O perigo de um discurso anticorrupção sem maiores mediações é que ele tende a ser regressivo e paralisante
O combate à corrupção é evidentemente desejável. Por certo, exageros e injustiças acontecem, o que é característico de períodos de amadurecimento, como o que ocorre com a jovem democracia brasileira. Isso não é motivo para querer que esse processo se interrompa, mas uma dose de parcimônia é saudável ao lidar com o tema.
Por exemplo, ao contrário do que costumam indicar diversos estudos sobre a corrupção, não vejo motivos para acreditar que por conta dela o crescimento econômico seja estruturalmente menor.
A corrupção tira recursos de algumas pessoas e finalidades, transferindo-os para outros. É verdade que grandes esquemas são concentradores de renda, tirando recursos dos mais pobres para enriquecer poucos, prejudicando o efeito multiplicador da renda na formação do PIB. Entretanto, a corrupção miúda -como de policiais, flanelinhas ou pirateadores de produtos- tem efeitos desconcentradores. Difícil dizer qual é o resultado final.
Além disso, crescer é essencialmente uma questão de demanda. Se há muitas pessoas procurando novos produtos e serviços, existem perspectivas de lucro e, assim, de investimento e crescimento, que pode ocorrer a despeito de diversas mazelas, como carência de mão de obra qualificada, produtividade baixa e corrupção. O crescimento cria as condições para ir solucionando esses problemas.
Ainda assim, é inegável que a corrupção significa perda de eficiência. Licitações viciadas em compras da saúde pública fazem ser pior o atendimento à população. Independentemente das implicações sobre o PIB, isso deve ser combatido.
Por isso, sou um chato ao lidar com serviços públicos. Mesmo sem bons resultados, costumo ligar para a Prefeitura do Rio para reclamar dos motoristas de ônibus que não param no ponto. No curso que faço na UFRJ, protesto porque, em grande parte das disciplinas, os professores não cumprem a carga horária mínima.
Tento lutar contra a corrupção no varejo e na prática, mas sem fazer generalizações indevidas. Afinal, ela está bem mais próxima de nós do que sugerem os esquemas ilícitos dos políticos. Por isso, é melhor combater a corrupção em nós mesmos -por exemplo, preferindo ser multado a pagar propina- e naquilo que está mais ao nosso alcance.
O perigo de um discurso anticorrupção demasiadamente geral e sem maiores mediações é que ele tende a ser regressivo e paralisante, estabelecendo dicotomias e pré-julgamentos que dificultam o enfrentamento dos problemas.
Por exemplo, a Lei das Licitações tenta previamente fechar tanto a porta para possíveis fraudes nas compras públicas, que torna tais procedimentos ineficientes ou leva os gestores a buscarem formas de não aplicá-la. Em outros países, as regras são menos rígidas, mas há punição severa quando irregularidades são encontradas.
Vale ainda lembrar frases que ouvimos cotidianamente, que denotam a dificuldade que o discurso anticorrupção indiferenciado impõe ao lidar com os assuntos públicos. "Congressistas só trabalham de terça a quinta-feira", como se suas obrigações se resumissem a estar no plenário. "Policiais são corruptos e bombeiros heróis", embora geralmente ambos sejam da mesma corporação, a PM.
É claro que há profissões em que é mais fácil não cumprir as jornadas de trabalho, como as que têm estabilidade no emprego. Outras atividades são mais favoráveis à propina, como são os casos óbvios dos operadores da lei e de políticos. Mas há muita gente honesta nessas atividades, além de outras que, face a regras críveis e estímulos de punição e recompensa, se adaptam a um sistema mais racional.
Todas são atividades imprescindíveis para melhorar a qualidade de vida na sociedade. Para funcionarem melhor precisam de planejamento, regulação e cobrança racional por parte dos poderes constituídos e da população.
A agenda tem vários temas: criar novos parâmetros para a estabilidade de servidores públicos, elevar os salários de policiais, professores e médicos, regras de financiamento das campanhas eleitorais etc. Melhor enfrentá-los do que simplesmente gritar contra políticos.
