quarta-feira, fevereiro 06, 2013

A missão de Henrique - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 06/02

Na sala do novo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, deputado há 41 anos pelo PMDB do Rio Grande do Norte, o visitante é recebido com uma seleção de frutas. Abacaxi, kiwi, uvas, manga, tudo bem cortado. Ontem, ele falou com exclusividade à coluna sobre como pretende executar o que propôs no discurso de posse, dentro da perspectiva de “valorização do parlamento”. Tão logo as comissões da Casa sejam instaladas, o que ficou para depois do carnaval, pedirá à Comissão de Constituição e Justiça que vote logo a admissibilidade das propostas de emendas constitucionais que tornam o Orçamento impositivo. Feito isso, o próximo passo é criar uma comissão especial para tratar do tema com o Poder Executivo.

Obviamente, a ideia não é tornar todo o Orçamento impositivo. Sabe que o governo jamais concordaria. Apenas a parcela relativa às emendas parlamentares. Essas emendas também certamente não ficarão nos valores estratosféricos de hoje, o que leva muitas vezes ao contingenciamento (os deputados têm urticária quando ouvem essa palavra!). Esse tal contingenciamento, emendas cujos valores o Executivo não corta totalmente, mas também não libera, é considerado, hoje, na visão de Henrique, algo que “constrange o governo e humilha o parlamentar”.

Constrange o governo porque, se o Poder Executivo libera, está fazendo toma lá dá cá. Se não libera, o deputado ou senador fica humilhado, porque não tem força para fazer valer aquilo que o prefeito lá do interior pediu para a cidade. Nesse sentido, a ideia do novo presidente da Câmara é formar a comissão e discutir com a área econômica do governo a seguinte fórmula: o Poder Executivo elenca os programas que podem ser alvo das emendas e os parlamentares elaboram as propostas que serão atendidas automaticamente. “Não é difícil de fazer e concilia a prioridade do Poder Executivo com o direito do parlamentar”, diz ele.

A outra proposta que está no radar de Henrique é a questão dos vetos. Ele faz inclusive o mea culpa “erramos e nos omitimos” ao deixar o bolo de vetos crescer sem apreciação por parte do parlamento. Portanto, pretende apoiar e ajudar a buscar um acordo entre os diversos partidos para devolver ao Poder Legislativo a última palavra no processo de elaboração das leis, que é a análise dos vetos. O problema aí é como um aliado do governo fará para levar os deputados da base e da oposição a manter vetos como o do fator previdenciário, do Código Florestal e da Emenda 29, que trata dos recursos da saúde (cito porque esses foram elencados pela oposição ontem, no fim da manhã, durante reunião com o novo presidente do Senado, Renan Calheiros). Henrique responde que é presidente da Casa e tem que buscar um entendimento para que haja a votação. “Cabe aos líderes dos partidos e do governo buscar o acordo”, diz, colocando-se como um magistrado nesse processo (os líderes do Senado, Eduardo Braga, e do Congresso, José Pimentel, já foram confirmados pela presidente Dilma).

Por falar em magistrado...

Henrique Alves pediu audiências para visitas de cortesia à presidente Dilma Rousseff e ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Este último marcou encontro para amanhã, ao meio-dia. Henrique quer saber dele quais são os projetos prioritários para o Poder Judiciário. Na segunda-feira, na solenidade de abertura da sessão legislativa, Barbosa mencionou o Código de Processo Civil (CPC) e o Código Penal. A conversa é vista como um bom lance no sentido de amortecer o tal enfrentamento entre os Poderes que marcou o fim da última sessão legislativa. Quanto a Dilma, como a conversa ainda não havia sido marcada até ontem, às 18h, o presidente da Câmara afirma apenas que faz questão de estreitar o relacionamento respeitoso que mantém. Ocorre que agora será de igual para igual. É o presidente de um Poder visitando o de outro Poder, e não um líder de partido aliado.

Quanto às denúncias que tomaram as páginas dos jornais nos últimos dias, pergunta inevitável, o novo comandante da Câmara considera-as “página virada”, e agora é trabalhar para tentar, como ele diz, “resgatar a imagem do parlamento”. Vem aí, inclusive, uma pesquisa que ele pretende encomendar para saber o que o cidadão espera de fato do Poder mais mal avaliado do país. “Vamos para a batalha da comunicação. Como dizia Chacrinha, quem não se comunica se estrumbica”. Vamos ver o que o novo presidente conseguirá. Uma coisa é certa: vontade, ele tem. Experiência parlamentar também. Pergunto se já que é assim, por que viajou todo mundo ontem mesmo, em vez de aproveitar a semana para escolher logo as comissões e votar o que tem que ser votado? Ele responde que, como não teve acordo para votar o Orçamento, os parlamentares aproveitaram para tentar antecipar os voos. Afinal, numa Casa onde o colegiado fala mais alto, não dá para o presidente impor, e sim dialogar.

Enquanto isso, na prefeitura de São Paulo...

Henrique estava quase terminando a conversa com a coluna quando toca o telefone. Era o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), para lhe dar os parabéns pela vitória e combinar uma visita. O telefonema pode ser um sinal de que Haddad tomou mais gosto pela política do que se podia imaginar. Não é à toa que muitos dizem que política é cachaça. Com a vantagem de que é possível beber e dirigir ao mesmo tempo.

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