O GLOBO - 28/07
A mudança para que valha o que está escrito na lei orçamentária precisa esperar a depuração do Congresso, a fim de que melhore a representatividade política
Em países de economia estabilizada e regime democrático consolidado, o envio do Orçamento ao Congresso, sua discussão e aprovação se constituem momentos decisivos da agenda nacional a cada ano. Como os números de despesas e receitas são para valer, têm de ser cumpridos pelo Estado, o debate em torno da peça orçamentária é a discussão sobre efetivas prioridades eleitas pela sociedade.
Não há mágica, nem pode existir “contabilidade criativa”. No final do primeiro mandato de Barack Obama, a máquina pública americana pararia se democratas e republicanos não se entendessem para elevar o nível do endividamento público. Um desentendimento semelhante, na gestão Clinton, levou ao fechamento de repartições federais.
Quando se propõe no Brasil a mudança de orçamento “autorizativo”, em que a despesa pode ser feita ou não, para “impositivo”, pelo qual o Estado terá de cumprir aquilo que está escrito, aponta-se para uma mudança radical nos usos e costumes na formulação e execução do plano de receitas e despesas do governo federal.
Inflar receitas para justificar despesas, um dos cacoetes de parlamentares para encaixar emendas de gastos paroquiais, terá de ser abandonado. É natural e até desejável que o representante do povo defenda a inclusão de projetos de sua base no Orçamento. As despesas públicas precisam de capilaridade para atingir todo o país. Este, porém, terá de ser um processo transparente e sério — dois predicados escassos no jogo de faz de conta orçamentário em Brasília.
Como o governo não poderá cortar despesas sob o eufemismo de “contingenciamento”, toda a produção da chamada peça orçamentária e o seu cumprimento precisarão ter uma qualidade hoje inexistente.
Há tempos se discute o orçamento impositivo para o Brasil. Será, de fato, um avanço. No momento, tramita proposta de emenda constitucional no Congresso com este objetivo, com a previsão de ser votada em comissão especial, no início de agosto, na volta dos parlamentares do recesso.
O governo se preocupa com esta PEC. A tendência no Congresso costuma ser defender a imposição no cumprimento do Orçamento apenas para proteger as emendas. E o Planalto não quer abrir mão de contingenciá-las em supostos justes fiscais, pois o Orçamento tem cerca de 80% de suas despesas já predefinidas, engessadas: Previdência, salário do funcionalismo, Saúde etc.
Outro ponto é imaginar o que seria um Orçamento impositivo formulado por um Congresso em parte dominado pelo baixo clero e por legendas nanicas especializadas em vender (de fato) apoios. Há, portanto, riscos em se adotar a fórmula sem antes melhorar-se a representatividade do Legislativo. É uma reforma a ser feita a conversão do orçamento autorizativo em impositivo. Mas no tempo certo.
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