O Estado de S.Paulo - 06/12
O governo desistiu de mais um malabarismo financeiro, desta vez com envolvimento da Caixa e da Eletrobrás, para facilitar o fechamento de suas contas em 2013. Sem poder recorrer a mais essa criatividade contábil, o Tesouro terá um pouco mais de problemas para alcançar os R$ 73 bilhões de superávit primário prometidos pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. A contribuição do novo malabarismo seria relativamente modesta, de cerca de R$ 2,65 bilhões, mas ajudaria a engordar um bolo formado por bônus de licitações de infraestrutura e outras receitas extraordinárias. Para alcançar a meta fiscal, o Tesouro tem vivido de bicos e de expedientes, incluída a redução da própria meta. A alternativa mais recomendável - uma gestão orçamentária mais séria e sustentável - continua fora de agenda.
Se a operação entre a Caixa e a Eletrobrás fosse concluída, seria possível diminuir a contribuição do Tesouro à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Essa conta, usada para cobrir os custos de geração térmica, foi sobrecarregada, neste ano, com os subsídios à redução das contas de eletricidade, um dos truques para administrar os índices de inflação.
De janeiro a outubro o Tesouro passou a essa conta R$ 8,36 bilhões, provenientes de emissões de títulos (R$ 6,37 bilhões) e de recebíveis da Usina Hidrelétrica de Itaipu (R$ 1,99 bilhão). O governo teve de aumentar seus aportes, neste ano, porque as contribuições das fontes habituais (concessionárias envolvidas na comercialização de energia) foram insuficientes para as necessidades.
O governo errou nos cálculos, quando tentou antecipar a renovação das concessões e impôs o corte de tarifas. Não só errou nos cálculos, como ainda misturou, de forma desastrada, diferentes objetivos de política.
O dinheiro emprestado pela Caixa à Eletrobrás, com juros muito baixos, seria usado para quitar dívidas de subsidiárias com fundos do setor elétrico. O Tesouro ficaria fora da manobra, formalmente, embora devesse aparecer como garantidor do empréstimo.
Em agosto, o Estado noticiou a elaboração do plano. A operação foi aprovada pelo Conselho de Administração da Eletrobrás, apesar da oposição de representantes dos minoritários. A operação foi informada à Comissão de Valores Mobiliários em 22 de novembro e na última terça-feira a manobra foi noticiada pelo jornal Valor. Diante da movimentação da imprensa e da reação de analistas do mercado financeiro, o ministro da Fazenda resolveu cancelar o financiamento da Caixa à Eletrobrás.
Funcionários federais negaram qualquer vínculo entre a operação e as dificuldades ligadas à meta fiscal. Segundo o secretário do Tesouro, Arno Augustin, o mercado interpretou mal o sentido da transação financeira. Em seguida, anunciou a emissão, em dezembro, de mais títulos da dívida pública, no valor de R$ 1,5 bilhão, para alimentar a CDE.
"No momento", a operação da Caixa está cancelada, segundo ele, porque "estava criando um tumulto desnecessário". A expressão "no momento" deixa aberta a possibilidade de uma retomada do plano em 2014. O secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, disse ter esperança de ver o empréstimo concretizado no próximo ano.
A operação desmontada é mais um desdobramento das trapalhadas da política econômica. A presidente Dilma Rousseff está certa quando se preocupa com o custo da energia elétrica, um peso para as famílias e um entrave à competitividade. Mas esse é um problema de longo alcance, para ser resolvido por meio de um planejamento amplo. Não se confunde com o problema da inflação, isto é, com o desafio representado pela alta geral e persistente dos preços de bens e serviços. O desajuste das contas públicas é um dos fatores bem conhecidos de pressão inflacionária.
Aumentar os gastos do Tesouro para maquiar os índices nunca resolverá esse problema. Ao contrário, tenderá a agravá-lo, além de reduzir as possibilidades de investir na promoção do desenvolvimento. Ao completar três anos, o atual governo parece ainda incapaz de absorver esses dados simples.
Nenhum comentário:
Postar um comentário