Câmbio, desligo
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 07/07/11
A relação entre o real e o dólar é problema quando sobe e quando cai. Outras moedas têm problemas. Nos últimos 12 meses, o dólar australiano subiu 21,5%; a coroa tcheca, 17,4%; o zloty polonês, 16,5%. O peso chileno, 13,8%. O real foi o sétimo (11,8%) nesse período. A nova diretora-gerente do FMI disse que uma de suas preocupações imediatas é o fluxo de capitais para países como o Brasil.
Há duas explicações para essas oscilações no câmbio. Os Estados Unidos estão inundando com dólar o mercado, com suas políticas para tentar reiniciar o crescimento econômico. A segunda explicação que justifica algumas altas, como as das moedas brasileira, australiana, chilena, é a disparada dos preços das commodities que esses países exportam.
O fenômeno é mundial. Estamos numa era de dólar fraco. O economista José Alfredo Lamy, da Cenário Investimentos, acha que o mundo vive o segundo capítulo da mesma crise que começou em 2008. Para tentar evitar o pior - a depressão - os Estados Unidos chegaram a um nível de endividamento sem precedentes, com um déficit público gigantesco.
O real está no time de moedas que mais se valorizam porque o Brasil é exportador de matérias-primas que estão tendo alta forte, como a soja e o minério de ferro. Isso produz uma entrada extra de dólares.
No começo do ano, as previsões da Pesquisa Focus do Banco Central eram de que o Brasil teria em 2011 um saldo comercial de US$ 8,5 bilhões; agora a previsão é de US$ 20 bilhões, e a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) estima um saldo de US$ 26 bilhões. É o mesmo caso que explica a elevação de moedas de exportadores de commodities como Austrália e Nova Zelândia.
"A alta do preço das matérias-primas garante a entrada forte de dólares nos países exportadores. Somente de minério de ferro, o Brasil vai exportar US$ 38 bilhões este ano, US$ 10 bilhões a mais do que em 2010. Isso dá solidez à entrada de moeda e acaba puxando mais dólares pela via financeira, que ainda se aproveita dos juros altos pagos pelo governo brasileiro para rolar sua dívida", explicou José Augusto de Castro, da AEB.
O problema é que essa queda do dólar representa sempre uma armadilha. Incentiva as empresas a buscarem crédito no exterior, como fizeram em 2008. Em julho daquele ano, a moeda americana caiu a R$ 1,56. Mas o pulo no valor do dólar dado em seguida, que chegou a R$ 2,53 em dezembro, provocou uma crise generalizada nas empresas que tinham se endividado em dólar e apostado que a moeda americana continuaria se desvalorizando.
O fortalecimento do real ajuda o governo no combate à inflação - ainda que involuntariamente. Por outro lado, a entrada excessiva de dólares turbina o crédito, que acaba fazendo o efeito contrário.
Diante desse dilema, e das reclamações da indústria, o governo já anunciou uma série de medidas. Nada funcionou. Só para lembrar. Em outubro do ano passado, o governo elevou duas vezes o IOF sobre entrada de capital para aplicações em renda fixa, de 2% para 4% e de 4% para 6%. Depois, aumentou o IOF sobre as margens de garantia dos investidores estrangeiros na BM & F, de 0,38% para 6%. No final do ano, autorizou o Fundo Soberano a emitir dívida para comprar dólares. Só este ano, o BC já comprou US$ 41 bilhões em diversos tipos de leilão.
Na terça-feira, o ministro Guido Mantega, em Londres, sugeriu que novas medidas serão tomadas, apesar de dizer em seguida que mudanças no câmbio só podem ser anunciadas depois da decisão tomada.
Nada disso está adiantando muito porque parte do problema é determinado por fatores externos. A crise da dívida dos governos europeus (dívida soberana) está aumentando o fluxo de capitais para países emergentes, admitiu ontem a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, em sua primeira entrevista no cargo. Ela disse que este fluxo excessivo é uma de suas preocupações imediatas. Depois da Europa, claro.
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