FOLHA DE SP - 26/06
SÃO PAULO - A pergunta cabível não é se houve um golpe no Paraguai, mas, sim, qual a natureza do impeachment. Este, como outras relíquias institucionais, se apresenta de modo ambíguo o bastante para comportar diferentes interpretações.
O mecanismo surgiu na Inglaterra medieval como uma forma de processar e condenar autoridades que, por serem amigas do rei, estavam acima da lei. Em vez de seguir os trâmites normais, o julgamento de impeachment ocorria no Parlamento, que era o que de mais perto havia de um poder independente ao da Coroa.
Assim, se reduzirmos o impeachment a um procedimento penal, os entusiastas de Lugo têm razão em queixar-se do açodamento com que o caso foi julgado, o que constituiria violação ao direito de ampla defesa.
O problema é que o homem, já dizia Aristóteles, é um animal político. Desde os primórdios o impeachment foi usado não só para julgar crimes de autoridades, mas também para livrar-se de políticos impopulares. A tendência foi reforçada com os avanços institucionais pós-Iluminismo: ao menos em teoria, todos, independentemente de condição social ou ligações, seriam processados na Justiça pelos crimes que cometessem.
Não é coincidência que, na Inglaterra parlamentarista, o instituto tenha se tornado obsoleto, sendo substituído pela moção de desconfiança, capaz de depor um governo em minutos sem que ninguém evoque nenhum suposto direito de defesa.
Nessa interpretação mais política do impeachment, Lugo caiu porque perdeu apoio popular -a economia despencou de 15% de crescimento em 2010 para 1,5% de retração neste ano- e se isolou dos partidos -tentou trazer os colorados para o governo, mas falhou e, com isso, afastou os liberais, que o apoiavam. Resultado: 39 votos a 4 pelo afastamento.
Cada um pode ficar com a interpretação que preferir, mas é importante deixar os paraguaios decidirem sem interferências seu destino.
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