domingo, julho 28, 2013

Representação como honra - MARCOS ROLIM

ZERO HORA - 28/07

Não se faz reforma política por fatias, nem se pergunta ao povo sobre sistemas abstratos e engenharia institucional. Democracia não é um abuso da estatística, é debate qualificado ou é manipulação. Reforma política exige uma assembleia de representantes eleitos para este fim específico, desafio imenso para o qual a disposição dos "donos do poder" (para lembrar o conceito de Raymundo Faoro) é nula. Entre os que gostariam de produzir mudanças, por seu turno, há a dificuldade inicial de formulação de um conceito e, por decorrência, a tentação de discutir propostas no varejo sem se dar conta de que cada uma delas pressupõe um sistema. Falar, por exemplo, em recall, o instituto pelo qual o eleitor pode "chamar de volta" o seu representante quando estiver insatisfeito com sua atuação, é simpático, mas só pode existir com o voto distrital. O voto distrital, entretanto, é um sistema majoritário _ não proporcional _ que só interessaria aos maiores partidos e que retiraria as minorias do parlamento. A longo prazo, o sistema estimula o bipartidarismo de fato, como no modelo americano, além de promover um tipo de representação paroquial onde os parlamentares dão toda importância ao distrito e nenhuma ao País. Como se vê, nada é tão ruim que não possa piorar.
Um bom conceito de reforma partiria da necessidade de se pensar a política
como dignidade. Para isso, todas as propostas de mudança deveriam se orientar para a necessidade de valorizar a opinião, o debate sobre políticas públicas e a disputa de projetos globais para o País. Um dos caminhos para isto é o de construir um sistema onde a representação política seja expressão da honra, e não uma carreira. Todos os eleitos teriam apenas um mandato, sendo inelegíveis após este período por pelo menos oito anos. Refiro-me a todos os mandatos, legislativos e executivos, vedada qualquer candidatura sucessiva, ainda que para outro Poder. A mesma inelegibilidade valeria para os ocupantes de cargos de confiança, de modo a desestimular o aparelhamento eleitoral da máquina pública.
A proposta tem desvantagens como a perda da experiência dos melhores
representantes e a redução da eficiência da pressão popular sobre governos e parlamentos. A pressão, entretanto, passaria a se dar sobre os partidos, o que poderia implicar em vantagens e maior consciência política. No mais, entendo que as reivindicações mais comuns e que mais "sensibilizam" governantes e parlamentares são exatamente aquelas que impedem mudanças e reformas ousadas, por conta do corporativismo reinante e das possibilidades de premiar a demagogia e a irresponsabilidade política.
Independentemente disto, teríamos uma radical e constante renovação nas
posições decisórias em missões cuja provisoriedade desestimularia os arrivistas e tornaria a demagogia algo completamente inútil. Ao contrário do que imagina o senso comum, que gostaria que os mandatos legislativos e executivos fossem gratuitos, seria preciso que os eleitos tivessem as melhores condições de trabalho e remuneração _ única forma de atrair as pessoas mais capacitadas e de evitar que a representação política seja, cada vez mais, um espaço para aqueles que não se preocupam com subsídios: os ricos e os ladrões.

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