"Desoneração gera emprego, segundo o governo", diz a chamada de uma matéria publicada no jornal "O Estado de São Paulo". A reportagem cita um estudo do Ministério da Fazenda no qual se constata que a renúncia fiscal de quase R$ 3 bilhões registrada até agora pelo governo com a desoneração da folha de pagamentos nos setores de couro e calçados, vestuário e tecnologia da informação pode gerar cerca de 21 mil postos de trabalho com carteira assinada por ano. Na concepção do governo, as desonerações não só criam empregos formais, como ajudam no combate inflacionário. Parece um instrumento fabuloso. Será mesmo?
Segundo o secretário de Política Econômica, Márcio Holland, o estudo revela que uma grande parte da queda na taxa de desemprego dos últimos meses é resultado direto da desoneração da folha de pagamentos. E que a taxa de demissão dos setores contemplados pela medida tem caído sensivelmente.
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em abril de 2012, sob os auspícios do Plano Brasil Maior II. Tratava-se, na ocasião, de substituir a contribuição patronal de 20% que incide sobre a folha de salários das empresas por um novo imposto sobre o faturamento dessas entidades. Cerca de quinze setores foram beneficiados pelas medidas na ocasião, incluindo os três citados no estudo mencionado pela reportagem. Em todos esses casos, trocou-se a contribuição patronal de 20% por uma alíquota sobre o faturamento que variava entre 1% e 2%, dependendo do setor. No livro que organizei com Edmar Bacha em 2012 - Bacha, E. e Bolle, M.B. "O Futuro da Indústria no Brasil, a desindustrialização em debate" - tratei desse tema junto com a economista Fernanda Guardado.
Partindo de um modelo simples para retratar o comportamento das empresas beneficiadas pelas desonerações do governo, constatamos algumas coisas interessantes. Primeiramente que, ao reduzir o custo de contratação das empresas retirando o imposto que incidia sobre a folha de pagamentos, o governo estaria incentivando o emprego de mais trabalhadores. A razão é simples: uma firma que quer maximizar os seus lucros, quando se defronta com um custo menor por trabalhador, tem o incentivo de contratar mais para produzir mais. Verificamos que, para os valores de 20% da desoneração da folha e sua subsequente substituição por um imposto de 1% a 2% sobre o faturamento, tal afirmativa seria sempre válida.
Portanto, a desoneração da folha poderia vir a pressionar o mercado de trabalho, já aquecido, por essa via. As pressões adicionais sobre o mercado de trabalho poderiam, por sua vez, intensificar a espiral salários-preços, alimentando a inflação. Isso desmontava o argumento do governo de que as desonerações ajudariam a atenuar a alta dos preços, isto é, de que serviriam, também, como instrumento de controle inflacionário.
Até aí, o modelo que desenvolvemos é compatível com as evidências do estudo realizado pela Secretaria de Política Econômica. Mas, há um outro efeito da troca do imposto sobre a folha por um imposto sobre o faturamento. Analisando o comportamento da receita das empresas para cada unidade adicional de capital, a chamada receita marginal do capital, constatamos que a substituição de um imposto sobre a folha por outro que incidia sobre o faturamento poderia afetar a escolha da empresa entre capital e trabalho.
Dito de outro modo, a forma que o governo escolheu para desonerar o setor produtivo acabava gerando um incentivo para que se investisse menos na formação bruta de capital e mais na contratação de trabalhadores.
Eis, portanto, a razão para o título desse artigo. O governo optou por desonerar a folha de pagamentos, aumentando a demanda por trabalho e pressionando os salários, isto é, onerando a inflação. Por outro lado, a adoção de um imposto sobre o faturamento para amenizar o efeito da renúncia fiscal sobre as contas públicas onerou o investimento em máquinas e equipamentos, reduzindo o estoque de capital desejado das empresas.
O estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda ainda não foi publicado. Contudo, as autoridades já permitiram que os jornais tivessem acesso ao que parece ser o lado bom da história. Faltou, entretanto, revelar o resto da trama. Para os setores que naturalmente empregam mais trabalhadores para produzir, a desoneração da folha pode ajudá-los a desfrutar de um alívio significativo. O custo agregado, entretanto, é de uma maior pressão de salários. Ao mesmo tempo, o imposto sobre o faturamento que compensa parte da desoneração implica uma escolha por menos capital. Cai o investimento.
