sexta-feira, dezembro 28, 2012

Abastecimento de energia deixa a zona de conforto EDITORIAL VALOR ECONÔMICO


VALOR ECONÔMICO - 28/12

O clima voltou a preparar armadilhas para o fornecimento de energia elétrica em um momento delicado. O governo fez polêmica mudança no modelo de concessões do setor elétrico para forçar uma redução de 20,2% nas tarifas, hoje entre as mais caras do mundo. Seis apagões ocorreram no segundo semestre, com o último, no dia 15, atingindo 12 Estados, entre eles os mais populosos, como São Paulo, Minas e Rio. O balanço hídrico não tem sido favorável no início da estação chuvosa, quadro que pode melhorar nos próximos meses, como já ocorreu no passado.
Apagões ou racionamentos são palavras que os governos não gostam de usar ou sequer ouvir. Na quinta, a presidente Dilma Rousseff disse que o país não teve recentemente apagões, mas "interrupções" de energia, e que é "ridículo dizer que o Brasil corre risco de racionamento". Como ninguém manda no tempo, é preciso contar com o pior e o governo já vem tomando medidas adequadas, como o acionamento da cara energia das termelétricas.

É inegável que a capacidade de armazenamento dos reservatórios piorou em dezembro. No início do mês, o nível dos reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste, que somam 70% da água represada, estava 6,7% acima do que é considerado seguro para o atendimento pleno da demanda. No dia 26, o índice recuara 2,4% e era só 2,1% superior à chamada curva de aversão de risco.

Ainda é cedo para se prever racionamento, mas não para ver que as possibilidades cresceram e que as condições climáticas já pregaram uma peça nos planos do governo e nos bolsos dos consumidores. Segundo estimativas dos grandes consumidores de energia, reunidos na Abrace, R$ 2,5 bilhões já foram gastos com o acionamento das termelétricas a gás e óleo. Isso significa, para a associação, um aumento de R$ 4 a R$ 5 por megawatt na conta de luz, que será repassado nos reajustes das distribuidoras em 2013 (Valor, 27 de dezembro). Quanto mais tempo as térmicas forem usadas, maior a conta para os usuários. Pelo último boletim do Operador Nacional do Sistema, elas continuaram em operação nesta semana, dada a ocorrência de chuvas fracas ou moderadas.

O encarecimento adicional trazido pela energia das termelétricas já consumiu, pelo menos no início, boa parte da queda da tarifa prevista com a mudança nas concessões, objeto da polêmica Medida Provisória 579, aprovada pelo Congresso. Ainda que seu objetivo seja de longo alcance, o consumidor pode não sentir de cara a diferença no que terá de pagar.

Os consumidores não serão os únicos a perder. A Petrobras tem um prejuízo de cerca de R$ 240 milhões com o acionamento das térmicas, segundo cálculos da consultoria Gas Energy. A perda ocorre pela diferença entre o preço do gás natural liquefeito importado pela estatal e o preço com que ela é remunerada pelas termelétricas - US$ 18 e US$ 12 por milhões de BTUs, respectivamente. A Petrobras está se abastecendo no mercado spot, alvo da pressão do inverno no hemisfério Norte. A demanda em alta pode afetar a disponibilidade do gás para a Petrobras. Esse risco levou a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro a alertar para a eventual falta de gás natural, caso a estatal desloque sua oferta para as usinas.

E mesmo a equação da oferta de gás revela-se agora bem menos confortável. O consumo de gás natural em novembro, de 97 milhões de m3 por dia, já teria encostado na capacidade instalada de produção do país (102 milhões de m3 /dia). Dessa forma, os contornos de turbulências no abastecimento de energia estão dados e podem ou não se agravar ao longo do tempo, se as chuvas não caírem na quantidade e horas certas até abril.

Nada disso, por enquanto, chegou a afetar o abastecimento. Mas os apagões temporários revelaram, segundo a Agência Nacional de energia elétrica e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que as subestações do sistema nacional precisam de modernização. No caso da subestação de Itumbiara, que provocou a queda da energia em 12 Estados, os equipamentos tinham 40 anos de uso e se revelaram inadequados para atender as novas e maiores cargas de exigência. Há necessidade clara de mais investimentos, mas eles não são imediatamente feitos porque as tarifas, que já são muito altas, seriam ainda maiores, reconhece o diretor-geral da ONS, Hermes Chipp. Ainda falta confiabilidade do sistema elétrico.

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