quinta-feira, novembro 01, 2012

A pressão salarial - SÉRGIO AMAD COSTA


O Estado de S.Paulo - 01/11

É de ficar surpreso quando se vê o resultado do balanço das negociações salariais ocorridas no Brasil neste ano. São reajustes, na maioria dos casos, não compatíveis com a realidade econômica, apresentando ganhos num momento em que o País, economicamente, não está crescendo praticamente nada. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), quase a totalidade dos acordos salariais realizados no primeiro semestre de 2012 resultou em aumentos reais para os trabalhadores.

Essa pesquisa mostrou que 96,5% dos 370 reajustes analisados ficaram acima da inflação registrada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do IBGE. Como 3% dos acordos tiveram reajustes iguais aos da inflação no período, apenas 0,5% do total ficou abaixo do índice. Os aumentos foram, em média, 2,23% acima do INPC, superando todos os resultados apresentados desde o início desses estudos, em 1996, não só na média dos ganhos reais, mas também na porcentagem de acordos acima da inflação.

Vale assinalar que até mesmo os resultados apresentados em 2010 foram superados pelos de agora. Naquele ano, quando foi registrado um Produto Interno Bruto (PIB) de 7,5%, o maior desde 1996, o total de acordos que obtiveram reajustes salariais superiores ao INPC foi de 88,2% e os reajustes salariais ficaram, em média, 1,68% acima do índice da inflação.

Na verdade, o que está acontecendo é uma espécie de populismo salarial, decorrente de uma economia fundada agora num paradoxo de quadro de quase pleno emprego com crescimento pífio do PIB, de cerca de 1,5%. Isto é, boa parte das empresas, para reter seus profissionais, concede aumentos salariais que não são justificados nem pelo desempenho nem pela produtividade.

Tal quadro de reajustes, como está sendo realizado, é um risco para a nossa economia. O resultado dessa pressão salarial encarece ainda mais o custo do emprego, gerando a redução da capacidade competitiva das empresas, o desestímulo a novos investimentos e a possibilidade de o número de postos de trabalho diminuir no País.

Os aumentos salariais, da forma como têm sido concedidos, em muitos casos desvinculados do aumento de produtividade e desconectados do contexto do mercado interno e externo, contribuem, também, para o aumento da inflação. Alguém tem de pagar esse desequilíbrio em que os salários se elevam e a produtividade não acompanha tal elevação. E esse alguém somos todos nós, consumidores. Inclusive os próprios trabalhadores que receberam o aumento salarial.

Os dirigentes sindicais deveriam ver, de maneira bem clara, esses riscos acima mencionados. São eles que negociam os reajustes salariais. E, embora muitos deles afirmem que as pautas das negociações são originadas das assembleias de trabalhadores, o fato é que em boa parte dos casos a maioria dos representados não tem a mínima ideia do que acontece no momento da chamada data-base, ou seja, na época do reajuste salarial.

Pelo fato de existir essa distância muito grande entre dirigentes sindicais e seus representados é que vários sindicalistas deveriam pensar seriamente nas consequências que os exageros incluídos na pauta de reivindicações podem ocasionar. Não raro, estão apresentando, até mesmo de forma bem-intencionada, um resultado para os seus representados que no curtíssimo prazo parece ser o melhor, mas que no médio prazo é o pior.

Celso Ming, nesta página (26/10), ao analisar a falta de mão de obra no País, de forma muita oportuna encerrou sua coluna com uma pergunta-chave: "Que acontecerá com o nível de emprego no Brasil se a atividade econômica (PIB), em vez do atual 1,5% ao ano, crescer os 3% a 4%, como conta o governo Dilma?". E eu deixo também uma indagação: Se neste ano, com um crescimento econômico quase nulo, assistimos a essa pressão salarial, como será o nível da pressão em 2013, caso o País volte a ter um avanço respeitável no PIB?

Um comentário:

FERNANDO disse...

Pela lógica do Amad, os salários sempre deverão estar em baixíssimos níveis para se ter competitividade, ou seja, a massa assalariada nunca terá oportunidade de melhorar de vida, enquanto os donos do capital se enriquecem pra valer. Não seria melhor achar uma outra desculpa para a falta de competitividade da indústria nacional?