sexta-feira, novembro 02, 2012

O fim dos ciclos monetários? - MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE


O Estado de S.Paulo - 02\11


Em 1997, a revista norte-americana Foreign Affairs publicou um artigo provocativamente intitulado O Fim dos Ciclos Econômicos?. Naquela altura, o mundo avançado vivenciava o início da "Grande Moderação", a era de baixa volatilidade macroeconômica que, apesar dos solavancos que caracterizariam o início dos anos 2000, se estenderia até 2007, quando apareceram os esqueletos dos subprimes. A ideia de que os ciclos econômicos haviam sido domados durou dez anos. Uma década. Parece uma eternidade. Sobretudo para os mercados. Mas, com a crise, a ilusão de que o ciclo econômico fora domesticado pelo alto grau de sofisticação da política econômica foi enterrada. O que sobrou?

Como todos já sabem, os bancos centrais dos países avançados reduziram drasticamente os juros em resposta à crise. Em certos casos, como nos EUA, a taxa básica foi levada a zero, limite abaixo do qual - em tese - não pode mais cair. A promessa do Fed de que os juros ficarão neste patamar por alguns anos e os ecos dos outros bancos centrais de países maduros de que a política monetária permanecerá inalterada induzem à pergunta, análoga à da Foreign Affairs: os ciclos monetários, os movimentos de altas e quedas das taxas de juros, foram abolidos? De certo modo, nos EUA, na Europa, no Japão e no Reino Unido, sim. Ao menos, até que se enxergue algum fim para a crise de crescimento, dívidas e desemprego que os assola. Esse fim não está próximo.

Curiosamente, muitos no Brasil têm proposto tese semelhante para explicar as mudanças na condução da política econômica. Acredita-se que há no País, agora, uma "meta de juros", o que equivale a dizer que os juros serão mantidos no patamar atual de 7,25%, independentemente das circunstâncias. E se a inflação subir além do tolerável? Bem, se isso acontecer, dizem, o Banco Central (BC) usará os apertos de crédito amplamente utilizados em 2011, esquivando-se de mexer nos juros. Ou seja, os ciclos monetários teriam sido abolidos.

Os ciclos monetários não foram abolidos no Brasil, insistiu o presidente do BC, Alexandre Tombini. A intenção é clara: derrubar a tese de que a Selic de 7,25% veio para ficar, aconteça o que acontecer.

O Brasil está no meio de um experimento, uma tentativa de normalizar a anacrônica taxa de juros brasileira. Afinal, a inflação por ora está contida, em parte em razão do cenário global. Mas as críticas ao Banco Central têm sido tão veementes quanto em 2011, quando o BC deu a guinada nos juros brasileiros e iniciou o ciclo de quedas. Ali, a inflação ameaçava ultrapassar 7,5%. Para piorar, o BC comunicava mal a sua estratégia e tudo parecia uma grande aposta. As críticas eram pertinentes. De lá para cá, o mundo ajudou a consolidar o cenário do BC. E a verdade é que a autoridade monetária mirou no que viu e acertou em tudo - dentro ou fora de seu campo de visão. As críticas sobre a atuação foram esvaziadas. Sobraram apenas as críticas sobre a comunicação.

Os dirigentes do BC reconheceram isso. No discurso que proferiu semana passada, Tombini disse que a autoridade monetária continua a se orientar pelas metas de inflação e que quer garantir que os preços convirjam para uma trajetória compatível com o regime. O BC merece o benefício da dúvida. Afinal, a inflação está, rigorosamente, dentro da meta, da banda de 2,5% a 6,5%, desde o início de 2012. O foco na banda, e não no centro de 4,5%, reflete uma maior preocupação com o crescimento. Essa maior preocupação no ambiente de inédita incerteza que caracteriza os quadros doméstico e global é legítima. Como já comentei aqui, o peso equivalente que o BC atribui aos desvios da inflação e aos desvios do crescimento de um objetivo específico, como os 4% almejados, sugere que estejam usando, informalmente, uma meta de PIB nominal. Não há nada de errado nisso, desde que não deixem a inflação fugir do controle.

É natural haver ciclos de humor com a atuação do BC brasileiro. Mas a atual onda de mau humor parece injustificada. Ainda mais quando há tantas outras coisas a criticar, como as artimanhas fiscais.

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