O GLOBO - 29/07
Os conflitos recentes em Mato Grosso do Sul entre fazendeiros e índios é mais um capítulo de uma longa e violenta história de desentendimento em que faltam mediação e equilíbrio. A radicalização de fazendeiros — muitos com terras tituladas há gerações — e tribos indígenas teria de ser evitada por uma revisão de métodos e regras com que a questão indígena vem sendo tratada no país.
Reclama-se de projeto de lei que transfere para o Congresso a última palavra na demarcação de reservas. Militantes da chamada causa indígena enxergam nesta iniciativa o lobby ruralista, preocupado com o avanço de reservas sobre propriedades produtivas. O caso recente mais rumoroso foi o da área ianomâmi da Raposa Serra do Sol, em Roraima, concedida aos índios, afinal, no início de 2009, decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Fazendas produtoras de arroz tiveram de ser desativadas. Existe o mesmo risco em Mato Grosso do Sul.
Mas não há como deixar de garantir direitos aos povos indígenas, reconhecidos pela Constituição. Trata-se, porém, de buscar o equilíbrio neste eterno cabo de guerra, também com a preocupação de garantir direitos dos produtores rurais, um segmento essencial para a economia e a sociedade brasileiras.
A tensão no setor cresceu à medida que, como em outros braços administrativos do Executivo federal, a Funai e áreas afins passaram a atuar, sob o lulopetismo, quase de forma autônoma, resultado do processo de aparelhamento ideológico da máquina pública.
Sob a égide do “politicamente correto”, nestes últimos anos os índios passaram a ser um tema privilegiado em Brasília. Merecidamente, contanto que seja considerada toda a diversidade do país e não haja privilégios a este ou aquele segmento em função de alianças com o campo político no poder. Assim como acontece no âmbito das “ações afirmativas” e na “política da mulher”, na questão indígena atuam grupos organizados, ONGs bastante influentes dentro do Estado. Na questão, transitam, ainda, segmentos do Ministério Público e da Igreja, esta por meio do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Não faltam projetos delirantes — nem por isso desprovidos de apoio — contra a própria noção de Estado. Caso da criação de nações indígenas que desrespeitam as fronteiras nacionais. Algo inaceitável.
Pode não ser função adequada ao Congresso sancionar reservas indígenas. Como também a Funai não deve ser um instrumento autônomo dentro da burocracia estatal. O falecido ministro do Supremo Carlos Alberto Direito, favorável aos ianomâmis no processo da Raposa Serra do Sol, deixou, no seu voto, uma relação de condicionantes para a administração deste problema. Entre eles, está a garantia da ação dos poderes do Estado nessas áreas, como é preciso. Além de ser um voto aprovado no Supremo, serve de roteiro para a imprescindível revisão da forma como a questão indígena tem sido tratada no Brasil.
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