FOLHA DE SP - 22/09
Deficit externo do Brasil chega ao maior nível desde 2002; parte da conta será paga em 2014-15
DIZER QUE O Brasil "está gastando demais" é um modo simples, simplório, de explicar que temos um deficit externo, que nossas transações com o resto do mundo estão no "vermelho": que o país consome e investe menos do que produz, tendo de importar a diferença. É simplório e soa moralizante, sendo pois estranho à economia. Mas vá lá.
O Brasil "gasta demais", tem um deficit externo de uns 3,4% do PIB, o maior desde junho de 2002 (então de 3,5% do PIB). No meio desse caminho, no início de 2008, as contas externas estavam equilibradas.
No que gastamos esses excessos medidos em 2013 e 2002, se fazemos a comparação com 2008? Nesta temporada mais recente, gastamos mais em bens de consumo.
Em si mesmos, deficit externos não são bons ou ruins, assim como ter dívida e tomar empréstimos pode ser conveniente ou não (depende do tamanho e do uso da dívida, se o empréstimo vai nos render mais do que os juros que pagamos por ele etc.). Um deficit externo na verdade é uma espécie de empréstimo.
Tanto em 2002 como em 2013 a situação da balança comercial (diferença entre exportação e importação de bens) era pior que em 2008. Tanto as importações aumentaram como as exportações diminuíram de 2008 para 2013 (em relação ao tamanho da economia: como proporção do PIB). Mas, em 2002, o problema era mais o da dificuldade de exportar que o excesso de importações.
A importação de bens de consumo não fora muito diferente entre 2002 e 2008 (carros, eletrodomésticos, eletrônicos, roupa). De 2008 para 2013, cresceu bem.
Também a conta de serviços piorou mais entre 2008 e 2013. Nessa conta entram, por exemplo, a diferença entre receitas e despesas de viagens internacionais (turismo e gasto com cartão de crédito), transportes, aluguel de equipamentos etc.
O aumento do gasto com viagens foi exorbitante, 0,5% do PIB; entre 2002 e 2008, a diferença foi outra vez mínima. O aumento da despesa com turismo e cartão no exterior entre 2008 e 2013 foi maior que todo aumento do gasto com a importação de bens de capital (máquinas e equipamentos) no período.
Além da exportação fraca, porque 2002 foi um ano de deficit tão maior que o de 2008? A conta de rendas era ruim: pagávamos mais juros para investidores externos. De 2008 para 2013, essa conta quase não aumentou.
A conta de combustíveis piorou desde 2008, decerto, mas não foi decisiva para a piora do deficit (cresceu à metade do ritmo do gasto com viagens). O que incomoda no caso é que o deficit de combustíveis aumentou devido a erros grossos do governo (controle de preços, estagnação de investimentos, mudanças malucas de política etc.).
Enfim, compramos mais importados, viajamos mais, estouramos o cartão, alugamos mais equipamentos, consumimos tanto que nossa indústria ficou sem excedente para exportar (e, nos casos em que poderia fazê-lo, ficou sem mercado devido ao câmbio ruim e à fraqueza da economia mundial).
Poupamos pouco, governo e famílias. Tínhamos menos dívidas para pagar, mas torramos algo além da conta, especialmente depois de 2010, anos Dilma Rousseff. Não reservamos o bastante para investimentos "em produção", que caíram desde 2008. Vamos pagar parte dessa conta em 2014-2015
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