mais instabilidade e recessão lá fora, mas não tsunamis derrubando fronteiras. Vão ser meses de tensões e inquietude, em que a ordem é baixar a cabeça, olhar para dentro, fortalecer reservas e administrar a enxurrada de dólares que, por mais que se faça, continuarão entrando.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, afirmou que as reservas de US$ 343 bilhões representam uma defesa segura contra crises externas. Há também o que ele classificou de "vigoroso mercado interno", que continua forte, mesmo crescendo menos devido às medidas para conter a inflação. O desafio das contas externas está circunscrito com aumento do superávit da balança comercial, petróleo, minério e commodities agrícolas, alimentos, que ninguém pode deixar de importar.
Mesmo assim, tempos ruins estão por vir, com economistas respeitáveis alertando para os riscos crescentes de recessão nos Estados Unidos Europa e Japão, que representam quase 60% do PIB mundial.
O Brasil não pode contar nem com eles nem com o mercado financeiro internacional. Só com consigo mesmo. Eles não devem sair tão cedo do clima de recessão.
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