FOLHA DE SP - 25/09
SÃO PAULO - Deu na "Ilustrada" que psiquiatras, enfermeiros, advogados e laboratórios já reclamaram da novela "Amor à Vida". Eles se queixam desde procedimentos que julgam mal indicados até a conduta ética de personagens, passando por frases tidas por preconceituosas contra uma categoria profissional.
Tenho horror ao excesso de poder de que gozam as corporações no Brasil, mas me parece óbvio que elas têm o direito de reclamar. A liberdade de expressão, afinal, vale para todos. Daí não decorre que o responsável pelo folhetim precise atendê-las. A qualidade de autor lhe dá o direito de fazer o que bem entender.
A pergunta que se impõe é se os lamentos têm base. Embora não haja muita dúvida de que uma informação errada, mesmo numa peça literária, possa causar estragos, não me parece que as pessoas confundam ficção com realidade muito amiúde. Há, por certo, casos quase patológicos, como os dos que pregam a inerrância de textos religiosos, mas a maioria dos humanos diferencia sem dificuldades narrativas inventadas de relatos supostamente factuais.
Se há algo surpreendente aqui é que nos interessemos por histórias que sabemos ser totalmente fantasiosas. Por que perdemos tempo com invencionices? E não falamos aqui só de aficionados por romances. Narrativas literárias na vertente oral ou escrita são um universal humano.
Os psicólogos evolutivos John Tooby e Leda Cosmides acreditam que a ficção é útil e adaptativa porque coloca o cérebro em modo de treinamento, preparando-o para lidar com situações complexas que possam aparecer em algum momento da vida. Ler um livro de mistério nos habilita a lidar melhor com mistérios da vida real. E é mais seguro também. Não corremos o risco de levar um tiro do assassino. A analogia é com brincadeiras de crianças, que são um universal não apenas humano mas mamífero. Pense nisso da próxima vez que decidir combater ficções.
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