O combate à corrupção é evidentemente desejável. Por certo, exageros e injustiças acontecem, o que é característico de períodos de amadurecimento, como o que ocorre com a jovem democracia brasileira. Isso não é motivo para querer que esse processo se interrompa, mas uma dose de parcimônia é saudável ao lidar com o tema.
Por exemplo, ao contrário do que costumam indicar diversos estudos sobre a corrupção, não vejo motivos para acreditar que por conta dela o crescimento econômico seja estruturalmente menor.
A corrupção tira recursos de algumas pessoas e finalidades, transferindo-os para outros. É verdade que grandes esquemas são concentradores de renda, tirando recursos dos mais pobres para enriquecer poucos, prejudicando o efeito multiplicador da renda na formação do PIB. Entretanto, a corrupção miúda -como de policiais, flanelinhas ou pirateadores de produtos- tem efeitos desconcentradores. Difícil dizer qual é o resultado final.
Além disso, crescer é essencialmente uma questão de demanda. Se há muitas pessoas procurando novos produtos e serviços, existem perspectivas de lucro e, assim, de investimento e crescimento, que pode ocorrer a despeito de diversas mazelas, como carência de mão de obra qualificada, produtividade baixa e corrupção. O crescimento cria as condições para ir solucionando esses problemas.
Ainda assim, é inegável que a corrupção significa perda de eficiência. Licitações viciadas em compras da saúde pública fazem ser pior o atendimento à população. Independentemente das implicações sobre o PIB, isso deve ser combatido.
Por isso, sou um chato ao lidar com serviços públicos. Mesmo sem bons resultados, costumo ligar para a Prefeitura do Rio para reclamar dos motoristas de ônibus que não param no ponto. No curso que faço na UFRJ, protesto porque, em grande parte das disciplinas, os professores não cumprem a carga horária mínima.
Tento lutar contra a corrupção no varejo e na prática, mas sem fazer generalizações indevidas. Afinal, ela está bem mais próxima de nós do que sugerem os esquemas ilícitos dos políticos. Por isso, é melhor combater a corrupção em nós mesmos -por exemplo, preferindo ser multado a pagar propina- e naquilo que está mais ao nosso alcance.
O perigo de um discurso anticorrupção demasiadamente geral e sem maiores mediações é que ele tende a ser regressivo e paralisante, estabelecendo dicotomias e pré-julgamentos que dificultam o enfrentamento dos problemas.
Por exemplo, a Lei das Licitações tenta previamente fechar tanto a porta para possíveis fraudes nas compras públicas, que torna tais procedimentos ineficientes ou leva os gestores a buscarem formas de não aplicá-la. Em outros países, as regras são menos rígidas, mas há punição severa quando irregularidades são encontradas.
Vale ainda lembrar frases que ouvimos cotidianamente, que denotam a dificuldade que o discurso anticorrupção indiferenciado impõe ao lidar com os assuntos públicos. "Congressistas só trabalham de terça a quinta-feira", como se suas obrigações se resumissem a estar no plenário. "Policiais são corruptos e bombeiros heróis", embora geralmente ambos sejam da mesma corporação, a PM.
É claro que há profissões em que é mais fácil não cumprir as jornadas de trabalho, como as que têm estabilidade no emprego. Outras atividades são mais favoráveis à propina, como são os casos óbvios dos operadores da lei e de políticos. Mas há muita gente honesta nessas atividades, além de outras que, face a regras críveis e estímulos de punição e recompensa, se adaptam a um sistema mais racional.
Todas são atividades imprescindíveis para melhorar a qualidade de vida na sociedade. Para funcionarem melhor precisam de planejamento, regulação e cobrança racional por parte dos poderes constituídos e da população.
A agenda tem vários temas: criar novos parâmetros para a estabilidade de servidores públicos, elevar os salários de policiais, professores e médicos, regras de financiamento das campanhas eleitorais etc. Melhor enfrentá-los do que simplesmente gritar contra políticos.
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