FOLHA DE SP - 06/12
Na globalização, mercado interno forte é consequência das economias capazes de competir em toda parte
A discussão sobre mercado interno versus mercado externo, outra vez em voga como subproduto de nosso atraso em relação a acordos de livre-comércio, assume o vício de origem de tomar a parte pelo todo. As fronteiras econômicas estão cada vez mais porosas devido às relações globalizadas e aos mercados integrados. A produção sem escala para servir ao todo global está ameaçada de não atender nem à parte nacional.
Apreciemos o Brasil, cuja produção manufatureira representa só 1,7% da indústria global e muito menos, 0,7%, das exportações. Embora o mercado interno seja preponderante para a indústria, sua produção não representa senão uma ínfima parcela do consumo mundial de manufaturas. Visto de outro ângulo, isso significa que há um gigantesco espaço a ser conquistado por produtos industriais brasileiros no exterior.
Dedicar a produção de todo o país a uma fração tão pequena do mercado mundial põe em risco a própria "reserva de mercado" local. Os conceitos de proteção de mercado e segurança econômica são outros num mundo integrado.
A produção local protegida é a que tem escala, preço e qualidade capazes de atender a qualquer mercado. Nem todos os países podem ter tal aspiração. Mas a 7ª maior economia do mundo e 4º principal destino dos investimentos estrangeiros tem razões para se preocupar com o modesto 22º lugar no fluxo de comércio global. Se não disputamos as primeiras posições nesse ranking, outros o fazem, servindo-se do mercado brasileiro como arena de competição. Algo como a seleção estar fora da Copa justamente quando o país sedia a competição.
Na economia globalizada, o jogo é travado em toda parte, não só nos campeonatos locais. EUA e China dividem os primeiros lugares em tamanho econômico e atração de investimentos e são também campeões no comércio global. Já o Brasil mantém diminuta relevância nesse campo, apesar do exuberante desempenho do agronegócio e da mineração, que elevaram a fatia do país nas exportações mundiais de 1,1%, em 2005, para 1,3%, em 2012, segundo a OMC.
Nem assim nossas exportações totais ganharam destaque no cenário internacional. E por quê? As vendas externas industriais não acompanharam a expansão do comércio global nos anos 2000 até a crise de 2008. No ranking do comércio de manufaturas, estamos na 30ª posição, regredindo do 27ª lugar que ocupávamos em 2005. Mesmo na lista de maiores importadores, em que passamos do 30º para o 20º lugar, nossa participação é apenas marginal.
O porte do mercado interno e a abundância de recursos naturais não explicam a distância em relação aos demais países. Na verdade, fizemos escolhas erradas no passado e agora pagamos o preço pelo atraso causado na estrutura industrial e nos padrões de inovação e produtividade.
Não será fácil mudar esse quadro, sobretudo devido à ociosidade nas economias avançadas. O esforço para sermos competitivos terá que ser maior. Não poderemos ter apenas laços tênues com outros países e blocos devido ao Mercosul, cujo dinamismo se esgotou. Precisamos de novos acordos. E abandonar a posição passiva diante do desenvolvimento das cadeias globais de valor (CGV).
Segundo a Unctad, agência da ONU para o comércio e o desenvolvimento mundial, países com maior crescimento do PIB per capita apresentam também maior aumento da taxa de participação nas cadeias produtivas. Pesquisa feita em 40 países mostra que a presença do Brasil nas CGV é das mais acanhadas.
Na contribuição estrangeira ao valor agregado das exportações, o índice brasileiro está abaixo de 10%. Na China, supera 30% e na média da OCDE alcança 24%. Quanto à proporção de insumos importados que é reexportada, o índice para o Brasil é de 14%, enquanto para a China e a Coreia do Sul supera 50%.
Para participar das CGV e usufruir seus benefícios, a vontade dos governantes é um primeiro e decisivo passo. Outros passos devem vir do avanço tecnológico de nossas empresas, da melhoria na infraestrutura e na educação, de sistema tributário descomplicado, de procedimentos alfandegários ágeis e de tarifas de importação em linha com padrões internacionais. O dado positivo é que as principais empresas internacionais estão no país, embora mais voltadas ao mercado interno que preocupadas em fazer da operação local uma plataforma de exportação. Isso deve e pode ser mudado.
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