Do ponto de vista do governo, o resultado, portanto, não parece ser dos melhores. Incentiva-se o emprego, que já não precisava de incentivos, aumenta-se a inflação, que não precisa de pressões adicionais, e prejudica-se o investimento do setor privado, que o governo quer tanto destravar.
Se há um caso na política econômica recente em que a emenda saiu pior do que o soneto, esse caso parece ser, indubitavelmente, o das desonerações que oneram.
Segundo o secretário de Política Econômica, Márcio Holland, o estudo revela que uma grande parte da queda na taxa de desemprego dos últimos meses é resultado direto da desoneração da folha de pagamentos. E que a taxa de demissão dos setores contemplados pela medida tem caído sensivelmente.
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em abril de 2012, sob os auspícios do Plano Brasil Maior II. Tratava-se, na ocasião, de substituir a contribuição patronal de 20% que incide sobre a folha de salários das empresas por um novo imposto sobre o faturamento dessas entidades. Cerca de quinze setores foram beneficiados pelas medidas na ocasião, incluindo os três citados no estudo mencionado pela reportagem. Em todos esses casos, trocou-se a contribuição patronal de 20% por uma alíquota sobre o faturamento que variava entre 1% e 2%, dependendo do setor. No livro que organizei com Edmar Bacha em 2012 - Bacha, E. e Bolle, M.B. "O Futuro da Indústria no Brasil, a desindustrialização em debate" - tratei desse tema junto com a economista Fernanda Guardado.
Partindo de um modelo simples para retratar o comportamento das empresas beneficiadas pelas desonerações do governo, constatamos algumas coisas interessantes. Primeiramente que, ao reduzir o custo de contratação das empresas retirando o imposto que incidia sobre a folha de pagamentos, o governo estaria incentivando o emprego de mais trabalhadores. A razão é simples: uma firma que quer maximizar os seus lucros, quando se defronta com um custo menor por trabalhador, tem o incentivo de contratar mais para produzir mais. Verificamos que, para os valores de 20% da desoneração da folha e sua subsequente substituição por um imposto de 1% a 2% sobre o faturamento, tal afirmativa seria sempre válida.
Portanto, a desoneração da folha poderia vir a pressionar o mercado de trabalho, já aquecido, por essa via. As pressões adicionais sobre o mercado de trabalho poderiam, por sua vez, intensificar a espiral salários-preços, alimentando a inflação. Isso desmontava o argumento do governo de que as desonerações ajudariam a atenuar a alta dos preços, isto é, de que serviriam, também, como instrumento de controle inflacionário.
Até aí, o modelo que desenvolvemos é compatível com as evidências do estudo realizado pela Secretaria de Política Econômica. Mas, há um outro efeito da troca do imposto sobre a folha por um imposto sobre o faturamento. Analisando o comportamento da receita das empresas para cada unidade adicional de capital, a chamada receita marginal do capital, constatamos que a substituição de um imposto sobre a folha por outro que incidia sobre o faturamento poderia afetar a escolha da empresa entre capital e trabalho.
Dito de outro modo, a forma que o governo escolheu para desonerar o setor produtivo acabava gerando um incentivo para que se investisse menos na formação bruta de capital e mais na contratação de trabalhadores.
Eis, portanto, a razão para o título desse artigo. O governo optou por desonerar a folha de pagamentos, aumentando a demanda por trabalho e pressionando os salários, isto é, onerando a inflação. Por outro lado, a adoção de um imposto sobre o faturamento para amenizar o efeito da renúncia fiscal sobre as contas públicas onerou o investimento em máquinas e equipamentos, reduzindo o estoque de capital desejado das empresas.
O estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda ainda não foi publicado. Contudo, as autoridades já permitiram que os jornais tivessem acesso ao que parece ser o lado bom da história. Faltou, entretanto, revelar o resto da trama. Para os setores que naturalmente empregam mais trabalhadores para produzir, a desoneração da folha pode ajudá-los a desfrutar de um alívio significativo. O custo agregado, entretanto, é de uma maior pressão de salários. Ao mesmo tempo, o imposto sobre o faturamento que compensa parte da desoneração implica uma escolha por menos capital. Cai o investimento.
Do ponto de vista do governo, o resultado, portanto, não parece ser dos melhores. Incentiva-se o emprego, que já não precisava de incentivos, aumenta-se a inflação, que não precisa de pressões adicionais, e prejudica-se o investimento do setor privado, que o governo quer tanto destravar.
Se há um caso na política econômica recente em que a emenda saiu pior do que o soneto, esse caso parece ser, indubitavelmente, o das desonerações que oneram.
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